ARTIGO


O estabelecimento de contato afetivo durante a gestação, sob a perspectiva da Gestalt-Terapia.

The establishment of affectionate contact in the gestation period, under the perspective of the Gestalt -Therapy.

Luciana Do Nascimento Castello

Endereço para correspondência


Kayna Franciany Borges Moraes

Endereço para correspondência

“Descobri um dia que em meu corpo
trazia a poesia no seu sentindo mais profundo. [...]
porque em meu ventre trazia o sorriso de uma criança”

(Carolina Dinô, 2002)


RESUMO

Esta pesquisa tem como objetivo revelar como as adolescentes grávidas estabelecem e vivenciam a construção do contato afetivo com o feto no período gestacional. Esta pesquisa foi realizada sob a perspectiva da Gestalt-Terapia tendo como base os seus pressupostos filosóficos; as Teorias de base; principais conceitos da Gestalt-Terapia, além do ciclo do contato com seus bloqueios de contato e respectivos fatores de cura. O presente estudo tem relevância na vida social e familiar, devido o elevado número de adolescentes grávidas em nossa sociedade nos tempos atuais. Participaram desta pesquisa cinco adolescentes, com idade entre 14 e 19 anos e que estão vivenciando a primeira gestação. Utilizaram-se entrevistas semi-estruturadas e análise dos discursos através do método fenomenológico. Concluiu-se que o contato afetivo é estabelecido e vivenciado em expressões de carinho e afeto através de formas de contato como o toque na barriga e a fala com o feto, e que as principais barreiras para o estabelecimento do contato com feto são as relações afetivas das adolescentes com os companheiros e familiares, o que acaba por influenciar nos sentimentos da própria adolescente em relação ao feto.

Palavras-chave: Construção do contato afetivo; Adolescência; Gravidez; Ciclo do Contato; Gestalt-Terapia.


ABSTRACT


This research has as objective to reveal as the pregnant adolescents they establish and they live the construction of the affectionate contact with the fetus in the gestation period. This research was accomplished under the perspective of the Gestalt-Therapy tends as base their philosophical presuppositions; the Theories of base; the principals concepts of Gestalt-Therapy, besides the cycle of the contact with their cure factors and contact blockade. The present study has relevance in the social life and family, due the high number of pregnant adolescents in our society in the current times. Five adolescents participated in this research, with age between 14 and 19 years and that are living the first gestation. Interviews were used semi-structured and analyzing their speeches through the phenomenon method. . It was ended that the affectionate contact is established and lived in expressions of affection and affection through contact forms as the touch in the belly and the speech with the fetus, and that the main barriers for the establishment of the contact with fetus are the adolescents' affectionate relationships with their partners and family, what ends for influencing in the own adolescent's feelings in relation to the fetus.

Keywords: Construction of affective contact; Adolescence; Pregnancy; Cycle of the Contact; Gestalt-Therapy.


INTRODUÇÃO

O interesse de pesquisar sobre o estabelecimento e vivência do contato afetivo no período gestacional, surgiu a partir da experiência de estágio de uma das autoras deste artigo, no Núcleo de Medicina Fetal, situado no Hospital Regional Dr.Abelardo Santos, na comunidade de Icoaraci – Belém/Pa. Onde se observou o elevado número de adolescentes grávidas, o que levou a reflexão a respeito das possíveis influências do campo de vida das mesmas (emocional, social, biológico e econômico) no processo da gravidez e na relação afetiva entre a mulher e o feto.

 

REVISÃO DE LITERATURA

Pressupostos Filosóficos

A Gestalt-Terapia se apresenta como uma abordagem psicológica embasada por pressupostos filosóficos do Existencialismo, Humanismo e Fenomenologia, a partir dos quais ela constrói sua visão de homem que define sua prática e teoria.
Para Ribeiro (1985) “o homem em si é um fenômeno, sem dúvida o mais complexo, aquele de difícil acesso, pois o fenômeno homem se revela lentamente” (p.46). Nesse entendimento, o homem é visto como um ser complexo, já que a todo o momento ele se reorganiza de acordo com as suas necessidades, não podendo ser então conhecido completamente, nem com características fixas e imutáveis.

Esta concepção de homem se constrói com base nas escolas filosóficas que sustentam a Gestalt-Terapia, assim o Existencialismo enquanto escola filosófica preconiza que, de acordo com Ribeiro (1999) “a pessoa humana é fundamentalmente livre e responsável” (p. 32), isto é, traz consigo a possibilidade de livre-arbítrio para fazer escolhas, e assim encontrar seus próprios caminhos e verdades. Atrelada a esta idéia está ainda à noção de responsabilidade e de consciência, que fortalece a idéia de liberdade de escolha, a qual Ribeiro (1999) se refere como sendo “do poder, do querer, do fazer o que gosta, [...] o fazer o que pode” (p.32) tendo assim possibilidades de ação e de assumir as conseqüências destas, além disso, de acordo com este mesmo autor o indivíduo deve assumir o que faz com responsabilidade como forma de libertação e liberação do próprio medo, ou seja, quando o sujeito age comprometido com o que está fazendo e, com o que quer alcançar ele consegue administrar melhor às situações em que está inserido.

Assim, compreendendo que estas características são inerentes a todos os indivíduos, torna-se importante considerá-las, visto que o homem é primordialmente um ser social e a partir de suas escolhas e de suas relações e atitudes que eles se constituem e que influenciam a sociedade em que vivem, já que fazem parte dela, como seres ativos, isto é modificando o meio e sendo modificado por este também.

O Humanismo é outra corrente filosófica que embasa a Gestalt-Terapia. Esta corrente se organiza a partir da idéia básica de que, segundo RIBEIRO (1997) “a pessoa humana é a medida de si mesma, sabe o que ela é, o que quer, para onde pretende ir [...] é ainda singular, e quando esta singularidade é descoberta e vivenciada, torna-se para ela uma fonte inesgotável de mudança” (p. 93-94).

Nesse entendimento, quando o homem conhece a sua essência, sua singularidade, ele é capaz de agir com maior consciência e responsabilidade por sua vida e por suas escolhas, e assim também se torna cada vez mais capaz de mudar, ou como pressupõe a Gestalt-Terapia a pessoa de acordo com RIBEIRO (1999) “encerra uma energia imensa de mudança e significa que somos seres de infinitas possibilidades” (p. 35), isto é, a todo o momento os sujeitos estão se modificando, já que sempre estão fazendo novas escolhas e estabelecendo relações que mudam os rumos de sua vida.

A Fenomenologia enquanto escola filosófica também fundamenta a visão de homem da Gestalt-Terapia. Sobre esta escola Moreira (2002) diz que “A Fenomenologia é uma ciência cujo propósito é descrever fenômenos particulares, ou ainda a aparência das coisas, como experiência vivida. A experiência vivida do mundo da vida de todo dia é o foco central da investigação fenomenológica” (p.67). Entende-se, assim que a Fenomenologia é o estudo baseado principalmente na descrição de experiência ou fenômeno, como este é vivido pelo sujeito. Assim é possível dizer que o objetivo central da utilização do método fenomenológico não é encontrar os porquês, mas como se dá a experiência.

Teorias de Base

A Gestalt-Terapia utiliza como uma de suas teorias básicas a Teoria de Campo, a qual se destaca para a compreensão do fenômeno que se busca conhecer nesta pesquisa. Assim, a Teoria de Campo de Kurt Lewin se refere à noção, segundo Yontef (1998) de que “Eventos, experienciações, objetos, organismos, e sistemas são partes significativas de uma totalidade conhecível de forças mutuamente influenciáveis, que em conjunto formam uma fatalidade unificada interativa contínua” (p.210).

Nesse sentido, entende-se que tudo o que existe e que acontece no mundo pertence a um campo de inter-relações de maneira que nenhum fenômeno deve ser identificado e entendido de maneira isolada, visto que é apenas uma parte de um todo (campo) unificado e contínuo, isto é, que se modifica e se compõe a todo o momento no tempo e no espaço.

A Teoria do Campo considera ainda o conceito de Espaço Vital que é de acordo com Ribeiro (1985) aonde os comportamentos se dão, ou seja, é a somatória do mundo físico onde o sujeito se encontra no momento em que se comporta e o mundo psicológico, ou seja, o significado deste mundo para o sujeito, suas necessidades, idéias, motivações, e etc...

