ARTIGO

A mãe perfeita: idealização e realidade - Algumas reflexões sobre a maternidade.

The perfect mother: idealização and realidade - some reflections on the maternity.

Julia Gama Tourinho
UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro


RESUMO

O objetivo do presente trabalho é fazer uma reflexão sobre o papel social da mãe, discutindo o conjunto de atitudes, comportamentos e sentimentos que são esperados que a mulher incorpore a partir do momento em que ela se descubra grávida. É avaliada aqui a construção do ideal materno, a quem serve e serviu e que conseqüências trouxe para a sociedade em geral. Revisitando dados históricos do século XIX ao XXI, têm-se uma visão de como a concepção de mãe e seus valores veio se transformando e como esta transformação prossegue, conseqüência da maior participação da mulher no mercado de trabalho. As normas sociais impostas fazem operar uma série de mecanismos psicológicos que vão desde a culpa ao medo para que esses ideais maternos sejam incorporados pelas mulheres. A construção social do ideal materno no ocidente advém da própria transformação dos conceitos e ideais de criança e família, transformação que se tem documentada desde início no século XVI e arrastou-se lentamente pelos séculos. De reprodutora à responsável pela saúde da família, o papel da mulher como mãe assumiu uma configuração que perdura até os dias atuais. A própria psique feminina foi sendo transformada para que as mulheres aceitassem as novas concepções de amor pelo filho como instintivo, incondicional e dotado de algo divino o que tornou inconcebível uma mulher recusar-se a cuidar de seu filho: os ideais da sociedade, guiados pelo pensamento masculino, estiveram presentes em todo este processo, principalmente em transformações mais recentes, quando um ideal romântico foi posto na ordem do dia. As mulheres casavam-se por amor e, por este sentimento, ao homem e à família, aceitava os sacrifícios que lhes eram impostos, pelo bem de seus filhos. No Brasil não foi diferente e graças à imprensa do século XIX, estes ideais foram rapidamente difundidos e incorporados pela sociedade brasileira. A finalidade política e econômica se torna clara conforme aprofunda-se a leitura desta monografia. Os ideais do Positivismo não podem deixar de serem notados, pois o que se buscava era a normatização dos costumes higiênicos e morais para o alcance do progresso social. No início do século XX, com o advento da Psicanálise, das duas Grandes Guerras, da entrada cada vez maior da mulher no mercado de trabalho, mais uma vez os ideais de amor materno ideal se vêem abalados. As idéias de S. Freud, D. Winnicott e C. Serrurier são comentadas nesta obra, na tentativa de compreender a transformação do papel social de mãe na atualidade: além da saúde física, está envolvida também a saúde mental da criança. Através do panorama da evolução dos costumes e papéis sociais constata-se a caminhada das mulheres ao mercado de trabalho e dos homens aos cuidados com os filhos e a casa. No entanto para evitar o adoecimento da família é necessário que haja debates acerca das novas posições e a flexibilização das rígidas divisões de trabalho entre o feminino e o masculino. E essa é a proposta desse trabalho: uma reflexão sobre a maternidade e uma possível reconfiguração de papeis já que se mulheres e homens descreditarem a maternidade como uma vocação inata e romperem as barreiras impostas pelo mito, o futuro será uma sociedade onde não existirá mais trabalho exclusivo para qualquer um dos sexos.

Palvras-chave: Maternidade; Relação mãe-bebê; identidade de gênero; representações sociais.


ABSTRACT

The propose of this paper is to make a reflection on the social function of the mother, discussing the set of attitudes, behaviors and feelings that are waited that the woman incorporates from the moment when she discovers herself pregnant. The construction of the maternal ideal is evaluated here, to who it serves and it served and which consequences it brought in general for the society. Revisiting historical data from19th to 21th century, we get a vision of how the mother conception and its values have been transforming and how this transformation continues, (as a) consequence of the biggest participation of the woman in the work market. The imposed social norms operate a series of psychological mechanisms, from guilt to fear, to the incorporation of these maternal ideals by the women. The social construction of the maternal ideal in ocidente came from the transformation of the concepts and ideals of child and family, transformation that are registered since beginning of the 16th century and has been passed slowly along the centuries.From reproductive to the responsible one for the health of the family, the woman's function as mother assumed a configuration that lasts until the current days. The own feminine psique was being transformed so that the women accepted the new conceptions of love for the son as instinctive, unconditional and endowed with something divine what has became inconceivable that a woman refuse to take care of her son: the ideals of the society, guided for the masculine thought, had been present in all this process, mainly in more recent transformations, when a romantic ideal was rank in the order of the day. The women married for love and, in the name of this feeling, for the man and the family, accepted the sacrifices that were imposed to them, for the wellbeing of her children. In Brazil it was not different and thanks to the press of 19th century, these ideals had been spread out and incorporated quickly for the Brazilian society. The politic and economic purpose becomes clear as how deep goes the reading of this monograph. The ideals from Positivism cannot being left, once what we searched was the padronization of the hygienics and morals behaviors for the reach of the social progress. In the beginning of the XXth century, with the advent of the Psychoanalysis, the two Great Wars, the entrance each time more representative of the woman in the work market, one more time the ideals of ideal maternal love got distorted. The ideas from S. Freud, D. Winnicott and C. Serrurier are commented in this workmanship, in the attempt to understand the transformation of the social function of mother in the present time: beyond the physical health, also the mental health of the child is involved. Through the panorama of the evolution of the customs and social functions we can see the women walking in the diretion of the work and to the cares of the children and the home. However to prevent the illness of the family it is necessary to be open to debates concerning the new positions and the moderation of the rigid divisions of the work between the feminine and the masculine one. And this is the proposal of this work: a reflection on the maternity and a possible reconfiguration of functions since if women and men stop to believe the maternity as an innate vocation and to breach the barriers imposed for the myth, the future will be a society where exclusive work for any one of the genders will not exist.

Keywords: Maternity; Relation mother-baby; sort identity; social representations.



INTRODUÇÃO

Durante o percurso acadêmico, em disciplinas como Psicologia da Personalidade e Psicologia do Desenvolvimento, foram abordados temas sobre cuidados à infância, incluindo-se aí as práticas da maternagem, a maternidade e seu imaginário. Contudo, a motivação para escrever sobre tal tema surgiu em especial na participação no projeto “Estilos parentais no Brasil: Contexto histórico e evolução”, como bolsista do Programa de Iniciação Científica da UERJ, no período de agosto de 2003 a dezembro de 2004. Entre as metodologias adotadas, foi analisado o conteúdo de duas revistas de grande circulação em séculos diferentes buscando-se a identificação dos modelos de estilos parentais e suas mudanças com o passar das épocas. O estudo do Movimento Higienista no Brasil, assim como a abordagens atuais de nossa cultura relativas aos estilos parentais foram de grande inspiração.
O referido projeto de pesquisa teve por objetivo a caracterização dos estilos parentais no Rio de Janeiro nas últimas duas décadas dos séculos XIX e XX, mas especificamente seu ideal a partir da análise do discurso especializado e sua divulgação na grande imprensa. Por estilos parentais entende-se o conjunto de práticas compreendidas desde cuidados básicos até estimulações realizadas pelos pais/cuidadores. Acredita-se que refletem os valores, as crenças e as representações destes e do grupo cultural a que pertencem sobre os bebês. Na construção social destas representações, o estudo privilegiou publicações acadêmicas e sua vulgarização através da grande imprensa por possuírem esses os elementos apropriados pelos pais na construção de suas próprias representações das necessidades limites e cuidados próprios aos bebês. As fontes selecionadas no âmbito da academia foram as teses da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, para o século XIX, e manuais de psicologia do desenvolvimento humano, para o século XX, e no âmbito da grande imprensa, o periódico “A mãi de família: Jornal Scientifico Litterario e Illustrado”, disponíveis nas publicações entre 1879 a 1888, e o s cadernos do “Jornal da Família” do O Globo, publicações do período de 1988 a 2000.
Dentre as atividades realizadas, a que envolveu mais atenção e requisitou uma análise minuciosa foi a leitura seletiva da revista “A mãi de família: Jornal scientifico e litterario illustrado”, com foco sobre temas envolvendo a maternagem e o desenvolvimento infantil entre 0 a 2 anos. O periódico, escrito por médicos, era meio de divulgação das idéias higienistas e sua leitura permitiu a identificação de uma concepção popular do que seria a mãe ideal bastante diversa da que encontramos hoje. O contato com o discurso normatizador do final do século XIX, especialmente médico, e seu contra ponto em novas abordagens, como o discurso de Elizabeth Badinter (1985), levaram-me a proposta de confrontar saberes consagrados difundidos no final do século XIX e na atualidade.
Jurandir Freire da Costa (1983) em obra que focaliza o movimento higienista na cidade do Rio de Janeiro, apresenta em relação à pratica da maternagem em geral e ao aleitamento em particular, a critica de uma imposição que se utiliza, entre outros métodos, de apelos dos médicos especialistas. A amamentação se transformou em prova de amor materno, tornou-se parte de um padrão de comportamento valorizado, mas também uma forma de regulação da vida da mulher através da mobilização do sentimento culpa.
E. Badinter (1985) questiona a natureza instintiva e universal do amor materno, trazendo a reflexão questões relativas ao aleitamento e à imposição feita por especialistas sejam eles médicos, filósofos, escritores ou profissionais dos meios de comunicação de diferentes épocas aprovados pelos círculos de poder. Afirma, ainda, que o amor materno inato é um mito e utiliza-se de documentos históricos para sustentar sua afirmação de que o ideal materno é produto das idéias especialistas e poderosos de construído ao longo dos séculos.
O ideal da mãe perfeita construído por cada sociedade em geral e por cada família, em particular, tem influências que podem ser positivas ou negativas para mulher e para a criança, assim como para todos de seu convívio íntimo. Muitas mulheres se sentem atormentadas por pensamentos acerca de estarem, ou não, sendo boas mães: ao mesmo tempo em que a sociedade lhes cobra amarem seus filhos incondicionalmente, muitas vezes elas não vivenciam dessa maneira. Em alguns momentos, sentem raiva de seus filhos, dúvidas e se culpam.
Este artigo tem como objetivo contrastar o conteúdo da fala dos especialistas sobre a mãe ideal em um discurso que vêm se reconfigurando timidamente desde o final do século XIX e as contribuições de teóricos contemporâneos como Donald Winicott, autor da noção de “mãe suficientemente boa”; o pensamento feminista de E. Badinter, e a perspectiva das “mães más”de C. Serrurier.
Se pensarmos em representações de papéis verificaremos que eles têm importantes funções estratégicas numa sociedade. Essas representações, de alguma forma, se caracterizam por ações repetidas de um modelo socialmente apreendido. O papel materno idealizado não foge a estes padrões: através das gerações, as mulheres se identificam com padrões de comportamento das mulheres de sua família e de sua comunidade modelados pelo discurso especializado.
Assim, depositou-se no ideal da mãe perfeita a responsabilidade pela unidade familiar e pela garantia ao homem de maior disponibilidade para outras obrigações sociais: a mãe ideal conjugaria perfeitamente sexo, estabilidade conjugal e responsabilidade com os filhos.
Se no século passado acreditava-se que a mãe tinha uma função mais biológica que afetiva, atualmente a maternidade é encarada de forma diferente pelos especialistas e pelas mulheres, especialmente nos centros urbanos ocidentais: socialmente construída, a maternidade é apropriada como elemento determinante pra seu reconhecimento como indivíduo, não mais tomada como decorrente da ação de algum instinto.
Contudo, pode-se freqüentemente identificar sentimentos de dúvida e ambivalência no discurso espontâneo das mulheres contemporâneas quando se vêm envolvidas com as questões da maternidade. Muitas se culpam por não sentir ou não agir de acordo com os modelos valorizados na sociedade, com normas inconscientemente internalizadas que se reproduzem através das gerações, integram a subjetividade feminina e modelam papéis. Estas mulheres podem se sentir assim por não amarem incondicionamente seus filhos, sentirem raiva ou frustração pelo nascimento de uma criança, o que não corresponde àqueles ideais normativos internalizados.
Acredita-se que uma mulher pode conceber e não necessariamente sentir amor por uma criança, e outros imperativos podem fazê-la cuidar de sua criança. Valores morais e sociais são determinantes sobre o desejo e o dever de ser mãe. “Os valores de uma sociedade são por vezes tão imperiosos que têm um peso incalculável sobre os nossos desejos” (BADINTER, 1985; p. 16).
Além deste determinante social mais largo, que faz uma mãe socialmente construída, sua própria história de identificação com sua mãe determina sentimentos e representações que podem se contrapor ao discurso normatizante e à experiência.
Escolheu-se como caminho uma revisão de textos do pensamento feminista de E. Badinter, do movimento higienista no Brasil e da obra de D. Winnicott e de C. Serrurier. Para ilustrar o grande contraste entre os discursos do final do século XIX e da segunda metade do século XX recorrer-se-á aos textos publicados no periódico “A Mãi de Família: Jornal Scientifico e Litterario Illustrado”.

