ARTIGO
Uma visão fenomenológica sobre os limites na adolescência.
Lucylle Fróis de Melo [1]
RESUMO
A adolescência é um período de intensas transformações
na vida de uma pessoa, transformações a nível corporal,
psicológico e social. A maneira como se passa pela adolescência
interfere significativamente na vida adulta, podendo, conforme o indivíduo,
superar certas limitações, mas com bastante dificuldades. O período
do adolescer é uma fase de descobertas e de início da aquisição
da independência, sendo necessário o estabelecimento de limites,
por parte dos pais, para que os mesmos aprendam o que é certo ou errado
e formem uma personalidade saudável. As dificuldades da adolescência
podem refletir no rendimento escolar, sendo preciso descobrir os motivos de
tais dificuldades, para podermos intervir. Neste trabalho iremos falar dos aspectos
da adolescência e como a falta de limites pode interferir no desempenho
escolar e como os pais podem ajudar os seus filhos nessa fase tão difícil
da adolescência. Isso será exemplificado através de um caso
de dificuldade escolar que chegou à clínica-escola integrada de
psicologia da Unip e foi atendido através da abordagem gestáltica.
Palavras-chaves: adolescência, falta de limites e desempenho
escolar.
Abstract
The adolescence is a period of intense transformations in a person's life, transformations
at level corporal, psychological and social. The way as he/she goes by the adolescence
interferes significantly in the adult life, being able to, according to the
individual, to overcome certain limitations, but with plenty difficulties. The
period of the adolescer is a phase of discoveries and at the beginning of the
acquisition of the independence, being necessary the establishment of limits,
on the part of the parents, so that the same ones learn what is right or wrong
and form a healthy personality. The difficulties of the adolescence can contemplate
in the school income, being needs to discover the reasons of such difficulties,
for us to intervene. In this work we will speak about the aspects of the adolescence
and as the lack of limits it can interfere in the school acting and as the parents
they can help their children in that phase so difficult of the adolescence.
That will be exemplified through a case of school difficulty that arrived at
the integrated clinic-school of psychology of Unip and it was assisted through
the approach gestáltica.
Keywords: adolescence, lacks of limits and school acting
Introdução
Histórico da Gestal-terapia
A palavra Gestalt tem origem alemã e surgiu em 1523 de uma tradução
da Bíblia com o significado “o que é colocado diante dos
olhos, exposto aos olhares”. Atualmente, reconhecida pelo mundo inteiro
significa um processo de dar forma ou configuração, uma integração
de partes em oposição ao todo. (Ms Loeci, 2004). Mas foi da Psicologia
da Gestalt, que investiga as formas de se perceber o mundo, que se concebeu
o nome Gestalt-terapia. (Rodrigues, n.d).
A Gestalt-terapia teve o essencial de sua filosofia extraído do pensamento europeu, principalmente germânico. Porém, teve seu destaque e o seu desenvolvimento nos EUA, na década de 50, como uma nova abordagem psicoterapêutica. (Ginger, S e Ginger, A (1995); Rodrigues n.d).
A Gestalt-terapia foi fundada por Frederick S.Perls na perspectiva de um movimento terapêutico, filosófico e ideológico. (Saidon, 1983). Isso tudo fundamentado nas características de seu fundador que tinha como ênfase à formação vivencial, a prática e a valorização da pessoa do terapeuta, no lugar da valorização da abordagem. (Rodrigues, n.d).
A abordagem da Gestalt se resume a ficar atento ao óbvio. Através dos sentidos fazemos descobertas e compreendemos as situações. O objetivo é ajudar o paciente a assumir responsabilidades e perceber que é capaz, ou seja, o crescimento e o amadurecimento. O terapeuta gestaltista está todo tempo atento a todos os sinais que o paciente apresenta na voz, nos movimentos, na postura e na imagem. Focando no aqui e agora, o mesmo aproveita as situações para ajudar no crescimento do paciente. A forma utilizada é a frustração, para que a pessoa desenvolva seu próprio potencial e descubra que pode fazer o que espera do terapeuta sozinha. Segundo Perls (1969) “Uma pessoa sadia está em contato consigo mesma e com a realidade” (p.02) E a técnica da gestalt para que isso aconteça é o estabelecimento de um “continuum” de conscientização, onde as situações inacabadas sejam elaboradas e fechadas, através do conhecimento e da comunicação. (Perls, 1969)
São
inúmeras as influências teóricas da Gestalt-terapia. O humanismo
e o existencialismo fundamentam sua visão de homem, um ser livre, responsável
por suas escolhas e ações, assim como suas conseqüências,
em constante interação com o mundo. (Vieira, 1998). A fenomenologia
coloca como foco a descrição subjetiva do sentimento do indivíduo,
em que o essencial é o que está acontecendo aqui e agora (Ms Loeci,
2004). A psicologia da gestalt empresta as noções de forma, figura
e fundo, junto com a ênfase no processo perceptivo e no dinamismo psíquico.