Assim, Ribeiro (1999) acrescenta sobre este aspecto da Teoria de Campo que “Espaço de vida é a totalidade dos fatos ou eventos possíveis coexistentes e mutuamente interdependentes, os quais determinam o comportamento de um indivíduo num dado momento sendo eles partes constituintes de uma realidade” (p.60).

A Gestalt-Terapia, enquanto ciência psicológica utiliza-se tanto na prática quanto na teoria dos conhecimentos da Teoria Organísmica, a qual de acordo com Ribeiro (1999) apresenta como ponto central à noção de que o homem deve ser entendido como uma totalidade integrada e por isso deve ser compreendido dentro de um campo. Considera ainda que os indivíduos se comportem como ser-no-mundo, ou seja, ficam sempre inter-relacionados com o mundo e não separados deste.

A respeito desta teoria, o autor Ribeiro (1999) considera ainda a idéia de que a “teoria organísmica insiste no organismo como uma só unidade, por meio da qual todo fenômeno mental ou fisiológico, que ocorre no organismo como um todo deve ser entendido como resultante de um encontro eu-mundo” (p.122). Assim, para compreendê-lo enquanto todo é necessário descobrir como se dão estes encontros da pessoa com o mundo, ou ainda quais são suas leis gerais do seu funcionamento total.

O contato na Gestalt-terapia

Com base na noção de indivíduo como ser ligado ao mundo considera-se que o mundo só existe a partir do momento em que é percebido e significado pelo sujeito, é que podemos citar uma das questões centrais da Gestalt-Terapia: o Contato, que são as relações estabelecidas no Aqui - Agora entre o indivíduo consigo mesmo e com o mundo, ou ser no mundo, isto é, a forma como se estabelece contato é a forma como se vivencia os fenômenos, como, por exemplo, a maneira como ocorre o contato afetivo na gestação.

A forma, ou seja, o olhar, tocar, falar, ouvir e a qualidade do contato estabelecido será expresso de modo variável, isto é, de acordo com a história de vida de cada pessoa, da história de contatos que ela estabeleceu, dos significados que atribuiu a estes e conseqüentemente de como os introjetou de maneira a estruturar sua realidade interna.

Pode-se acrescentar que, nesse sentido, os contatos estabelecidos são resultados das relações vivenciadas no campo de vida dos indivíduos, pois é neste que os contatos se dão, ou seja, as relações entre as pessoas e o mundo ocorrem no campo do sujeito e influenciado pelo seu espaço de vida. Nesse sentido, segundo Ribeiro (1997) “a vivência do contato depende da experiência do campo, cuja qualidade altera a experiência imediata vivida pelo sujeito em um momento dado” (p. 13). Assim, a experienciação, significação e organização do campo do sujeito determinarão o tipo e a qualidade do contato estabelecido.

A respeito de contato considera-se a importância do corpo como sendo o objeto ou o meio pelo qual o contato se manifesta, isto é, através do olhar, tocar, falar, movimentar, cheiro e paladar, onde estes sete modos de o corpo estabelecer contato são o que Polster e Polster (1979) chamam de “funções do contato” (p.124), quer dizer são por estas sete vias básicas que se pode estabelecer, interromper ou evitar o contato.

Nesse sentido, segundo Ribeiro (1997) o corpo é o que determina as possibilidades e limites do contato, de tal modo que “as leis que regem o corpo são as leis cuja compreensão nos indicam processos que proporcionam um contato de maior ou de menor qualidade” (p. 14).

Para uma melhor compreensão do contato é o que Ginger e Ginger (1995) chamam de quatro fases principais, as quais são: o pré-contato; tomar contato; contato pleno e pós-contato.

O pré-contato é entendido, segundo Ginger e Ginger (1995), como “uma fase de sensações, durante a qual a percepção ou excitação nascente em meu corpo – geralmente por um estímulo do meio – tornar-se-á a figura que solicita meu interesse” (p.130). Entende-se assim que esta seria a fase em que o corpo é estimulado pelo meio e define o que no momento presente será a sua figura.

O tomar contato é dito por GINGER e GINGER (1995) com sendo “uma fase ativa, no decorrer da qual o organismo vai enfrentar o meio. Trata-se, aqui, não do contato estabelecido, mas do estabelecimento de contato, de um processo e não de um estado” (p. 131). Assim, podemos dizer que esta é a fase em que o sujeito vai se relacionar com o meio, estabelecendo um contato com o seu objeto de maneira processual, nesse sentido, o mesmo autor diz ainda que seja nesta fase que o sujeito irá empregar ações para entrar em contato, que serão definidas de acordo com sua figura e fundo no momento.

O contato pleno é a fase, a qual segundo Ginger e Ginger (1995) “É um momento essencial de confluência saudável, de indiferenciação entre o organismo e o meio, entre o eu e o tu, um momento de abertura ou de abolição da fronteira de contato. A ação é unificada no aqui e agora: há coesão entre percepção, à emoção e o movimento” (p. 131).

Esta seria então a fase em que o sujeito está em contato com o outro, de maneira que os dois se tornam unificados e coesos em seus sentimentos e comportamentos, pode-se dizer assim que neste momento há uma total integração entre os dois.

O pós-contato, de acordo com Ginger e Ginger, (1995) “é a fase de assimilação, que favorece o crescimento. [...] o sujeito está novamente disponível para uma outra ação: a gestalt é fechada, um ciclo está terminado” (p. 131). Assim, nesta fase final o sujeito apresenta uma mudança na sua natureza que foi favorecida pelo contato, onde esta lhe possibilita crescimento e aprendizado, além disso, é também nesta fase que uma gestalt é fechada, fazendo com que o que era figura se torne fundo.

Entendendo o contato como um processo, que envolve os já citados momentos ou fases, pode-se ainda compreender o contato em um ciclo, este Ciclo do Contato, é denominado pelo autor Ribeiro (1997), como “Ciclo dos Fatores de Cura (fluidez, sensação, consciência, mobilização, ação, interação, contato final, satisfação e retirada) e Bloqueio de Contato (Fixação, Dessensibilização, Deflexão, Introjeção, Projeção, Interação, Retroflexão, Egotismo e Confluência)” (p.38), de maneira que é possível verificá-lo como tendo início, meio e fim, e que quando é completado significa o fechamento de uma gestalt e a abertura de uma nova gestalt.
Outra característica relevante deste ciclo é que cada momento deste contêm influência do momento anterior.

A esse respeito Ribeiro (1997) diz que:

“Em cada ponto do Ciclo, o Ciclo inteiro se repete, no sentido de que nenhum gesto pode ser visto ou ocorre isoladamente. [...]. Cada mecanismo de defesa do eu e cada fator de cura contém parte do outro, o que não nos impede de defini-los como polares enquanto processos em oposição, e, às vezes, em exclusão e / ou em complementaridade” (p. 62).

Nesse sentido, de que o ciclo inteiro se repete em cada ponto dele mesmo e de que fatores de cura e de bloqueio de contato estão interligados neste processo, é que se apresenta a seguir para uma melhor compreensão destas relações, os fatores de cura e os seus respectivos mecanismos de defesa ou bloqueios de contato.

A Fluidez é entendida, segundo RIBEIRO (1997) como “processo pelo qual me movimento, localizo-me no tempo e no espaço, deixo posições antigas, renovo-me, sinto-me mais solto e espontâneo e com vontade de criar e recriar minha própria vida” (p. 42). Assim entende-se que este processo significa a capacidade dos sujeitos de não se ligarem demasiadamente a pessoas ou coisas, de tal modo que passem a não conseguir se movimentar sem estas, ainda segundo este processo os indivíduos se percebem como seres fazendo parte de um tempo e num espaço com inúmeras possibilidades de mudar ou de se recriarem a qualquer momento.

O mecanismo de Fixação é o “processo pelo qual me apego excessivamente a pessoas, idéias ou coisas, temendo surpresas diante do novo e da realidade, sinto-me incapaz de explorar situações que flutuam rapidamente, permanecendo fixado em coisas e emoções” (p. 43), ou seja, entende-se que neste processo as pessoas têm como característica o medo de correr riscos, de mudar, de sair da rotina, pois sempre consideram que poderão ter surpresas desagradáveis e por isso se apegam excessivamente as pessoas, coisas e sentimentos, com os quais sente alguma segurança, por já conhecê-los e saber como lidar e o que esperar deles.

