WORKSHOP 05: OS DESAFIOS NA EVOLUÇÃO DO TERAPEUTA DIANTE DA RECONSTRUÇÃO DO MUNDO E DE NOVA CONSCIÊNCIA SOCIAL, ESPIRITUAL E CULTURAL NA CONTEMPORANEIDADE

 

Autora: Rosa Cristina Cavalcante Pereira


Eixo Temático: A prática da Gestalt-terapia na atualidade e os seus caminhos


OBJETIVO GERAL

Através do movimento, da dança e de práticas de observação sobre si, este workshop se propõe a despertar o participante para a necessidade da experimentação como forma de dinamizar o potencial criativo e transformador, considerando questões de intercorporeidade e salientando os cuidados e a atenção requerida num estudo sobre necessidades que, terapeutas e educadores, podem vivenciar.


OBJETIVO ESPECÍFICO

Possibilitar aos participantes, que, através do movimento corporal, conectem-se com o próprio corpo, usufruindo um tempo para lembrarem-se de si e de estarem com o outro.


DESCRIÇÃO DAS ETAPAS DE CONDUÇÃO

1) Objetivo da proposta e apresentação da facilitadora e do grupo.
2) Expectativas e Integração do grupo
3) Aquecimento em roda com música e movimento: percepção e exploração corporal experimenta-se no espaço,
4) Meditação em movimento, dialogar com a arte, dança e momentos de expressividade e de criatividade.
5) Práticas em dupla -Proporcionar a observação de si
6) Leitura e discussão de texto (slides)
7) Práticas em sub-grupos
8) Sensibilização -Fechamento do trabalho

 

MATERIAL A SER UTILIZADO

• Som e datashow

OBS: É importante que os participantes estejam com roupas confortáveis e descalços.
Consideramos que o processo de formação de um psicoterapeuta é infinito. A nosso ver, a aquisição constante de novos conhecimentos teóricos para o desenvolvimento do seu trabalho, bem como a busca do seu desenvolvimento pessoal submetendo-se a psicoterapia, devem ser objetivos sempre presentes no percurso de um terapeuta consciente de suas funções. Acreditamos que esses suportes são fundamentais para o encontro humano que existe na relação terapêutica. A importância de fazer por si o que ensina, orienta, troca, e incentiva seus clientes a fazerem por eles próprios, é ser uma pessoa terapêutica.

O comprometimento do gestalt-terapeuta para estar afinado, em sintonia, implicado com sua própria presença, é de extrema importância para os propósitos das relações, sejam elas educacionais ou terapêuticas. Acreditamos que em qualquer um desses espaços, saber mais de si, ser um instrumento dentro das várias atribuições que hoje desenvolve seja como clínico, educador, ou professor, é demonstrar estar coerente com a atitude Gestáltica.

Além dessas trajetórias o terapeuta ao ter uma vida criativa, plantar sementes na reconstrução do mundo em crise, que pede urgentemente ação, evolução, novos estilos, tornar-se um ser social, cultural, participante deste momento transformador.

É preciso se ter tempo para lembrar de si, do outro, dos nóis e nós, investir e priorizar, não esquecer, estar envolvido com a evolução da consciência ambiental, da responsabilidade social, na reconstrução de um mundo verdadeiramente humano. Estes focos em uma visão de mundo, em um trabalho de desenvolvimento pode trazer possibilidades de resgatar confiança, valores, ética, que estão tão distantes do homem atual. Considerando ainda que as mudanças na comunicação trazendo-nos rapidez e praticidade, por um lado, nos levam a um distanciamento da experiência por outro. A velocidade das informações nos conduzem, muitas vezes, ao movimento automático, a um esquecimento de nós mesmos e, sem nos darmos conta seguimos em frente, nos distanciando cada vez mais do ser humano que se relaciona através do seu corpo inteiro .Tudo ficou ao alcance dos dedos, diz Baumann (2009).

Baumann (2009), nos incita a refletir sobre a conexão que se estabelece com o corpo diante da realidade que hoje vivemos.
É fato que somos um corpo, mas um corpo que hoje está em voga, idolatrado, destituído de sentido próprio, que revela em si o paradoxo da liberdade e da fixação em modelos pré-determinados.
Dentro dessa visão nos transformamos em imitadores neuróticos, onde a energia sensória adormece e o senso de identidade, de diferenciação, se perde. Vive-se o que está instituído pelo hábito, pelas regras sociais ou qualquer outra forma de fixação neurótica.
Enquanto processo terapêutico que busca a reflexão sobre si mesmo, a Gestalt-terapia, considera o experimento como uma possibilidade de se perceber com segurança, estas repetições automáticas e promover mudanças criativas. Desta forma, acorda-se o corpo dando vida ao fundo e ao fluxo de “awareness” a partir dele.
Pensamos que, neste sentido, existe em algum nível uma reconfiguração, um sentido do eu diante das repetições, e que desse fato surgem possibilidades de se fazer ajustamentos criativos.