O psicodrama trouxe para a gestalt a importância da representação
de conflitos e da vivência de papéis em psicoterapia. O zen-budismo
a redução, o mínimo da intelectualização
e o enfoque da consciência no presente. O behaviorismo lembrou a gestalt
a importância que deve se dar ao comportamento. (Saidon, 1983). E sobre
a psicanálise podemos dizer que gerou a Gestalt-terapia e que concebeu
um filho rebelde. (Ginger, 1995).
Conforme o exposto acima, para Perls o ser humano deve ser visto como um todo,
tanto na relação intra-organísmica como na relação
entre o indivíduo e o seu meio. (Saidon, 1983). E como disse Christian
Von Ehrenfels (1886-1932) “o todo é uma realidade diferente da
soma de suas partes”.
A percepção que temos das coisas e dos eventos é determinada pelo caráter do campo como um todo, uma realidade por si. O campo perceptivo se distingue em um fundo e uma figura, porém não podemos distinguir a figura sem um fundo. A percepção depende de fatores objetivos e subjetivos, cuja importância pode variar. Wertheirmer afirma “uma transformação tem lugar a partir do que eu quero para o que a situação exige”. (Yunes, 1999)
Perls postulou a hipótese de que “... a nossa necessidade ou interesse mais premente tende a vir naturalmente para o primeiro plano de atenção, enquanto todo o resto tende a retroceder para o fundo” (Marc Joslyn; 1977, p.306).
Goldstein postula que o homem é um ser todo unificado, o que ocorre em uma parte afeta o todo e afirma que existe um impulso de auto-regulação, em que todo indivíduo é constantemente motivado a se melhorar o quanto possível.
A gestalt não nega a influência do tempo na percepção e no comportamento presente. Como diz (Ponciano, 198, p.78) “a experiência presente é explicável a partir de sua relação com o campo fisiológico e cria uma situação a - histórica, e que o passado passa a ter um valor relativo. “ Isso pois, o passado é muito das vezes prejudicado pelas distorções causadas por eventos anteriores e ulteriores assim como pelas complexidades introduzidas pela participação de efeito histórico no campo presente (Koffa;1975, p. 290).
Perls relatou que a vários modos de realizar o crescimento psicológico e um deles é completar situações, fechar as gestalts inacabadas, ou seja, entrar em contato. “Pois com a fuga da conscientização, a rigidez da percepção e do comportamento, as necessidades não são vistas claramente e o indivíduo não é capaz de distinguir de forma apropriada entre eles e o resto do mundo. A conseqüência é a incapacidade de encontrar e manter um equilíbrio adequado.” (J.Fadiman, 1980, p.05).
Mas a gestalt terapia não vai ao passado para fechá-las, pois considera que se fossem passados, não seriam mais problemas. (Saidon, 1983). O terapeuta então convida o cliente a concentrar-se para que se torne consciente de sua experiência presente, pressupondo que as partes das situações inacabadas e os problemas não resolvidos do passado surgirão “inevitavelmente” como parte desta experiência presente. E na medida em que as situações inacabadas emergem, pede-se ao cliente que as represente e experimente de novo, com o objetivo de completá-las e assimilá-las no presente. (J.Fadiman, 1980)
Assim, na prática da Gestalt-terapia destaca-se o fato de ampliar constantemente a consciência da maneira como a pessoa se comporta, com ênfase na compreensão da experiência de uma maneira descritiva e não causal. .(Yunes, 1999).