A Construção Social do Ideal Materno no Ocidente

Focalizaremos inicialmente a história do surgimento da infância a partir de uma analise sócio-histórica com base em pesquisas de antropólogos, sociólogos, psicólogos e outros estudiosos das ciências humanas e sociais. Em especial, através da investigação de P. Ariès (1978) pode-se obter descrições históricas sobre a criança, a família e a maternidade em seus contextos temporais. Áries não se prende a acontecimentos, mas ao cotidiano expresso em itens do vestiário, mobiliário, diários, etc.
Desta abordagem, pode-se concluir que não existia, na idade média, entre os séculos XII e XV, o sentimento de infância como uma consciência da particularidade infantil capaz de distinguir a criança do adulto: logo que a criança era capaz de dispensar a ajuda da mãe ou da ama, depois de um desmame tardio que acontecia por volta dos sete anos de idade, ela ingressava na comunidade dos adultos: participava dos jogos e dos trabalhos e seus trajes também não a diferenciavam dos mais velhos, pois assim que deixava o cueiro, se vestia como os outros homens e mulheres, embora as roupas mostrassem a hierarquia social. O sentimento de infância começa a aparecer no século XVI numa atitude diferenciada em relação à criança que começa a ser difundida nos séculos XVI e XVII. Nesse último, a noção de “família” remetia à fidelidade dos servos e a “criança” era definida como um adulto em miniatura.
Inicia-se, então, uma nova associação entre a criança, que precisa de proteção e formação, e a família que, entre outras coisas, tem a missão de proteger e educar seus membros. O cuidado dispensado aos pequenos passou a inspirar novos sentimentos e a nova atitude parental envolvia paparicos e focalização da criança como fonte de distração dos adultos. As crianças começam a receber nomes próprios e a saber quantos anos têm, assim como os pais passam a considerar importante saber quantos são os seus filhos. Surge uma especificidade deste período da vida, expresso pelos novos lugares que lhe são determinados nos cômodos das casas, na dimensão dos móveis, nas atividades que lhe seriam proibidas. E há também um lugar entre os saberes, justificando uma medicina especializada e uma pedagogia que lhe sejam próprias. No século XVIII começa a surgir uma preocupação com a higiene e a saúde física, inspirada pelas ações médicas: a designação específica do campo da Pediatria surge em 1872. De acordo com Badinter (1985), os médicos, até então, não tratavam as crianças por considerarem desnecessário qualquer cuidado e não digna a tarefa.
Do ponto de vista de Badinter (op.cit.) o amor materno é essencialmente adquirido ao longo da evolução social no ocidente, um sentimento não inerente à condição da mulher. Sua pesquisa, com bases documentais revela que na França dos séculos XVII e XVIII as crianças eram entregues às amas, desde o nascimento, para que fossem criadas e garantida sua sobrevivência física. Esse cuidado envolvia seu deslocamento para a casa dessas amas e seu retorno para a família só acontecia depois dos cinco anos, quando sobreviviam, pois as condições de higiene em que sobreviviam eram precárias. A tarefa de amamentar não era nobre para uma dama.
O movimento higienista buscou inserir as normas higiênicas no cotidiano da família. Os especialistas, assim como a sociedade de um modo geral, durante muito tempo reduziram as mulheres ao seu sexo, sempre frágil, doente e quase sempre indutor de doenças: um perigo para o homem. Este movimento, muito antigo, se acelerou no século XVIII, levando a uma patologização da mulher. Por fim, seu corpo tornou-se objeto médico por excelência, alvo do poder/saber normativo da higiene. Encontrou-se neste argumento uma via para coação, já que a mulher era possuidora de um instinto materno, sendo assim a grande responsável por zelar pela saúde da família através do cumprimento das normas higiênicas.
Além dos argumentos sobre as imposições do instinto, analogias entre a imagem da mãe e da santa eram freqüentes, já que das duas se exigia sacrifício e reclusão. Essas comparações lhe traziam louros de heroísmo e gratificação e finalmente garantiam algum reconhecimento dentro da sociedade.
Após certo “tratamento de choque” pelo movimento higiênico, chegando-se até mesmo a comparar as mulheres que não amamentavam às feras, o amor materno se distanciou um pouco - mas não muito - do caráter biológico e passou a se configurar como um dever moral para com a sociedade. Um dever para com a educação de seus filhos, do qual a mãe não poderia se furtar, visto ser a única capaz de exercer tal papel.

Sobre as amas.

No cenário anterior à construção do amor materno é predominante a insensibilidade dos pais com relação aos filhos. As mães possuíam tanta indiferença com relação à perda dos filhos quanto os pais, sendo a morte da criança um acidente quase banal, que o nascimento de outro filho repararia.
A entrega dos recém-nascidos as amas era um hábito corriqueiro, até mesmo obrigatório. Segundo Badinter (1985) a abertura da primeira agência de amas-de-leite em Paris tem como data o século XIII. A criança era considerada um estorvo, “os cuidados, a atenção e a fadiga que um bebê representa no lar nem sempre parecem agradar os pais.” (BADINTER, 1985; p. 64). Foi no século XVII, principalmente entre a burguesia, que se disseminou o hábito de deixar a criança na casa das amas, “como a sociedade que valoriza o homem, e portanto o marido, é normal que a esposa dê prioridade aos interesses deste sobre os do bebê.” (OP. CIT.; p. 77).
Entregar um filho à ama era quase o mesmo que entregá-lo a morte, ainda assim preferível a suportar as dificuldades dos cuidados com a criança, já que “ocupar-se de uma criança não é divertido, nem elegante”. (OP. CIT.; p. 98).
No final do século XVIII observa-se um início de sentido de alerta para as condições de vida das amas a quem se entregavam as crianças: mulheres em estado de miséria, vivendo em condições sub-humanas. As crianças eram entregues às intermediárias muitas vezes sem saber seu nome, e a própria criança muitas vezes também não tinha nome: havia grande possibilidade de que essas crianças nunca mais fossem vistas. As mais frágeis eram devolvidas mortas alguns dias após saírem da casa dos pais. A intermediária, muitas vezes responsável por muitas crianças ao mesmo tempo, poderia mesmo não se dar conta da perda de um bebê que caísse da carroça e morresse esmagado pela sua roda.
Quando o bebê sobrevivia até a casa da ama enfrentava varias dificuldades, entre elas a alimentação. As amas exauridas pelo trabalho e mal alimentadas tinham a oferecer à criança um leite de péssima qualidade. Também se acreditava que o caráter se passava pelo leite, se trocava, então, a amamentação do seio por uma alimentação grosseira, inadaptável ao estomago delicado do recém-nato. Muitas amas, para não terem aborrecimentos ou não serem incomodadas pelos choros do bebê, utilizavam-se de narcóticos para fazê-los dormir e muitos morriam por excesso desses medicamentos. “Mas quando a alimentação não é fatal ao bebê, sua natureza tem ainda de vencer um mal temível: a sujeira e a falta do mínimo de higiene” (OP. CIT.; p. 124)
As crianças ficavam cobertas de fezes durante todo o dia, muitas vezes semanas com a mesma roupa, sua pele se inflamava e ficava coberta de úlceras. Eram enfaixadas, para evitar luxações na coluna, com os braços sobre o ventre e panos entre as pernas, o que impedia que os excrementos se afastassem do corpo e fazia com que este ficasse marcado e ferido. Tal bandagem pressionava as costelas e perturbava a digestão e a respiração. Muitas amas camponesas penduravam os bebês pela roupa, em um prego à parede, para evitar que fossem feridos ou servissem de comida dos animais das fazendas.
As crianças permaneciam em média quatro anos na casa das amas e muitas delas prolongavam o período de desmame interessadas em manter o contrato de serviço e os parcos honorários. Os pais não pareciam se preocupar com a sorte dos filhos, sem visitá-los ou ao menos escrever demandando notícias. As crianças, ao retornar para a casa dos pais, se deparavam com verdadeiros estranhos, que, muitas vezes, não desejavam o retorno deste filho.

“A verdade é que quando a criança volta ao lar paterno, quando volta, está freqüentemente estropiada, malformada, raquítica, enfermiça ou mesmo gravemente doente. Os pais queixam-se amargamente e talvez com mais alarido do que se o filho tivesse morrido. Pois uma criança doente represente muitas despesas futuras e poucas vantagens a longo prazo.” (OP. CIT.; p. 127)

O desinteresse geral dos pais pela criança fazia com que elas morressem aos montes. Muitas eram abandonadas nas rodas dos expostos, recurso de acolhimento de crianças enjeitadas por instituições religiosas. Mas a entrega à ama era um infanticídio disfarçado. Apenas um número muito pequeno de pais recuperava seus filhos algum dia.
Somente quando essas perdas passaram a interessar ao estado se procurou salvá-las da morte. “A verdade é que a criança, especialmente em fins do século XVIII, adquire um valor mercantil. Percebe-se que ela é, potencialmente, uma riqueza econômica.” (OP. CIT.; p. 153.). Foi necessária, então, a utilização de muitos argumentos para convencer as mulheres de que era sua vocação – instintiva, imaculada e incondicional - SER MÃE.

O amor instintivo.

