WORKSHOP 02: E AI, BELEZA? EXPERIMENTANDO SUA FORMA DE ESTAR NO MUNDO ATRAVÉS DA CONSCIÊNCIA ALIMENTAR

 

Autoras: Claudia Puntel Pereira dos Santos e Carolina Duarte

 

RESUMO

A vivência aqui apresentada tem como principal objetivo fazer com que os participantes relacionem a maneira como hoje escolhem se alimentar com sua história de vida, para que tornem conscientes padrões repetitivos que cristalizam a maneira como se relacionam com sua imagem corporal, com relações afetivas, com escolhas profissionais e nas demais áreas da vida.
Palavras-chave: padrões estéticos, alimentação, consumo, contemporaneidade e transtorno alimentar.
A forma como nos alimentamos, como, e o quê, escolhemos comer, representa muito da forma como nos relacionamos em outros âmbitos da vida.
Alimentar-se é um ato social desde que nascemos. Alimentar-se é fundamentalmente trocar com o ambiente. É receber algo que vem de fora, deixar que este algo penetre em nossa intimidade, nosso mundo; é nos misturar com ele, até que não se saiba mais o que sou eu e o que é ele; para que depois uma separação seja possível e eu possa assimilar o que me nutre e eliminar o que não me serve.
Ao mesmo tempo, alimentar-se é pegar no seio da mãe e olhar em seus olhos; é primeiramente receber o alimento pronto, oferecido por alguém na hora marcada; é experimentar diferentes sabores e a partir deste ensaio da infância, aos poucos, escolher.
No ambiente familiar, vamos criando padrões de relacionamento com o não eu, algo que vem de fora da fronteira, que me alimenta.
Através de um processo de aprendizagem construímos nosso auto-suporte, pois aprendemos constantemente com a nossa relação com o mundo, com nosso corpo e com nós mesmos.

Primordialmente buscamos a satisfação de nossas necessidades, mas somos desafiados pela contemporaneidade, através de uma sociedade cujos padrões de beleza rígidos e inatingíveis são exteriormente estabelecidos e absorvidos sem questionamento.
Segundo Frei Beto (2001):
“O culto ao corpo perfeito dá lugar a uma supervalorização da aparência, da estética “epidérmica”, em detrimento da essência e das potencialidades humanas. E, é importante lembrar que os padrões estabelecidos, como os da beleza, de corpo e mesmo hábitos alimentares, são propagados e incentivados com muito afinco pela própria mídia. E a “americanização” dos hábitos alimentares tem alcançado índices alarmantes, reforçando o aumento do número de pessoas obesas.”
Encontramos pessoas extremamente insatisfeitas, aprisionadas no único lugar que seria inadmissível serem aprisionadas: dentro de si mesmas. Com uma auto-estima debilitada, não sentem prazer de viver e guerreiam com sua imagem, rejeitando a si mesmas profundamente.
Uma atitude crítica que distorce a percepção da realidade promovendo uma imensa insatisfação. Deixando de ter um caso de amor com sua história, um romance com a própria vida, valorizando e aceitando a beleza única e particular que cada um tem. Pois como escreveu Augusto Cury “A pior solidão da existência é aquela em que nós mesmos nos abandonamos.” (CURY.A. 2005p.25)
O poder da mídia, da indústria alimentar e da indústria farmacêutica combinados contribui muito para perpetuar o que hoje se chama a Era do Consumo. Aparentemente, tudo está passível de se tornar um produto a ser vendido.
O homem contemporâneo tem como objetivo construir, confeccionar, moldar seus corpos em prol, não só de uma imagem tida como ideal, mas de um corpo domesticado, controlado, aparentemente saudável e capaz de realizar todos os desejos. Desejos estes enquadrados socialmente.
Por um outro lado, a maneira como a maioria da população se alimenta hoje, consumindo alimentos processados, enlatados, ou freqüentando restaurantes e lanchonetes de fast foods, fez com que a idéia de processo fosse perdida.