O estudo
realizado neste artigo levou em conta a importância da conscientização
e motivação de um indivíduo para resolver e fechar, conforme
a gestalt, situações inacabadas. Temos então o propósito
de através da Gestalt e da sua maneira de olhar e apreender o todo de
uma determinada experiência, levar a conscientização de
nossa paciente que aqui será estudada e de todos que se encontram nesta
mesma fase e contexto, que aprendam assumir responsabilidades e percebam que
são capazes de superarem suas dificuldades e conseguirem atingir seus
objetivos e sonhos.
Adolescência
Consoante Bueno (1996), “a adolescência è o período
de vida entre a puberdade e a idade adulta” (p.24). Apesar de cada cultura
ter o seu próprio conceito de adolescência e definir este período
em diferentes idades, é um fenômeno universal. No Brasil o Estatuto
da criança e do adolescente define esta época peculiar entre os
13 e 18 anos de idade. (Ballone, 2003)
A adolescência é um período de intensas transformações que inclui aspectos biológicos, psicológicos e sociais. (Oliveira, 2003) O aspecto biológico produz modificações físicas visíveis que caracterizam a puberdade.
A puberdade feminina inicia entre os 11 e 14 anos, ocorrendo variações, quando surge a primeira menstruação que é simultânea com as transformações do corpo como rápido crescimento, os seios começam a aumentar, a cintura afina, os quadris alargam, surge pilosidade no púbis e nas axilas, as glândulas sudoríparas se desenvolvem tornando o odor do corpo mais intenso e provocando maior sudorese nas axilas. (Ballone, 2003)
No menino as transformações iniciam por volta dos 13 anos e estas são mais lentas do que nas meninas. As transformações são os aumentos dos órgãos genitais, o nascimento de barba e surgimento de pêlos na região pubiana, pernas, braços e peito. Além da modificação da voz, que fica mais grave, o esqueleto se alonga, os músculos se enrijecem, o tronco e os ombros alargam e a pele se torna mais gordurosa. (Ballone, 2003)
Estas mudanças físicas no adolescente interferem no seu estado psicológico, pois é um período em que sua imagem está em transformação, não é mais criança, mas ainda não é adulto. O que incita um sentimento de insegurança fazendo o adolescente a cuidar com especial atenção de sua aparência física. (Minelli, n.d)
As alterações hormonais despertam a sensibilidade sexual e provocam períodos de intensa energia física, entusiasmo, inquietação, rebeldia, oposição, irritabilidade e alguns estados de depressão. O adolescente passa assim por uma comoção emocional que ressoa em seu comportamento e provoca situações difíceis tanto para ele como para sua família. Mas todos esses estados emocionais são saudáveis e necessários para que estes jovens exprimam suas próprias personalidades e formem seu caráter definitivo. (Ballone 2003; Minelli, n.d)
É nessa fase, a adolescência, que o indivíduo adquire também a capacidade de pensar o abstrato e dedica sua faculdade ao questionamento do mundo que o rodeia. O intelecto apresenta-se aqui mais eficaz, rápido e permite elaborações mais complexas, ocorre um aumento da concentração, seleção de informações, maior capacidade de retenção e evocação, a linguagem se torna mais completa e complexa. Isso tudo faz com que o adolescente sinta que “pode tudo” tornando-se mais independente e contra os valores até então tidos como corretos. (Minelli, n.d; Ballone, 2003).
Neste momento a pessoa responsável pelo adolescente deve além da sua função específica de proteger, fazer cortes, colocar limites através de diálogo, atenção e elasticidade, apoiando e fazendo limites claros quando necessário. (Merlin, 1999)
Segundo Merlin (1999), o adolescente para criar sua identidade própria e desprender-se dos laços familiares procura pertencer a um grupo. Os pais passam neste momento um processo de separação do filho. (Selene, n.d) Nessa nova fase da vida o jovem deixa-se influenciar muito mais pelo ambiente do que antes, juntamente com o estabelecimento de novos vínculos sociais são inseridos no indivíduo um conjunto de características necessárias para que o mesmo seja aceito no grupo e expresse o seu próprio estilo. (Ballone, 2003)
Pertencer a um grupo é extremamente importante para o adolescente, pois permite que junto a pessoas da mesma idade se sinta à vontade, definindo sua própria identidade, desenvolvendo suas habilidades de interação social, adquirindo o amadurecimento suficiente para integrar-se ao mundo dos adultos e libertar-se da família, pois o grupo o apóia a ir contra os controles da família. Isso tudo acontece por que no grupo o adolescente pode ao mesmo tempo ver as características comuns a todos os membros do grupo e também reconhecer as diferenças nos outros e em si próprio. (Minelli, n.d)
Porém o fato do adolescente pertencer a um grupo não deve ser motivo de preocupação dos pais ou responsáveis, pois quando o ambiente familiar é sadio e afetuoso, a autoridade, não se perde, mas se transforma, dando aos jovens não ordens e proibições, mas o influenciando pelo exemplo, pelo afeto e pelo conselho. (Minelli, n.d)
Apesar de
a adolescência ser um período com intensas transformações
e, às vezes, muitas perturbações. É um período
muito importante na vida de todos os indivíduos, pois é onde os
mesmos aprendem e apreendem todos os conceitos, regras e limites que nortearão
a sua vida adulta, ajudando nas dificuldades da vida. Por isso é a fase
que os mesmos devem conscientizar de seus problemas e de descobrirem até
onde são capazes de ir, sendo às vezes, necessário a ajuda
de um terapeuta.