O conceito de amor materno foi assimilado de forma contundente, e por muito tempo não questionável como se fosse uma situação “sine qua non”: mulher = maternar. Afirmava-se que a necessidade de maternagem é uma característica universal feminina, fazendo-a parecer um dom, um sentimento instintivo e estritamente biológico que todas as mulheres vivenciariam independentemente da cultura ou da condição sócio-econômica: pré-concebido, pré-formado, esperava-se apenas a ocasião para exercê-lo, sofrendo-se quando a oportunidade tardava.
Sob o domínio exclusivo dos pressupostos biológicos instintivos, não era possível considerar também aspectos psicológicos ou sócio-culturais e os especialistas não conseguiam explicar como esse imperativo biológico se manifestava em algumas mulheres e em outras não. As mulheres que não possuíam desejo de amamentar fugiam à norma sendo classificadas em termos de exceções patológicas ou desvios.
Maternar, desde os primórdios da humanidade, foi considerado uma função principalmente feminina, a diferença é que até o século XVIII esta não possuía caráter obrigatório e àquelas mulheres a que era imposta a maternidade não garantia gloria ou reconhecimento. Mais especificamente em relação à amamentação, muitas se negavam sob argumentos de diferentes ordens: que era um ato despudorado; que perderiam a beleza, fundamental à existência; que não era digno; que remetia a uma imagem animalizada, mas principalmente “Alimentar o próprio filho equivalia a confessar que não se pertencia à melhor sociedade” (OP. CIT.; p. 96).
A filosofia das luzes trouxe uma nova linguagem, em que não se falava em dever, obrigação e sacrifício sem reconhecimento, baseando-se para tal na igualdade, no amor e na felicidade. O patriarcado abstrato e absoluto foi, então, substituído por uma concepção mais igualitária onde o bem estar físico da criança justificava a autoridade do pai e da mãe: o amor passa a ser o regente das relações entre pais e filhos, onde respeito e a afeição devem ser recíprocos.
A felicidade seria fruto da igualdade e do amor e o hábito do marido castigar a mulher deixa de ser aceito, assim como os casamentos por conveniência. O patriarcado foi substituído por ideais de igualdade “Para as mulheres, esse novo direito ao amor abalou o autoritarismo que as mantinha durante toda vida na submissão.” (OP. CIT.; p. 177).
No final do século XVIII idealiza-se o sucesso de uma família fundamentado no amor e já se observa uma mudança nas mentalidades. O que é novo aqui é a exaltação do instinto e do amor materno. A sobrevivência das crianças agora é prioritária e o abandono do aleitamento é considerado injustiça para com o filho.
O ideal de amor não levou as mães a amamentarem, em especial as mais abastadas e as mais pobres, por motivos diferentes. Foi necessário então se apelar à obrigatoriedade da natureza, já que se a mais selvagem das feras amamenta seus filhos, a mulher também estaria submetida a esse instinto, como todo animal: serem boas reprodutoras era o que lhes convinha. “A mulher não deve se envaidecer ou extrair prazer de seus órgãos, pois sua função essencial é nutricia. A natureza criou-a fêmea antes de mais nada, permitindo-lhe alimentar o filho com o próprio leite. Ai daquelas que o esquecessem!” (OP. CIT.; p. 183).
As mulheres eram também ameaçadas com a possibilidade de enfermidades se não amamentassem. “Essa trágica descrição dos riscos corridos pela mãe má mostrava que a natureza sabia se vingar cruelmente das mulheres que lhe desobedecessem.” (OP. CIT.; p. 197).
Como a insistência no instinto materno por si só não havia provocado grandes mudanças e as mulheres não vinham cedendo aos argumentos de que amamentar seria o melhor para preservar a sua saúde e a de seu filho; nem o da beleza das mulheres grávidas; ou a felicidade que apenas o ato da amamentação lhes daria, passou-se a conceber a mãe como alguém puro a quem se atribuem apenas sentimentos nobres de acolhimento, abrigo e continência. “Em nenhum caso ela deve se aborrecer ou mostrar a menor impaciencia, pois a mãe [...] ignora o principio do prazer e a agressividade.” (OP. CIT.; p. 244). Assim, se oferecia a elas a estima, o respeito e a dignidade da sociedade por serem mães dignas deste imaculado nome.

O amor imaculado.

No prefácio de seu polêmico livro “Um amor conquistado: o mito do amor materno” E. Badinter apresenta relatos apaixonados ao livro, o que revela o quanto a maternidade ainda é um tema sagrado. Observou-se que ninguém saiu imune à leitura que evidenciou que o sentimento supostamente mais puro e genuíno (aquele que situa a mãe acima de todas as coisas) em verdade fosse construído. Apesar da argumentação da autora, em defesa de uma implantação do amor materno, podemos verificar que “continua difícil questionar o amor materno, e a mãe permanece, em nosso inconsciente coletivo, identificada a Maria, símbolo do indefectível amor oferecido oblativo” (OP. CIT.; p. 9)
Nesse processo de construção do ideal materno passou-se também a se associar a figura da mãe como colaboradora do padre. “Tomou-se consciência de que a mãe não tem apenas uma função ‘animal’, competindo-lhe também o dever de formar um bom cristão” (OP. CIT.; p. 237). Desta forma:

“A maternidade torna-se um papel gratificante pois está agora impregnado de ideal. O modo como se fala dessa ‘nobre função’ [...] indica que um novo aspecto místico é associado ao papel materno. A mãe é agora usualmente comparada a uma santa e se criará o hábito de pensar que toda boa mãe é uma ‘santa mulher’. A padroeira natural dessa nova mãe é a Virgem Maria, cuja vida inteira testemunha seu devotamento ao filho”. (OP. CIT.; p. 223).

Passa-se a fazer analogias entre a boa mãe e a boa religiosa, de quem se exige sacrifício e reclusão, para garantia do direito de ser considerada uma Santa. Assim, “adiquiriu-se o hábito de falar da mãe e de suas funções em termos místicos. Afirmava-se com o mesmo ardor que o sacrifício materno estava enraizado na natureza feminina e que a boa mãe era uma santa.” (OP. CIT.; p. 269)

A mulher transbordante de caridade, doçura e resignação constante se torna o estandarte da religião, e através de imagens religiosas tem associadas a si características necessárias ao ideal de maternidade. Como portadoras do pecado original, as mulheres atravessam seus dias a pagar através da dor a gloria dada por Deus de redimir seus pecados. Diz-se ainda que, apenas através do sofrimento expiatório e sagrado é que se adquire a paciência e o engrandecimento como ser. Sobre o sofrimento se afirma: “a mulher é feita tão somente para ser mãe e amar os sofrimentos que acompanham sua vocação [...] Suas dores são a condição de sua purificação [...] ela não deve esperar recompensas neste mundo.” (OP. CIT.; p. 267).

A igreja divulgava o discurso de que as mulheres não poderiam fugir do dever do aleitamento e da maternidade sem pecar e “O abandono do aleitamento materno é apresentado por todos, não apenas como um erro de regime mas também e sobretudo um pecado contra Deus, uma ação imoral.” (OP. CIT.; p. 197).

O amor incondicional.

Em retrospectiva podemos observar que o dizer sobre o amor materno, em específico o que se inicia com o iluminismo atingindo os séculos XVIII, XIX e início do XX, envolve mudanças fluidas e sutis em três enfoques: a natureza instintiva, a exigência de resignação com devotamento e o incondicional desejo de ser mãe, idéia de que para a realização plena de sua feminilidade, a mulher precisava cumprir a vocação materna.
O conceito de amor materno, como constituído, passa a organizar a família em torno da criança, principalmente pela mãe. O desenvolvimento do culto ao amor materno teve seu apogeu nos séculos XIX e XX, nos quais, devido às condições econômicas e políticas, o homem foi levado a sair de casa e a entregar toda a responsabilidade desta à mulher: a dignificação da maternidade foi o que possibilitou às mulheres encontrar esta função determinada e desfrutar de um prestígio até então desconhecido.
A mãe, anteriormente restrita a uma função geratriz, assumiu também o papel de educadora e passou a ter uma função social. Cabia à mulher a responsabilidade pela saúde e pelo bem-estar dos membros da família e ampliava-se sua responsabilidade como dona de casa no controle dos filhos. A ela foram delegadas, também, responsabilidades pelo desenvolvimento emocional dos filhos.
Divinas e virtuosas, essas mães sentiam um enorme peso sobre si. E se todos concordavam em glorificar a mãe perfeita, também estavam dispostos a desqualificar as mulheres que "fracassavam" em sua função materna. A mãe "perfeita e normal" devia mostrar-se paciente e dedicada, atenta a todas as necessidades de seu filho, totalmente devotada e qualquer afastamento desse padrão acarretava sentimentos de culpa ou frustração.
A mãe ideal encarregava-se insistentemente de tudo, assumindo sozinha a educação completa dos filhos: não deveria ter um sono muito pesado, deveria não pensar no marido, o seu instinto era infalível e permitia que apenas ela soubesse a hora exata de misturar as batatas com a carne. Ser mãe não deixava tempo livre para a mulher, que se tornou aprisionada no papel de mãe, nos cuidados infantis a que estava obrigada. Tal condição, entre outras, detém novamente a mulher no lar e arrefece a independência feminina decorrente da recente emancipação do patriarcado.
Suas responsabilidades não se restringiam à criança propriamente dita, mas desempenhavam um papel determinante no futuro de seu filho: se ele se tornasse um criminoso ou apresentasse qualquer tipo de deficiência física ou emocional, já se sabia quem deveria ser colocado no banco dos réus. A mãe se tornaria responsável não só por qualquer ato inconveniente do filho, mas também do marido, freqüentemente desculpado por não encontrar suporte ou aconchego ao chegar em casa: um ambiente agradável, um chinelo quente e uma comida bem feita.
É importante notar que as tradições foram se construindo de modo a estabelecer uma rígida divisão sexual do trabalho que subordinou a mulher às exigências do lar e ao cuidado da família. Os novos padrões normativos de comportamento promoveram uma modificação radical das imagens e dos papeis materno e paterno. O exercício da maternidade possibilitou às mulheres encontrarem uma função determinada, de um prestígio até então desconhecido. O caráter de novidade centrava-se na percepção do "ser mãe" naturalmente vinculada à feminilidade e na abertura de novas possibilidades que o exercício da função materna permitia. Houve um deslocamento do poder paterno, que passou a ser partilhado com a mãe.
Essas novas regras impuseram à mulher a obrigação de ser mãe e engendraram o "mito do amor materno", como um valor incondicional. Ao pai, a aproximação ao filho foi uma novidade, no entanto, menos generalizada e nem mesmo sentida como obrigatória. O pai devia exercer uma boa influência sobre o filho, ter um bom caráter e reputação e aquele que desse um bom exemplo estaria cumprindo seu dever. Era bem visto o homem que participasse da educação de seu filho ou fosse seu primeiro professor, mas tal fato, na maioria das vezes, não acontecia por lhes faltar tempo e em muitos casos, vontade.
O pai, que até o século XIX era absoluto, ganhou a possibilidade de ser falível, ignorante e até em muitas situações mau, o que determinou uma intervenção do estado sobre as relações: o pai perdeu o pátrio poder sobre o filho e passou a estar exposto a julgamento quando sua má conduta era notória e escandalosa, tornando-se objeto de investigação e vigilância. A escola passou a ser quem instruía a criança. “A escola para todos no século XIX pôs fim ao mito da onisciência paterna, tornando evidente a incapacidade de certos pais para acompanhar os estudos dos filhos, ou mesmo de lhes explicar um dever em casa.” (OP. CIT.; p. 290). Assim, a criança passou a ser a detentora do saber da família. Transportou-se a imagem do pai despótico para o pai mantenedor, responsável pelo conforto e sobrevivência da família.

“Esse pai viveu, durante décadas, satisfeito, seguro de ter cumprido sua parte... E como não a teria cumprido, se não lhe pediam nada mais que ser um bom trabalhador que volta ajuizadamente, todas as noites, para casa? No máximo esperava-se dele que elevasse a voz, à noite, contra o menino teimoso, ou que felicitasse o aluno estudioso.” (OP.CIT.; p.294)

À mulher cabia cuidar da casa, onde ela era a única a mandar, sendo indecoroso o homem desejar participar e ao menos saber do que lá acontecia. Dentro destes preceitos, a mulher torna-se o que o homem não é, deve se subjugar e ser agradável ao homem a ponto de poder-se afirmar que “as panelas, o assado e os filhos são toda a gloria, a dignidade e os prazeres da mulher” (OP. CIT.; p. 244), assim como as tarefas necessárias e nobres, que o homem não podia, ou não queria realizar. Dessa forma ela deve se limitar ao recolhimento do lar e se dedicar a cumprir a única função que a natureza lhe deu, sua única possibilidade de almejar a felicidade.
O instinto materno passou a dominar a mulher desde a infância, tornando-a fascinada pelo papel de mãe, sob o modelo e o fundamento o amor materno. O sofrimento passa a ser considerado inerente à condição feminina, e por possuir ela um amor incondicional, este lhe parece satisfatório.

“Feita para sofrer e gostando disso, a mulher não pode encontrar melhor ocasião de exercer seus dons do que na maternidade. [...] Para que uma mulher cumpra sua vocação, é preciso que seja mãe, não como outrora, de maneira esporádica e irregular, mas constante, vinte quatro horas por dia.” (OP. CIT.; p. 249).

