ARTIGO


Cuidando da pessoa com câncer:Contribuições da Gestalt-Terapia


Taking care of the person with cancer: Contributions of Gestalt-Therapy


Emily Suelen Antunes de Castro
Airte Miranda de Souza

Endereço para correspondência

 


RESUMO

Este trabalho teve como objetivo discutir as contribuições da Gestalt-Terapia na assistência ao paciente oncológico. O câncer é uma doença comumente associada à morte, em que a qualidade de vida pode depender do estádio da doença, características do tratamento e mecanismos internos de que o paciente poderá dispor para o enfretamento e a percepção do adoecimento. Trata-se de uma pesquisa teórica, de cunho exploratório, suscitada a partir da revisão da literatura realizada acerca do tema. Constatou-se a importância dessa abordagem para a Psico-Oncologia na compreensão de como esse fenômeno é experienciado, pois a percepção do câncer pelo sujeito se dá com base em suas construções, em seus relacionamentos consigo mesmo e com o outro. O psicólogo pautado nesse referencial busca acompanhar, significar e intervir na estruturação do processo de adoecimento, com o intuito de favorecer a ressignificação, utilizando, para isso, uma escuta atenta àquilo que emerge à consciência, em sua facticidade, a fim de apreender o significado das experiências vividas pelo paciente, possibilitando que um encontro dialógico possa ocorrer por meio da presença e aceitação genuína do outro.

Palavras-chave: Câncer; Gestalt-Terapia; Encontro Dialógico.


ABSTRACT

This work was aimed at discussing the contributions of Gestalt Therapy in oncological patient care. Cancer is a disease commonly associated with death, in which the quality of life may depend on the stage of the disease, and treatment characteristics of internal mechanisms that the patient may have to the confrontation and perception of illness. It is a theoretical research, exploratory purposes, raised from the literature review conducted on the subject. It was noted the importance of this approach to Psycho-Oncology in understanding how this phenomenon is experienced because the perception of cancer by subject is based on their constructions, in their relationships with themselves and each other. The psychologist that accompany search referential bases mean and intervene in structuring the process of illness, in order to promote ressignificação, using to this end, an attentive listening to what emerges to consciousness, in his facticidade, in order to grasp the significance of the experiences lived by the patient, allowing a Dialogic meeting can take place through the presence and genuine acceptance of another.

Keywords: Cancer; Gestalt-Therapy; Meeting Dialogic.


INTRODUÇÃO

O presente artigo tem o intuito de discutir as possibilidades de interlocução entre conceitos, técnicas e práticas da Gestalt-Terapia com a assistência ao paciente, em Oncologia.

Surgiu a partir da experiência construída ao longo dos dois anos no processo de Residência Multiprofissional em Saúde (RMS), em que foram realizados atendimentos a pacientes portadores de doença oncológica, norteados pelo olhar e a compreensão gestáltica do ser.

A RMS, criada com a promulgação da Lei n° 11.129, de 2005, é coordenada conjuntamente pelo Ministério da Saúde e pelo Ministério da Educação e tem como base os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS): universalidade, integralidade e equidade. Constitui-se em um programa de pós-graduação em nível lato sensu, que garante uma certificação em caráter de especialização (BRASIL, 2006).

No Estado do Pará, instituiu-se no ano de 2010, vinculada à Universidade Federal do Pará (UFPA) e desenvolvida através do Hospital Universitário João de Barros Barreto (HUJBB), em parceria com outras instituições de saúde, como o Hospital Ophir Loyola (HOL), o Hospital Universitário Bettina Ferro de Souza (HUBFS) e Unidades Básicas de Saúde (UBS) da capital.

Atualmente, abrange as seguintes profissões da área da saúde: Psicologia, Terapia Ocupacional, Biomedicina, Nutrição, Farmácia, Enfermagem, Fisioterapia, Odontologia, Serviço Social, com vagas distribuídas em duas áreas de concentração: Oncologia e Saúde do Idoso.

A escolha pela Oncologia, quando do processo seletivo da Residência, deu-se diante da percepção do progressivo crescimento do número de pessoas acometidas por tal patologia que, em sua maioria, manifestam conflitos e angústias inerentes ao diagnóstico e às frequentes perdas por eles vivenciadas, como da “condição de saudável”, do trabalho, lazer, da convivência com seus entes queridos e da vida, quando a cura não mais é possível e a finitude se aproxima, trazendo com ela seus temores, fantasmas e fantasias.

Assim, acreditando na possibilidade de ofertar a esses pacientes e aos seus familiares um contato autêntico, suporte psicológico, de modo a destinar-lhes uma escuta capaz de oferecer não só o manejo de seu sofrimento em decorrência da doença e hospitalização, mas também a possibilidade da emergência do sujeito como um todo, para além de sua patologia, considerando sua particularidade a partir de uma visão integral, é que se desenvolve este trabalho.

PSICO-ONCOLOGIA: UM CAMPO DE PRODUÇÃO DE SABERES E PRÁTICAS

O câncer representa um conjunto de mais de 100 patologias que acomete indivíduos em qualquer idade, cuja característica básica é o desenvolvimento de alterações durante o processo de divisão celular, promovendo um crescimento anormal, desordenado e autônomo de células que invadem os tecidos e órgãos, podendo espalhar-se (metástase) para outras regiões do corpo (INCA, 2011).

As causas de câncer são variadas, podendo ser externas ou internas ao organismo, estando ambas as formas inter-relacionadas. As causas externas relacionam-se ao meio ambiente e aos hábitos ou costumes próprios de um ambiente social e cultural, que atuam de modo a alterar a estrutura genética (DNA) das células. O surgimento do câncer depende da intensidade e duração da exposição das células aos agentes cancerígenos. As causas internas são, na maioria das vezes, geneticamente pré-determinadas e estão ligadas à capacidade do organismo de se defender das agressões externas. Esses fatores causais podem interagir de várias maneiras, aumentando a probabilidade de transformações malignas nas células normais (SILVA, 2006).

Conhecido há muitos séculos, o câncer foi amplamente considerado como uma doença dos países desenvolvidos e com grandes recursos financeiros. Há aproximadamente quatro décadas, a situação vem mudando, e a maior parte do ônus global do câncer pode ser observada em países em desenvolvimento, principalmente aqueles com poucos e médios recursos. O câncer, como outras doenças crônicas não transmissíveis, vem-se tornando cada vez mais comum no mundo todo e pode causar danos de vários aspectos para famílias inteiras (INCA, 2011; SILVA, 2006).

Seguindo tendência mundial, notam-se no Brasil processos de transição que têm produzido importantes mudanças no perfil das enfermidades que acometem a população, como, por exemplo, o fato de que, desde a década de 1960, as doenças infecciosas e parasitárias deixaram de ser a principal causa de morte, sendo substituídas pelas doenças do aparelho circulatório e pelas neoplasias (INCA, 2011).

O problema do câncer, no país, diante da ascensão de sua incidência e da mortalidade, ganha relevância e, com isso, o tema tem conquistado espaço no meio político e acadêmico, visto que o conhecimento sobre a situação dessa doença permite estabelecer prioridades e alocar recursos de forma direcionada para a modificação positiva desse cenário na população brasileira (SHERMAN JÚNIOR, 1999).