A adolescência na visão dos pais
A adolescência dos filhos provoca uma enorme ansiedade nos pais, pois
a mesma traz consigo mudanças na dinâmica familiar, na relação
dos pais e principalmente do filho que nunca será mais o mesmo.
Um aspecto importante que acontece com os pais de adolescentes é que consciente e inconsciente eles revivem o período da própria adolescência. Este é um aspecto muito importante quando os pais conseguem separar os seus próprios processos internos do de seus filhos, aproveitando assim a oportunidade para elaborar questões que ficaram mal resolvidas em suas próprias adolescências. (Selene, n.d)
Ocorre também que alguns pais não conseguem aceitar as mudanças que ocorrem em seu filho e procuram a ajuda de um psicoterapeuta com a esperança de que ele volte a ser como antes. Porém, somente alguns pais percebem a necessidade de uma orientação para lidar com essa nova situação, a maioria se mostra inflexível e aponta como problema o filho, não aceitando serem questionados em suas posturas.
Devemos alertar-los que a relação antes verticalizada, pais no poder e filhos apenas obedecem, deve ser repensada para que o jovem desenvolva uma estrutura emocional básica para uma expressão madura e adulta.
Podemos
dizer assim, que talvez parte do conflito existente entre as gerações
venha da rigidez e a necessidade de demonstrar poder por parte dos pais ou responsáveis
de nossos adolescentes. (Dinelli, n.d)
Limites na adolescência
A falta de limites na educação dos adolescentes é devido
a vários fatores, falta de valores morais da sociedade, a ausência
dos pais na vida das crianças e o medo que os pais têm com relação
aos traumas que poderão provocar nos filhos caso eles sejam mais enérgicos
na educação. (Neto, n.d).
A idéia de que a liberdade é a melhor resposta em todas as situações faz com que os pais se tornem permissivos com os desejos dos jovens para compensarem suas ausências. Às vezes também pode ser uma forma dos pais fugirem dessa tarefa tão difícil, educar. A omissão dos pais na educação pode ter conseqüências graves como o uso de drogas e o risco dos jovens se tornarem adultos infelizes e desajustados, pois a falta de limites faz com que esses indivíduos se tornem incapazes de lidar com os “reveses” frustrações naturais da vida, tenham dificuldades em relacionamentos hierárquicos, na independência emocional e financeira. Isso tudo por que os pais ao super protegerem todas as atitudes dos filhos estão ao mesmo tempo tirando a capacidade deles desenvolverem para enfrentar o mundo sem tantas dificuldades. Podemos dizer que a finalidade do limite é construir a individualidade e a identidade de um indivíduo. (Viva saudável, 2002)
Um fator que pode ajudar nessa situação é a reciprocidade na relação de pais e filhos que foi perdida e deve ser resgatada, ou seja, dar mais cobrar o preço. Os pais ou responsáveis devem também assumir e revalorizar o papel de regulador.
Segundo
Zagury (n.d), “papel de pai é ser pai” (p.4). Consoante Escobar
“Os direito e deveres dos pais são diferentes dos direitos e deveres
dos filhos, a família não deve ser uma instituição
democrática, os filhos devem ser ouvidos, mas a decisão tem que
ser dos pais” E para que os adolescentes entendam as regras familiares
às mesmas devem ser claras e expressas com convicção. (Jornal
do Comércio, 2003).