Com respeito à capacidade intelectual da mulher, os estudiosos informavam que, mesmo aquelas aparentemente bem dotadas, a apresentavam de forma inferior à dos homens. Evidencia-se um discurso que contrasta dois seres sociais distintos: a mulher passiva e o homem ativo. Assim, se estabelecia que qualquer outra atividade feminina externa ao lar devia ser entendida como subordinada, assessória e desviante.
O trabalho feminino externo provocava indignação aos moralistas, que evocavam suas conseqüências morais. A “fraqueza moral” das mulheres era considerada endêmica à sua natureza, encontrando no trabalho coletivo terreno fértil para manifestar-se. O discurso moralizador aconselhou a retirada das mulheres da fábrica e de outras atividades, onde se tornavam mais propensas a cair na prostituição, como as operárias, as costureiras, as criadas de servir e as empregadas no teatro.
Predominou, assim, uma representação simbólica ideal da mulher dedicada às tarefas do lar. Condenava-se o trabalho extra-doméstico como desperdício físico de energias femininas, da saúde e da capacidade de desempenho das funções maternais, além de elemento comprometedor da dignidade feminina. A mulher que não desejasse exercer sua vocação materna era condenada por violar as leis da natureza, considerada uma desviante por negar o sentimento de amor inerente à condição feminina.

“A falta de amor é portanto considerada como um crime imperdoável que não pode ser remido por nenhuma virtude. A mãe que experimenta tal sentimento é excluída da humanidade, pois perdeu sua especificidade feminina. Meio monstro, meio criminosa, tal mulher é o que poderíamos chamar de ‘erro da natureza’”. (OP. CIT.; p. 275).

A única atividade feminina relativamente aceita era o ofício de professora, revelando uma ambigüidade de representação: deveria ser a primeira professora de seus filhos e, como professora, a mãe de seus alunos. Mesmo que certa educação intelectual da mulher fosse condição de sua moralidade, era vergonhoso que ela desejasse ampliar seus conhecimentos.
As intelectuais eram as mais condenadas entre as mulheres que não exerciam suas funções maternas, pois assim o faziam voluntariamente, em contraste com as operárias ou quaisquer outras profissões movidas pela necessidade. Dizia-se com relação às intelectuais que:


“Recusam-se voluntariamente a restringir seu universo aos limites do lar, e circunscrever sua vida à maternidade e à casa. Essa atitude monstruosa foi considerada a fonte de todos os flagelos sociais, pois se a mulher despreza suas funções naturais, disso só pode resultar a desordem para a sociedade.” (OP. CIT.; p. 281).

O amor romântico.

O amor romântico foi o móvel de um movimento centrado no casamento por amor que transformou a esposa na companheira querida e eleita, o que conferiu um certo status à mulher doméstica. Mesmo a figura da mãe passou a desempenhar um papel mais importante dentro da família, e notadamente, na criação dos filhos. Assim, o amor romântico criou o lar e recriou o papel da mãe, já que estes eram frutos da associação entre amor, casamento e maternidade.
As relações deviam ser duradouras, mesmo que sustentadas na duplicidade das experiências masculinas e no confinamento da sexualidade feminina. Se para os homens prevaleceria um duplo padrão ancorado nesta divisão, para as mulheres desenvolvia-se o isolamento do mundo exterior, e contraditoriamente, uma total autonomia e poder nos novos domínios do lar. Em verdade, este contexto reafirmava a separação entre o público e o privado, entre a tranqüilidade do ambiente doméstico e a sexualidade da prostituta, servindo de referência para a construção de valores sociais que se encarregaram de manter os comportamentos sexuais em níveis compatíveis com o convívio familiar e social.
O amor, de uma forma geral, serviu como mecanismo de união do casal e estratégia para definição dos papéis a serem representados por homens e mulheres, o que colaboraria para uma maior rigidez e diferenciação entre eles.
O papel da mãe e o casamento, construídos como ato de amor natural em seu sentido obrigatório, eram a base de sustentação para a educação moral dos filhos. O romantismo e o amor foram incentivados numa sociedade encantada com a literatura romântica e o discurso literário foi utilizado para a garantir mecanismos de controle, sobre as mulheres e as mães. A poesia romântica em muito contribuiu para popularizar e banalizar o discurso sobre o instinto masterno.
Como exemplo deste discurso literário brasileiro podemos tomar um trecho da obra de José de Alencar no livro Senhora:

“Felizmente D. Camila tinha dado a suas filhas a mesma vigorosa educação que recebera; antiga educação brasileira, já bem rara em nossos dias, que, se não fazia donzelas românticas, preparava a mulher para as sublimes abnegações que protegem a família e fazem da humilde casa um santuário.” (ALENCAR 1875; p. 53).

A Construção Social do Ideal Materno no Brasil: O Papel da Maternagem Ideal no Discurso Vinculado na Grande Imprensa do Século XIX.


O movimento higienista designa o pensamento dos médicos e especialistas do século XIX no Brasil que teve a maternidade e o aleitamento como principais focos de atuação. Sob a condução inicial das mães de família desenvolveram-se três pilares básicos para a ação do movimento: a educação física, que criou o corpo saudável; a educação moral, gênese da figura do indivíduo contido e polido; e a educação sexual que na concepção higienista deveria transformar homens e mulheres em reprodutores e guardiões de seus filhos.
Para os editores do periódico “A Mãi de Família: Jornal Scientifico e Litterario Illustrado” a família era a grande responsável pela escandalosa mortalidade infantil que atingia o país. Dizia-se mesmo que os pais exerciam uma "funesta influência" aos seus filhos. Era necessário, então, que esses pais se colocassem nas mãos daqueles que conheciam suficientemente bem os princípios de higiene, de assepsia, de prevenção de doenças, se quisessem manter vivos seus filhos. Era preciso introduzir em suas vidas a figura do médico, prescritor de regras e de normas de conduta, capaz de diante ditar os melhores modos de se alimentar e cuidar das crianças.

“Nunca será demais repetir que a verdadeira alimentação das crianças nos primeiros annos é o leite materno. Entretanto a negligencia, o egoísmo, a indolência, a servil submissão as etiquetas sociaes, a vaidade e o luxo impedem as mais de cumprirem o sacrossanto dever que lhes é imposto pela natureza”. (COSTA, Maio1879; p. 65)

A família, incapaz de sozinha cuidar e dar a devida educação [higienizada] a seus filhos, precisava da intervenção de um outro agente educador, o médico: “Há uma coisa que sempre me deu que pensar e da qual tenho tido provas evidentíssimas em toda minha vida: refiro-me a profunda ignorância das moças em geral com respeito aos primeiros cuidados que um recém-nascido reclama. (MONTALCHEZ, Fev.1880; p. 19).
É na família, centrada nas figuras do homem-pai e da mulher-mãe, que a higiene focaliza sua atenção. Seu discurso inclui e valoriza a criança em sua imaturidade e fragilidade e faz da família sua própria polícia: do seu corpo, do seu sexo e de sua vida social. Este controle foi uma das formas encontradas para exterminar os velhos hábitos "anti-higiênicos", criando-se paulatinamente o ideal de família dos nossos dias, a família burguesa. “Afóra o caso de enfermidade, o primeiro dever da mãi é amamentar o seu filho. O seio materno pertence de direito ao pobre innocentinho, é a única coisa que lhe pertence no vasto mundo em que surgiu, tão desprovido de forças” (MONTALCHEZ, Fev.1880; p. 19).
As campanhas pelo aleitamento materno foram um dos pontos centrais dos escritos e das ações médicas, apresentando-se como um momento de estreitamento dos laços familiares e de manifestação do amor materno capaz de garantir o bom desenvolvimento físico e moral das crianças. Denunciavam o egoísmo e a vaidade das mulheres que não queriam amamentar seus filhos, acusando-as de causadoras da desnutrição, do raquitismo e da mortalidade infantil. Seus porta-vozes se expressavam em exortações como:

“a mulher nasceu para ser mãi, a mãi deverá viver para seu filho ‘completamente’, devendo acabar para ella os prazeres ephemeros desse mundo, que não é o de seu tecto, desse mundo de mentirosos, de intrigantes e calumniadores que estão sempre promptos a ferir até a sua virtude.” (COSTA, Maio 1879; p. 66).

A amamentação se tornou uma obrigação materna, a confirmação de um ato natural, inato, instintivo, biológico envolvendo o binômio mãe-filho, em que a mãe, mamífera, detém a responsabilidade sobre a saúde de sua cria.


“Temos (os médicos) necessidade de mostrarmos as tristes conseqüências da fatal teimosia das mulheres, que privilegiadas da natureza, entretanto se collocam em condição inferior a de outros animais; que não entregam a outros de sua espécie o encargo sublime de amamentar seus filhos! [...] Há deveres de tal ordem impostos pela própria natureza, que a não serem cumpridos collocam as mulheres em condição inferior a de outros animaes. A organização anatômica da mulher bem lhe indica qual o papel que lhe traçou o Creador, o de ser Mãi. [...] São actos naturaes dependentes de leis physiologicas, que quando são invertidas merecem bem o titulo de aberrações. [...] Se a ovelha, a cabra e outros animaes o fazem sem que ninguém lhes tivesse aconselhado, porque será preciso que se diga a mulher, que tem a felicidade de possuir uma intelligencia: não serás verdadeiramente Mãi, sem que aleites teu filho? [...] É muito necessário que se use de todos os meios possíveis para lembrar a mulher onde está a sublimidade de seu papel no mundo.” (COSTA, Mar. 1888; p. 33-34).


A comparação com as fêmeas de outras espécies causava grande impacto e incômodo sobre as mulheres uma vez que não amamentar consistia uma infração às leis naturais: “Em primeiro lugar, porque se conduzia de modo contrário a todas as fêmeas da classe dos mamíferos; em segundo lugar, porque contrariava sua vocação ‘natural’, a de ser mãe, conforme o figurino higiênico” (COSTA, 1983; p. 256-257).
A concepção do instinto materno para cuidado e amamentação como próprio da espécie procurava orientar as ações da mulher, associada a informações sobre as vantagens em ofertar o seio a seu filho, responsabilizando-as pelos resultados futuros. A lógica de informar para responsabilizar procurava modular seu comportamento conforme os ideais higiênicos, imputando-lhe culpa pelo desmame precoce, então associado de forma direta a agravos para a saúde infantil.

“Para [...] que a mãi amamente sempre seu filho é necessário que a mulher, quando sinta os primeiros signaes da maternidade, comprehenda desde logo que tem este dever a cumprir. Assim pois deverá tudo fazer para que não aconteça faltar-lhe o leite como a tantas tem succedido. Para isso deverá [...] não fatigar-se em divertimentos nocturnos, como temos tido occasião de observar. [...] É preciso que [...] vos esqueçais completamente de que sois moças, bonitas e elegantes. Deveis vos lembrar unicamente de que tendes de ser mãi e que tendes obrigação de amamentar vossos filhos.” (COSTA, Abril 1888; p. 49).

Esses médicos condenaram rigorosamente o aluguel de escravas como amas-de-leite, “nenhum outro modo de amamentação equivale a amamentação materna, e é culpada toda mãi que, podendo amamentar seu filho, deixa de fazel-o.” (COSTA, Ago. 1882; p. 122).A maioria das críticas feitas à mortalidade infantil foi por meio de trabalhos médicos sobre amamentação, cuja tônica não era o destino dos filhos das escravas, mas a saúde dos bem-nascidos. De um artigo médico se extraiu esse trecho: “a triste historia dos casos fataes devido à má amamentação, confiada a mercenárias, verdadeiras criminosas, que alugam seu leite impuro, impróprio por todas as razoes à nutrição dos pequenos entes.” (COSTA, Abril 1881; p. 67). Algumas famílias ainda mantinham o hábito de que as crianças fossem criadas nas casas das amas.