De acordo com o Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA), estimam-se cerca de 520 mil novos casos da doença para 2012. O estudo destaca os tipos de câncer mais incidentes nas regiões brasileiras, como de pele não melanoma, próstata, mama e pulmão. A Organização Mundial da Saúde (OMS) fez uma projeção de 27 milhões de novos casos de câncer para o ano de 2030, em todo o mundo, e de 17 milhões de mortes pela doença. Os países em desenvolvimento serão os mais afetados, entre os quais o Brasil (INCA, 2011).

A estimativa de casos novos de câncer auxilia no sentido de prover gestores, serviços de saúde, universidades, centros de pesquisa e sociedades científicas de informações que possam subsidiar o conhecimento sobre a ocorrência da doença na população brasileira, o planejamento das ações para a prevenção e o controle do câncer e documentos científicos, como dissertações e teses relacionadas ao tema. Além de se configurarem em importante instrumento para os meios de comunicação de massa e da imprensa em geral, constituem-se na principal ferramenta de planejamento e gestão da saúde pública na área oncológica, no Brasil, porque fornece informações necessárias para a elaboração das políticas públicas de saúde voltadas para o atendimento da população (INCA, 2011).

Assim, por tratar-se de uma doença crônica de prognóstico nem sempre favorável, responsável por parcela significativa de óbitos e cujo tratamento pode exigir níveis de tolerância bastante elevados, nota-se nas últimas décadas uma enorme mobilização científica e profissional, no sentido do desenvolvimento de novas modalidades terapêuticas de prevenção e de tratamento do câncer (COSTA JÚNIOR, 2001).

Para o enfrentamento do câncer, segundo o INCA (2011), são necessárias ações que incluam: educação em saúde em todos os níveis da sociedade; promoção e prevenção orientadas a indivíduos e grupos (não se esquecendo da ênfase em ambientes de trabalho e nas escolas); geração de opinião pública; apoio e estímulo à formulação de leis que possibilitem monitorar a ocorrência de casos.

Observa-se, no entanto, que embora o câncer seja uma doença que acompanha a humanidade desde sempre, a forma como esta é significada tem sofrido alterações conforme o momento histórico-social e a sociedade em que se manifesta. Como lembra Minayo (1997), não podemos desconsiderar os determinantes histórico-culturais que envolvem o processo saúde-doença.

Nesse sentido, a partir do século XX, o câncer passou a personificar um “vilão cruel”, que se comporta de maneira descontrolada e destrutiva contra o corpo, sendo significado por muitas pessoas como uma sentença de morte, que traz usualmente consigo um efeito devastador, relacionado à ideia de morte iminente, ao medo de mutilações e do desfiguramento, dos tratamentos dolorosos e das muitas perdas provocadas pela doença (BRAGANÇA, 2006).

Essa situação de sofrimento acaba por delinear uma problemática psíquica com características específicas, demandando a necessidade de um profissional especializado que acolha os conflitos emocionais desencadeados nesses pacientes, durante todo esse processo. A doença é mais que um conjunto de sintomas: tem representação simbólica, moral, social e psicológica, uma vez que ainda carrega em si o significado de doença fatal, podendo levar a estados de crise pela hospitalização prolongada, pela ameaça da terminalidade e pela perda de sonhos e esperanças futuras.

Para Bromberg, Kovács e Carvalho (1996), o diagnóstico de uma doença com prognóstico reservado traz consigo o sentimento de fragilidade humana e o contato com sua finitude. Males como câncer, AIDS e as doenças cardíacas estão carregados de estigmas, ou seja, sinalizando uma “sentença de morte”. Assim, carregam um fardo. A presença da possibilidade de morte assusta, mesmo que as fronteiras entre a vida e a morte não estejam demarcadas e conhecidas.

A hospitalização e o tratamento também podem ser sentidos como uma morte, envolvendo algumas perdas, como mudança de ambiente, afastamento da família, dos amigos, a perda da privacidade, autonomia e solidão, esta última mesmo no meio de muitos “estranhos”. O medo do sofrimento e da dor pode fazer com que o indivíduo se sinta morto ou prefira a morte a viver com suas limitações e temores (BROMBERG; KOVÁCS; CARVALHO, 1996).

O tratamento do câncer submete o paciente a eventos ambientais estressantes, de caráter doloroso, mutilador e invasivo, incluindo-se a duração prolongada do tratamento, a invasibilidade dos procedimentos médicos, os riscos de recidiva e os efeitos da quimio e radioterapia (COSTA JÚNIOR, 2001).

Tal situação é geradora de intensa angústia, em geral temor à mutilação, dor, culpa, à separação, ao sofrimento e à morte, desencadeando reações psíquicas específicas que variam de acordo com os recursos psicológicos internos de cada paciente (CHIATTONE, 1996).

Portanto, a Psico-Oncologia surge como subárea da Psicologia da Saúde, de interface entre Psicologia e Oncologia, que usa conhecimentos educacionais, profissionais e científico-metodológicos para identificar o papel de aspectos psicossociais na prevenção, etiologia e reabilitação do câncer; sistematizar conhecimentos que subsidiem a assistência integral a pacientes e familiares; e a qualificação profissional (GIMENES, 1994).

É um campo interdisciplinar da saúde que visa estudar a influência de fatores psicológicos sobre o desenvolvimento, o tratamento e a reabilitação de pacientes com câncer. Dentre seus principais objetivos, está o de identificar variáveis que possam interferir e/ou auxiliar no processo de enfrentamento da doença (CARVALHO, 2002).

Segundo Gimenes (1994), a Psico-Oncologia busca identificar e compreender os aspectos psicossociais e ambientais envolvidos no processo de adoecimento do câncer; sistematizar e ampliar os conhecimentos engendrados; subsidiar uma assistência integral ao paciente e seus familiares; contribuir para a formação de profissionais da saúde envolvidos no tratamento do câncer. Sobre o desenvolvimento desse campo, destaca que “[...] a Psico-Oncologia começa a surgir como área sistematizada do conhecimento a partir do momento em que a comunidade científica passa a reconhecer tanto o aparecimento, quanto a manutenção e a remissão do câncer, são intermediados por uma série de fatores cuja natureza extrapola condições apenas de natureza biomédica” (GIMENES, 1994, p. 42).

Para Bayés (1985), o desenvolvimento da Psico-Oncologia ocorre em razão dos seguintes fatores ou condições: 1) o reconhecimento entre a relação da etiologia e o desenvolvimento do câncer com fatores psicológicos; 2) a importância da adesão e do reconhecimento dos diversos tratamentos prescritos; 3) o fato de a adesão ao tratamento ser influenciada por fatores psicossociais; 4) a atenção crescente à qualidade de vida dos pacientes e familiares, durante e após a doença.

Jimmy Holland (1990 apud CARVALHO, 2002) afirma que esse ramo da Psicologia da Saúde almeja estudar duas dimensões psicológicas presentes no diagnóstico do câncer: o impacto da doença na dinâmica emocional do paciente, dos familiares e da equipe de saúde; o papel das variáveis psicológicas e comportamentais na incidência e na sobrevivência do câncer, orientando a prática em direção à minimização do sofrimento causado pela hospitalização e por eventuais sequelas emocionais decorrentes desse processo, assim como na busca pela humanização das relações travadas nesse contexto.

Dessa forma, é o campo de estudo que proporciona o desenvolvimento de um trabalho suportivo aos clientes, familiares e profissionais envolvidos com a doença oncológica, buscando acompanhar, significar e, quando possível, intervir na estruturação do processo de adoecimento, objetivando sempre uma melhoria na qualidade de vida de todos aqueles nele envolvidos. Desloca o foco da doença em si, passando a contemplar o ser humano como um todo, em seu contexto psicossocial.