Diante da correria do dia a dia os pais se sentem perdidos, culpados, impotentes,
desamparados, irritados e agressivos e não conseguem manter um diálogo
“esclarecedor” em ambiente de respeito e equilíbrio, assim
conflitos se instalam. (Afeto e limite, n.d)
Os pais precisam admitir que são humanos e seus recursos emocionais são limitados, as dificuldades e as crises familiares são inevitáveis, e que a discussão para resolver um problema pode ser uma grande lição aos filhos para enfrentarem os problemas que a vida certamente trará. Mas momentos de grandes emoções pedem equilíbrio e indicam a “inconveniência” de se colocar limites com raiva, pressa e na presença de terceiros. Os pais devem e podem aprender o autocontrole, o desafio na educação é encontrar formas de substituir à desaprovação, o castigo, as surrras, a falta de limite por uma atitude orientadora. (Afeto e limite, n.d)
Os limites
podem ajudar o jovem em suas relações diárias a desenvolver
um auto-conhecimento e a autocrítica, permitindo que com isso expresse
seus sentimentos de forma adequada. Isso ocorre por que apesar dos limites os
pais não censuram e sim esclarecem as situações e escutam
o filho. O equilíbrio entre o afeto e o limite ensina ao adolescente
a aprender com os erros. (Afeto e limite, n.d).
Dificuldades escolares
A forma como o adolescente se comporta na escola de certa forma é o reflexo
de como é o seu contexto familiar. Segundo Ferreira e Maturano (2002)
comportamentos inadequados freqüentemente se desenvolvem em contextos de
adversidade ambiental, que existem problemas nas relações interpessoais,
falta de supervisão, monitoramento, suporte e investimento dos pais no
desenvolvimento da criança, incluindo também práticas punitivas
e modelos agressivos. O que gera uma inadaptação psicossocial
e aumentam a probabilidade do jovem apresentar dificuldades escolares com sérias
conseqüências como comportamentos anti-sociais. (Ferreira e Maturano
2002).
Para Zagury (n.d) “Acreditar que a escola possa assumir sozinha o seu papel de educar os adolescentes”(p. 2) é uma fuga bastante comum entre os pais.
A revolução bio-psíquica da adolescência pode prejudicar o desempenho escolar, na medida em que nessa fase não a inteligência, mas sim a motivação é o fator preponderante de bons resultados. (Ballone, 2003)
Uma boa
forma de se educar é demonstrar ao adolescente que se acredita nele,
que ele é capaz de vir a ser melhor. Porém pais e educadores frequentemente
não utilizam dessa técnica e quando o adolescente não vai
bem, eles reforçam essa atitude mostrando uma expectativa negativa em
relação a eles. (Andrade, n.d).
Método
Participante
A participante do presente estudo, que foi realizado na Clínica Psicológica
Objetivo - UNIP, é do sexo feminino, têm 12 anos de idade, é
brasileira, branca e pertence à classe social média.
Materiais
Todas as sessões foram realizadas em uma sala de psicoterapia na clínica
psicológica Objetivo-Unip que continha cadeiras, uma mesa, janelas e
ventilador. Foram também utilizados os seguintes materiais, caneta, lápis,
borracha, folhas de chamex A4, computador e impressora, colchonete, quebra-cabeça
e um questionário sobre sua história de vida.
Procedimentos
A participante desse estudo foi selecionada através de uma triagem clínica
feita por uma psicóloga da instituição, com a finalidade
de verificar a queixa escolar e subsidiar o atendimento psicológico caso
houvesse indicação para o mesmo. Após isso a mesma foi
encaminhada para a área de atendimento breve a adulto e adolescente da
abordagem gestáltica, onde foi atendida pela estagiária-psicóloga,
foram realizadas doze sessões de terapia, entrevistas e orientação
aos pais e aplicado um questionário sobre sua história de vida.
O responsável legal da paciente, o pai, assinou um termo de contrato,
autorizando o uso das informações sobre as sessões realizadas
com sua filha neste trabalho, o contrato garante a preservação
de suas identidades.
