MESA REDONDA 06 – PARTE I: GESTALT-TERAPIA: APONTAMENTOS PARA A PRÁTICA NO CONTEXTO HOSPITALAR
Autores: Maria do Rosário Camacho e Marcela Arrivabeni
INTRODUÇÃO
Este artigo tem por objetivo apontar fundamentos conceituais da Gestalt-terapia que tem sustentado a prática psicológica no espaço do hospital. Relata experiências das autoras no âmbito do estágio supervisionado em psicologia da Faesa/ES. O campo de estágio é o Hospital Infantil de Vila Velha/ES. A metodologia segue uma organização dos estagiários nos setores do hospital – UTI Neonatal; Enfermarias da Maternidade; pré-parto; pré-cirurgico e grupo com profissionais e com mães. A postura fenomenológica permeia a atuação nesses espaços sendo disponibilizada à população hospitalar. Apontamos a importância da prática para a formação do psicólogo e a pertinência do plantão psicológico como lócus da escuta psicoterápica.
Palavras-chaves: gestalt-terapia, plantão psicológico, hospital,
formação do psicólogo.
UMA PROPOSTA DE ESTAGIO CURRICULAR
É no contexto do curso de formação do psicólogo oferecido pela Faesa/ES que se insere a oferta de estágio com fundamento fenomenológico-existencial. Incluímos aqui as Abordagens da Gestalt-Terapia e Centrada na Pessoa as quais tem as autoras desse artigo como docentes responsáveis. É nessa interface que emerge o projeto de estágio para o Hospital Infantil de Vila Velha/ES, ou seja, um projeto31 que se encontra na matriz fenomenológica apresentando-se como nova forma de prática para alunos interessados na realização do estágio em psicoterapia num contexto fora da Clinica-Escola.
31 O projeto se refere ao ORELHINHA: escutando a criança no HIMABA (Hospital Infantil de Vila Velha) elaborado em 2006 como espaço de realização de estágio supervisionado em psicoterapia oferecido pela Gestal-terapia e Abordagem Centrada na Pessoa e, desde então, em atividade.
O desafio de levar o estágio em psicoterapia para o hospital demanda
novos enquadramentos teóricos e metodológicos. Optamos por trabalhar
no solo do plantão psicológico. A escolha justificou-se pelo trabalho32
de uma das autoras no contexto citado e por contato com profissionais33
que tem trilhado esse caminho.
32 O trabalho
a que se remete a autora foi realizado junto a comunidade de Linhares/ES e pode
ser encontrado como artigo na revista “Luminis”: Faculdade de Ciências
Aplicadas Sagrado Coração – UNILINHARES – v 1, nº
1 – jul/dez 2006. Trata-se de projeto de Extensão e Pesquisa desenvolvido
entre 2004-2006 nos hospitais Rio Doce e HGL (Linhares/ES), sob o titulo “Plantão
psicológico: espaço de escuta das emergências emocionais”.
33 Referimos-nos às trocas informais em congressos (ULAPSI/JORNADA FAESA) em especial com Henriette T. P. Morato.
O foco na postura fenomenológica aponta para alguns cuidados na realização do plantão psicológico. Entendemos o fazer do plantão alicerçado numa disponibilidade que lança os envolvidos – cliente/psicoterapeuta – no solo do humano. No cotidiano significa abrir-se à relação, envolver-se emocionalmente, distanciar-se e, sem perder tal movimento, intervir no que se faz emergente. Ainda, abrir-se ao contato com a dor da condição humana no encontro com a finitude.
Temos observado
diferentes práticas sob a denominação “plantão
psicológico”. De forma geral, o plantão psicológico
tem sido concebido como um espaço no qual “qualquer pessoa que
procure ajuda será atendida” pelo profissional plantonista do momento.
A idéia central desta modalidade de atendimento é o acolhimento
às demandas emergentes da pessoa que “procura ajuda”, sejam
elas quais forem. O plantão psicológico tem sido realizado em
instituições gerais, como hospital, escolas, unidades de saúde,
empresas, centros universitários, clínicas. Neste espaços
o plantão é destinado a pessoas que buscam um atendimento emergencial,
em situações de crise, caracterizada pelo sofrimento, angústia,
dúvidas, desespero, perdas, desabafo ou qualquer contexto que retire
da pessoa sua capacidade de “tomar atitudes” que sejam promotoras
de seu equilíbrio momentâneo.