Para Angerami-Camon (1996), o psicólogo atuante na área da Psicologia Oncológica procura manter o bem-estar psicológico do paciente, identificando e compreendendo os fatores emocionais que intervêm na sua saúde. Outros objetivos do trabalho desse profissional são prevenir e reduzir os sintomas emocionais e físicos causados pelo câncer e seus tratamentos, levar o paciente a compreender o significado da experiência do adoecer, possibilitando ressignificações desse processo.

Santos, Santos e Abrantes (1996) frisam que grande parte dos pacientes portadores de câncer manifesta perturbações emocionais, sendo a depressão e a ansiedade as mais comuns, uma vez que a experiência de adoecimento e de realização do tratamento oncológico (quimioterapia, radioterapia, cirurgia) geram limitações e conflitos no paciente e em seus familiares, mobilizando inseguranças, temores e angústias.

Carvalho (2002) descreve que um dos sentimentos mais presentes nos pacientes de câncer é o medo. Outros autores, como Angerami-Camon (1996), Le Shan (1992) e Simonton (1987), elencam vários outros sentimentos e receios percebidos no paciente de câncer, tais como a mutilação, a dor, a apreensão quanto a exames médicos desconhecidos, o medo do contágio, a emoção da perda relacionada à autoimagem corporal, a perda da força física, a perda do atrativo sexual, o medo da recidiva da doença e morte, a perda dos objetivos de vida, papéis sociais, e o fato de causar sofrimento à família.

Gimenes (1994) aponta três âmbitos possíveis para intervenções em Psico-Oncologia: assistência, pesquisa e organização dos serviços. Desse modo, são consideradas: 1) A assistência ao paciente oncológico, sua família e profissionais de saúde envolvidos com a prevenção, o tratamento, a reabilitação e a fase terminal da doença; 2) A pesquisa e o estudo de variáveis psicológicas e sociais relevantes para a compreensão da incidência, da recuperação e do tempo de sobrevida após o diagnóstico do câncer; 3) A organização de serviços oncológicos que visem ao atendimento integral do paciente, enfatizando de modo especial a formação e o aprimoramento dos profissionais da Saúde implicados nas diferentes etapas do tratamento.

Conforme Le Shan (1992), os estudos têm sugerido a associação de fatores psicológicos à origem e ao prognóstico do câncer. Entre os fatores mais recorrentes indicados através dessas pesquisas, encontram-se os estados afetivos, especialmente depressão; eventos de vida estressantes, com destaque para as perdas; apoio social; personalidade e estilos de enfrentamento das situações problemáticas. Esse autor ressalta que há relação entre o estresse e a depressão, com o enfraquecimento do sistema imunológico, o que contribui para o desenvolvimento de tumores.

Destacam-se também os estudos realizados por Simonton (1987), que investigou a influência das emoções no surgimento do câncer, das lacunas do conhecimento do que realmente ocorre nos processos oncológicos, do desconhecimento de causa e fatores curativos que envolvem a doença, dos porquês de os mesmos tratamentos surtirem efeitos distintos em pacientes com o mesmo diagnóstico, prognóstico e fase da doença. O autor concluiu que os pacientes sobreviventes tinham algo em comum: motivação para viver, ou seja, expectativas de um futuro melhor.

Esses estudos impulsionaram a adoção de novas possibilidades de assistência e de enfrentamento da doença, a obtenção de uma melhor qualidade de vida através de atitudes e comportamentos mais saudáveis, como, por exemplo, o uso de técnicas de visualização e relaxamento e os grupos de aconselhamento como recursos importantes no acompanhamento aos pacientes com câncer. Tais recursos têm apresentado resultados na melhora física, como mais rigor físico, fortalecimento do sistema imunológico e formas de enfrentamento mais saudáveis.

O Programa Simonton refere-se a outra modalidade de atendimento psicossocial que pretende oferecer bem-estar psíquico e auxílio na recuperação do paciente oncológico, além do apoio aos familiares. Os atendimentos são realizados em grupos temáticos, com duração pré-determinada.

A assistência em Psico-Oncologia, em consequência, inclui, além do tratamento médico, o apoio psicossocial ao doente e seus familiares. O foco desloca-se da doença em si, passando a contemplar o ser humano como um todo. Visa a proporcionar aos doentes oncológicos uma abordagem abrangente, tomando por referência o modelo biopsicossocial da saúde e da doença.

A GESTALT-TERAPIA: CONSIDERAÇÕES SOBRE UMA ABORDAGEM EXISTENCIAL-FENOMENOLÓGICA

A Gestalt-Terapia é uma abordagem Existencial-Fenomenológica que valoriza as potencialidades do sujeito e o concebe como um ser-no-mundo; consciente; intencional; total; singular; que está em constante processo e em relação consigo mesmo e com o campo em que está inserido, influenciando e sendo influenciado por este; livre para fazer suas escolhas, ao mesmo tempo em que é responsável por elas (CARDELLA, 2002; CARDOSO, 2002; GINGER, 1995).

Essa abordagem é Existencial, por acreditar na capacidade do ser humano em escolher e criar seu próprio destino e ser responsável pela sua construção, em reconfigurar, a qualquer momento, sua relação consigo mesmo, com os outros e com o mundo, pois está em um constante refazer-se. Isto é, refere-se ao como o sujeito “dirige” a sua existência (GINGER, 1995).

Fenomenológica, no sentido de buscar compreender a forma como o sujeito se relaciona com o mundo, dando ênfase à vivência imediata, tal como é percebida ou sentida corporalmente. Está ligada ao como a pessoa experiencia os fenômenos; vai ao encontro das coisas mesmas; e acredita na intencionalidade da consciência, já que esta é sempre dirigida a um objeto, compreendendo a intencionalidade, essencialmente, como o ato de atribuir um sentido ao fenômeno (CARDELLA, 2002; FORGHIERI, 1993; GINGER, 1995).

O terapeuta, nessa abordagem, se utiliza de dois recursos para chegar ao fenômeno em si: a Redução Fenomenológica que possui como objetivo descrever o homem no mundo, a fim de apreender o significado das experiências vividas. E a Epoché, que é relativa à abstenção de juízos pré-concebidos e de ideias prévias, a fim de permitir a emergência do fenômeno em sua facticidade. É pôr os a prioris entre parênteses em favor da realidade fenomenal (MARTINS; BICUDO, 1983).

Portanto, implica na busca de sentido inerente ao fenômeno, objetivando compreender e não explicar o homem no mundo. Trata-se de estudar as vivências do sujeito através da realidade vivida e experienciada, de sorte a não interferir na autenticidade do encontro.

Segundo Yontef (1998), esse método é essencial para que se escute genuinamente o paciente. Ele integra tanto o comportamento observado quanto os relatos pessoais e experienciais, objetivando uma descrição detalhada e cada vez mais clara do que realmente é, não enfatizando o que foi ou poderia ter sido sobre o que é relevante.

Se a intenção proposta pela Fenomenologia é chegar à essência dos fenômenos trazidos pelos pacientes, Rudio afirma:

“Para que se possa ir diretamente às coisas, mas de uma forma sistemática, a Fenomenologia utiliza um método - o método fenomenológico - que é regido por dois princípios: o primeiro determina que se apreenda intuitivamente a essência do fenômeno. O segundo estabelece que, para intuir a essência, torna-se necessário a libertação de qualquer interferência alheia ao fenômeno que possa desviar a atenção do ato de observá-lo.” (RUDIO, 1998, p. 139).