Cada sessão
de terapia teve duração de 50 minutos, que se estenderam por quatro
meses. Foi feita juntamente com a Sthephany uma agenda diária, para ajudar
a mesma a organizar seus horários com atividades de lazer e obrigações,
como as tarefas escolares. Como a mesma não estava seguindo a agenda
foi pedido então que tentasse fazer as atividades e quando não
conseguisse anotasse o porquê não havia realizado a tarefa, falando
de seus sentimentos e pensamentos.
Resultados
Sthephany, nossa paciente, é uma adolescente que não possui horário
pré-estabelecido para suas ações, dorme, acorda e faz tarefas
na hora que quiser. Ela adora assistir televisão e brincar com suas amigas.
Já repetiu de série uma vez, por excesso de faltas, isso por que
neste período sua irmã caçula havia nascido e ela estava
apresentando quadros de ciúmes.
A adolescente
de nosso caso, sempre ganha tudo o que pede para os seus pais. O pai da mesma
relatou durante uma das primeiras sessões que tinha aflição
de ser mais severo na educação de sua filha, por ter sofrido muito
com educação de seus pais. E ambos os pais relataram que tentam
ajudá-la dando de tudo que podem, mas que isso não havia surtido
efeitos. Pontuei para os mesmos a falta de limites existente na vida da Sthephany,
eles disseram que já haviam pensado nisso, mas que não tinham
feito nada a respeito. Falei também de que forma esse limite deveria
ser colocado, da importância deles demonstrarem a diferença de
autoridade entre eles e Sthephany.
Sthephany já trocou de escola três vezes e disse que a escola que
está atualmente é a melhor de todas, pois sua tia é a coordenadora
do mesmo, então ela pode fazer o que quiser.
Durante todas as sessões realizadas na clínica escola, onde se desenvolveu este trabalho, os pais foram orientados e tidos como importantes colaboradores na melhora das dificuldades escolares de sua filha.
Para que Sthephany apreendesse a ter limites, horários e conseguisse organizar sua vida de uma maneira mais produtiva foi realizado juntamente com ela uma agenda, em que continha horários diários para tarefas escolares, diversão, atividades físicas e descanso. Essa agenda não foi seguida por Sthephany, foi pedido então que tentasse segui-la de novo só que agora fazendo anotações sobre como estava sentindo-se quando fazia determinada atividade sugerida pela agenda e também quando não fazia. Essa tentativa também foi frustrada. Apesar de já ter sido pedido a ajuda dos pais para que a mesma experienciasse as tarefas que a terapeuta solicitava, foi novamente necessário convocá-los e de certa forma mostrar lhes que a responsabilidade sobre a vida da filha deles e suas conseqüências que no momento refletem no âmbito escolar é de total responsabilidade deles que são os educadores dessa adolescente que precisa de limites, para ter uma vida adulta equilibrada e satisfatória apesar dos reveses da vida. E também da importância de não desistirem de ajudar Sthephany, mas trocando os tipos de instrumentos e a forma de utilizarem estes para ganharem essa batalha.
Nas últimas sessões os pais de Sthephany disseram que sabiam da importância de estarem colocando limites para a melhora dela no colégio, porém esse fator não era tão importante naquele momento para eles, pois estavam vivendo uma crise de casal.
Ao conversarmos com Sthephany, levamos-a refletir sobre o que realmente era importante para ela naquele momento e também a refletir sobre se ela continuasse a agir dessa maneira qual provavelmente seria o seu futuro e se era esse futuro que ela queria. Ela no momento respondeu que ela teria que mudar sua forma de pensar e agir no presente para ter o futuro que queria.
Durante esse estudo de caso que está sendo aqui apresentado tivemos como resultados, a conscientização da Sthephany de o motivo de suas dificuldades escolares e também a compreensão dos fatores necessários, como a organização de suas atividades diárias e a valorização dos estudos em sua vida, para que ela consiga a superação de suas dificuldades.
Vimos também que apesar da adolescente conseguir acreditar e visualizar que é capaz de superar as dificuldades escolares, a mesma descobriu que no momento existia coisas mais importantes para ela investir seu tempo.
Os pais de Sthephany que também demonstraram no começo uma preocupação com as dificuldades escolares de sua filha, descobriram também que a melhora no colégio não era o assunto que eles tinham como fundamental no momento. Isso por terem que ajudarem a Sthephany na regulação de seus horários e impondo limites quando necessários, numa época em que os mesmos não estavam conseguindo tirar como foco os seus próprios problemas.