“Julgo dever insistir em recomendar ás mãis que amam verdadeiramente seus filhos que nunca decidam ou deixem decidir por pessoas incompetentes uma questão tão grave como a da alimentação (o leite materno) que se deve dar aos recemnascidos.” (CHESNAIS, Set. 1884; p. 132).

Apesar de sucessivamente ter-se tentado regulamentar essa ocupação, o que mais influenciou na gradativa diminuição da utilização das amas-de-leite foram às alterações nas relações familiares. Propagou-se um modelo imaginário de família orientado para a intimidade do lar que conduzia a mulher ao território da vida doméstica onde seriam privilegiados os seus talentos e reafirmada a importância da missão de mãe.

No “desempenho da missão, que é apanágio incomparável da mãi de família, de promover, com o sacrifício mesmo de todas as forças de que dispuzer, o maximo bem estar de seus filhos, que for compatível com os princípios da religião, da moral e dos bons costumes” (PIRAGIBE, Set. 1880; p. 131).

Para tanto, foram necessários a profissionalização da maternidade e o desenvolvimento do ideal de mãe, em grande parte impulsionados por médicos higienistas e reformadores sociais.


“O exemplo materno é que nos lecciona praticamente o papel que temos de desempenhar mais tarde; elle nos ensina a ser terna para com os filhos, desvelada para com o marido, sincera para com os amigos boa para com os servidores e modesta para com a sociedade.” (FERREIRA, Mar. 1881; p. 38).


“Desde que a creança vê a luz do dia, desde que ella dá o primeiro grito, o primeiro movimento da mãi é pedir seu filho para cobril-o de caricias e beijos; e o seu segundo movimento profundamente espontâneo é de querer dar-lhe o seio. Todos os moralistas estão de acordo em reclamar com todo enthusiasmo, a satisfação d’este anhelo da natureza. Demosthenes pedia a condemnação de uma mulher de Athenas porque fizera amamentar seu filho por uma mulher estranha. [..] Marco Aurélio ordenava que tudas as mais amamentassem seusfilhos porque só assim seriam completamente mais.” (ALMEIDA, Abril 1885; p. 58).


Assim, o ideal de mãe vinculou-se às idéias higiênicas redentoras da maternidade e da proteção à infância, “a mãi com a consciência em paz, orgulhosa por ter sabido cumprir religiosamente seu dever materno , pôde então entregar-se a todas as outras distracções que lhe agradem, e todos admirarão sua coragem, dedicação e verdadeiro amor materno.” (COSTA, Maio 1886; p. 67).
A maternidade deixou de ser uma experiência exclusivamente feminina, transmitida entre mulheres, para transformar-se em um saber emergente de um discurso profissional da medicina - na verdade, um discurso masculino sobre as mulheres. “Toda mãi digna deste nome deve dar o seio a seu filho; não pôde dispensar-se desta sublime tarefa senão por impossibilidade absoluta e prescripção formal do médico” (HYGIENE, Abril 1885; p. 59).
Buscou-se regular a vida da mulher através de normas higiênicas: a amamentação foi a mais enfática das imposições e tinha também, como objetivo a regulamentação do tempo livre da mulher na casa, livrando-a do ócio e dos passatempos que iam contra a moral e os bons costumes familiares. Essa delimitação das ações da mulher, no lar, objetivava ainda enfraquecer seus desejos de independência, já que “nada se dá na mulher que não influa mais ou menos directamente sobre o innocentinho que traz no ventre, e uma das causas que mais nos convence d’essa verdade são as impressões moraes.” (ALMEIDA, Jan. 1883; p. 2). Ou então, com relação ao leite, acreditava-se que “as affecções moraes, os desgostos, etc., exercem uma influencia considerável sobre a quantidade e qualidade do leite.” (CHESNAIS, Set. 1884; p. 132).
A ordem médica criou normas que tornaram possível um controle da família e uma definição de papéis sexuais regidos pela busca "disciplinada" do prazer através das normas de conduta e da organização, o que notadamente afetou mais as mulheres que os homens. Numa sociedade feita e pensada por homens, as concepções higienistas vieram explicar e fixar cientificamente as características supostamente típicas de cada sexo, apresentando-as como imperativos da natureza: para o homem a força física e o prazer sexual, para a mulher a submissão e a fidelidade, sendo a castidade um aspecto muito importante para a preservação da virgindade antes do casamento.

“Considerada debaixo do ponto de vista intelectual e moral, a menina apresentaria seguramente maior interesse; porque naquela idade (a infância) o sexo manifesta-se por gestos, tendências, aptidões, mais do que organização physica. [...] com sua boneca, essa primeira amiga, (a menina) parece preparar-se de antemão para os cuidados da maternidade” (ALMEIDA, Abril 1885; p. 58).

“A menina – Desde que ella nasce vemos na mulher bem impressos os instintos do sexo feminino que distinctamente a separam do masculino, e indicam sua aptidão a particulares encargos e deveres. Assim a menina mostra especial prazer em brincar com bonecas prestando-lhe cuidados e patenteando maternal solicitude e carinhos;” (MACDONALD, Maio 1886; p. 75).

A culpabilização da mulher foi fundamental à regulação da reprodução humana pela medicina social. A circunscrição da sexualidade feminina envolveu várias manobras entre as quais a limitação do ato sexual no curso da amamentação foi uma das mais bem-sucedidas. Tais restrições justificavam-se por evitar uma nova concepção que comprometeria a secreção lática e pelo fato de a própria relação sexual ser capaz de corromper as qualidades do leite.

“Durante a gravidez ha outras cautelas que precisam tomar-se: mas os conselhos que precisam ser seguidos devem ser dados nos maridos. É imprudente que os deveres matrimoniais sejam cumpridos como habitualmente. É necessária toda a reserva [...] e abstinencia absoluta nos últimos mezes.” (COSTA, Mar. 1881; p. 34).

“As senhoras casadas que amamentam devem ter seu leito separado e esquecerem-se o mais que poderem de seus maridos.” (COSTA, Abril 1888; p. 57).

Esta visão permitiu que durante um longo período, o casamento e a maternidade regulassem homens e mulheres uma vez que "Através da amamentação buscava-se depositar na mulher a responsabilidade pela unidade da família e dar ao homem maior disponibilidade para outras obrigações sociais." (COSTA, 1983; p. 26).
Cumpre assinalar que também o amor serviu aos objetivos da ordem médica, na medida em que afirmava-se sua determinação para a solidez da família e proteção da prole. O sexo, circunscrito à moral familiar e objeto de regulação médica foi classificado conforme princípios de normalidade e anormalidade. O propósito médico estatal era a exaltação da sexualidade conjugal baseada no "casamento modelo" e a regulação dos novos papéis de homens e mulheres dentro desse casamento. Para os médicos da higiene "ser pai e mãe passou a ser a finalidade última do homem e da mulher". (OP. CIT.;1983; p. 238).
No conjunto das estratégias médicas para difundir e regulamentar a higiene familiar o foco sobre a relação mãe-filho foi uma das mais brilhantes equações desenvolvidas pelos higienistas, e, por seu intermédio, elevou-se a mulher à categoria de mediadora entre os filhos e o Estado. Os higienistas buscavam resgatar, na ordem natural dos instintos, a maternidade e a amamentação como fatores vitais para a sobrevida dos filhos. “A mãi deve criar seu filho, a natureza e a razão lh’o ordenam” (BLANCHE, Out. 1885; p. 156). Como para a plena realização de sua feminilidade a mulher precisava cumprir a vocação materna, cabia a ela a responsabilidade pela saúde e pelo bem-estar de sua família, ampliando-se sua responsabilidade como dona de casa no controle dos mandamentos da higiene, principalmente em relação à infância.

“A moral, a religião, a physiologia impõem a mãi o dever imperioso de criar seu filho. Tudo na natureza indica que ella foi creada para isso, e a mãe que, sem motivos legítimos, não cumpre esse dever, é, aos olhos do philosopho, indigna desse doce nome” (EDUCAÇÃO, Mar. 1883; p. 44).

A técnica de persuasão mais eficaz foi a analogia entre mãe e santa, exigindo-se da mulher sacrifício e reclusão. A maternidade passou a ser encarada, então, como um sacerdócio, que exigia da mulher paciência e total dedicação. O "instinto maternal" guiou a mãe a uma dedicação e amor sem limites uma vez que o devotamento era apontado como parte integral da "natureza" feminina e que nele estava a fonte mais segura de sua felicidade. “O acto mais natural da vida da mulher e pelo qual ella se torna grande, sublime, isto é, pelo qual ella se torna mãi, é o parto”.(COSTA, Mar. 1881; p. 41).
Glorificada a mulher-mãe, àquelas que não apresentassem naturalmente esse altruísmo aplicava-se o discurso moralizante, definidor do espírito do sacrifício não como natural, mas como obrigatório. Se “Não podeis, minha senhora amamentar o vosso filho. Não quero cogitar das razões que vos impedem de cumprir com esse santo dever”. (BLANCHE, Ago. 1882; p. 126). Insistia-se na idéia de que toda "boa mãe" é incondicionalmente terna e devotada, predominando uma interpretação mística das funções maternas. Foi o sacrifício inerente à maternagem que elevou a "boa mãe" à condição santificada. A função da mãe era abdicar de si mesma para o bem dos filhos e da família.
A educação feminina tornou-se um ponto-chave para a medicina, pois através dela pretendia-se o aperfeiçoamento físico e moral da mulher, da mãe e das futuras gerações do país. Se “a mulher é fecunda, pode (então) ser mãi [...] A mãi deve vigiar mais do que nunca o desenvolvimento physico e principalmente moral de sua filha” (HYGIENE, Abril 1885; p. 59). A “nova mulher”, submetida à tutela médica, passou a constituir-se, assim, um agente fiscalizador. “O fim da educação é não eliminar na menina as naturais tendências do sexo que serão sua corôa e gloria, o que se deve é regularizar, adestrar e aperfeiçoar essas inclinações afim de prevenir ulterior desenvolvimento” (MACDONALD, Maio 1886; p. 75).

Abordagens da maternidade ao final do século XX.

As idéias psicanalíticas e as instruções de Freud e de seus sucessores atestaram “(...) ao mesmo tempo a desorientação dessas mães e a crença num ideal, que desmentem ambos a idéia de uma atitude materna instintivamente boa. Todos os gestos da mãe foram objeto de recomendações.” (BADINTER, 1985; p. 310).
Com o intuito de melhor fixar as recomendações para os papeis paterno e materno, os psicanalistas reforçaram a diferenciação e estratificação de papeis “a mãe simboliza antes de tudo o amor e a ternura, e o pai, a lei e a autoridade.” (OP. CIT; p. 315).
Dentre as recomendações à mãe, observa-se a responsabilidade pela criação dos filhos e pela harmonia da família, ilustrada por mitos da maternidade onde representa a generosidade única, capaz de fazer todas as concessões em favor dos filhos. Sua feminilidade só se completa pela maternidade e o homem teria que ter tido uma boa mãe para se tornar um homem responsável, capaz de sustentar sua família.
Uma boa mãe, imprescindível à saúde da criança, foi descrita como uma mulher tornada realmente feminina. Alguém que foi capaz de superar o Complexo de Édipo em sua versão feminina, o que corresponde ao abandono do desejo de possuir um falo, substituído pelo desejo de um filho.
No contexto histórico do século XX, mais especificamente das duas grandes guerras observou-se que o recrutamento dos homens para os campos de batalha e determinou a ocupação, por mulheres, de funções anteriormente masculinas. Esse foi um caminho sem volta, uma vez que à necessidade inicial de assegurar o sustento da família somou-se e seguiu-se um desejo de satisfação pessoal. No entanto, a mulher-mãe continuou vivenciando o mito da mãe eternamente abnegada, aquela que é responsável pela felicidade de todos, passando a sofrer conflito e ambiguidade por não conseguir dedicar-se plenamente a sua função de trabalhadora, nem ser uma mãe exemplar.
No campo do pensamento psicanalítico, diferentes autores focalizaram a identidade materna. Desde a perspectiva fundadora de Freud a contribuições posteriores, como D. Winnicott e C. Serrurier, pode-se observar um alargamento de perspectiva.