Para isso, o terapeuta examina os fenômenos que emergem para a consciência, descritos pelo paciente de acordo como estes são vividos e experienciados por ele, levando em consideração a totalidade em que os fenômenos estão inseridos. A partir da observação, o terapeuta busca compreender a rede de sentido e significado que os permeia (CIORNAI, 2004; RIBEIRO, 2006).

O homem é um ser-no-mundo, cuja existência se dá em relação a algo ou alguém. O sentido de sua existência é revelado pelos significados que atribui às suas experiências, pelo modo como os compreende (FORGHIERI, 1993).

Diante da compreensão de que o fenômeno é uma gestalt, é um todo percebido e indivisível, é “[...] uma configuração de partes em inter e intra-relação”, é aquilo que se manifesta, é aquilo a que temos acesso, “[...] o terapeuta facilita que o paciente entre em contato com sua essência, por meio daquilo que está aparente, já que os fenômenos estão ligados à individualidade e subjetividade de cada sujeito” (RIBEIRO, 2006, p. 137).

Na perspectiva de Juliano (1999, p. 26), “[...] o terapeuta deve ficar com o fenômeno tal qual ele se apresenta, tal qual ele é, mais do que com aquilo que foi, poderia ou deveria ser”. Isto é, o terapeuta deve observar o fenômeno como este se apresenta no aqui-agora, pois é neste momento presente que se manifesta o tempo vivido e experienciado pelo sujeito.

Assim, para compreender o funcionamento do indivíduo em sua manifestação de contato com o mundo, é preciso compreender o seu self, porque é por meio deste que a pessoa entra em contato com o mundo e se ajusta criativamente. O self representa a maneira particular como cada um entra em contato com os fenômenos que a ele se apresentam e como hierarquiza suas necessidades, formando suas figuras e fundos (LATNER, 1987 apud GINGER, 1995).

O self é constituído por três funções: o Id, que está relacionado com as necessidades vitais, com atos automáticos; o Ego, o qual é ativo no processo de escolhas e responsável em aceitar ou rejeitar aspectos do meio; e a Personalidade, que se refere à representação de si mesmo (CARDELLA, 2002).

Desse modo, intervir considerando os pressupostos da Gestalt-Terapia implica estar atento à singularidade na forma de ver e lidar com o mundo de cada indivíduo, sem pré-concepções, apoiando-se no aqui-agora, focalizando o fluxo e a direção da energia corporal, promovendo a awareness do paciente sobre ele mesmo e sobre a maneira como ele age no mundo, visto que “[...] quanto mais aware ele esteja, mais condições terá de fazer escolhas responsáveis, autênticas e pertinentes com seu próprio referencial” (CARDOSO, 2002, p. 61).

Tomando por base Ginger (1995), um indivíduo aware possui consciência daquilo que é, sabe o que faz, como faz e pelo que escolhe ser quem é. Ou ainda, como aponta Ribeiro (2006), awareness é o processo em que tomo consciência da minha consciência; de constante conhecer a mim mesmo e a mim mesmo no mundo, ao como me relaciono, como faço meus contatos, onde bloqueio, onde faço interrupções ou simplesmente desvio de um contato direto. É muito além de um mecanismo cognitivo, porque está relacionada com o afetivo-emocional e com o motor. Conforme as palavras de Ginger:

“[...] a Gestalt-Terapia favorece um contato autêntico com os outros e consigo mesmo, um ajustamento criador do organismo ao meio, assim como uma consciência dos mecanismos interiores que nos levam, bem frequentemente, a condutas repetitivas. Ela coloca em destaque nossos processos de bloqueio ou de interrupção no ciclo normal de satisfação de nossas necessidades e desmascara nossas evitações, medos e inibições, assim como nossas ilusões.” (GINGER, 1995, p. 17-18).

Isso se dá por meio do “olhar diferente” em que se constitui o olhar do gestalt-terapeuta, pois este vê o paciente a partir de outro ângulo, almejando alçar mudanças em seu modo de estruturar a sua percepção, o qual depende do contexto em que o indivíduo está inserido (hospitalização, por exemplo), da história de vida do mesmo e de seu estado no momento presente, já que dele depende sua maneira de ser e estar no mundo (JULIANO, 1999).

Essa atitude do gestalt-terapeuta está fundamentada na Abordagem Dialógica, a qual está associada com a valorização da pessoa, à ênfase em uma relação de mutualidade e reciprocidade, em que há um interesse genuíno pelo outro, que aceita a outra pessoa como ela verdadeiramente é. “É inerente à abordagem dialógica a disponibilidade do terapeuta para entrar, o mais completamente possível, na experiência subjetiva do cliente” (HYCNER, 1995, p. 111).

É nesse sentido que o psicoterapeuta busca, num primeiro momento, confirmar o paciente e aceitar seu comportamento, a fim de que se construa uma relação de confiança, para que, por meio do contato dialógico construído entre estes, o indivíduo possa explorar seus conflitos e buscar um contato mais nutritivo com o mundo (HYCNER, 1995).

No contato dialógico com o paciente, o gestalt-terapeuta procura pelo significado, pela totalidade, observando aquilo que emerge no momento como estando ligado com uma gestalt mais ampla, visto que esta revela como está a autorregulação organísmica do sujeito, a qual pode ser descrita como o processo de manutenção da vida em que o indivíduo se regula, para restabelecer um equilíbrio, conforme a necessidade do organismo no aqui-agora (RIBEIRO, 2006; YONTEF, 1998).

Segundo Ribeiro (2006, p. 56), “[...] autorregular-se significa respeitar a totalidade funcional do organismo; [...] significa privilegiar as necessidades que gritam dentro de nós para ser saciadas ou satisfeitas; significa olhar-se como uma pessoa inteira no mundo”.

Assim, objetiva-se restaurar a qualidade do contato do ser com o mundo, uma vez que essa abordagem acredita na potencialidade de seu crescimento, criando condições para que ele experimente novas maneiras de perceber-se, alargando suas fronteiras pessoais, com base em uma base sólida que lhe permita a mudança. No entanto, não é possível mudar sem awareness, porque ela é um caminho para a mudança, já que é o “dar-se conta” do que ocorre à nossa volta que nos possibilita mudar (JULIANO, 1999; RIBEIRO, 2006).

O PROCESSO DE ADOECIMENTO SOB O OLHAR DO GESTALT-TERAPEUTA

A manifestação do corpo por meio de sintomas pode ser caracterizada como uma forma precária do organismo se autorregular e buscar seu reequilíbrio. Desse modo, a doença pode ser caracterizada por um desequilíbrio prolongado, ou seja, implica a perda da homeostase, levando o indivíduo a ajustar-se da melhor forma possível às situações. Tal desequilíbrio, por vezes, ocorre quando se exige do organismo força e habilidades para as quais não está preparado (CARDELLA, 2002; RIBEIRO, 2006).

Compreender a doença, dentro desse contexto, é correlacionar que um sintoma sinaliza que algo não está agindo de forma saudável no todo que constitui o ser, isto é, o indivíduo não está em seu completo bem-estar físico e psicológico. Para Ribeiro (2006), quando um sintoma emerge, é sinal de que as partes não estão em sintonia harmoniosa entre si. O sintoma “[...] emerge como o porta-voz da totalidade, sempre que esta não pode ou não consegue se fazer perceber” (ibid., p. 178).