A Sensação é segundo este mesmo autor “processo pelo qual eu saio do estado de frieza emocional, sinto melhor a mim mesmo e as coisas, estou mais atento aos sinais que meu corpo me manda ou produz, sinto e até procuro novos estímulos” (p. 42), isto é, os sujeitos sentem a si mesmos e as coisas que estão ao seu redor, conseguem interagir com elas, de acordo com os sinais e necessidades de seu corpo e assim passam também a buscar novos estímulos que lhes emocionem.

O mecanismo de Dessensibilização é definido como “processo pelo qual me sinto entorpecido, [...], sinto uma diminuição sensorial no meu corpo, não diferenciando estímulos externos, e perdendo o interesse por sensações novas e mais intensas” (p. 45), assim entende-se que, neste processo, o sujeito não consegue captar os estímulos sensoriais que lhes são oferecidos, não consegue ter experiências que exijam algum grau de sensação e percepção corporal, o que acaba levando a uma perda de interesse por parte do sujeito a vivência de situações e sensações novas.

A Consciência é definida como “processo pelo qual me dou conta de mim mesmo de uma maneira mais clara e reflexiva, estou mais atento ao que ocorre a minha volta, percebo-me relacionando com mais reciprocidade com pessoas e coisas” (p. 42), ou seja, a pessoa se percebe de maneira mais clara e ciente de si mesmo, do outro e das coisas, conseguindo assim entrar em contato com elas de uma maneira direta e profunda.

O mecanismo Deflexão é conceituado como “processo pelo qual evito contato pelos meus vários sentidos, ou faço isso de uma maneira vaga e geral, desperdiço minha energia na relação com o outro, usando um contato indireto, palavreado vago, sem ir direto ao assunto” (p. 43), pode-se depreender então que neste processo as pessoas agem de forma superficial para com o outro, evitando ou minimizando o estabelecimento do contato de modo que suas relações se tornam vagas, inexpressivas ou apáticas.

O fator Mobilização é entendido como “processo pelo qual sinto necessidade de me mudar, de exigir meus direitos, de separar minhas coisas das dos outros, de sair da rotina, de expressar meus sentimentos exatamente como sinto e de não ter medo de ser diferente” (p. 46), assim este fator se refere ao processo pelo qual os sujeitos conseguem se individualizar, ou seja, se separar dos outros, entendendo que são diferentes dos demais e que, portanto podem ter pensamentos e opiniões diferentes, conseguindo assim expressá-los e defendê-los sem medo de ser diferente e talvez não agradar aos outros. Além disso, neste processo as pessoas desejam mudar e não têm medo disso, buscam sair da rotina, do comodismo.

O mecanismo Introjeção é definido por Ribeiro (1997), como sendo:

“Processo pelo qual obedeço e aceito opiniões arbitrárias, normas e valores que pertencem a outros, engolindo coisas sem querer e sem conseguir defender meus direitos por medo da minha própria agressividade e da dos outros. Desejo mudar, mas temo minha própria mudança, preferindo a rotina, simplificações e situações que são facilmente controláveis” (p. 43-44).

Nesse sentido, entende-se que os sujeitos neste processo de introjeção agem de modo a tentar manter as situações da maneira que consideram como sendo a mais cômoda de lidar, visto que sentem medo de mudanças em sua própria vida, assim geralmente se relacionam com os outros a sua volta aceitando tudo o que estes lhes dizem, introjetando ou “engolindo” mesmo que não concordem, além disso, não conseguem expressar, nem defender suas opiniões, exigir seus direitos, devido ao receio de que o outro seja agressivo ou não lhe aceite por isso.

A Ação é conceituada por este autor como “processo pelo qual expresso mais confiança nos outros, assumo responsabilidades pelos meus próprios atos, identifico em mim mesmo as razões dos meus problemas, ajo em nome próprio sem medo da minha própria ansiedade” (p. 46).

Assim, pode-se entender a ação como o processo em que as pessoas têm melhor capacidade de se perceber enquanto responsável pelos seus atos, isto é pelo que fazem e falam, conseguindo identificar em si próprio os motivos dos seus comportamentos.

O mecanismo Projeção é definido como “processo pelo qual a pessoa tendo dificuldade de identificar o que é seu, atribui aos outros a responsabilidade pelos seus fracassos, sente-se ameaçada pelo mundo em geral [...] gosta que os outros façam a coisas no seu lugar” (p. 44). Assim pode-se dizer que neste processo a pessoa age com dificuldade de se perceber enquanto responsável por seus atos e pelas conseqüências destes, de modo que passam a responsabilizar os outros pelo que lhe acontece, além disso, sente-se constantemente ameaçada pelos que estão a sua volta como se estes sempre quisessem o seu mau, ou estivessem planejando algo para lhe prejudicar.

A Interação é o “processo pelo qual me aproximo do outro sem esperar nada em troca, ajo de igual para igual, dou pelo prazer de dar, convivo sem esperar retribuição, sinto que estar e relacionar-me com o outro me ajuda a me perceber como pessoa” (p. 47).

Neste processo então, os sujeitos agem em relação ao outro de maneira descompromissada, quer dizer conseguem se relacionar com as pessoas que estão a sua volta sem ficar sempre esperando algo em troca, e quando dão algo e porque realmente o querem fazer e não porque desejam que seu gesto seja retribuído, consideram ainda que agindo desta forma conseguem se perceber melhor.

O mecanismo Proflexão é conceituado como sendo “processo pelo qual a pessoa deseja que os outros sejam como ela própria é manipulando-os a fim de receber deles aquilo de que precisa, seja fazendo o que eles gostam, seja submetendo-se passivamente eles” (p. 47), ou seja, neste processo a pessoa não se percebe enquanto ser capaz de satisfazer suas próprias necessidades, passa a manipular os outros ou se submeter a estes sempre esperando que estes o satisfaçam, realize seus desejos, que lhe proporcionem aquilo que ela não consegue.

O fator Contato Final é o “processo pelo qual sinto a mim mesmo como minha própria fonte de prazer, nutro-me do que gosto e do que quero sem intermediário, relaciono-me com as pessoas de uma maneira direta e clara” (p. 47), isto é, com base neste processo entende-se que as pessoas agem sem depender do outro para viver, para satisfazerem suas necessidades e desejos, sentem que possuem em si mesmo o que necessitam para ter prazer.

O mecanismo Retroflexão é definido de acordo Ribeiro (1997) como:

“Processo pelo qual a pessoa deseja ser como os outros desejam que ela seja [...]. Arrepende-se com facilidade por se considerar inadequada nas coisas que faz por isso as faz e refaz várias vezes, para não se sentir culpada depois [...]. Deixa de fazer coisas com medo de ferir e ser ferida. Sente muitas vezes que é inimiga de si mesma” (p.44).

Neste sentido, a pessoa age de maneira a ser o que os outros gostariam que ela fosse, ou seja, deseja ser o que os outros são e não o que ela é na verdade, assim geralmente se considera inadequada nas atividades que realiza, e então se arrepende ou simplesmente não faz o que gostaria com medo de se arrepender, de sofrer ou de magoar alguém, por não fazer o que quer ou como quer, acaba por sentir que age como se lutasse contra si própria.

A Satisfação é de acordo com o Ribeiro (1997) definida como “Processo pelo qual vejo que o mundo é composto de pessoas, que o outro pode ser fonte de contato nutritivo, que o prazer e a vida podem ser co-divididos, que pensar em possibilidades é pensar em crescimento, que é possível desfrutar dividindo e que o mundo fora de nós pode ser fonte de prazer” (p. 42).

Neste processo então, as pessoas percebem que fazer contato com outras pessoas pode ser algo bom, que possibilite prazer e satisfação e que estes não estão somente em cada um de nós, mas que também podem ser obtidos através do mundo e compartilhados com os outros.