Caracterizamos nossa ação como plantão psicológico nos referindo à criação de um lugar de acolhimento do emergencial, lugar que perpassa o ambiente e repousa na pessoa do plantonista. Entendemos que o plantão funda-se na relação cujo norte é a postura fenomenológica.
A fenomenologia contribui com uma visão holística de homem e mundo. Tal visão se expressa no paradigma existencial-humanista que representa um corpo teórico-metodológico importante na fundamentação de práticas que enfatizam uma visão de homem como totalidade. As Abordagens psicoterápicas como a Centrada na Pessoa (Rogers, 1961), a Gestalt-terapia (Perls, 1970) aglutinam propostas nesse caminho. Ainda, pesquisas qualitativas fenomenológicas emergem no campo da saúde, bem como, ações de práticas meditativas e relaxamentos. Justifica-se aqui o plantão no olhar fenomenológico-existencial-humanista.
UM CLIENTE HOSPITALIZADO
Nosso dia inicia-se com a chegada ao hospital. Aqui nos concentramos em grupo; trocamos brevemente algumas recomendações e nos dirigimos aos diferentes espaços para a realização do plantão. Estar como supervisora nesse campo é colocar-se como facilitadora de processos relacionais. Uma vez que o estagiário segue com a “ronda”, o supervisor caminha pelos corredores. É esta presença que sustenta tal fazer ao atuar como ponto de encontro e expressão de angústias vividas pelo estagiário, como bem o expressa Martin Buber (1958) “todo viver verdadeiro é encontro”. Terminada a jornada do dia nos encontramos novamente no grupo para aprofundamentos teóricos, reflexões e troca de experiências vividas.
Chegando – ir a um lugar chamado hospital não é tarefa das mais simples. O estigma34 de se tratar de “lugar para morrer” permeia o imaginário social. Ir a um
34 Para aprofundamentos desse olhar sobre a instituição
hospital, remetemos o leitor à leitura da obra de FOUCAULT. M. Microfísica
do Poder. 22ª ed. Rio de janeiro: Graal, 1979.
hospital, para a população, significa ultrapassar medos na realização de um ato que se coloca fora do cotidiano. Vamos ao hospital, geralmente, para uma visita a alguém adoecido; outras, para celebrar um nascimento, mas como hospitalizado ou como alguém que oferece um serviço de psicologia, é uma “outra” experiência. Observamos, junto aos estagiários, a mobilização de uma energia afetiva para ir. Aqui ocorrem atrasos, esquecimentos do horário combinado, perda do crachá de identificação e, tantas vezes, “crises de pressão baixa”. Assim, a chegada se configura num acontecimento em que o grupo oferece suporte e se suporta; onde o supervisor é convocado à escuta desse fenômeno. O acontecimento “chegada” demarca o inicio do plantão, no entanto, muito antes, o campo vivencial desse plantonista já se encontra mobilizado. O supervisor é o lugar da realização desse plantão e se oferece como tal.
A “ronda” – organizados por setores, os quais foram escolhidos pelo estagiário, tem inicio a ronda. Trata-se de uma caminhada pelos corredores do hospital; da entrada em enfermarias; Utin; sala de parto. O fenômeno se apresenta à escuta: o entrelaçamento plantonista e espaço hospitalar torna-se mundo vivido.
O “cliente hospitalizado” é convidado ao encontro humano. A postura do estagiário é de uma ética “sem precedentes” – como testemunhará o próprio grupo de supervisão. A escuta, ou o plantão, não pode ser imposto. A presença do plantonista visa à relação Eu-Tu, porém, nas palavras de Richard Hycner (1995) “podemos apenas nos preparar para a possibilidade do encontro EU-TU. Não podemos ‘forçar’ sua ocorrência”.
A formação do psicólogo o preparou para um cliente “que vem até determinado espaço e se coloca para o processo psicoterápico”. Para um processo situado num tempo que permite retornos e feedback. O “cliente hospitalizado” não solicitou a psicologia, sequer pensa em psicoterapia ou “tem tempo para a mesma”. Configura-se como essencial para prática do plantão no hospital o entendimento dessa relação que se propõe.
A postura fenomenológica será o instrumento de abordagem a ser entendido, refletido e exercitado pelo aluno em formação. O que é um “atendimento” nesse contexto será a questão “arduamente” discutida e desconstruída na pratica denominada plantão psicológico.