Tendo por base a definição de ajustamento criativo segundo esse autor, ou seja, como um processo que se manifesta na relação do organismo consigo mesmo e com o outro, na possibilidade de encontrar mecanismos em si, no ambiente ou em ambos, para satisfazer suas necessidades e preservá-lo, observa-se que o ajustamento nem sempre se dá de forma saudável, pois, por vezes, o organismo não se ajusta satisfatoriamente às situações.

Por conseguinte, o funcionamento saudável caracteriza-se pelo ajustamento criativo do sujeito ao seu meio; pela permanente interação do organismo com este, num processo contínuo de surgimento e destruição de figuras, as quais variam de acordo com o fundo e a percepção do indivíduo sobre ela; em identificar a necessidade mais dominante, permitindo que as gestalten sejam fechadas (CARDELLA, 2002; CIORNAI, 2004).

Por outro lado, em um funcionamento não-saudável, há um ajustamento criativo disfuncional, a awareness encontra-se reduzida e esse processo de constante percepção de si mesmo, do como me relaciono e de como faço meus contatos, fica prejudicado, o que, consequentemente, dificulta a formação de novas gestalten, pois o organismo não satisfaz as suas necessidades e há um acúmulo de situações inacabadas (CARDELLA, 2002).

Logo, as figuras tornam-se fixas e mal delineadas, o que leva a interrupções no contato e à dificuldade na produção de contatos criativos. A disfuncionalidade refere-se então a uma situação em que há um empobrecimento da forma de contatar com o mundo.

O adoecer está na perda das fronteiras, dos contornos de si mesmo. Quase sempre a doença é resultante de um contínuo de necessidades não satisfeitas e de um mecanismo de defesa habitual que se cristalizou, bloqueando o contato (CARDELLA, 2002; CIORNAI, 2004; RIBEIRO, 2006).

Em decorrência, os mecanismos de defesa, quando se tornam repetitivos e crônicos, podem estar relacionados com a vontade (não-consciente) de impedir algo, não deixando de ser, mesmo assim, uma forma de contato encontrada pelo sujeito.

A tendência a escolher um determinado modo de enfrentamento depende do modo de ser individual, dos recursos disponíveis internos, socioambientais, valores e crenças. O adoecimento, desse modo, está ligado a um ajustamento criativo disfuncional do indivíduo, a uma parte “perdida” que está em desajuste com o todo. Dessa maneira, torna-se imprescindível conhecer o paciente, suas experiências prévias, atentando para o momento existencial que este está vivendo, como experiencia os fenômenos no aqui-agora, diante do contexto que o permeia, e a significação dada ao seu adoecimento a partir de seu mundo de valores e concepções, pois estes configuram situações específicas de dor e sofrimento (ANGERAMI-CAMON, 2001).

Juliano (1999) afirma que, quando ouvimos uma pessoa que apresenta queixas físicas, é importante desvendar como se deu o início da doença, como estava sua vida antes dela, em que contexto apareceu, no sentido de compreender qual o significado daqueles sintomas, como lida e que uso faz deles em sua vida, por que seu corpo “escolheu” aquela linguagem, aquela forma de se fazer ouvir, se ajustou e se comporta dessa maneira.

Refere-se à observação do modo como o paciente funciona na sua relação com o meio, como e o que restringe ou interrompe seu contato com ele, pois se compreende que a situação-problema que aflige o indivíduo se dá na interação organismo-meio, em virtude de uma não-satisfação organísmica, que a pessoa a mantém de alguma forma e por algum motivo. Nessa perspectiva, em face da observação do como a pessoa faz contatos, pode-se chegar ao como a pessoa está, como faz suas escolhas, porque isso nos leva à essência das coisas (COSTA JÚNIOR, 1995; RIBEIRO, 2006).

O processo do contato é um todo unificado, que pode ser representado em uma sequência contínua de figura-fundo, o qual tem origem numa vaga sensação que se delineia como figura, levando à mobilização de energia e a uma ação organizada que responde a uma necessidade emergente. O ciclo se fecha quando o organismo tem a experiência de satisfação plena, entrando em retraimento e colocando-se, em seguida, à disposição de uma nova figura. Em todo processo de contato, há uma unidade subjacente de funções perceptivas, motoras e sensorioafetivas que funcionam de modo integrado (PERLS; HEFFERLINE; GOODMAN, 1997).

No entanto, é comum notarmos gestalts inacabadas e ciclos interrompidos por uma perturbação da fronteira de contato, que pode ser de origem interna ou externa ao sujeito e, consequentemente, faz surgir os mecanismos de defesa ou de evitação de contato. Tais mecanismos podem se caracterizar como formas de contato saudáveis ou patológicas, uma vez que, somente quando estas se tornam cristalizadas, há um bloqueio do contato e se constituem em um comportamento neurótico (GINGER, 1995).

Conforme Ribeiro (2006, p. 80), “[...] todos os mecanismos de contato [...] são formas complexas de contato e indicam uma posição vivida pelo organismo, como um fundo que organiza as necessidades do sujeito ou como algo, aqui-agora, disfuncional em sua relação pessoa-mundo”.

O Ciclo de Contato de acordo com Ribeiro (1997), contém dois movimentos: o de bloqueio e o de saúde, identificando o modo como a pessoa experiencia sua realidade, como ela funciona, por meio das nove fases do contato:

* Fluidez: Processo em que o self se movimenta; deixa posições antigas que não lhe são mais funcionais; sente-se mais solto e espontâneo.
* Sensação: Processo em que a pessoa sai do estado de frieza emocional; procura novos estímulos; sente-se estimulada pelo meio.
* Consciência: Processo em que a pessoa entra em contato consigo mesma; relaciona-se com mais reciprocidade.
* Mobilização: Processo em que a pessoa sente necessidade de mudar; separar o que é seu do que é do outro; consegue identificar o que é compatível ou não ao seu self.
* Ação: Processo em que a pessoa assume suas responsabilidades por seus atos; expressa confiança nos outros.
* Interação: Processo em que a pessoa se aproxima dos outros, sem esperar nada em troca.
* Contato Final: Processo em que a pessoa se sente como fonte de prazer; relaciona-se de maneira direta e clara.
* Satisfação: Processo em que a pessoa percebe que o outro pode ser fonte de contato nutritivo.
* Retirada: Processo em que a pessoa percebe o que é seu e o que é do outro; aceita ser diferente deste.
Como mecanismos de defesa, ou seja, bloqueio do contato, definidos como formas polares e complementares, ressaltam-se:
* Fixação: Processo pelo qual a pessoa preserva seus valores, crenças, em detrimento daquilo que recebe do meio, havendo um apego excessivo a pessoas, ideias ou coisas, sem verificar se estes são nutritivos ou não ao self.
* Dessensibilização: Processo que compromete a expressão dos sentimentos. A pessoa age com frieza diante de um contato, com dificuldade para se estimular, perdendo o interesse por sensações novas e mais intensas.
* Deflexão: Processo pelo qual o meio traz alguma ação e o self se desvia do contato direto, ou o faz de maneira vaga. A pessoa sente-se incompreendida, pouco valorizada.
* Introjeção: É um mecanismo em que tudo aquilo que é do meio é incorporado pelo self, sem ser avaliado se será necessário ou não; não assimila o que recebe do meio, “engole” por inteiro, aceitando opiniões, normas e valores contrários aos seus, já que acredita que os outros sabem o que é melhor para ele.
* Projeção: É a tendência a fazer o meio responsável pelo que se origina na própria pessoa; atribui ao meio o mundo interno, quer dizer, defeitos e qualidades que estão em si; aliena-se de si mesmo, por ter dificuldade em identificar o que é seu.
* Proflexão: Processo em que a pessoa deseja que os outros sejam como ela deseja que eles sejam, ou que eles sejam como ela é, podendo acontecer de forma ativa, quando manipula, fazendo algo para o outro com o objetivo que o mesmo reaja da maneira desejada e esperada; ou passiva, quando se submete aos outros, fazendo o que eles gostam, para receber algo em troca.
* Retroflexão: É o processo pelo qual a pessoa retorna a energia ou o comportamento para si mesma, fazendo em si algo que gostaria de fazer com o outro; ou fazendo em si aquilo que gostaria que o outro fizesse nela; ou desejando ser como os outros são ou como gostariam que ela fosse.
* Egotismo: Processo em que a pessoa está centralizada nela mesma, não se preocupa com as satisfações do meio e se satisfaz consigo mesma. Não há espaço para a espontaneidade; já que o sujeito exerce controle rígido sobre o mundo, a fim de evitar surpresas. O outro não existe, é um objeto de manipulação; é ela quem controla a situação, o mundo fora dela.
* Confluência: Acontece por meio da aproximação entre o eu e o outro, ocorrendo a perda de identidade do indivíduo, que, desse modo, passa a agir como o outro. Caracteriza-se por uma relação de dependência, pelo fato de não haver separação. Teme o isolamento: por conta disso, vive em grupos.