O mecanismo do Egotismo é entendido de acordo com Ribeiro (1997) como “processo pelo qual a pessoa se coloca sempre como o centro das coisas [...]. Impõe tanto a sua vontade e desejos, que deixa de prestar atenção ao meio circundante, [...], tendo muita dificuldade em dar e receber” (p. 48), neste processo então se pode dizer que a pessoa age como se percebe somente a si própria, de modo que só ela existe e tem necessidades e desejos e os outros a sua volta apenas satisfazem esses desejos, por isso busca sempre manipular o meio em que está inserida a seu favor. Isto se dá, para que tudo ocorra como ela quer, assim passa a ter dificuldades para entrar em contato com o outro ou para estabelecer relações onde possa dar e receber.

De acordo com Ribeiro (1997) A Retirada é o “processo pelo qual saio das coisas no momento em que sinto que devo sair, percebendo o que é meu e o que é dos outros, aceito ser diferente para ser fiel a mim mesmo, [...], procuro o novo e convivo com o velho de uma maneira crítica e inteligente” (p. 48). A partir deste processo entende-se que se remete a idéia de que as pessoas conseguem perceber que são diferentes umas das outras e que, com isso possuem opiniões, idéias e pensamentos às vezes divergentes, mas elas se aceitam e por isso são fiéis a si próprias e as suas necessidades, de modo que podem entrar ou sair de um contato no momento em que acharem que o devem fazer, respeitando o outro, mas não se subordinando a ele.

O mecanismo da Confluência é definido segundo Ribeiro (1997) como sendo “Processo pelo qual a pessoa se liga fortemente aos outros, sem diferenciar o que é seu do que é deles, diminui as diferenças para sentir-se melhor e semelhante aos demais e, embora com sofrimento, termina obedecendo a valores e atitudes da sociedade e dos pais” (p.45).

Entende-se que a pessoa neste processo não consegue se perceber com o ser diferenciado e separado dos demais, como se não existisse o eu, mas sim o nós. Ela se torna o grupo ou a sociedade de maneira que faz tudo o que estes querem ou dizem que é o certo, com o objetivo de sempre agradá-los, visto que considera que só assim será aceita pelos outros e não ficará sozinha.

Outro conceito da Gestalt-Terapia é o de Self, pois é de fundamental importância para a Gestalt-Terapia este processo contínuo de desenvolvimento humano, que a todo o momento o campo do indivíduo estará sofrendo influências que irão ser determinadas a partir da relação estabelecida com outras pessoas e com o meio em que está inserido.

Em relação à noção de que o Self é um sistema de contatos, conforme nos referimos anteriormente, a autora Kyan (2001) acrescenta que o Self pode estar localizado na chamada fronteira do organismo, que seria justamente o que separa o indivíduo do meio, ao mesmo tempo em que o coloca em contato com ele. Além disso, esta autora diz ainda que, assim como a função e a intensidade do Self são variáveis esta fronteira onde o Self se “localiza” também muda constantemente, visto que cada contato é diferente do outro.

É importante ainda considerarmos a presença e influência do Self no ciclo do contato, visto que, de acordo com Ribeiro (1997) o Self se localiza no centro do ciclo do contato de modo a regular os contatos estabelecidos de acordo com os mecanismos ou fatores de cura e bloqueios de contato, isto é ora de modo saudável ora de modo doentio. Assim “O ciclo do contato com o self no centro é a expressão mais afirmativa de seu aspecto relacional e da totalidade visível nas diversas formas que o contato assume como expressão da pessoa humana” (p. 30).

O processo de adolescência

A adolescência é comumente conhecida por ser uma fase do desenvolvimento humano com características e especificidades muito particulares.

Nesse sentido, Santrock (2003) conceitua adolescência como sendo “O período desenvolvimentista de transição entre a infância e a vida adulta; envolve mudanças biológicas, cognitivas e socioemocionais [...] começa aos 10 a 13 anos de idade e termina aos 18 e 22 anos de idade para a maioria das pessoas” (p.11).

Sob esta perspectiva a adolescência pode ser vista como uma etapa de transição onde estes sujeitos não são mais crianças, mas também não se tornaram adultos. Assim, a adolescência é um período da vida em que estão presentes transformações significativas que irão envolver as mudanças corporais, como também emocionais e psíquicas deste ser. Desta forma, os impactos serão diferenciados para cada um, pois esta etapa corresponde não só a forma da sua vivência atual como a sua história de vida.
Ozella (2002) afirma ainda que “A adolescência não é um período natural do desenvolvimento. È um momento significado e interpretado pelo homem. Há marcas que a sociedade destaca e significa. Mudanças no corpo e desenvolvimento cognitivo são marcas que a sociedade destacou” (p. 21).

A adolescência pode ser entendida como um período do desenvolvimento humano com características próprias, mas não gerais, ou seja, a presença, a ausência ou a intensidade de manifestação destas será variável de acordo com cada sujeito. Nessa perspectiva, a compreensão da adolescência é a de que ela é construída com influências significativas do contexto social e histórico, ou seja, influenciada pelas experiências que o sujeito vivencia e pelo seu meio.

No processo de significação da identidade durante a adolescência, inclui-se a questão da sexualidade, sobre a qual Oliva (2004) explica que “Os adolescentes deixaram de serem crianças e começam a ver como seus desejos e necessidades sexuais se intensificam como conseqüência da maturação de seus corpos” (p. 362), isto é, seu desenvolvimento biológico aliado à busca de novas emoções, favorece e intensifica comportamentos sexuais, os quais, segundo o que pode ser observado na mídia, e em literaturas sobre este assunto, podem causar deslumbramento e sentimento de onipotência, de maneira que estes sujeitos passariam a ter suas primeiras experiências sexuais com o pensamento de que não correria nenhum risco de uma gravidez; de contraírem uma doença sexualmente transmissível, e assim não se preocupam com a utilização de qualquer tipo de preservativo.

O fenômeno da gravidez

A gravidez segundo Dickstein, Maldonado e Nahoum (1985), é considerada uma das etapas mais importantes do desenvolvimento da mulher e por isso necessita de adaptações e reajustes biológicos, psicológicos e sociais da mesma, para isso pode-se considerar de extrema importância que à participação do seu companheiro e de sua família neste momento sejam significativas, tendo em vista a forma como se dão estas relações, isto é, se esses sujeitos estão presentes, se dão apoio, atenção e carinho a mulher, tem geralmente bastante relevância para o desenvolvimento da gestação.

Quando se trata do fenômeno da gestação um conceito deve ser discutido, o qual é a maternidade, devido principalmente ao fato de que a construção histórica desse conceito influencia diretamente a relação mãe-feto. Atualmente, a maternidade passa aos poucos a assumir um novo significado social, de acordo com Lima et al (1996) “Como um novo momento do ciclo existencial, onde deve ser permitido à mulher experienciar os sentimentos, assim como, o direito de escolher ser mãe [...] não por cobranças da sociedade, imposições morais, mas como uma opção responsável em gerar ou não um ser” (p.17).

A partir desta perspectiva é possível considerar que a gravidez desencadeará para a mulher três momentos: o nascimento de um novo ser, de uma mãe e de uma possível família, portanto esta nova situação que envolve a mulher e o meio social no qual está inserida irá influenciar o processo psicológico, a adaptação a este novo período e o desenvolvimento desses novos papéis psicossociais. Nesse sentido, esta mulher deixará de ser somente filha para se tornar também mãe.

Vínculo afetivo na construção do contato

A construção vincular afetiva entre a mãe e o feto na gestação, é relevante, pois neste período estes envolvidos possuem necessidades de adaptação às mudanças, as quais podem envolver aspectos físicos e psíquicos, e para a satisfação dessas necessidades pode-se formar o vínculo materno filial.

Sobre o vínculo afetivo entre pais e feto é a autora Wilheim (1997) de maneira que os considera como fundamentais para a construção da identidade do bebê. Ela os caracteriza como sendo “‘investimentos afetivos’ com os quais envolvemos as pessoas e as coisas com as quais convivemos”. (p.107).