Breves comentários sobre a contribuição de S. Freud.

Para compreender a perspectiva de S.Freud sobre a maternidade cabe contextualizar sua produção: médico e pensador do final do século XIX início do XX, estabelece em sua teoria um vinculo entre feminilidade e maternidade confirmando a mãe como o personagem principal da família, determinante da saúde e da felicidade dos filhos. Para desenvolver sentimentos e atributos próprios a uma boa mãe, a mulher deveria ter tido, ela própria, uma boa mãe, objeto primário de amor e identificação. Caso contrario, haveria uma perpetuação da infelicidade e mesmo de patologia na família. Centrada nas fantasias edipianas, na castração e na inveja ao pênis, a abordagem freudiana condiciona à feminilidade plena à geração de um filho.
Freud em sua importância como fundador da psicanálise e grande pensador de sua época teve como um dos primeiros objetos de estudos a histeria, o que contribuiu em muito para a patologização e estigmatização da condição feminina. Entre os sintomas histéricos incluem-se nevralgias e anestesias de vários tipos, paralisias, agitação motora, convulsões, vômitos, anorexia, entre outros, e sua patogênese indicava episódio traumático passível de ser trazido à luz através da fala.
As pacientes investigadas apresentavam sintomas repetidos ligados a idéias reprimidas, afastadas e convertidas, com conteúdo sexual: suas fantasias envolviam o pai, o que conduziu à elaboração do Complexo de Édipo e à identificação de uma sexualidade infantil.
Em resumo, sua perspectiva afirmava que o menino experimenta inicialmente um grande amor pela mãe, fonte de alimento, cuidados e carícias, seu primeiro objeto de amor até ser substituído por um outro semelhante, uma outra mulher. Na irrupção do Édipo, esse amor passional pela mãe corresponde a um sentimento de ciúme e rivalidade formando uma relação triangular. Neste cenário, a descoberta do órgão feminino provoca no menino o medo da castração capaz de mobilizar forças que leva, à superação desse do complexo de Édipo e à criação do superego: impedido de eliminar o pai para desposar a mãe, o menino se identifica com aquele que representa a lei e o mundo exterior.
Segundo Freud a menina também experimenta uma situação análoga ao Édipo masculino, de relação triangular e a rivalidade com a mãe, mas como ela já nasce castrada, a dinâmica torna-se mais complexa: a atribuição de à mãe, por não ter lhe dado o pênis, determina o surgimento de uma relação de amor e ódio à mãe, que nunca lhe dá o suficiente. Por outro lado, sem o medo da castração, a menina não experimenta a mesma tensão que o menino para superar o Édipo, permanecendo nele por mais tempo e superando-o de forma tardia e incompleta, com comprometimento da formação do superego.

“A renúncia ao pênis não é tolerada pela menina sem alguma tentativa de compensação. Ela desliza [...] do pênis para um bebê. Seu complexo de Édipo culmina em um desejo, mantido por muito tempo, de receber do pai um bebê como presente — dar-lhe um filho. Tem-se a impressão de que o complexo de Édipo é então gradativamente abandonado de vez que esse desejo jamais se realiza. Os dois desejos — possuir um pênis e um filho — permanecem fortemente catexizados no inconsciente e ajudam a preparar a criatura do sexo feminino para seu papel posterior [...] Deve-se admitir, contudo, que nossa compreensão interna (insight) desses processos de desenvolvimento em meninas em geral é insatisfatório, incompleto e vago.” (FREUD, 1976 p. 223-224).

Para alcançar a feminilidade, a menina precisa transferir o objeto de amor da mãe para o pai, assim como mudar o órgão de satisfação do clitóris para vagina mas, acima de tudo abandonar o desejo de possuir um pênis pelo desejo de ter um filho. Sem essas transições, corre o risco de não se tornar uma mulher autenticamente feminina.
Assim constituem-se s três pilares básicos da condição feminina: a passividade, o masoquismo e o narcisismo, os mesmos requisitos primordiais para boa mãe aceitar o sofrimento inerente à maternidade. Somente a sublimação do desejo do pênis permite o estabelecimento das formas mais elevadas do amor materno, requisitos inerentes, segundo a perspectiva freudiana, ao bom desenvolvimento feminino produtivo, descartando-se determinantes culturais.
Freud apresenta a concepção de gêneros em termos de superioridade e inferioridade ao considerar uma incompletude no desenvolvimento do superego feminino, condição determinante de dependência à figura masculina e o sofrimento, inerente à maternidade. Desta perspectiva, a maternidade é compensatória e a relação mãe-bebê o cenário de reedição de conflitos envolvendo o objeto original de amor: “Ela reconhece o fato de sua castração, e, com ele, também a superioridade do homem e sua própria inferioridade” (OP. CIT.; p.264)

Winnicott e a “mãe suficientemente boa”


A dedicação de D. Winnicott ao tratamento psicanalítico de crianças bem pequenas possibilitou um aperfeiçoamento do pensamento freudiano original, um aprofundamento da compreensão do ambiente facilitador ao desenvolvimento, especialmente do papel de uma mãe suficientemente boa, presente e confiável. Nesta abordagem, a condição para a boa maternagem é a disposição da mulher para adaptar-se, desde as primeiras semanas após o nascimento, compreendido como um prolongamento da relação intra-uterina experimentada na gestação. Os fundamentos da teoria de Winnicott focalizam a relação mãe-bebê, seu caráter simbiótico onde um ser imaturo e dependente elicia sentimentos e comportamentos na mãe, capazes de garantir-lhe prazer.“Esse sentimento de hipersensibilidade materna é uma doença boa, que permite à ‘mãe normal’ adaptar-se às primeiras necessidades do filho com delicadeza e sensibilidade.” (BADINTER,1985; p. 309)
Winnicott toma a relação mãe-bebê e as interações com o meio como fio condutor dos processos de maturação e desenvolvimento psíquico do indivíduo e considera duas categorias para o estado de dependência inicial humana: uma primeira, inicial, desde a gestação até os seis meses, aproximadamente, caracterizada como dependência inicial absoluta, à qual segue-se uma condição de dependência relativa, entre os seis meses aos dois anos, aproximadamente, limite estabelecido para as reflexões desse estudo.
Nos primeiros seis meses de vida o bebê acha-se em um estado de total dependência do meio que lhe é oferecido pela mãe, ele e o meio estão fundidos numa unidade e a adaptação da mãe às necessidades do bebê nesta ambientação primária é o que permite que os processos de maturação ocorram naturalmente.

“O bebê tem outros significados para a mãe na fantasia inconsciente, mas a característica predominante deve ser uma vontade bem como uma habilidade por parte da mãe para drenar interesse de si mesma para o bebê. Eu me referi a esse aspecto de uma atitude da mãe como sendo ‘preocupação maternal primária’”. (WINNICOTT, 1980; p.27)

Para Winnicott não existe saúde para o ser humano que não tenha sido acolhido e cuidado com amor uma vez que na tenra idade constrói-se uma área intermediaria é necessária ao início de um relacionamento ente a criança e o mundo, tornada possível por uma maternagem suficientemente boa. Nesta, a mãe normalmente devotada é, em realidade, a mãe ‘absolutamente’ devotada,mas para que a relação seja realmente bem-sucedida, é indispensável que ela encontre prazer nela.

A importância da mãe é vital especialmente no início e, realmente, a mãe tem como tarefa proteger seu bebê de complicações que ele não pode entender ainda e continuar a fornecer, de maneira uniforme, o pedacinho simplificado de mundo que a criança, através dela, passa a conhecer. Somente sobre este alicerce pode-se construir objetividade ou uma atitude científica. Qualquer falha de objetividade que ocorra em qualquer época se relaciona a uma falha neste estádio do desenvolvimento emocional primitivo. Tendo somente como base a monotonia, uma mãe pode enriquecer proveitosamente a vida de seu filho.” (WINNICOTT, 1978; p.280)

Desta perspectiva, a devoção da mãe é necessária e incondicional para que permita a descoberta do mundo exterior: quando o feto se movimenta como um chute na barriga da mãe, não há nenhuma intenção agressiva, da mesma forma que quando o recém-nascido morde o mamilo, ele não intente destruí-lo, mas usar sua força muscular para encontrar e descobrir o meio ambiente. A mãe deve receber esses gestos, ser capaz de suportá-los e de sobreviver a esse estado pré-cruel, não intencional. A mãe não deve reagir, retaliar-se ou vingar-se, mas sobreviver para que esse gesto não adquira precocemente uma significação cruel e destrutivo.

“Todos os processos de uma criatura viva constituem um vir-a-ser, uma espécie de plano para existência. A mãe que é capaz de se devotar por um período, a essa tarefa natural, é capaz de proteger o vir-a-ser de seu nenê. Qualquer irritação, ou falha na adaptação, causa uma reação no lactente, e essa reação quebra o vir-a-ser.” (WINNICOTT, 1990; p.82).

Se a mãe não for capaz de acolher esse gesto espontâneo e impulsivo do bebê, ou se ela o retalia, o afeto não será ainda de ódio, mas um sentimento de aniquilamento, uma angustia inominável. A dependência total demanda uma adaptação precisa e as falhas na adaptação materna podem tomar proporções e produzir distorções dos processos vitais do bebê.
As falhas na adaptação podem ser identificadas quando a mãe é boa de menos, realizando uma maternagem insuficiente, mas também quando a mãe é boa demais, permissiva, que não delimita o espaço da criança. Assim, a mãe suficientemente boa deve ser uma pessoa presente e estável, capaz de administrar os cuidados necessários com a alimentação e com o corpo, assim como disponibilizar a linguagem que chegará a criança.

“Mas tudo isso resulta da relação anterior que existia entre a mãe e a criança. Ai existem condições especiais. A mãe reparte com o seu filho um fragmento especializado do mundo, conservando esse fragmento suficientemente pequeno para que a criança não se confunda, mas ampliando-o gradualmente, de maneira que a crescente capacidade da criança para desfrutar o mundo seja alimentada. Esta é uma das partes mais importantes da tarefa materna. E a mãe a desempenha com naturalidade.”(WINNICOTT, 1977; p.80).

Daí a importância da identificação da mãe com seu bebê, onde esta quase se perde numa semi-fusão, tornando-se, a partir deste lugar, capaz de saber, genérica ou especificamente, aquilo de que o bebê precisa a cada momento. Essa mãe assume, assim, a vulnerabilidade do bebê, “... ela está muito identificada com o nenê e sabe muito bem como é que o nenê está se sentindo” (WINNICOTT, 1990; p.90). Winnicott considera que, pra tal, a mãe deve saber que já foi um bebê, e que essa experiência está localizada em alguma parte de seu ser. Além disso, brincou de ser bebê, papai e mamãe, e também teve regressões ao estado de dependência inicial quando esteve doente sendo, portanto, capaz de colocar-se em seu lugar.
Sobre o desenvolvimento emocional primitivo, as palavras de Winnicott (1978) lançam a luz necessária à compreensão da assimetria e da sintonia próprias à relação:

“Considerando-se o par bebê e seio da mãe (não estou afirmando que o seio seja essencial como veículo do amor materno), o bebê tem ímpetos pulsionais e idéias predatórias. A mãe tem um seio e o poder de produzir leite, e a idéia de ser atacada por um bebê faminto lhe é agradável. Estes dois fenômenos não entram em relação um com o outro até que a mãe e a criança vivam uma experiência juntos. A mãe, por ser madura e fisicamente capaz, tem que ter tolerância e compreensão, de forma que é ela quem produz uma situação que, com sorte, pode resultar no primeiro laço feito pelo bebê com um objeto externo, um objeto que é externo ao self do ponto de vista do bebê.”... “A mãe tem que continuar a proporcionar ao filho este tipo de experiência. O processo fica imensamente simplificado, se apenas uma pessoa cuida do bebê, utilizando uma só técnica. É como se o bebê fosse realmente planejado para que a própria mãe cuidasse dele desde o nascimento ou, se isto não é possível, uma mãe adotiva e não várias babás. (WINNICOTT, 1978; p. 279)

Ainda sobre a mãe suficientemente boa:

“Inicialmente, [ela] deixa que o bebê domine, desejando (na medida em que a criança é quase uma parte dela mesma) estar pronta para responder. Gradualmente introduz o mundo externo compartilhado, ajustando cuidadosamente esta introdução, de acordo com as necessidades do bebê, que variam de dia para dia e de hora para hora.” (OP. CIT.; p.292).