Na opinião de Ribeiro (1997), cada indivíduo pode interromper o ciclo em qualquer ponto, conforme as exigências do contexto, porém, existe um lugar onde o bloqueio é mais constante. De acordo com esse autor, o ciclo é uma maneira de explicar a forma como as pessoas fazem contato, como elas lidam com a experiência presente, como se expressam, onde bloqueiam sua relação com o outro ou onde elas se perdem no contato com o meio: “Ciclo significa que o presente é o repasse do passado transformado e a projeção do futuro por meio das estruturas já presentes nele. Essa circularidade nos torna essencialmente seres de relação em permanente mudança, ou seja, seres à busca de si mesmos. Isso é contato” (RIBEIRO, 2006, p. 89).

Portanto, um fenômeno a ser estudado deve levar em consideração o campo do sujeito, uma vez que este é reflexo das relações do indivíduo com seu meio aqui e agora. É esse campo que torna compreensível o como o indivíduo estabelece contato, ou foge e/ou o interrompe. Além disso, não é possível entender um fenômeno sem olhar para o todo com o qual ele está relacionado, para os vários sistemas em que está inserido. “O sentido das coisas está na totalidade da coisa” (RIBEIRO, 2006, p. 85).

Logo, quando o campo se refere ao âmbito hospitalar, é importante atentar para esse novo contexto onde as relações do indivíduo serão vivenciadas, pois, vendo-se em situação de adoecimento, o sujeito pode se valer de seus mecanismos de defesa, já habituais, para lidar com a mesma situação ou encontrar novas configurações para se ajustar a ela, tendo em vista que esta pode ser assemelhada a situações de crise em que a pessoa, frente à necessidade de uma tomada de atitude, bloqueia o seu crescimento, sendo este o melhor que ela pode fazer, naquele momento.

Nesse sentido, os comportamentos emitidos pela pessoa poderão ser compreendidos através da dinâmica de seu campo holístico relacional, porque os contextos em que esta interage influenciam em sua totalidade; e da Teoria do Ciclo do Contato, já que esta auxilia a compreender em qual fase do contato o sujeito está paralisado, por gerar padrões repetitivos. Além disso, norteia a elaboração de hipóteses de quais intervenções poderão ser mais adequadas àquele sujeito, valendo-se para isso dos Fatores de Cura correspondentes.

Vale salientar que “[...] a Gestalt-Terapia não visa atacar ou ‘superar’ as resistências, mas, principalmente, torná-las mais conscientes, mais adaptadas à situação do momento” (GINGER, 1995, p. 132).

Conclui-se, assim, que o terapeuta deve estar sempre atento àquilo que emerge no aqui-agora, observar e identificar a presença dos mecanismos de contato, considerar os dados comportamentais que emergem como fenômenos apresentados pelo paciente, tudo aquilo que emerge como vivido, pois este é diferente para cada um; há uma maneira individualizada como cada um significa o diagnóstico/adoecimento e estas significações representam a forma como o indivíduo percebe a si e o mundo ao seu redor.

Dessa forma, o psicoterapeuta possibilita ao paciente a consciência de sua nova condição e limitações, a hierarquização de suas necessidades, o ajustamento criativo ao meio, de sorte a manter com este um contato mais nutritivo. Em acréscimo, examina os sintomas e formas de contato que emergem nesse contexto de hospitalização, inter-relacionando-os, na busca de compreender o sentido dos mesmos. Para isso, é necessário conhecer a história de vida do indivíduo, seu momento e sua maneira de estar no mundo.

CONTEXTUALIZANDO A CLÍNICA: A ASSISTÊNCIA NAS DIVERSAS ETAPAS DO TRATAMENTO

A escolha da Gestalt-Terapia como abordagem diz respeito a um olhar que busca não fragmentar o ser humano em patologias, mas estar a serviço dos recursos funcionais que ainda são possíveis de ser resgatados, em favor de um enfrentamento saudável do adoecimento. Desse modo, considerando que o processo do adoecer é comumente compreendido como desintegrador, oferece-se ao paciente uma nova visão: a de possibilitar percebê-lo como uma vivência transformadora.

De fato, como aponta Remen,

“[a] doença pode ser vista como uma abertura para novas possibilidades existenciais a partir do confronto com determinados impedimentos. Se o indivíduo não se permite mergulhar no próprio adoecimento e perceber o que ele quer dizer, dificilmente poderá experimentar como é esse processo. A exploração de si, o confronto com toda gama de bloqueios e cristalizações que participam do contato e da relação sujeito-ambiente deve surgir como um novo processo ativo e delineador de uma conscientização fluida, inteira na totalidade.” (REMEN, 1993 apud SILVA; BOAVENTURA, 2011, p. 40-41).

A conceituação gestáltica do adoecer compreende que este é um ajustamento criativo disfuncional, reconhecido como um percurso de crescimento a serviço de algo, podendo, muitas vezes, salvaguardar o indivíduo da insuportabilidade de determinadas experiências. Logo, uma enfermidade como o câncer pode ameaçar e/ou interromper a vida do indivíduo que, para poder viver, terá que ultrapassar o impacto do diagnóstico e enfrentar os tratamentos propostos (GASPAR, 2004).

É o momento em que o tempo pessoal se relativiza, mudanças ocorrem, as prioridades do cotidiano passam a ser outras, o objetivo maior tende a ser a recuperação da saúde; todavia, para poder lidar com isso, a pessoa terá de valer-se de seus recursos próprios internos e daqueles disponíveis no ambiente.

Silva e Boaventura afirmam:

“É importante tentar reativar nessas pessoas o desejo de viver. Na maioria das vezes, ao se aproximarem desses pacientes, os psicoterapeutas são depositários dos medos, dores, sofrimentos e angústias, que os paralisam frente ao mundo e a si mesmo. Esta é a figura fixa e cristalizada que temos disponível, e é com ela que iremos trabalhar, pois o medo da dor e do sofrimento impedem o crescimento humano através da evitação. O paciente percebe a sua condição e desvia sua atenção, impedindo-se de dispor de seus próprios recursos de enfrentamento, dificultando a tomada de consciência.” (SILVA; BOAVENTURA, 2011, p. 42).