Assim, através
dos procedimentos e instrumentos utilizados, constatamos que a falta de limites
imposta a adolescente pelos pais, produzia resultados negativos que refletiam
no ambiente escolar.
Discussão
O presente artigo teve como objetivo investigar a relação existente
entre a dificuldade escolar e a falta de limites na adolescência. Sthephany,
nossa paciente, como mostrado anteriormente é uma adolescente que não
possui limites e que apresenta problemas escolares.
Sobre a falta de limites, Zaguri fala que a reciprocidade na relação entre pais e filhos foi perdida e deve ser resgatada. Todos têm direitos e deveres, mas esses são diferentes entre pais e filhos. “Papel de pai é ser pai”, e o mesmo deve demonstrar sua autoridade e ter a decisão final. A reciprocidade e autoridade dos pais em relação aos filhos foi uma das questões que foram enfocadas durante o nosso estudo e que apesar de termos trabalhado esse ponto e os pais terem conscientizado da importância de tais fatores, os mesmos não conseguiram colocá-los em prática.
A nossa pesquisa se definiu através das características da adolescência com suas conquistas, perdas e necessidades como o apoio emocional, social e psicológico e da conseqüência da falta de imposição de um responsável de autoridade e limite para com o adolescente. Em Viva Saudável, 2002 há um artigo que fala sobre a idéia que os pais têm sobre liberdade e que faz com que os mesmos a considerem como a melhor resposta em todas as situações, tornando-se permissivos para compensarem suas ausências. Mas, também vista como uma forma de fuga dessa tarefa que é tão difícil, educar. Em nosso estudo foi possível observar e confirmar a visão sobre a permissividade expostas no artigo da Viva Saudável, tivemos a oportunidade de verificar que as características dos pais de Sthephany na forma de educar a mesma baseava-se numa tentativa de resgate e compensação do sofrimento de suas próprias infâncias, que os levaram assim a uma maior dificuldade de educar.
Assim, ao descobrirmos a dificuldade do casal em relação à educação de sua filha Sthephany, compreendemos a importância de trazê-los para o presente focando no aqui e agora e alertando-os para a importância de seus papéis de autoridade e, ao mesmo tempo, de amparo, como aqueles que ensinam e acolhem.
É na adolescência que o indivíduo está conhecendo o mundo em que um dia próximo será o seu lugar, por isso ele precisa se conhecer e se preciso desafiará fronteiras para si descobrir e descobrir ao outro, e também para saber até onde pode ir, cabendo aqui aos pais delimitar o campo desse jovem, para que ele apreenda as noções da vida.
Foi possível observar com este trabalho que o comportamento de nossa adolescente é totalmente reproduzido em sua escola, principalmente pelo ambiente escolar ser uma extensão do seu contexto familiar. Não há limites para com a nossa adolescente nos contextos que a cercam, o que a impede de aprender o que pode ou não pode, tornando assim uma jovem sem regras que provavelmente se tornará um adulto com condutas inassertivas.
As pesquisas que realizamos constataram que a forma como o adolescente se relaciona em seu ambiente familiar o influencia na forma como ele se comporta em frente aos grupos que se relaciona. Tendo aqui um importante fator a ser levado como reflexão, como os pais ou responsáveis pelos adolescentes de hoje estão contribuindo para um futuro melhor para a sociedade.
Apesar dos comportamentos liberais dos pais ou responsáveis de nossas crianças e adolescente terem como justificativas a adolescência reprimida de sua época, querendo assim proporcionar a estes adolescentes uma vida diferente das suas e isto com ótimas intenções, e também devido à correria do dia a dia que demonstra o valor do sistema capitalista em nossas vidas, onde pais sem tempo enchem seus filhos de presentes e os deixam fazer o que quiserem com a ilusão de compensar o tempo que não foi investido na criação dos mesmos.
Deve-se
então alertar essa sociedade de pais para esse assunto tão esquecido,
mas ao mesmo tempo tão importante, para que os mesmos procurem orientações
caso estejam com dificuldades das melhores maneiras de educarem seus filhos.