Outro aspecto importante nesta relação é a afetividade em qualquer contato estabelecido entre duas pessoas, isto é, segundo Carvalho (2002) sentimentos e emoções que se apresentam como comportamentos emocionais de dar e receber atenção, carinho e afeto através da palavra, do olhar, do toque, entre outros, mas que podem ser também negativos através da violência.
Assim, considerar como as adolescentes grávidas percebem e agem em relação ao fenômeno da gravidez, quais os afetos envolvidos e vivenciados durante este período, representa conhecer através da expressão subjetiva como estas adolescentes estão construindo o contato afetivo com o feto.

OBJETIVOS

O objetivo desta pesquisa é revelar como as adolescentes grávidas estabelecem e vivenciam a construção do contato afetivo com o feto no período gestacional, para isso consideramos os seguintes aspectos: compreender como se dá para as participantes o processo da gravidez; o significado do contato afetivo; como é a vivência da gravidez na adolescência; e o processo de construção pessoal do fenômeno da maternidade.
Logo, este estudo busca a compreensão subjetiva das adolescentes, em relação ás mudanças psicológicas proporcionadas por este fenômeno da gravidez na vida das mesmas, assim como conhecer como estão construindo o contato afetivo com o feto nesta relação.

METODOLOGIA

A pesquisa é de campo numa abordagem qualitativa. Através de entrevistas semi-estruturadas, a partir de roteiro elaborado previamente comporto por questões referentes ao problema de pesquisa, entrevistaram-se cinco adolescentes grávidas, com idade entre 14 e 19 anos, que estão vivenciando a primeira gestação. As entrevistas foram realizadas nas dependências do Núcleo de Medicina Fetal (NUMEFE) do Hospital Regional Dr. Abelardo Santos em Icoaraci-Belém/PA.

Para contatar as adolescentes inicialmente obteve-se encaminhamento da coordenação do curso de Psicologia da Unama ao Hospital Dr. Abelardo Santos. No dia agendado previamente com a coordenação do NUMEFE, foi esclarecida a pesquisa as participantes através do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para ser assinado pelas mesmas e seus responsáveis, a fim de autorizar a utilização das respostas obtidas na entrevista. Este documento e roteiro de entrevista já haviam sido entregues e aprovados anteriormente, pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unama.

No tratamento dos dados, analisamos as respostas das entrevistas, após transcrição literal, a partir do referencial teórico da Gestalt-

Terapia e método fenomenológico, o qual é subdivido em redução, descrição e interpretação.

RESULTADOS

Compreendem-se as entrevistadas como seres humanos singulares, ativos, dotados de consciência, liberdade e responsabilidade para fazer escolhas e assumir as conseqüências de seus atos, isto é, dentre todas as adolescentes entrevistadas, verifica-se que o momento e a forma como estão construindo o contato com o feto está sendo de acordo com as escolhas que elas fazem. Este aspecto pode ser observado nos relatos de M3 e M4 respectivamente “Antes eu sentia alegria e tristeza, mas com o passar do tempo agora é só alegria, às vezes vem uns pensamentos ruins, mas logo passa”; “Estar grávida é mais alegria e felicidade, não tem tristeza”.

Além disso, elas têm ainda a capacidade de enfrentar, se adaptar e se reorganizar diante das situações da vida, como neste caso o período que estão vivenciando da gravidez e a fase da adolescência. Pode-se dizer que relacionando esses pressupostos filosóficos com o contato afetivo na gestação, é importante que os pais adolescentes tenham consciência do fenômeno que estão vivendo para que assim possa tomar atitudes como o estabelecimento de contato com o feto com responsabilidade sabendo que são livres para decidir que são responsáveis pelas conseqüências decorrentes das suas atitudes.

A Gestalt-Terapia entende, portanto, que estas características são inerentes a todos os indivíduos e que por serem essencialmente sociais, estes estão sempre em relação com os outros e com o meio, de tal modo que as suas escolhas influenciam a sua vida e a dos que estão à sua volta. Nesse sentido, a maneira com as adolescentes grávidas decidem vivenciar a fase da adolescência, a gravidez e como constroem o contato afetivo com o feto influenciará na suas próprias vidas e possivelmente na do feto em desenvolvimento.

Essas influências foram observadas na fala de M1 ao falar como está construindo o contato afetivo com o feto “Eu procuro pensar bastante em coisas boas, é eu fico rezando, eu rezo bastante, aí eu fico pensando e peço para Deus proteção do meu filho, procuro trazer as pessoas mais para perto de mim, para elas transmitirem o carinho delas para mim, para que eu possa transformar esse carinho em uma coisa mais forte, para eu passar para o bebê”. Revela-se assim que a construção do contato afetivo se dá a partir das influências da personalidade das próprias adolescentes, dos seus valores, crenças e dos outros significativos para as mesmas.

Com base na Gestalt-Terapia e nas influências da Psicologia da Gestalt e a Teoria do Campo consideram-se ainda, as adolescentes entrevistadas, como inseridas em um campo de vida onde elas se inter-relacionam com o meio interno e externo e este campo vai se reorganizando de acordo com as experiências e significações sobre elas e sobre o mundo, nesse sentido a forma como estabelecem o contato afetivo com o feto pode ser entendida como decorrência de uma reorganização no seu campo de vida, onde a gravidez vai influenciar a vivência da adolescência e vice-versa. Observa-se este aspecto na fala de M2 quando perguntada sobre como está vivenciando a fase da adolescência “[...] as pessoas se preocupam mais comigo, eu parei de estudar, voltei a morar com minha mãe, a minha forma de viver mudou um pouco porque eu era de me dedicar mais aos estudos, gostava de fazer mais coisas, agora não, eu fiquei muito preguiçosa, fiquei um pouco distante das pessoas, porque começou a me dar raiva, muita raiva, quando alguém fala alguma coisa comigo que eu não gosto me dá muita raiva, eu não era assim antes, eu gostava de brincar, era muito atentada e agora não [...]”. Percebe-se assim que o campo de vida da entrevistada está se adaptando, suas relações com o mundo interno e externo estão se reorganizando devido à experiência da gestação.

Com base nos conceitos descritos no decorrer desta pesquisa evidenciamos nos discursos das participantes como naquele momento realizavam o contato afetivo com o feto, e ainda verificamos que em suas falas estavam presentes muitos dos bloqueios de contato apresentados, assim como os fatores de cura.

Pode-se observar que a noção de contato para as participantes refere-se a dar carinho, a compreensão e a cuidar do outro. Dentre essas definições dadas pelas mesmas a que mais se evidencia é o contato afetivo sendo este qualificado como carinho e amor para com o próximo. Torna-se necessário destacar que contato é a forma como vivenciamos os fenômenos, neste caso especificamente o contato afetivo na gestação, portanto o conceito de contato será algo mais amplo do que foi descrito por elas.

Percebe-se, na descrição das participantes o quanto à história de vida e a experiência atual vivenciada influencia em seus relatos.

Para M1 “[...] contato é carinho que a gente transmite para o bebê, o que ele transmite para a gente uma certa segurança [...]”, posteriormente à mesma diz que não teve carinho da família, pois foi rejeitada por causa da gravidez, e que por não ter tido esse apoio afirma ainda que: “[...] o que eu não tive no inicio da minha gravidez eu estou tentando passar tudo para ele, que é o carinho [...]”. Portanto, a forma como define contato está intimamente ligada a sua experiência vivenciada com sua família, refletindo conseqüentemente na sua relação com o feto. Para M5 contato afetivo é “Os sentimentos que envolvem meu relacionamento com meus amigos e família, é o carinho que sinto com minha família, com meu bebê ainda não tenho total carinho, quando pego na minha barriga e penso no bebê já começo a sentir raiva [...]”; percebe-se que ao definir contato afetivo M5 relaciona o conceito com sentimentos positivos, sendo que a mesma tem dificuldades em conseguir estabelecer contato com o feto, pois sua gravidez não foi planejada e seu parceiro não deu o apoio que ela esperava, portanto para M5 o abandono e a falta de planejamento são fatores que influenciam no estabelecimento do contato com o feto em gestação. É necessário frisar que M5 já realiza contato com o feto, no entanto esta não prioriza está relação devido a sentimentos negativos sentidos para com ele (feto). Neste sentido Ribeiro (1997) afirma que contato “é, portanto, um jeito de ser e um jeito de se expressar. Ele me faz visível aos outros e me remete à camada mais profunda de mim mesmo, quando tento perceber o porquê do meu jeito de ser” (p.24).