Sendo assim, o trabalho com esses pacientes requer o acompanhamento psicológico nas diferentes etapas que poderão ser vivenciadas, dentre as quais se realçam:

1.Diagnóstico: momento em que há uma grande mobilização emocional, em que se percebe com frequência a angústia, a irritabilidade, o desespero, o medo, a tristeza, dentre outros sentimentos. As intervenções do gestalt-terapeuta podem ser psicoeducativas e psicoprofiláticas, objetivando o acolhimento, orientação e o resgate de uma rede de suporte do indivíduo em busca da reorganização egoica frente a essa nova condição.

2.Tratamento: o estado de confusão inicial vai-se desfazendo, o paciente tende a ir se organizando, experienciando o momento presente, vivido aqui-agora. Percebe-se que, em decorrência do significado dado à enfermidade e ao tratamento, é que tenderão seus modos de enfrentamento e uma adesão eficiente, uma vez que esse processo é permeado de crenças, sentimentos, fantasias, do conhecimento e informações que possui, dos medos e/ou ideias distorcidas sobre os mesmos.

3.Recuperação da saúde: período após a realização dos procedimentos necessários, como cirurgia, radioterapia, quimioterapia, em que o paciente entra na fase de controles periódicos; apesar de o indivíduo sentir-se bem, tende a apresentar medo e expectativa de uma recaída, com recidiva da doença.

4.Cronicidade e/ou terminalidade: fase em que não é mais possível a cura. O paciente entra em cuidados paliativos, objetivando o alívio dos sintomas e a preservação de sua dignidade. Busca-se o conforto e o bem-estar, que este possa continuar vivendo, até o final, com o máximo de autonomia e qualidade de vida possível, ao redor de seus entes queridos. É o tempo de proporcionar espaço para a expressão de sentimentos acerca da vida e da morte, do fechamento de situações pendentes, das despedidas. Nesse momento, é necessário adotar uma postura que nos possibilite confirmar a vida e encarar o morrer como um processo normal; não apressar nem adiar a morte; procurar aliviar a dor e outros sintomas angustiantes; integrar os aspectos psicológicos e espirituais nos cuidados do paciente; oferecer um sistema de apoio para ajudar os pacientes a viverem ativamente, tanto quanto possível, até a morte e oferecer um sistema de apoio para ajudar a família a lidar com a doença do paciente e com o seu próprio luto (PESSINI, 2001).

Como aponta Rehfeld (1991, p. 28-29) “[...] a doença precisa ser vista como a ‘abertura para novas possibilidades existenciais a partir do confronto com determinados impedimentos’”. O indivíduo deve se permitir mergulhar no próprio adoecimento e perceber o que ele quer dizer, ou como vem fazendo parte de sua vida, pois aquele organismo enfermo possui uma mensagem a ser decifrada (GASPAR, 2004).

A exploração de si mesmo, o confronto com toda a gama de bloqueios e cristalizações que participam do contato e da relação sujeito-ambiente devem surgir como um processo ativo e delineador de uma conscientização fluida, inteira da totalidade fenomenológico-existencial. Com a integração da atenção e da tomada de consciência, o paciente pode voltar e mobilizar seus recursos de enfrentamento que até então estavam indisponíveis, dando curso ao seu processo em si (GASPAR, 2004; SILVA; BOAVENTURA, 2011).

Nesse sentido, salienta Kiyan:

“É o amadurecimento, a transformação, a transmutação do adoecimento e o consequente contato com os recursos pessoais que faz a grande diferença entre somente lutar contra a doença ou transmutá-la. Logo, a abordagem gestáltica [...] busca ressignificar os sintomas, visando um funcionamento mais saudável do organismo como um todo. Neste sentido o trabalho gestáltico pretende um resgate da consciência do adoecer aqui-e-agora, considerando sua direta ligação com o ajustamento criativo e com o funcionamento saudável do organismo.” (KIYAN, 2006 apud SILVA; BOAVENTURA, 2011, p. 41).

O estado de adoecimento, assim, pode se revelar como fruto de relações cristalizadas, ausência de autoconfiança e autoestima. Entretanto, é fundamental que o paciente hospitalizado seja visto como portador de uma história pessoal que antecede a própria internação. E, por essa razão, esse estado de crise deve ser compreendido por todos os comportamentos e crenças que a história daquele paciente refletir (GASPAR, 2004).

Tomando essa via de reflexão é que se propõe traçar algumas correlações entre a visão gestáltica do Ciclo de Contato e os estágios pelos quais passam os pacientes, tendo como fundamento o estudo de Kübler-Ross (1996), que aponta uma configuração para compreender as experiências dos pacientes, após a notícia de uma grave enfermidade. Seu estudo fornece uma visão real da complexidade vivida pelo paciente diante de seu adoecimento e terminalidade.

Para essa autora, a negação e o isolamento se apresentam como a primeira reação do indivíduo à sua enfermidade. É quando o paciente nega a sua doença e a gravidade do seu estado. Recusa-se a falar sobre o assunto e tende a isolar-se.
Refletindo gestalticamente, a negação pode, num primeiro momento, ser produtiva, na medida em que permite ao paciente se retrair e proteger-se na fronteira de contato, contra a dor e a angústia iniciais. Observa-se que, mesmo na retração, há um acúmulo de energia armazenada que, posteriormente, poderá ser utilizada como uma via de ação e conscientização do adoecimento (GASPAR, 2004).

Nos momentos de raiva, as falas, muitas vezes, vêm carregadas de sentimentos de inconformismo e fracasso. O paciente tende a fazer exigências, reclamações, críticas aos atendimentos e a solicitar atenção contínua. Se for respeitado e compreendido, logo cessarão suas reivindicações. É importante tolerar a raiva, consciente ou não, do paciente. É preciso ouvi-la e suportá-la, sabendo que o alívio proveniente do fato de tê-la externado contribuirá para melhor aceitar esse momento atual que está experienciando. A raiva mobiliza uma tomada de atitude, e bloqueá-la é tornar algo indigesto, impedindo de ser processado sensorial e afetivamente (GASPAR, 2004).

Na barganha, o paciente tenta negociar sua cura, geralmente com Deus. Quase sempre almeja um prolongamento de vida ou deseja alguns dias sem dor ou sem males físicos. Na grande maioria dos casos, há uma luta desenfreada para controlar a difícil situação, em que as trocas entre fronteiras vão ganhando uma conotação vitimizada e camuflada por promessas de seguir o tratamento corretamente, tomar a medicação prescrita, aparentando “uma tentativa de adiamento” da aceitação da atual condição de adoecimento (GASPAR, 2004).

A depressão aparece quando o paciente não pode mais negar sua doença, quando começa a apresentar novos sintomas e tornar-se mais debilitado, não conseguindo mais esconder a sua realidade. Sua revolta e raiva cederão lugar a um sentimento de grande perda: perda da saúde, do bem-estar, da vida (PAULINI, 2007).

Na linguagem gestáltica, este poderá ser visto como um momento de intensa retração na fronteira e forte introspecção. Fazendo uma analogia com a curva de contato, esse momento pode configurar uma verdadeira percepção e conscientização do processo de adoecimento, uma vez que o paciente se dispõe a identificar e entrar em contato com a figura dominante (GASPAR, 2004).