A abordagem – a caminhada pelos corredores convoca o plantonista ao aqui-agora. Apontando para um conceito vivencial estamos atentos à caminhada. Assim testemunha o plantonista:
Faz algum tempo que chegamos ao Hospital. Será que estou pronta? Que surpresa me aguarda hoje. Já andei por “todos” os corredores e não consegui fazer atendimento. Lá está minha supervisora. Sentamos juntas. Falo dessa angústia. Que bom não ter pressa pra atender. Levanto. Caminho novamente, agora, pela Maternidade. Sinto meus passos; minha respiração; a mão fria. Meus olhos se encontram com os olhos daquela mulher ... (sic) (relato em diário de campo do estagiário).
Aqui-agora é processo vivido entrelaçado ao campo.Torna-se limitado localizar partes desse campo vivido; dizer, quem sabe, que a estrutura física, com seus desdobramentos, bem como a estrutura dinâmica do hospital, representada nas relações ali travadas, são as partes determinantes desse campo. O campo se concretiza no aqui-agora, constrói-se das infinitas possibilidades que se apresentam na relação. Acreditamos que campo, no contexto hospitalar, se define como possibilidades – o que é possível no aqui-agora vivido.Tal configuração emerge no relato abaixo:
Entro na sala de parto. Meus olhos se encontram com os de Teresa. Respondo a este convite: Teresa é uma menina de 17 anos, está em trabalho de parto. Percebo-a calma e, bem “baixinho”, ouço seus gemidos. Penso: quais serão seus anseios para aquele momento tão especial na vida de uma mulher? Teresa me conta que é o seu primeiro filho e que está curiosa para ver seu rostinho. Entre gemidos a dilatação aumenta. Sinto-me presente para o momento do parto. Minha presença busca potencializar calma, conforto e segurança de que tudo sairá como esperado. Estou próxima, bem junto a esta jovem mãe. O bebê nasce. Vejo as feições de Teresa transformar: a alegria toma conta; seus olhos estão marejados e emerge um “chorar de emoção”. Eu respiro. Sinto-me grata!!(relato em diário de campo do estagiário).
A abordagem a este “cliente hospitalizado” é a abertura ao encontro genuíno. Novamente as palavras de Richard Hycner (1995) nos parecem pertinentes:
Essa abertura para encontros genuínos significa sempre uma disponibilidade de encontrar o inesperado, o mistério existencial entre pessoas, deixando de lado a segurança dos próprios métodos e da teoria (p. 40).
O assim colocado, “atendimento” acontece nesse lócus denominado campo. O fazer do plantonista sugere um movimento – chegar; perceber-se; abrir-se à caminhada; encontrar-se com o outro; abordar; oferecer-se como lugar de plantão; permitir-se ficar junto ao outro como pessoa; cuidar de si e do outro no fechamento desse encontro – estar como uma “árvore frondosa a oferecer sua sombra”, concluirá Henriete Moratto.Temos aqui caracterizado “o atendimento” na situação que ora refletimos.
No início, ainda tímida com relação à abordagem às pessoas, me senti um tanto incapaz, porém enquanto conversava com aquela menina, dentro da Utin, me senti tranqüilizada, pois percebi que somos sim capazes de trazer um acalento para as pessoas que estão ali naquele ambiente triste do hospital (relato de diário de campo do estagiário).
Partindo
– o que demarca a finalização do plantão é
a hora acordada entre plantonistas e supervisor; assim, vindo dos vários
setores do Hospital, reúnem-se os integrantes do grupo. Grupo reunido
iniciamos a troca de experiências. Contamos como foi o dia; relatamos
as abordagens realizadas; falamos das dúvidas “vistas” na
hora da prática; trocamos nossa experiência e a articulamos teoricamente.
A formação do psicólogo encontra nessa experiência
de plantão o exercício das habilidades desse fazer. A supervisão
acolhe o vivido; oferece marcos conceituais como recurso para a caminhada desse
profissional em construção. Juntos, em grupo, cuidamos de dores
e limites para a partida. Haverá uma chegada, pois há outro lugar
a nos esperar.
APONTAMENTOS E REFLEXÕES QUE EMERGEM DESSA PRÁTICA
O profissional plantonista, neste caso, o estagiário de psicologia, precisa desenvolver uma disponibilidade para se deparar com o inesperado, com o não planejado, com a possibilidade do encontro com a pessoa. Como também precisa acolher a pessoa no momento da sua necessidade e, assim, se desvencilhar da tendência de dar continuidade ao processo.