Gabriel Tarde no seu livro Leis da Imitação (1976), nos diz que “o ser social na medida em que é social, é imitador por essência” (p.31) e que os homens estariam todos numa espécie de “sonambulismo” (p. 113)

Surge aqui a questão da mecanicidade na qual estamos todos inseridos. No Sistema Rio Aberto em que a via é o corpo mais desperto para a conexão e a partir do movimento corporal o instrutor, guia, move, dança, para outras vias que não as habituais, o instrutor chega, busca seu suporte, sua respiração, faz contato e com sua própia presença convida o outro para começar a compor a roda de mãos dadas. O indivíduo olha e é visto, sente e é sentido, deixa-se afetar e é afetado pelos corpos ali presentes e pela música que toca.

O instituto Rio Abierto considera que a prática da observação sobre si é o inicio para o estudo de si mesmo, que por sua vez possibilita um descobrimento sobre os mecanismos utilizados por nós na vida cotidiana em diferentes situações, porque o homem tende, naturalmente, a se identificar com tais mecanismos. Não deve, entretanto, ter como objetivo mudanças, estado, gesto ou hábito e sim, o conhecer-se.

Segundo Laura Pozzana de Barros (2006):
Todos devem repetir os movimentos da maneira mais fiel possível. Esta repetição a principio, busca basicamente convocar a presença de cada um, trabalha a atenção. Assim, cada um do seu jeito vai imitando, participando do coletivo ao mesmo tempo em que vai sendo dissolvido e impregnado por este mesmo movimento habitado por múltiplas maneiras de ser, desprendendo de formas conhecidas. (Barros, 2006, p.57)

É exatamente desse copiar que surge o criar.
Sem dúvida nós somos levados a copiar do outro o que se nos oferece como um meio novo próprio para atingir os nossos antigos fins, para satisfazer as nossas antigas necessidades, ou como uma expressão nova das nossas antigas idéias; e entramos nesse caminho ao mesmo tempo em que começamos a acolher inovações que despertam em nós idéias novas, fins novos. (Tarde, 1976, p.239)

O Rio Abierto é uma escola para o desenvolvimento integral do ser. Vê o homem em sua totalidade, num eterno vir-a –ser, em constante transformação e o quanto cronifica sua forma de estar no mundo em uma única forma de ser, em um corpo. Entende como fronteiras que protegem e impedem o seu desenvolvimento integral assim como na Gestalt-Terapia.
Um dos caminhos no trabalho do Rio Aberto é colocar na roda personagens, com múltiplas posturas e formas, vozes e corpos, para que o indivíduo possa experimentá-las, abrindo espaços para o seu oposto, para o trânsito entre elas, considerando que ficar também com a passagem, o nada, o vazio é de extrema importância.

Passamos geralmente de uma postura para outra tão rapidamente que não notamos as atitudes que tomamos durante a passagem. O exercício do ”STOP” nos proporciona a possibilidade O exercício do ”STOP” nos proporciona a possibilidade de ver e sentir nosso própio corpo em posições e atitudes que lhe são inteiramente inabituais e não são naturais dele. (Gurdjieff, 1973, p.158)

Acreditamos que os psicoterapeutas, educadores, formadores de um aprendiz de psicoterapia na difícil arte de exercer esta profissão, devem estar ancorados na psicoterapia pessoal, para serem capazes de abandonar papéis, lamentar perdas, dar sentido a necessidade de ser a pessoa que cuida, reconhecer impotência e medos e estarem equipados para ajudar seu cliente a vivenciar este mesmo processo na relação terapêutica.

Segundo Merleau Ponty (1945):
Ë por meu corpo que compreendo o outro, assim como é por meu corpo que percebo ”coisas”. Assim compreendido, o sentido do gesto não está atrás dele, ele se confunde com a estrutura do mundo que o gesto desenha e que por minha conta eu retomo, ele se expõe no próprio gesto. Nesse sentido o corpo é engajado no mundo, sujeito do movimento, o lugar do surgimento do sentido e da percepção. (Merleau-Ponty, 1945, p.253)

O propósito de Merleau Ponty a partir da fenomenologia de Husserl é desenvolver um novo paradigma através do conceito do corpo que o conduzirá da idéia de intersubjetividade a intercorporeidade. Este autor coloca a presença em nosso corpo de duas camadas distintas: o corpo habitual e o corpo atual.

