ARTIGO

Gestalt Fechada: Abertura para o Mundo

Maria Janaína S. Fonseca


Não gosto de explicações. Acredito que as mesmas favorecem a expressão de conteúdos verbais lacônicos e vazios. Mas... perguntas sempre emergem dentro de mim e sempre a partir da fala do outro; esse outro que como Sartre já dizia: "guarda um segredo: o segredo do que eu sou".

Na entrevista para o meu primeiro estágio o outro surgiu: "Por que você escolheu a Gestalt-Terapia?". Na hora tudo o que pude fazer foi racionalizar; dei uma explicação puramente objetiva, sem entrar em contato com o que falava. O outro foi satisfeito, mas eu não. Menti para o outro, mas como enganar a mim mesma? A explicação, para mim, constituiu-se de meras palavras jogadas ao vento. Elas não me pertenciam!

Saí daquela sala com uma sensação estranha. Estava cercada de amigos, todos eufóricos por conta do estágio, mas eu não conseguia me envolver... "NÃO CONSEGUIA ME ENVOLVER": era esta a grande temática que norteou a minha resposta e que agora me atormentava fazendo eclodir repetidamente a pergunta: "Por que escolhi a Gestalt-Terapia?". Busquei a resposta trilhando outros caminhos... Acreditava, e ainda acredito, que a grande questão versa sobre o como: "Como escolhi a Gestalt-Terapia?". Assim, abandonei a procura pelas causas e lancei meu olhar para minhas próprias vivências. Presentifiquei o passado:

"É mais um dia como outro qualquer... Dirijo-me à biblioteca da faculdade para fazer um trabalho sobre uma abordagem que não conheço: Gestalt-Terapia. Seleciono alguns livros sobre o assunto e começo a leitura por Gestalt-Terapia Explicada. Uma experiência de deslumbramento e encantamento toma conta de mim. Sempre gostei muito de ler – sou daquele tipo que lê tudo, até bula de remédio – mas esta leitura é diferente, cada palavra preenche um espaço que algumas dezenas de livros jamais preencheram, cada frase faz para mim um sentido enorme, cada parágrafo me faz desejar outro e mais outro... Prossigo a leitura ali mesmo na biblioteca que é imensa, mas que durante algumas horas se tornou insignificante, afinal eu já não estava ali. Um mundo novo, com mais vida e que estimulava o lado positivo e criativo, foi revelado ao me revelar”.

Teria sido tudo mais fácil, menos angustiante, se tivesse relatado naquela entrevista apenas a minha experiência, de algumas horas, mas de uma imensidão inimaginável. Era simples: a Gestalt-Terapia tinha me absorvido e eu tinha absorvido a Gestalt-Terapia. Mas havia o olhar do outro, esse olhar que me petrificou com minha permissão. O outro, vendo-me como objeto, lançou a interrogação; e eu tentando me fazer do modo como fui vista, forneci a explicação objetiva que o outro buscava em mim.

Penso que aquela foi a melhor resposta que pude criar no momento e situação específica em que me encontrava. Atualizando aquele momento vejo que foi bom, pois me fez refletir acerca de como me afastei de mim mesma e esforcei-me por ser apenas um "objeto-visto-pelo-outro” , como me confundi com o outro quebrando o processo relacional, como não permiti me envolver.

Mais que refletir pude transcender, pois hoje percebo a possibilidade de recorrer a recursos autênticos e de manter uma interação criativa com o mundo, não sendo necessário perpetuar respostas inautênticas como aquela que se apresentou na entrevista e que já fazia parte da minha vida sem que eu percebesse. Agora, sinto que uma gestalt foi fechada e que uma estrada para o mundo foi aberta. É tempo de caminhar!