Quanto à fase do contato descrita no referencial teórico, esta pode ser identificada nas participantes quando estas percebem os sintomas da gravidez como enjôos, ausência de menstruação, mudanças físicas no corpo. Estas mudanças e estímulos que antes não ocorriam passam a se evidenciar tornando-se figura (gravidez), o que solicitará a elas um maior interesse, investimentos e cuidados. Esta fase revela-se quando M2 diz “é a primeira vez, o primeiro filho, eu fico mais diferente, toda mulher sente várias coisas, sente enjôo, cansaço, dores”.

Na fase do tomar contato pode ser percebida em M2 quando afirma que “Se eu me sinto mal, já me preocupo com ele, tenho medo de fazer alguma coisa que eu possa prejudicar ele, eu vou mais ao médico, pergunto se o que eu sinto é normal, pra saber se esta acontecendo alguma coisa ou não”. Assim, considera-se enquanto processo como figura, devido às mudanças estarem proporcionando preocupação para com o feto fazendo com que esta entre em contato, portanto é uma fase gradual já que as mudanças vão ocorrendo de maneira diferenciada no período da gestação.

No que diz respeito ao contato pleno pode-se dizer que neste momento há uma total integração entre os dois, ou seja, mãe e feto, isso pode ser observado quando M2 em seu relato diz “eu fico passando a mão na barriga, fico fazendo massagem, já dá para saber que tem uma pessoa dentro da gente, a gente conversa, fica tendo mais carinho (ela e o feto)”, portanto neste momento M2 estabelece contato com o feto, através de um processo de confluência saudável onde a experiência do contato se torna enriquecida.

A fase do pós – contato é evidenciada em M1 quando diz “eu pensei uma coisa e foi outra muito diferente, porque eu pensei que eu ia ser apoiada, que minha família ia me ajudar, sei lá parecia que tinha caído uma pedra em cima de tudo que tinha feito, e uma coisa, um filho foi uma coisa ruim que aconteceu na minha vida, e pronto acabou tudo pra mim, eu não vou mais estudar, não vou mais trabalhar (a minha família está pensando isso) (...) por que eu não vou? Só se eu tiver a cabeça de pensar, que não posso por causa do meu filho, não eu arrumo ele direitinho, coloco ele no braço e levo para o colégio, pra trabalhar eu pago uma pessoa pra cuidar dele”. Assim, M1 percebe que com a gravidez terá que assumir papéis e responsabilidades que antes não tinha, o que possibilitará seu crescimento e aprendizado da vida devido está não ter apoio necessário da família e do seu companheiro. Verifica-se em seus relatos que para a família a gravidez será o término do seu crescimento, no entanto para ela, esta será mais uma fase que irá enfrentar para cuidar de si e do seu filho.

Desta forma, torna-se necessário compreender o contato como um processo, ou melhor, como define Ribeiro (1997) o ciclo do contato como “Ciclo de Fatores de Cura e Bloqueio de contato” (p.38). Onde este ciclo possui inicio, meio e fim, e que quando é completado significa o fechamento de uma gestalt. Este ciclo possui como característica essencial ser formado simultaneamente por processos de saúde e de doença, onde cada momento deste contém influência do momento anterior.

Neste sentido, podem-se perceber nos relatos das participantes vários momentos que evidenciam processos de saúde em que conseguem satisfazer suas necessidades em relação à situação vivenciada, de maneira fluídica, assim como é percebido em outros relatos; a não satisfação de necessidades gerando interrupções constantes em seus contatos, caracterizando o estado de doença, segundo a Gestalt-Terapia.

Alinhavamos o processo de saúde e doença com os fatores de cura e bloqueios de contato para compreensão do funcionamento das adolescentes com seus vividos Em relação aos fatores de cura Ribeiro (1997) compõe este ciclo com: “fluidez, sensação, consciência, mobilização, ação, interação, contato final, satisfação e retirada” (p.42).

Pode-se constatar o processo de sensação nas participantes: M1 quando diz “eu sinto o meu bebê, eu converso com ele, eu sinto ele todo tempo próximo de mim (...) eu fico às vezes deitada, ai fico pensando, aí fico pegando na minha barriga”; M2 diz que “às vezes fico passando a mão na barriga, fico fazendo massagem, já dá para saber que tem uma pessoa dentro da gente”; M3 diz que “de manhã quando acordo, eu pego na minha barriga e ela ta só para um lado e isso é comovente, eu faço um carinho e ele vai se mexendo, já sinto que tem uma pessoa dentro de mim”. Observa-se que as participantes neste momento buscam novos estímulos e procuram interagir com o feto, tais estímulos proporcionam a elas sentimentos que mobilizam sensações de felicidade e de que também dentro delas há uma pessoa se desenvolvendo. Os movimentos dos fetos possibilitam com que elas fiquem mais atentas aos sinais que a gravidez proporciona e também com que elas procurem sentir cada vez mais seus filhos de uma maneira mais intensa, favorecendo até mesmo no processo de conscientização desta fase.

Outro processo percebido de acordo com o relato da participante M5 foi à fixação, no sentido de que ela está ainda excessivamente apegada à pessoa do seu ex-companheiro de maneira que a sua relação afetiva com o feto fica “empobrecida”, pois M5 não consegue direcionar carinho para o feto, porque ainda está muito presa aos sentimentos de abandono do namorado.

Esta fase de consciência pode ser verificada na participante M1 quando diz “minha mãe queria que eu abortasse, eu sinto mais por isso, eu esperava isso de qualquer pessoa menos dela, pensei que ela fosse me apoiar e dizer ‘minha filha se você vai querer isso mesmo tudo bem eu vou ficar estar do seu lado’, mas não, ela disse “porque tu não tiras? Ainda ta em tempo agora que tu vais fazer dois meses”, mas eu não, eu decidi e é isso que eu vou querer, e o carinho que eu sinto pelo meu filho é tão grande que eu sou capaz de enfrentar qualquer coisa, e qualquer, e qualquer pessoa por causa dele”. Percebe-se que M1 se dá conta da sua realidade, pois sua mãe não aceita a gravidez, o que a leva a refletir e a tomar a decisão de que irá assumir seu filho e que a partir desta decisão assuma de maneira direta e profunda sua gestação tendo consciência da mesma, M3 também apresenta a conscientização quando afirma “Eu quero muito ele, carinho toda hora, antes eu pensava só na minha vida e agora não eu penso em outra vida que está vindo”. Constata-se que a gravidez possibilitou que M3 refletisse sobre si e o outro no caso o feto, proporcionando assim o estabelecimento da construção de contato com o mesmo. Observou-se assim que a maioria das adolescentes consegue perceber a si mesmas e ao outro (feto) de maneira clara, isto é como duas pessoas que estão unidas pela gravidez, mas também pelos sentimentos e afetos, de tal modo que entram em contato direto e profundo com o feto.

Outro processo observado foi o de mobilização, este está presente na fala de M3 quando afirma que “Se por acaso não der certo a nossa vida, com certeza o meu pai não vai querer que o pai do bebê o veja, o bebê vai ser criado longe dele (companheiro), como filho do meu pai, aí eu no caso vou ser irmã do meu filho (...) às vezes meu pai diz que vai tomar meu filho, que vai colocar o nome dele, que ele vai ser o pai e eu vou ser a irmã. Uma coisa que eu sempre quis é ter um filho, no começo eu achava meio estranho, mas agora eu sei que tem uma vida dentro de mim eu não quero ser irmã dele, eu quero ser mãe que é o que vou ser”. Verifica-se que M3 sente a necessidade de manter seus direitos de mãe, de se expressar diante a família; observa-se também um processo de confluência quando em seu relato foi percebida uma relação de dependência com a família, não tendo firmeza a respeito de sua gravidez e de seu relacionamento, tal fato pode ser influenciado pela incerteza, medo e pela vivência de sentimentos ambivalentes provocados pela gravidez. Percebe-se em M3 a mobilização no momento em que ela busca a mudança, sai do comodismo, enfrenta a opinião de seu pai contrapondo-se a ele e assumindo uma postura mais independente em assumir sua maternidade. Esta participante apresenta ainda um funcionamento introjetivo quando conforme a experiências referentes à gravidez, ela vai introjetando ou incorporando a sua personalidade a vontade de ser mãe.