Por fim, a aceitação. É quando não mais se sente depressão nem raiva. É o momento em que encontra paz e se aceita o que está acontecendo. Os momentos de silêncio tendem a ser maiores. Pode-se considerar que essa fase é uma experiência de awareness ampliada, na medida em que, experienciando medos, dúvidas e impasses, chega a hora de agir e contatar os recursos próprios diante do adoecimento (GASPAR, 2004).

Em consequência, a clínica aparece como tarefa desafiadora, porque pressupõe primordialmente uma atitude favorecedora do desvelamento daquilo que não se mostra por si mesmo. Ou seja, a clínica vai-se desenhando pelo espaço de revelação do outro em sua alteridade. E, ainda, pelo oferecimento de um espaço favorável de confiança, em que se possa experimentar com certa segurança, e tais sentidos do viver possam ser desvelados.

O fazer clínico apresenta-se enquanto promoção e busca pela emergência do Ser, pela ressignificação do modo de estar no mundo, direcionado na possibilidade de lançar um novo olhar sobre as experiências vividas. É desse modo que a ação clínica fenomenológico-existencial se constitui como movimento de mutualidade, no qual o cuidado para com o outro se dá através do encontro, do acolhimento e do diálogo em torno das tensões/conflitos expressos pelo sujeito, em suas experiências de sofrimento.

A partir dessa clínica, revela-se a importância de o processo do adoecer ser visto como uma experiência peculiar do indivíduo, repleta de liberdade, crente em sua capacidade de decidir sobre sua vida, escolhendo-a e por ela se responsabilizando (GASPAR, 2004).

De acordo com Forghieri (1993, p. 53), é nesse aspecto que se fundamenta a conceituação de saúde: é a capacidade de “[...] estabelecer articulações eficientes entre a amplitude e as restrições de nosso existir”.

Ao ser olhado como uma totalidade, em nível processual e dinâmico, pode-se favorecer ao indivíduo uma melhor qualidade do diálogo entre ele e seu mundo, numa constante busca de autorregulação organísmica, evitando-se prejuízos ao ajustamento criativo e cristalizações numa só polaridade de percepção de si mesmo e de si em relação ao meio.

A Gestalt-Terapia, fundamentada na relação entre paciente e terapeuta, abre possibilidades para “cuidar” e ressignificar o estado do adoecer, a fim de desencadear mudanças de percepção, das coisas, das pessoas e de si próprio. Para isso, a proposta gestáltica é a de incentivar o autossuporte, no sentido de que cada paciente se responsabilize e escolha o que quer fazer ao se perceber “adoecido”, onde paciente e terapeuta tecem um caminho possível, fazendo do adoecer uma experiência transformadora (GASPAR, 2004; SILVA; BOAVENTURA, 2011).

O gestalt-terapeuta busca a compreensão baseada no que é revelado pela situação, incluindo tanto o paciente quanto seu ambiente. Atua na situação experienciada, facultando que o paciente viva momentos de awareness, pois, como aponta Rudio (1998, p. 130), “[...] conhecer e compreender o mundo interior do cliente é conhecer e compreender os fenômenos que povoam a sua consciência tal como ele os conhece, compreende e sente”.

O atendimento psicológico a esses pacientes é realizado de modo a oferecer conforto e tranquilidade e, quando suas condições físicas permitem, estabelece-se um diálogo por meio do qual a relação de contato vai se fazendo e se refazendo, em suas múltiplas facetas.

As vivências do paciente são evocadas para serem progressivamente compreendidas, de sorte que este possa ter insights que lhe ajudem a alcançar a descoberta de novos significados para essa experiência. Dessa forma, mudado o significado, muda a percepção e, mudada a percepção, muda-se o modo de o paciente sentir a realidade e de se comportar diante dela.

A postura adotada deve ser, por conseguinte, de redução e escuta fenomenológica. Almeja-se o Encontro Dialógico, através da escuta, presença, aceitação do outro como este se mostra. Uma presença verdadeira, genuína, em que se olha para o paciente como ele realmente é e a partir do que está experienciando, nesse momento presente.

A postura fenomenológica se configura no reconhecimento e na valorização dos elementos e dos significados presentes na fala do paciente, desprovida de preconceitos. É necessário, portanto, aceitar o que está sendo revelado, sem medos, desqualificações ou qualquer outra variável que possa interferir no momento em que o paciente se desvela. Deve proporcionar abertura ao ser do outro, em que o paciente se sinta livre e à vontade para ser autêntico, procurando buscar sempre a conscientização interna do momento vivido e o bem-estar emocional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme a literatura pesquisada, observa-se que as significações múltiplas do câncer e a singularidade de cada caso sugerem a importância do apoio psicológico e de uma equipe de saúde bem integrada, pois os pacientes se encontram, em sua maioria, acometidos pelo sofrimento, medo e angústia, no seu desespero frente à doença, na sobrecarga de suas funções, dentre outros transtornos.

Pensando no contexto vivenciado por esses pacientes, é importante que se tenha clareza dos estágios e emoções que perpassam esse momento, para ajudá-los a superá-los e/ou experienciá-los da melhor maneira possível para eles, aqui-agora. É importante também conhecer os problemas biopsicossociais implicados no processo do adoecer e do morrer, para contribuir na busca de um sentimento de “completo bem-estar”.

O foco da intervenção em Psico-Oncologia deve estar nos pacientes, familiares e equipe e não somente na doença em si, uma vez que se presume que a boa comunicação entre esses atores é indispensável no decorrer da doença.

Não se pode perder de vista as problemáticas intrapsíquicas, sociais e físicas que envolvem o processo do adoecimento em diferentes etapas do tratamento, a fim de que o atendimento seja mais adequado e eficaz quanto possível.

Assim, com base nessas questões, verifica-se a necessidade de uma atitude humanizada, que dê abertura e conforto ao desvelamento da singularidade de cada pessoa, de cada paciente, tornando-se prioridade na construção de novas relações.

Contudo, foi possível perceber que tal problemática ainda precisa de contribuições e sistematizações que problematizem e discutam continuamente a ação clínica do psicólogo, na Oncologia, pelo prisma fenomenológico-existencial.

A partir da Abordagem Gestáltica, com sua perspectiva holística do processo de desenvolvimento humano, alicerçada numa teoria de autorregulação organísmica, onde o viver implica reconfigurações constantes, decorrentes desse ser-no-mundo, entende-se que a percepção do câncer pelo sujeito se dá por intermédio de suas construções, de seus relacionamentos consigo mesmo e com o outro. Nesse sentido, uma doença grave remete aos pacientes e familiares reflexões sobre questões como a morte, o sentido da vida, os limites do homem, as quais, até então, não faziam parte do seu mundo. Essa permanência da fatalidade faz com que o ser-no-mundo se sinta angustiado. É na angústia que o mundo surge diante do homem, aniquilando todas as coisas particulares que o rodeiam e, portanto, apontando para o nada. O homem sente-se e defronta-se com a possibilidade de finitude. Entretanto, é a angústia que reconduz o ser humano à sua totalidade, fazendo com que de seus medos e preocupações reconstrua o seu ser e passe a enxergar novos horizontes (KÜBLER-ROSS, 1996).

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Endereço para correspondência

Emily Suelen Antunes de Castro
Airte Miranda de Souza


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airlemiranda@gmail.com

 


Recebido em:10/04/2012

Aprovado em:04/07/2012