[1] E-mail: lucyllem@hotmail.com. Telefone para contato: (62) 321 1872 ou 92223586.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
___________.Afeto e limite – Uma vida melhor para pais e filhos. Recuperado
em 15 outubro de 2004: http:// www.ergon.com.br/afetoelimite.htm
____________.Permissivo ou Autoritário. (2002) Revista Viva Saudável.
ANDRADE, Antonio. Educação para um mundo melhor: Firmeza com coração.
Recuperado em 16 outubro de 2004: http://www.editora-opcao.com.br
BALLONE GJ. Depressão na Adolescência – in PsiqWeb, Internet,
revisto em 2003. Recuperado em 01 outubro de 2004: http:// sites uol. Com.br/
gballone/ adoelesc. 2 html
BUENO, Francisco da Silveira. (1996). Minidicionário da Língua
Portuguesa. Ed. Ver. e atual. Por Helena Bonito C. Pereira, Rena Signer. São
Paulo: FTD: LISA.
DINELLI, Gino José. (n.d). Viver junto a adolescência – Internet.
Recuperado em 15 de novembro de 2004: htpp:// www.Planeta Educação
– Viver junto a adolescência. htm
GINGER, Serge e Ginger, Anne. (1995). A árvore genealógica da
Gestalt. Algumas raízes: Fenomenologia, existencialismo, psicologia da
Gestalt, cap.2 – p.33. Summus, J. Fadiman, R. Frager. (1980). Teorias
da Personalidade. Rio de Janeiro: Harbra.
MATURANO, Edna Maria; Ferreia, Marlene de Cássia Trivellato Ferreira.
(2002). Ambiente familiar e os problemas do comportamento apresentados por crianças
com baixo desempenho escolar. Psicologia: Reflexão e crítica,
vol. 15, n° 1, Porto Alegre, p.1 -16.
MS LOECI, Maria Pagano Galli. Site Gestalt – Centro do Rio Grande do Sul
Recuperado em 25 de julho de 2004: http:// www.igestalt@gestalt.psc.br
MINELLI, Aparecida Luciana – O Adolescente. Recuperado em 15/10/04: http://
www.drogas.org.br/adolescer.htm
MERLIN, JOACERI. A Identidade do Adolescente e a Formação de Grupos
- Palestra realizada no Colégio Oswaldo Aranha no Encontro de Pais, Alunos
e Professores. Outubro de 1999. Recuperado em 15 outubro de 2004 em: http://
identidadeadolescente.htm.
NETO, Armando Correa de Siqueira. Educação sem Limites. Recuperado
em 16 de outubro de 2004 em: http:// www.mathatlantica:pt/ecal-cm/ArmandoCorrea.htm
OLIVEIRA, Audrey Mara de. A Importância do Lúdico na Adolescência.
Recuperado em 15 de outubro de 2004 em: Psicopedagogia On Line: Portal da Educação
e Saúde Mental, 2004.
PERLS, S. Frederick. (1969). Algumas idéias básicas de Frederick
S. Perls in Gestalt Therapy Verbatim, Moab, Utah: Real People Press. Compilado
por Felá Moscovici.
RODRIGUES, Hugo Elidio. (n.d)
SAIDON, Osvaldo e co-autores. (1983). Práticas Grupais. Rio de Janeiro:
Campus.
SELENE, Schwalb Olívia Maria. (n.d). Até onde vai o pânico.
Recuperado em 10 de novembro de 2004: http://www.Adolescênciana relação
pais e filhos. htm.
VIEIRA, Maria Aparecida S.D. (1998). Contando a Abordagem Gestáltica.
Revista do IV Encontro Goiano da Abordagem Gestalt, n.4, p.61.
WALLONE, G. J – Depressão na Adolescência. Recuperado em
10/10/04: Psiq web, Internet.
WERTHEIMER, Michael. (n.d) Pequena História da Psicologia, São
Paulo: Cia Editora Nacional.
YUNES, Yamile Adriana. (1999) Abordagens Psicológicas: Percepção,
encontro de sentido e conscientização – Rumo à Integração,
cap 2, parte 3. Dissertação, Recuperado em 14 de julho de 2004
em: http://www.eps.ufsc.br/disserta99/yamile/cap2c.htm
ZAGURY, Tânia. (n.d) Adolescentes pais e autoridade: A Tirania Adolescente.
Revista Veja, reportagem de Anna Paula Buchalla.
1. E-mail: lucyllem@hotmail.com. Telefone para contato: (62) 321 1872 ou 92223586.