Não se sabe mais como a comida aparece em nossas mesas. Não se sabe mais o que comemos. Os rótulos dos produtos parecem bulas de remédio. Quase todos os alimentos têm alto teor calórico, de gordura, sal e açúcar. Neste cenário o transtorno alimentar representa uma nova forma de estar no mundo, um ajustamento criativo em forma de sintoma.
Em contra partida uma relação saudável com o mundo implica em discriminar o que nos é tóxico e assimilar o que nos é nutritivo. Porém muitas pessoas não conseguem fazer essa discriminação funcional: rejeitando tudo que vem de fora ou assimilando tudo ou assimilando o que não serve ou ainda rejeitando o que serve.
As pessoas diferem também pela forma como fazem esta discriminação. Algumas por exemplo são ansiosas, escolhem rápido e consomem, outras são lentas ou indecisas, não sabem o que lhes faz bem. Trazendo para o trabalho terapêutico, percebe-se a necessidade de experimentar novas formas criativas e funcionais de relacionamento com o outro, consigo mesmo e com o alimento.
O importante passa a ser não eliminar o sintoma, mas entender qual a mensagem existencial que está contida em seu interior. Uma vez consciente esta mensagem pode ser relativizada e utilizada de acordo com a pertinência do agora. Deixa-se para traz um padrão autômato de reação baseado em algo do passado, sem valor atual.
Quando uma pessoa está dentro de uma dinâmica desregulada, inúmeros ajustamentos criativos disfuncionais tomam o lugar das ações realmente nutritivas para a auto-estima e relacionais, como: compulsão por comida, compulsão por não comer, compulsão por exercícios compensatórios e inúmeras outras formas de compulsões como compras e tratamentos estéticos.
O conceito de estética utilizado pela Gestalt Terapia, a busca pela boa forma, pela “organização mais estável, ordenada, harmoniosa, livre de fatores supérfluos ou arbitrários” (BARBOSA. R M 2007 p. 88) aponta para a importância do belo, mas abrange também uma visão de mundo baseada em valores éticos que nos orientam como terapeutas e como pessoas.

Para tal utilizaremos a seguinte metodologia:

1-Mobilização corporal – inicialmente promoveremos um ambiente de intimidade entre os participantes através de uma mobilização corporal aumentando o nível energético do corpo e a consciência do mesmo.

2-Trabalho com a projeção – de forma lúdica pediremos que os participantes elogiem uns aos outros.

3-Trabalho com a introjeção – busca e tomada de consciência da crença primordial com relação à alimentação.

4-Experimento – espalharemos no meio da sala diversas fotografias de comidas dos mais variados tipos e pediremos que as pessoas escolham o que desejam de acordo com suas crenças pessoais, indo até o alimento como fazem na vida. Por exemplo: uma pessoa escolheria só o que considera saudável e vegetariano, não importando se engorda ou não. Isso a ajudaria a ser saudável, mas acabaria comendo muito carboidrato e engordando, ou, uma pessoa que possui a crença de não poder “passar vontade” pegaria tudo o que lhe chamasse a atenção.

5-Reflexão e Identificação do comportamento disfuncional e funcional – a partir do experimento trabalharemos qual a função das introjeções hoje para os participantes e qual o efeito funcional e disfuncional para suas vidas.

6-Expressão artística -os participantes farão uma obra que representará como eles estão hoje em suas vidas em decorrência das escolhas atuais de como se alimentam.

7-Trabalho com projeções -De forma lúdica em duplas trabalharemos características indesejáveis através da crítica.

8-Trabalho de aceitação – Promoveremos o contato com sua totalidade e mobilizaremos o grupo num trabalho corporal de aceitação e pertencimento.

9-Partilha-Finalização do trabalho com uma roda de elaboração da vivência.

CONCLUSÃO

Durante nossa vivência colocaremos estes valores pessoais e sociais emergentes em cheque para que cada pessoa possa tornar consciente a maneira como escolhe e vive, a maneira como aceita o diferente e como se sente sendo o que é. Podendo escolher e ampliar uma nova forma de pensar e se alimentar.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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