A satisfação e a interação podem ser identificadas como funcionamentos na participante M1 quando diz com relação à terceira questão que “procuro trazer as pessoas mais para perto de mim, para elas transmitirem o carinho delas para mim, para que eu possa transformar esse carinho em uma coisa mais forte, para eu passar para o bebê”. Neste sentido, M1 procura estabelecer contato com outras pessoas para que isto possibilite algo bom para seu filho, proporcionando também para si um contato nutritivo, onde busca dividir com outras pessoas o afeto para com seu filho e assim desfrutar o momento da sua gravidez. Portanto é nesta fase que as pessoas percebem o quanto é importante o estabelecimento de contato com as outras pessoas.

Com relação ao processo de retirada, este é evidenciado em M1 quando diz “eu já procuro relevar o que eles falam, não ouço, olho para o lado e finjo que não estou ouvindo, que é para eu não sentir aquela falta de carinho, aquele rancor, porque eu tenho certeza que se eu sentir, o meu bebê também vai estar sentido, então eu já procuro ter mais tranqüilidade”. Observa-se que M1 percebe que os sentimentos dos outros em relação a sua gravidez é algo que pode ser nocivo para o desenvolvimento saudável do seu feto, ao ter esta percepção M1 retira-se quando a convém. Além disso, percebe também que os sentimentos referentes à sua gravidez e as opiniões familiares são diferentes das suas, e ao ter sua opinião formada frente à vivência da sua gravidez entra e sai do contato com as outras pessoas quando acha necessário e respeita a opinião dos familiares.

Verificam-se além dos fatores de cura, os processos de bloqueio de contato nas falas das entrevistadas. Conforme Ribeiro (1997) o ciclo é formador pelos seguintes bloqueios de contato: “Fixação, dessensibilização, deflexão, introjeção, projeção, interação, retroflexão, egotismo e confluência” (p.43). Ressalta-se que alguns dos bloqueios foram mais evidenciados nos relatos como a introjeção e a projeção.

Em relação à dessensibilização, como bloqueio de contato, verificou-se que a participante que mais apresentou em seu discurso foi M5, pois apesar de experienciar o movimento do feto, não consegue ter interesse por essas sensações novas e intensas, o que provavelmente deve-se ao fato da mesma não estar recebendo o apoio emocional e financeiro necessário na sua gravidez, já que o companheiro ao saber da gravidez a abandonou e que também sua família além de não proporcionar o suporte emocional necessário, não possui condições financeiras para ajudá-la, o que pode estar deixando-a distanciada e sem interesse no contato com o feto.

Outro funcionamento que pode ser percebido é o deflexivo, quando M5 diz “não tenho curiosidade para saber, as minhas amigas perguntam e eu digo que ainda não, que qualquer um ta bom, homem ou mulher para mim tanto faz, o que vier para mim ta ótimo”. Neste caso, a participante não vivencia suas experiências com intensidade, evitando a responsabilidade por seus sentimentos em relação ao feto. Verificou-se também um funcionamento deflexivo na resposta de M2 onde ela demonstra a construção de um contato afetivo superficial com o feto, visto que dá ênfase apenas a preocupação com o desenvolvimento biológico do feto, de tal modo que sua relação com ele parece ainda ser vaga e “distante”, já que tende a não vivenciar e expressar afeto pelo seu filho.

O funcionamento introjetivo é percebido em M2 e M3, quando M2 diz “ele me apoiou muito, porque ele é quem queria mais que eu ficasse grávida, aí eu aceite, ele se comporta bem, se preocupa demais, minha família também, minha mãe principalmente, minha mãe principalmente, é o primeiro neto dela, aí ela gostou, o meu pai, todos eles se preocupam, a família dele (companheiro) também se preocupa”; percebe-se que a gravidez é mais uma escolha do companheiro do que dela, no entanto aceita o fato de estar grávida, pois todas as pessoas próximas a ela se preocupam e desejam a gravidez.

A participante M3 revela também um funcionamento introjetivo, quando afirma “estou grávida nessa idade (16anos), eles não aceitaram logo no começo, mas agora eles já estão aceitando, já querem bem, no começo eles diziam que não queriam porque eu era nova, porque tem gente que já é mais velha e já tem filho, eu novinha agora veio isso (gravidez), agora toda a minha família já aceita, eu aceito também, o meu marido aceita”. Verifica-se que M3 no início de sua gestação vivencia intensamente sentimentos de ambivalência de diante do fato de estar grávida, pois além dela não aceitar a gravidez, todos da sua família não aceitam devido sua idade e também devido seu companheiro ter desentendimentos com sua família. Posteriormente M3 passa a aceitar a gestação porque sua família já aceita o fato e seu companheiro também, portanto constata-se que M3 qualifica a sua gravidez introjetando às idéias e opiniões dos outros.

Observou-se que nas respostas das adolescentes sobre o significado da maternidade, há um funcionamento introjetivo, como o relato de algumas entrevistadas, quando elas dão um significado para maternidade de acordo com o que observaram no comportamento de suas mães, ou seja, elas parecem ter introjetado um conceito ou um tipo de comportamento materno que deve ser o mais adequado, destaca-se este aspecto no caso da entrevistada M4, visto que ela atribui ao significado de maternidade a idéia de responsabilidade, percebe-se assim que ela parece ter introjetado um conceito de maternidade que lhe foi imposta, e que ela aceita como sendo seu, deixando de lado, mesmo que não deliberadamente, suas próprias opiniões sobre este assunto.

Outro bloqueio identificado é a projeção, e neste contexto observa-se que M5 apresenta funcionamento introjetivo quando diz “quando me perguntam, você sente amor pelo seu filho? Eu digo que ainda não, porque ainda sinto muita raiva dele (namorado) eu não consigo sentir amor por essa criança”, constata-se que pelo abandono sofrido M5 projeta seus sentimentos de rancor e raiva no feto, pois não consegue aceitar sua gravidez devido seu companheiro não apóia-la, culpando ele (namorado) por não conseguir sentir amor pelo feto em gestação, assim como o culpa por sua vida ter mudado, transfere para ele a responsabilidade por estar grávida, afirma ainda “quando pego na minha barriga e penso no bebê já começo a sentir raiva e penso, é teu pai fez isso com nós dois”, isso evidencia o quanto projeta no companheiro sua não aceitação pela gravidez, neste sentido verifica-se que possui dificuldades em identificar quais são seus reais sentimentos perante esta gestação, além do que atribui toda responsabilidade dos seus fracasso para o outro (namorado).

Constatou-se que nas respostas das adolescentes sobre como estão vivenciando esta fase da adolescência, há um funcionamento projetivo, visto que elas atribuem tudo o que estão vivenciando nesta fase como conseqüência da gravidez, algumas delas atribuem à mudança em função da gestação, e as outras dizem que os outros, em especial os familiares, é que mudaram para com elas.

Concluiu-se que nas respostas das participantes sobre a mesma questão acima, encontrou-se o processo da fluidez, pelo fato de algumas relatarem que estão vivenciando o período da gravidez com dificuldades, mas que também tem alguns aspectos bons, ou seja, elas não estão se ligando demasiadamente as dificuldades, estão tentando considerar também as alegrias da gestação, percebendo assim que este momento acarreta em várias possibilidades e experiências que elas podem vivenciar.

Outro conceito descrito no decorrer desta pesquisa é o Self, conceito que é relevante ser analisado nas participantes, pois como sistema complexo de contatos possibilita o crescimento como pessoas e como futuras mães, papel a qual terão que desempenhar.

Percebe-se que no decorrer da gravidez as participantes vão se desenvolvendo, conforme os contatos estabelecidos, o que conseqüentemente interfere na sua relação com o feto, verifica-se também que a história de vida de cada uma é diferenciada, outra variável que influencia no Self de cada uma onde se constata a característica de plasticidade do processo de desenvolvimento psíquico destas adolescentes.

Com relação à adolescência, revela-se que as participantes da pesquisa, na primeira questão, relacionam a vivência da adolescência com a gravidez, isto confirma o que foi dito anteriormente no referencial teórico, isto é a compreensão da adolescência é a de que ela é construída com influências significativas do contexto social e histórico, ou seja, influenciada pelas experiências que o sujeito vivencia, em seu meio, isto pode ser evidenciado em todos os relatos apesar de cada participante apresentar vivências diversificadas.

