Aquecimento Global numa Perspectiva Clínica: Um Diálogo entre a Gestalt-Terapia e a Ecopsicologia

Marco Aurélio Bilibio

 

Nos últimos anos, presenciamos os primeiros sinais de um desastre ecológico anunciado há décadas. Até onde nossa visão de nós mesmos como seres dissociados de um sistema maior não está por trás desse desastre? E quais as origens dessa visão dissociada? Até onde a Psicologia, como ciência, é responsável por isso? Essas colocações, que bem podem soar como provocações a nós profissionais, foram feitas por Theodore Rozsak em sua palestra como convidado especial da Décima Sexta Conferência Anual do The Gestalt Journal. Como resposta a essas provocações, a edição de primavera de 1995 de nossa mais importante publicação foi dedicada às conexões entre ecologia e Gestalt-Terapia. A visão de ser humano sustentada pelos fundamentos teóricos da abordagem gestáltica permite profundas reflexões sobre a qualidade das interações entre o ser humano e seu meio. Por exemplo, as relações entre economia e ecologia, responsáveis mais evidentes do stress dos sistemas naturais, não esconderiam elementos de psicopatalogia? Onde se perdeu o sentimento de pertencimento ao ambiente, que outros povos souberam preservar, e que está de acordo com a visão sistêmica e holística da Gestalt-Terapia com respeito a uma psicologia da saúde? Que respostas poderia nos oferecer a Gestalt-Terapia para um entendimento de nossas relações com os ambientes naturais intocados como, por exemplo, o que Greenway (1995) chamou de wilderness effect? Muitas perguntas surgem destas reflexões, que nos remetem a uma Ecopsicologia – termo cunhado pelo próprio Rozsak para definir o diálogo necessário entre os dois campos. Torna-se urgente explorar o alcance dos pressupostos teóricos da Gestalt-Terapia em situar e compreender o homem em crise com seu habitat planetário. Além de propor essa reflexão, a Oficina Teórico-Vivencial apresentará, também, os principais pontos do pensamento de Theodore Rozsak bem como as respostas de gestalt-terapeutas a seus pontos de vista. A investigação das dimensões alienadas do ser humano fixado na urbanidade e na selva de concreto será empreendida em conjunto com os participantes, à luz da visão gestáltica de saúde, neurose, ajustamento, maturidade, responsabilidade e auto-regulação. Serão focalizadas as implicações para o conceito de crescimento, quando este se dá na direção de um ego urbano, a serviço de um roteiro social centrado na polaridade industrialismo/consumo, dissociado da ordem e dos ciclos observados apenas pelo contato direto com a natureza. Também será focalizada a aplicação dos conceitos buberianos de EU-TU/EU-ISSO no encontro com as formas não-humanas de vida, assim como as limitações culturais que reprimem a conscientização da agonia dos sistemas de vida do planeta.
Essas limitações culturais estão na raiz da cultura Judaico-Cristã, cujo antropocentrismo dominador em relação aos outros sistemas de vida condiciona valores e sentimentos. Embora imersa nesse contexto, a Gestalt-Terapia traz um viés revolucionário que a torna um interlocutor privilegiado da Ecopsicologia.
Essas reflexões exigem um aprofundamento de nossa compreensão sobre suas aplicações à nossa prática clínica. É sabido que os conteúdos psicológicos reprimidos na vida pessoal de um psicoterapeuta não são acolhidos quando trazidos por um cliente. Integrar a dimensão humana que Rozsak chamou de Inconsciente Ecológico a um quadro de referência gestáltico pode ser uma necessidade na formação de gestalt-terapeutas.
As vivências terão o objetivo de experimentar nossos vínculos profundos com o mundo natural, e o conseqüente poder terapêutico da tomada de consciência desses vínculos. Será proposta uma reflexão sobre formas de convidar a natureza para o papel de co-terapeuta, explorando contribuições da Ecopsicologia.