O corpo habitual formula um conhecimento a partir de sua motricidade. É adquirido, mas não é apenas motor, ele é também perceptivo, se constituem mutuamente. Os gestos que resultam de histórias anteriores e coexistem com o registro do atual.
O corpo atual é aquele que vislumbra um alcance para seu gesto a partir dessa tarefa que se coloca diante dele. Gestos possíveis a serem realizados por um determinado corpo. (Merleau-Ponty, 1945, p.122)

O movimento corporal do sistema Rio Aberto é um grande facilitador da conexão entre os corpos habitual e o atual. O habitual é convidado para estar desperto, acordado, e atualizando-se na vida.
Perls, Hefferline e Goodman (1951) afirmam que a “excitação que permanece como situação inacabada não pode ser esquecida, mas o controle deliberado pode ser esquecido e permanecer inconsciente. Isto ocorre simplesmente porque sendo um padrão motor, depois de algum tempo a situação é aprendida (como hábito)”. (p.234)

Acreditamos que essas formas cristalizadas comprometem a percepção e a motricidade, cronificando no corpo tensão, bloqueio, impedindo o livre fluxo de awareness. É preciso despertar o homem, por que ele dorme, no sentido de estado de consciência. E esse despertar se dará através do seu corpo ao experimentar através de uma das técnicas do Rio aberto que é a imitação, no sentido de retirar-se da própia mecanicidade e viver o novo, o diferente do si mesmo repetido, ampliando repertório de movimentos.

Ser uma consciência, ou, antes, ser uma experiência é comunicar interiormente com o mundo, com o corpo e com os outros, ser com eles em lugar de estar ao lado deles. (Merleau-Ponty, 1999, p.142).

Convidamos a todos para comporem esta roda como participantes e testemunhos da existência mútua de ser-com o outro que, neste contexto, podem ser clientes, alunos, aprendizes de psicoterapia, que nos instigam a reflexão e com quem aprendemos na estrada profissional e pessoal.

A humanidade não é uma soma de indivíduos, uma comunidade de pensadores em cada um, em sua solidão, obtém antecipadamente a certeza de se entender com os outros, porque eles participariam todos da mesma essência pensante.Não há vida em grupo que nos livre do peso de nós mesmos, de que nos dispense de ter uma opinião; e não existe vida “interior” que não seja como uma primeira experiência de nossas relações com o outro.Nesta situação ambígua da qual somos lançados porque temos um corpo e uma historia pessoal e coletiva, não conseguimos encontrar repouso absoluto, precisamos lutar o tempo todo para reduzir nossas divergências, para explicar nossas palavras mal compreendidas, para manifestar nossos aspectos ocultos, para perceber outro. (Merleau-Ponty, 1948, p. 49)

E por fim, fechamos essa roda, certos de que muitas vezes ela tornará a se abrir para a entrada de outros, sejam curiosos, instrutores, simpatizantes, adeptos, terapeutas, gestalt-terapeutas e que eles possam chegar com seus corpos para descansar, respirar, brincar, dançar e estudar sobre-si, tornando-se a cada dia e, mais e mais, pessoas terapêuticas e grávidas de um novo mundo que busca clareza e confiança nas relações sejam terapêuticas ou educacionais.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROS, P. Laura.(2006-57) O corpo em conexão. Sistema Rio Aberto.

GURDJIEFF, I.George. –(1973-158) Gurdjieff fala a seus alunos.

MERLEAU,P, Maurice-(1945-253, 122) Fenomenologia da percepção.

-------------------------------(1948-49) Conversas

PERLS, F. Hefferline, R. & Goodman, P .(1951-234) Gestalt-Terapia .Ed. Summus

TARDE Gabriel -As leis da imitação (1976-31, 113 e 239).Tradução de Carlos Fernandes maia Ed. Rés.

BAUMAN, Zygmunt – (2009 –36)-Revista O Globo ano 5 n 24

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CONSULTAS

Bauman, Zygmunt -Modernidade liquida ed. Jorge Zahar

Campos, G. W. de Souza -Um Método para análise e Co-gestão de coletivos Ed. Hucitec.S. Paulo

FILHO, L. P.Alberto – Gestalt e sonhos-Ed. Summus.

HILTON, Robert-Terapeutas em Risco -Cap 7-Ed. Summus.

ROBIN, Michel. Tornando-se dançarino. Rio de Janeiro: Ed. Mauad, 2009.

YONTEF, Gary -processo, diálogo e awarenes-Ed. Summus.

ALVIM B, M-Tese de Doutorado, 2007-Ato artístico e ato psicoterápico como experiment-ação: diálogo entre a fenomenologia, a arte de Lygia Clark e a Gestalt-Terapia.