No caso de M1 esta diz “Bem no período da minha gravidez eu estou passando por uma barra muito grande” constata-se que ao perguntar sobre a fase da adolescência M1 descreve logo a gravidez, o que se deve pela influência de suas experiências, já M3 diz “não está sendo bem como é para muitas adolescentes” para esta participante a sua fase da adolescência não está sendo vivida como ela considera que as outras meninas da sua idade vivem, ela atribui estas diferenças às dificuldades que ela está experienciando nas relações com seus familiares em função da gravidez. Desta forma, percebe-se que a adolescência é um período da vida em que estão presentes transformações significativas que irão envolver desde as mudanças corporais, o desenvolvimento emocional e psíquico, devido às próprias características biológicas de cada ser, assim como as influências sociais, das relações com a família, amigos, escola entre outros.

O fenômeno da gravidez de um modo geral pode ser considerado um dos momentos ou etapas do desenvolvimento da mulher de extrema relevância, no que se refere ao nível de maturação biológica e desenvolvimento da sua identidade. Esse fenômeno acarreta em transformações e ajustes físicos, psicológicos e sociais assim como a fase da adolescência, e nesse sentido, quando ocorrem simultaneamente, como no caso das adolescentes entrevistadas que estão vivenciando a gestação, a experiência dos fenômenos pode repercutir em intensos conflitos psicológicos e misturas de sentimentos às vezes ambíguos.

Estes conflitos psicológicos são observados no discurso de M3 “Eu sempre quis ser mãe, mas eu não queria tão nova, aí no começo eu ficava pensando se eu tirava se não tirava, [...] aí agora eu já aceito, mas nunca quis tirar só que no começo ninguém quis aceitar, chegou a ter brigas na minha família, [...], por isso no começo eu fiquei pensando... porque brigar com a família toda, chegar com eles e não ter o apoio da família é muito difícil”. Outro momento em que M3 demonstra ambivalência afetiva é quando diz como está vivenciando a gravidez “Com alegria com certeza, mas às vezes com medo também, porque tenho medo de repente, não poder voltar atrás, de não ser uma boa coisa, assim de repente não dar certo [...]”. Percebe-se assim que a experiência da gravidez está gerando sentimentos conflitantes para M3, devido à situação nova que está vivendo e também com relação à influência da família da mesma, das brigas que ocorreram e a possibilidade da perda do apoio familiar.

Conforme dito anteriormente a experiência da gravidez paralelamente ao período da adolescência remete as adolescentes a simultâneas transformações, as quais podem ser destacadas do relato de M1 e M5 quando elas falam sobre o que mudou na adolescência com a gravidez respectivamente “mudou, mudou muito, mudou o meu jeito de ser, eu era sempre muito brincalhona, meio rebelde, gostava de sair, ir para as festas e agora não, eu estou mais caseira, fico mais em casa, cuido um pouco mais de mim [...]”; “[...] mudou também porque depois que eu engravidei já não é mais como era antigamente, eu saia me divertia e agora já não acontece mais isso, agora eu não tenho mais vontade de ir para festas nem estudar [...]”. Observa-se assim que os comportamentos de M1 e M5, característicos da fase da adolescência de uma maneira geral como a rebeldia, extroversão, gostar de sair com amigos, ir para festas, para a escola foram alterados com a experiência da gravidez. Pode–se dizer assim que a gestação está desencadeando o nascimento de um novo ser, mas, além disso, elas estão deixando de ser somente adolescentes e filhas para se tornarem também mães.

No estabelecimento do contato afetivo entre a mãe e o feto destaca-se ainda a importância do vínculo afetivo que é construído nessa relação materno filial, e que se dá essencialmente para a satisfação das necessidades e adaptação à nova situação dos envolvidos. Outra característica do vínculo afetivo é que ele se dá com influências dos outros vínculos que o sujeito estabeleceu no decorrer da sua vida com os que estão a sua volta, que lhes são significativos, e que a percepção do mesmo é única para cada indivíduo já que eles também são únicos.

Em relação ao vínculo afetivo durante a gestação foi possível observar a presença deste na fala das entrevistadas, como, por exemplo, relata M1 sobre a questão do significado de maternidade para ela, diz que “[...]. È carinho também que a gente sente pelo filho e que a gente passa a transmitir não só para ele, mas para todos que estão ao redor [...]. Eu acho que a experiência que eu tenho com a minha mãe eu quero passar para o meu filho, isso para mim é ser mãe, carinho, amor, afeto, tudo o que há de bom”.

Constata-se assim que M1 está estabelecendo um vínculo afetivo com o feto através de sentimentos que ela diz “passar” para o mesmo, e que o contato que está sendo construído tem influências da relação dela com a mãe, ou seja, da qualidade do vínculo anteriormente estabelecido entre a adolescente e a sua mãe.

O vínculo afetivo na gestação pode ser entendido ainda como um processo de confluência, onde mãe e filho se tornam integrados física, orgânica e emocionalmente de maneira que a mãe se percebe como fortemente ligada ao feto como se um fizesse parte do outro. Destaca-se este aspecto no relato de M1 que diz “A minha gravidez está sendo ótima por uma parte, [...], para mim está sendo uma maravilha porque eu sinto o meu bebê, eu converso com ele, eu sinto ele o tempo todo perto de mim [...]”.

Com base nesta pesquisa realizada, pode-se perceber que quanto ao contato afetivo construído pelas adolescentes que estão passando pela gravidez precoce, conclui-se que as formas como elas estabelecem contato individualmente e com os outros, principalmente conforme dito anteriormente sendo estes a família e os companheiros, ou seja, conforme a história de vida de cada uma revela o nível de maturidade e de conscientização que elas possuem e, portanto pode se refletir no nível e a qualidade de contato que eles estabelecerão com o feto.

Entretanto é necessário destacar que mesmo com as dificuldades físicas, psicológicas e emocionais por que passam as adolescentes grávidas, há de uma maneira geral um esforço por parte das mesmas em estabelecer e vivenciar um contato afetivo saudável com o feto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a realização desta pesquisa é possível considerar que no que se refere ao conceito de contato afetivo e como o estão construindo com o feto, percebeu-se nos relatos das participantes uma proximidade nas manifestações de contato afetivo, onde este está diretamente relacionado à afetividade, a demonstração de afeto e carinho para com o feto. A respeito da construção deste contato elas dizem que o fazem, expressando carinho e afeto através de formas de contato como o toque na barriga e a fala.

Constatou-se ainda que as principais barreiras para as participantes estabelecerem o contato saudável com feto são as relações afetivas com os companheiros e familiares, no que se refere aos sentimentos destes de aceitação e rejeição da adolescente e de sua gravidez, o que acaba por influenciar nos sentimentos da própria adolescente em relação ao feto.

Em relação ao ciclo do contato e seus fatores de cura e de bloqueio de contato estes foram observados nos relatos das participantes, de acordo com suas histórias de vida e graus de maturidade em relação ao processo de contatar vivenciado no momento, onde alguns bloqueios de contato foram mais intensamente vivenciados e percebidos como interferindo nas suas relações afetivas com familiares, amigos, e namorados de modo que elas não vivenciam plenamente o contato nas relações consigo mesmo e com o outro que neste caso é o feto, visto que, elas desequilibram e interrompem o processo saudável de vivência do ciclo.

Faz-se necessário, portanto, ressaltar a importância da melhoria da qualidade do contato, através do qual as adolescentes grávidas conseguiram fechar gestalten, reorganizar seu campo de vida e se adaptar as situações da vida. É através do contato afetivo que as mesmas conseguirão vivenciar a gravidez de maneira saudável ou não e ter uma maior integração com o feto, visto que o contato favorece a formação de vínculos afetivos e a organização e maturação da identidade dos sujeitos.

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Endereço para correspondência:

Kayna Franciany Borges Moraes

E-mail: kaynapsi@ig.com.br

Luciana do Nascimento Castello

E-mail:lucianacastello@ig.com.br

 

Recebido em: 13/ 03/2009.
Aprovado em:
16/ 03/2009.