O plantão é uma oportunidade para o plantonista se colocar disponível à escuta e acolher a experiência da pessoa em vez de enfocar o problema, até porque, este não é o objetivo. É um exercício de desenvolvimento no plantonista /aluno de uma maior autonomia e consciência crítica de seu fazer psicológico, já que está desprovido de ferramentas, instrumentos técnicos que possam funcionar como amparo no encontro com o outro. No serviço de plantão psicológico, o plantão está no próprio plantonista.
A situação de hospitalização é geradora de uma vivência angustiante e desagregadora de uma crise cujos aspectos são uma interface entre fatores econômicos, sociais, espirituais, orgânicos, psicológicos, culturais e políticos, dentre outros. Neste sentido, a doença tal como é vivida pela pessoa engloba dois aspectos que devem ser considerados: o primeiro é o fato de que a doença, em qualquer lugar, será sempre entendida da mesma forma, ou seja, é estrutural, o segundo expressa a condição existencial concreta da pessoa doente, que se apresenta com suas emoções, pensamentos, cultura, corporeidade, linguagem, enfim, com sua singularidade.
O binômio saúde-doença não pode ser mais analisado separado da pessoa que vivencia tal fenômeno. É preciso uma abordagem que acolha a pessoa na sua existência total. A perspectiva existencial-humanista-fenomenológica, ao compreender a pessoa na sua totalidade, se caracteriza como um modo de estar-no-mundo com o outro se aproximando do fazer psicológico na modalidade de plantão com todas as peculiaridades já refletidas.
O ser plantonista se des-vela nas vivências do cuidar, que acreditamos se expressar no cuidar-de e cuidar-com cuidando, que implica em proporcionar a pessoa a oportunidade de se cuidar minimamente que seja em qualquer sentido.
Contato é uma palavra mágica, é sinônimo de encontro pleno, de mudança,de vida. É convite ao encontro, ao entregar-se. É um processo, cujo sinônimo é cuidado, a alma do contato (RIBEIRO, 1997, p.13).
O profissional
do plantão psicológico tem uma oportunidade única de preencher
este “papel de cuidador”. Entretanto, não é fácil
estar neste lugar. Mas, quando se está aberto para tal experiência,
para este encontro sem garantias e formas, muito se aprende sobre a arte de
cuidar cuidando-se, já que acreditamos na resultante de um cuidado mútuo,
profissional e doente se cuidam e se oportunizam um aprimoramento das dimensões
do existir de uma forma mais plena.
Analisando nossa experiência no Hospital Infantil e Maternidade de Vila
Velha/ES nestes anos (2006-2009) de oferta de estágio na modalidade de
plantão, descobrimos o quanto tal vivência contribuiu para a formação
profissional e pessoal dos alunos que verdadeiramente estiveram abertos para
tais encontros, pois sabemos que o fato do estagiário estar em determinado
campo de estágio não significa o estabelecimento de uma aprendizagem
significativa. Muitas vezes, este aluno simplesmente ocupa um lugar por obrigação,
por cumprimento dos créditos necessários para sua formatura. O
que não aconteceu, felizmente, com muitos de nossos alunos que lá
estiveram por períodos de um ano letivo.
Cada uma de nós, supervisoras de estágio curricular, esteve responsável pelo acompanhamento, orientação e supervisão em dias diferentes por duas turmas, que eventualmente trocavam suas experiências nos espaços de consolidação de trocas, como jornadas científicas, seminários integrados, e outros eventos que fomentavam este objetivo.
A Gestalt-terapia apresenta fundamentos conceituais, filosóficos e metodológicos pertinentes à prática do psicólogo no contexto hospitalar. Apontamos o conceito de campo como contribuição central do entendimento da temática apresentada por esta população. O conceito se refere ao processo de organização como relações e forma, portanto, engloba sistema e estrutura.
O processo de organização é único, embora exista mais de uma área organizada dentro de um mesmo campo. Isto nos conduz aos conceitos de sistema e estrutura (RIBEIRO, 1985, p. 74).
O campo é lócus de processos psicológicos em desdobramentos na situação da hospitalização. As possibilidades de configuração do campo são mutáveis a cada abordagem ao “cliente hospitalizado”. A riqueza desse campo está nas nuances do vivido – a forma particular de colocar-se nesse espaço-tempo.
O plantonista move-se no campo vivencial e, a abordagem, acontece no campo. Torna-se difícil separar ou demarcar etapas desse vivido. Assim é; a existência se apresenta com tudo o que nela há, como reflete forghieri (1993). O vivido é a nossa percepção imediata, pré-reflexiva, do movimento existencial.