Nessa fase da vida também se inicia o processo de formação do self, e no começo da vida o self verdadeiro não é muito mais que o somatório da vida sensório-motora. A evolução psíquica do bebê está então estreitamente ligada à presença de uma mãe suficientemente boa, aquela que possui uma sensibilidade peculiar que a leva a poder sentir como se estivesse no lugar do bebê; é por esta via que ela responde às suas necessidades que são inicialmente corporais e posteriormente, necessidades do ego. Nesta ocasião, passa a existir uma relação de ego entre a mãe e o bebê; quando esta relação ocorre de forma sólida, confiável, os impulsos do id concorrem para a maturidade do ego.

“Do meu ponto de vista, a saúde mental do individuo está sendo construída desde o inicio pela mãe, que oferece o que chamei de ambiente facilitador, isto é, um ambiente em que os processos evolutivos e as interações naturais do beb com o meio podem desenvolver-se de acordo com o padrão hereditário do individuo. A mãe está assentando, sem que saiba, as bases da saúde mental do individuo. (WINNICOTT, 2002; p.20).

A mãe tem um ego integrado de forma tal a fazê-la permanecer idêntica a si mesma nas mais diversas circunstâncias, colocando-o a serviço do bebê. A mãe é o ego auxiliar do bebê e - falando do ponto de vista dele - é o próprio ego do bebê (mãe ambiente). Esta disponibilidade materna é que vai possibilitando o processo de "fortalecimento", de "amadurecimento" do ego do bebê.

“Dizemos que o apoio do ego materno facilita a organização do ego do bebê. Com o tempo, o bebê torna-se capaz de afirmar sua própria individualidade, e até mesmo de experimentar um sentimento de identidade pessoal. Tudo parece muito simples quando vai bem e a base de tudo isso encontra-se nos primórdios do relacionamento, quando a mãe e o bebê estão em harmonia.” (WINNICOTT, 2002; p.9)

A partir dos seis meses, até aos dois anos aproximadamente, a criança vive uma dependência relativa da mãe, quando é capaz de tolerar melhor as falhas de adaptação da mãe suficientemente boa, que são vivenciadas sem prejuízos, e a criança as utiliza para sua própria evolução. Os cuidados, assim como as posteriores falhas naturais de uma mãe devotada comum possibilitam ao bebê o desenvolvimento de uma crescente confiança em si mesmo para ingressar na “capacidade de estar só”, de produzir, de criar.
É nesta fase que a criança inicia o processo de unificação das duas mães, vivenciadas independentemente nos momentos de tranqüilidade e agressividade, e a eficiência dessa integração depende de uma mãe suficientemente boa, uma mãe que sobrevive, que nos momentos de tensão continua a tratar a criança com atenção e ternura e que não se ausenta por um tempo que ultrapasse a capacidade da criança de acreditar em sua existência.
Próprios deste período, os fenômenos transicionais sinalizam que na primeira fase de dependência da criança ela teve uma mãe suficientemente boa. Sendo uma de suas funções é apresentação do objeto, a entrega, ao bebê, do objeto desejado no momento em que ele o necessita, possibilitando-lhe a ilusão de que ele o criou. A importância dessa experiência ilusória é dupla: reforça a onipotência do bebê, ao mesmo tempo em que faz com que ele acredite que o mundo pode conter o que ele deseja e precisa. Mais que isso, a constituição e fruição dessa área de ilusão é essencial para a posterior formação do sentimento de que a vida vale a pena ser vivida.
A observação e o tratamento psicanalítico de crianças permitiu a Winnicott (1978) formular as seguintes observações dos os fenômenos transicionais e as experiências auto-eróticas. O polegar ao ser colocado na boca pode vir acompanhado de outras ações:


“1. – Com a outra mão, o bebê leva um objeto externo (uma parte do lençol ou do cobertor) à boca, juntamente com os dedos;
2. – ou de uma maneira ou outra, o pedaço de tecido é segurado e chupado, ou não concretamente chupado; os objetos naturalmente usados incluem babadores e (posteriormente) lenços, dependendo do que esteja pronta e seguramente disponível;
3. – ou o bebê, começa, desde os primeiros meses, a colher lã, a reuni-la e a usá-la para a parte acariciante da atividade; menos comumente, a lã é engolida, chegando a causar problemas;
4. – ou movimentos bucais, acompanhados por sons, ‘mm...mm’, balbucios, ruídos anais e as primeiras notas musicais, e assim por diante.” (WINNICOTT, 1978; p. 392)


Esses comportamentos teriam por função sustentar as crianças nas experiências difíceis e geradoras de angústia.

Desta perspectiva, a função do pai é permitir à mulher ser uma boa mãe, garantindo-lhe conforto e segurança física e emocional. Nessa relação “ela será muito ajudada pela experiência da potência genital de seu homem” (WINNICOTT, 1990; p. 123).
Pode-se reconhecer a grande contribuição de Winnicott à compreensão da relação mãe-bebê. Entretanto, seus comentários e recomendações de como ser uma ‘mãe suficientemente boa’ trouxeram a algumas mães grande angústia e culpa. Em verdade, são condições históricas pessoais que garantem esse desempenho, não apenas prescrições de especialistas.

Serrurier e “as mães más”

C. Serrurier (1993) como representante de um pensamento contemporâneo em Psicanálise, e com base em sua experiência clínica no atendimento de mulheres pode trazer à luz um maior entendimento da condição materna frente às exigências sociais. Sua compreensão da condição materna na atualidade inclui os conflitos daquelas mulheres que não se sentem preparadas ou não desejam ser mãe. “Ser mãe hoje não é tão simples; recusar a sê-lo menos ainda” (SERRURIER, 1993; p. 8).
Muito da dificuldade encontrada pelas mulheres tem origem numa representação consagrada de perfeição e abnegação, uma idealização que leva muitasdelas ao sofrimento e à frustração por não possuírem os requisitos esperados pela sociedade.
Serrurier (1993) busca trazer a tona esse tema e defende a necessidade de questionar estes modelos que associam diretamente feminilidade e maternidade. “E depois porque uma mãe má, ora, isso não existia! A partir do momento em que uma mulher estava grávida [...], automaticamente, ia ser uma boa mãe.” (SERRURIER, 1993; p.11).
Argumentando que embora a natureza faça das mulheres mães, o intelecto e a mente resistem, a autora questiona as razões de um tratamento diferenciado à mulher grávida, se durante toda a infância e adolescência meninos e meninas são considerados iguais e preparados para os mesmos interesses. Em realidade, acredita-se que ela descobrirá todos os mistérios da maternidade ao engravidar, consagrando-se a célebre frase: ‘Quando elas forem mães elas vão saber!’. Dessa forma se coloca a responsabilidade da maternidade para a mulher, como um fardo que deve carregar sozinhas. Porque não se ensinar às meninas a serem mães e aos meninos a serem pais?
Serrurier (1993) enfatiza o quanto é importante se falar sobre maternidade em sua complexidade, tema naturalizado já que na sociedade esse assunto não é discutido nem ensinado, cujo silêncio acerca de condições e implicações pode levar muitas mulheres a engravidarem não para ter uma criança, mas para ter atenção, satisfazer sua própria mãe ou ainda para se ligar a um homem, dirigidas por um desejo infantil de posse. São mulheres que “querem ser mães para elas mesmas, bem antes de sê-lo para os filhos. E se esse desejo totalmente egoísta é tão compreensível quanto legitimo é também perigoso, se não for logo substituído por um desejo verdadeiro de dar vida.” (SERRURIER, 1993; p.19).
Sua preocupação em descrever o que ela denomina de o mito da ‘Boa Mãe’ vem do fato de que as mães contemporâneas e a sociedade em geral encontram-se atadas a este mito, apesar de toda a evolução dos costumes.

“Aquilo que continua presente no inconsciente coletivo, é a mãe ideal: dizer que ela é devotada seria pouco: ela é toda dada, toda maternal, se esquece completamente dela mesma para só pensar nos filhos. É a abnegação, a generosidade encarnada. Está sempre presente quando preciso. Podemos dizer-lhe tudo e pedir-lhe tudo. É o consolo, a doçura, a ternura, a alegria. Ela é o todo. Esse amor filial mítico (e cego) é a sobrevivência do reconhecimento carnal, instintivo do recém nascido, é o primeiro ‘objeto de amor’. Ela fornece o alimento , a ternura e os cuidados tudo vem dela. Essa pessoa onipresente, no inicio indiferenciada para o bebê é seu todo, sua coisa, sua vida [...] desse sentimento de impotência e de dependência total da criança nasce, portanto – logicamente- uma ligação e um reconhecimento infinito para com aquela que a fez e a que faz viver sempre. ” (SERRURIER, 1993; p. 64).

A maioria das mães toma como farol e guia o mito da boa mãe devota e incondicional, e a maternidade não é ensinada nem mesmo discutida até a sua gravidez. No dia-a-dia, a mulher acaba por descobrir a idealização e a impossibilidade de se ser essa mãe ideal. Na sua experiência clinica Serrurier (1993) pôde avaliar o quanto a crença na descoberta instantânea da maternidade ideal a partir do conhecimento da gravidez pode adoecer algumas mulheres e fazê-las realmente más para seus filhos.
Sua perspectiva de maldade materna inclui uma classificação básica: as ‘mães más’ em sem consciência, aquelas com preferências restritivas ou voluntariamente sós; as conscientes, culpadas e depressivas; e as muito más, a excessiva e a sádica, sendo essa ultima tão caricatural que fica entre a ficção e a realidade.
As mães em geral têm preferência pelo sexo das crianças, mas aquelas que não aceitam sua contrariedade podem provocar trazer sérios danos ao desenvolvimento da criança: nos primeiros anos, quando a criança possui atitudes independentes dos gêneros, sua dificuldade não afetará esta relação. No entanto, na puberdade ou mesmo na infância, quando a criança apresentar fortemente as características de seu sexo, esta mãe poderá vir a ter sentimentos de repulsa e invasão nesta relação.
Há ainda as mães voluntariamente só, ou seja, aquelas que de forma inconsciente boicotam a figura paterna afastando-a do lar ou simplesmente agindo em seu lugar, privando a criança de uma relação essencial a sua construção como sujeito. Tais mulheres podem agir assim impulsionadas pelo desejo de mostrar aos homens que são capazes de fazer tudo sozinhas ou, então, ainda representando o papel de rainha-do-lar provavelmente influenciadas pelas ações de suas próprias mães com relação a maternidade.
As mães culpadas são aquelas que sentem dificuldades em aceitar as funções caracteristicamente femininas, e se culpam por não serem excelentes. Sentem-se mal por deixar os seus filhos para trabalhar. Em realidade, não desejam assumir tais funções e precisam lutar constantemente com a idéia perturbadora de que seus filhos lhes incomodam e que ela não os deseja. A culpa surge em conseqüência dessa ambigüidade, pois uma excelente mãe não pode ter tais sentimentos. Mais que a ausência destas mães, sua culpa gera nas crianças um forte sentimento de insegurança uma pressão constante para merecer a afeição da mãe.
Quanto às mães deprimidas, tratam-se de mulheres que se vitimizam e se sentem obrigadas a carregar os filhos dia após dia, que reclamam e se queixam de tudo, mudam de opinião rápida e frequentemente, não riem, submetendo as crianças a desgastes freqüentes. Em realidade são mulheres que não desejavam as conseqüências da maternidade, “simplesmente porque enganou-se sobre si mesma: não reconheceu os limites de seu desejo de ter filhos [...] sentirá rancor de ter posto filhos no mundo e não se sentir capaz de lhes dedicar sua vida, e a criança sofrerá.” (SERRURIER, 1993; p. 41)
Dentre as mães que Serrurier (1993) considera muito más, a mãe excessiva é aquela que se considera tão boa que sufoca o filho. Deseja dar-lhe tudo, mas também ter tudo em troca.