[...] nossa reação interior imediata àquilo que nos acontece, antes mesmo que tenhamos refletido ou elaborado conceitos. [...] está num plano da consciência onde o sentir e o pensar não se distinguiram ainda. [...] o vivido “se diz” dentro de nós, ele se expressa, e assim assume um significado. (AMATUZZI, 2001, pp. 53-55).
O plantonista caminha pelos corredores e, ao caminhar, vive o percurso. O viver ocorre no presente, no aqui-agora. Compreender o sentido vivencial do conceito aqui-agora é fundamento para este fazer. O campo se auto-constrói no aqui-agora, no movimento da vida. Soltar-se, confiar na sabedoria do campo, arriscar-se, enfim, abrir-se ao mistério são requisitos para o estar no tempo-espaço do hospital.
Outro conceito debatido em nossas supervisões é awareness. Campo, aqui-agora e awareness são processos; ou seja, estamos falando de elementos vivos. Como pensar gestalt-terapia sem remeter-se à vida? O solo filosófico sustenta tal vôo. Cremos que a criação da gestalt para o hospital aqui se diferencia. Estamos falando de uma teoria viva, aplicando-a num espaço que remete à morte. Awareness é deixar-se estar; é fluir perceptual; é continuum de consciência. Lembramos Stevens (1988) awareness é “tornar-se presente”.
O plantonista estará “de fronte” à própria finitude ao permitir o contato. A experiência da fronteira vida-morte é o que aguarda nos encontros do dia. Estar awareness é incluir o fluir existencial no tempo-espaço; isto é, auto-compreender-se como ser finito, ser de projetos.
Campo, aqui-agora, awareness, fronteira de contato, são conceitos vivos que vão dando forma à prática do plantão psicológico no olhar fenomenológico-existencial-humanista. O percurso anuncia o experimento – metodologia tão cara à Gestalt¬teapia. Pensamos que o experimento tem suas raízes na proposta fenomenológica de “ir às coisas mesmas”. Nesse sentido o experimento é a escuta fenomenológica que se concretiza no campo vivencial que se apresenta. Dentro desse campo a criatividade do plantonista é seu guia. Experienciar compreensão ao, por escolha, olhar a narrativa do outro como se fosse sua. Tomar propriedade desse lugar e intervir como se fosse sua voz. Experienciar compreensão quando, para além da escolha, ser lançado no drama do outro e ver-se dolorido na situação. Estar awareness desse movimento e assim intervir comunicando que compartilha a condição humana desse outro.
O experimento que funciona como uma concretização, no aqui-agora, das forças atuantes no campo vivencial da pessoa, vista sob uma ótica holística, considera que é necessário começarmos qualquer caminhada exatamente de onde estamos. Partir de onde estamos, além de permitir a escolha até “para onde se vai”, permite também a escolha sobre “se quer ir ou ficar” (RODRIGUES, 2002, p. 86).
O experimento é um convite ao contato que se realiza em ambos, quem convida e quem aceita o convite. Estar como plantonista é responder sim ao convite e desdobrar-se em polaridades sequer imaginadas.
Finalizamos
aqui nossas reflexões vividas no espaço tempo de estar junto a
formandos de psicologia no contexto hospitalar tendo, por instrumento, a Gestalt-terapia
e a ACP. O olhar compreensivo – aquele que se solta dos pré-conceitos,
que sabe que sujeito e objeto não são separados, que fenômeno
é ato de criação – é a “menina dos olhos”
que reflete este fazer-saber.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BUBER, M. Eu e tu. São Paulo: Cortez e Moraes, 1979.
FORGHIERI, Y. C. Psicologia fenomenológica: fundamentos, métodos e pesquisa. São Paulo: Pioneira, 1993.
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MORATO, H. T. Aconselhamento Psicológico Centrado na Pessoa: novos desafios. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999.
PERLS, J. S.; HEFFERLINE, R. F.; GOODMAN, P. Gestalt-terapia. . São Paulo: Summus, 1977.
RIBEIRO, J. P. Gestalt-terapia: refazendo um caminho. São Paulo: Summus, 1985.
______. O ciclo do Contato. Temas básicos na Abordagem gestaltica. São Paulo: Summus,1997.
RODRIGUES, H. E. Introdução à Gestalt-terapia: conversando sobre os fundamentos da abordagem gestáltica. Petrópolis: Vozes, 2002.
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STEVENS, J. O. (ORG). Tornar-se presente. São Paulo: Summus, 1988.