“Não pode sequer imaginar que o filho tenha critérios pessoais [...] como conseqüência a criança não existe por si mesma, não faz escolhas pessoais (profissão, casamento, etc.) sobrevive na sombra e sobre a direção da mãe, e, as vezes mesmo depois de sua morte não consegue se libertar.” (SERRURIER, 1993; p. 42)

A mãe sádica é também uma mãe muito má, pois sente prazer em submeter os filhos a vexames. “O prazer: é justamente essa palavra que as horroriza – o prazer dos filhos. Sua tarefa mais urgente e importante parece ser evitar ou interromper o prazer de uma criança.” (SERRURIER, 1993; p. 50). Tais mães refletem em seus filhos as atitudes que sofreram no passado, muitas vezes de forma inconsciente, não admitindo que os filhos tenham mais do que ela teve, ou o que ela não teve. Em conseqüência muitos desses filhos desenvolvem sintomas físicos não associados a patologias, além de sentimento de culpa e depressão permanentes.
Ao identificar essas mães más, a autora chama atenção para a necessidade de se prevenir tais casos, uma vez que tais atitudes decorrem do desconhecimento de seus próprios desejos e da influência dos inúmeros mitos acerca da maternidade. Na contemporaneidade, observam-se mães donas de casa, mães trabalhadoras e mães de dupla jornada que não chegam a ser mães más, mas também enfrentam dificuldades de lidar com esse ideal não criticado.
A mãe do lar ideal seria aquela que além de ser uma exímia dona de casa é também uma eximía mãe, esposa, amiga, companheira. Verificou-se, no entanto que mesmo se dedicando exclusivamente à casa e à família, muitas mulheres não se sentem adequadas ao modelo, desenvolvem sentimentos de culpa, buscam desesperadamente espelhar atitudes ideais, sacrificando-se na busca de uma realização humanamente impossível. Observa-se mesmo que a mulher do lar, contrariamente ao que se pensa, não possui tempo para si, nem para o descanso físico essencial.
A mãe trabalhadora seria aquela que se dedica a uma atividade de trabalho externo e não precisa responsabilizar-se diretamente pelos deveres do lar, pois possui alguém para fazê-los. No entanto, depara-se com a difícil tarefa de encontrar alguém que seja tão capaz como a mãe ideal para cuidar de seu lar e de seus filhos, e muitas vezes se martiriza por não acompanhar o crescimento e o desenvolvimento dos filhos, o que lhe provoca sofrimento e à família.
A mãe de dupla jornada é a mulher exerce as funções distintas de subsistência e cuidados com o lar. No trabalho, muitas vezes, é obrigada a desenvolver uma atitude convencionalmente masculina para garantir ser tão capaz quanto um homem, enquanto no lar cobra-se uma excelência como dona de casa, capaz de satisfazer com total perfeição os desejos de sua família deseja sem mostrar cansaço. A rotina diária dessa mulher exige um esforço extra-humano e a percepção de falhas nos papéis determina sentimentos de frustração e culpa.
O afastamento do lar e dos filhos pequenos comportamento que não condiz com o ideal é também gerador de culpa. Diante de verdadeiras súplicas dos filhos para permanecerem em casa, torna-se penoso para essas mulheres assumirem para si mesmas que sentem prazer em trabalhar. Para a autora, confidenciar este sentimento aos filhos uma atitude saudável que pode aproximá-los.

“Dizendo isso, a mãe reconhece seus limites como mãe: ela gosta muito do filho, mas também gosta muito de sua vida de mulher, da qual o trabalho faz parte. Dizendo isso, confessando-lhe sua divisão, ela vive uma verdade. E nenhuma verdade materna, dita afetuosamente, pode fazer mal à criança.” (SERRURIER, 1993; p. 124).

Pra se ser uma mãe saudável é necessário conhecer-se, aceitar desejos e avaliar deforma prospectiva as atitudes de seus pais próprios pais, reconciliando-se com eles. “E evidente que a mulher, antes mesmo desse trabalho de esclarecimento de seus sentimentos profundos em relação a seu ou seus filhos, deve tentar se conscientizar sobre a natureza de seu desejo de ter um filho.” (SERRURIER, 1993; p. 121). Mas o principal para ser uma mãe feliz e autêntica é necessário livrar-se da culpa, tornando-se uma mãe feliz, mais segura de si mesma, criando filhos menos ansiosos e angustiados por se considerarem responsáveis pela infelicidade da mãe.

“Culpada, e de mil formas, por não ser a mãe perfeita dos mitos. Por não fazer tudo pelos filhos, por não saber evitar doenças, ou as notas baixas, por resmungar quando eles acordam a noite ou por reclamar de suas roupas estragadas... Culpada também hoje porque, com toda literatura que explica e aconselha, não temos mais direito de não nos sairmos bem.
Essa culpa é a inimiga número um da maternidade feliz. Ela provoca tristeza infinita (e indefinida!) que encontramos com tanta freqüência nas mães jovens.
Trata-se, portanto, de um inimigo a abater, imperativamente! É preciso ser uma mãe feliz!” (SERRURIER, 1993; p. 129)

Conclusão

A representação do que se instituiu como papel feminino ideal leva muitas mulheres a assumirem seus filhos por pura obrigação e culpa, pautadas em um perfil materno surgido a partir do século XVIII. A imagem propagada dos sentimentos maternos inatos foi transmitida através das gerações (através de troca de experiências, histórias, contos) e mostra a dedicação que a mãe deve ter à prole, levada ao extremo de renúncia em prol da preservação e sobrevivência dos filhos, exaltando-se as qualidades de uma “boa mãe”. Esse discurso moralizador, mesmo nos dias atuais, ainda cobra das mulheres amor e cuidados incondicionais com seus filhos.
Nosso objetivo ao analisar o pensamento de E. Badinter (1985) foi ilustrar, pelo oposto, o quanto o desenvolvimento do afeto precisa de proximidade física e emocional, deve ser conquistado com e na convivência, na intimidade das relações: não é dado e não está garantido de antemão, não é fruto de geração espontânea mas, ao contrário, demanda empenho, cuidado e investimento dos que integram uma relação amorosa qualquer que seja ela. “O amor materno não é inerente às mulheres. ‘É adicional’.” (BADINTER, 1985; p. 367)
Buscou-se ainda, através de análise de impressos de grande circulação na imprensa carioca e de textos especializados, evidências da grande preocupação com a normatização das atitudes maternas, já que é grande a diversidade de atitudes e de qualidades maternas possíveis, assim como são diversas as maneiras de expressá-la. Encontra-se o interesse, a dedicação ou a ternura da mãe, mas também a indiferença, a negligência ou a crueldade da mãe.
Ao analisar os movimentos que influenciaram a construção do ideal materno procura-se auxiliar uma reflexão e uma desconstrução de um ideal utópico que, em realidade, muito dificulta às mulheres agir frente à maternidade mais livremente. Independente do fato da mulher possuir um trabalho extra-lar, a exigência de dedicação total e incondicional é cruel, impondo àquela uma anulação de sua subjetividade e de seus desejos, já que para tal ela substituiria a condição de mulher (um papel multifacetado que inclui o materno) pelo de mãe em tempo integral. A conseqüência é o adoecimento feminino, seja pela tentativa de alcançar esse ideal, deixando de lado sua subjetividade ou, então, uma opção pelos seus desejos e uma terrível culpa.
É necessário desacreditar que a maternidade é superior à paternidade, mas para tal é preciso desmistificar a amor materno inato e tomar o do pré-suposto de que o amor paterno também é semeado, alimentado e aprendido no trato diário com os filhos e que em nada difere, em possibilidade, do amor materno. Considerar ambos os “amores” conquistados, legítimos e de igual qualidade não equivale a dizer que não haja diferenças entre as funções maternas e paternas, pois elas têm suas especificidades.
Como já citado, a participação na pesquisa “Estilos parentais no Brasil: Contexto histórico e evolução” serviu de inspiração para o tema desse estudo. Nela procurava-se investigar os estilos parentais ideais em duas épocas, utilizando-se o periódico a “A mãi de família: Jornal Scientifico Litterario e Illustrado” para ilustrar o final do século XIX e a atuação do movimento higienista, assim como para o final do século XX foram utilizados os cadernos do “Jornal da Família”, do O Globo.
O contato com este último periódico proporcionou um panorama da família atual e das modernas técnicas de fertilização: recursos como a inseminação artificial e os bebês de proveta levaram muitas mulheres a discutir a real necessidade de um pai na criação dos filhos. Em contrapartida, a gravidez vem sendo considerada como um evento do ‘casal grávido’ e não um episódio puramente biológico que diz respeito somente à mulher. Com a maior participação do pai e a saída da mulher para o mercado de trabalho, muitas reportagens focalizavam a escolha da creche e suas vantagens.
Um diferencial temático nas reportagens analisadas no “Jornal da Família” focaliza o papel do pai e a importância de sua participação para uma melhor saúde da família. O pai passou a entrar nos consultórios pré-natais, nas salas de parto e a participar da vida da criança desde a concepção. Os cuidados com o bebê, tradicionalmente designados maternagem, são compartilhados: os homens trocam fraldas e preparam a alimentação do bebê. Entretanto, ao executar tais tarefas, os homens ainda são comparados com a mãe e frases ‘Os pais que são verdadeiras ‘mães’ e ‘Novos pais com dedicação de mães’ são usuais para definir os novs interesses masculinos.
Esses homens, na sua maioria, executam essas tarefas com os filhos e com a casa apenas quando a mulher trabalha fora e não pode executá-las. Nota-se que as mulheres sentem-se muito confusas frente à criação dos filhos, tendo que reaprender a dividir o espaço que lhe foi ensinado seria só dela e se despojar do ideal de que só a mãe sabe cuidar dos filhos. Os homens também apresentam ambigüidades quanto às representações de papéis: ao mesmo tempo em que desejam ter amor e reconhecimento dos filhos, conquistando isso através da maior participação na criação das crianças, também querem dormir sossegados, ter espaços só seus, evidenciando dificuldade em requerer para si parte nos ônus da criação dos filhos.
Chega-se à conclusão de que: se “a maternidade é mais difícil de viver do que em geral se crê e que a todo-poderosa natureza não dotou a mulher de armas suficientes para enfrenta-la” (BADINTER, 1985; p. 353), a paternidade também é, e embora vejamos nos pais um renovado desejo de serem ativos na criação dos filhos, dividindo com as mães os cuidados com a criança, essa é uma tarefa árdua. É necessário, então, a família readaptar-se para redistribuir os espaços na criação dos filhos.
Além dos pais introduziram-se os avós, as babás, as novas madrastas e os profissionais de creche na diversificação dos agentes promotores de cuidados na primeira infância, o que se tornara raro a partir da propaganda higienista, de modo que no contexto das transformações contemporâneas observadas nas famílias predomina uma nova idealização: quando as atividades de cuidado infantil são divididas pelos pais, existe mais tempo para ambos se dedicarem ao trabalho profissional, a atenção aos filhos e à própria relação conjugal numa busca compartilhada da felicidade pessoal.

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