ARTIGO

Inclusão ou Exclusão de crianças e adolescentes no mundo do crime. Que questão é essa?

Exclusion or Enclosure of kids and teenagers in the world of the crime. Which question is this?

 

Antônio Vieira Vitória*

FAMATH - Faculdades Integradas Maria Thereza, Niterói - RJ.

Endereço para correspondência

 


RESUMO

Este estudo pretende trazer algumas interrogações que giram em torno das palavras inclusão e exclusão, ele vem analisar e problematizar algumas situações vividas no cotidiano de crianças e adolescentes, moradoras em Comunidades na cidade do Rio de Janeiro. Questionam-se ao longo deste artigo, fatores que levam a exclusão ou inclusão de crianças e adolescentes no mundo do crime, como os aspectos subjetivos que os levam a ingressarem ou serem introduzidos na criminalidade. Esta análise conta com o apoio de princípios filosóficos e psicológicos que orientam um campo de possível intervenção. Neste percurso investigativo, a partir do material que se levantou em livros, documentários, jornais, filmes e outros se focaliza a fala dos diversos atores sociais (crianças, adolescentes e jovens das classes pobres) buscando revelar alguns caminhos que possam dirigir esses atores a sua não adesão ao mundo do crime.

Palavras-chave: Crianças e adolescentes; Inclusão e Exclusão; Psicologia.


ABSTRACT

This I study is going to bring some interrogations that rotate around the words enclosure and exclusion, he is going to analyze and complicate some situations lived in the routine one of kids and teenagers, inhabitants in shanty towns in the city of the Rio de Janeiro.  They question itself to the long one of this article, factors that cause to exclusion or enclosure of kids and teenagers in the world of the crime, as the subjective aspects that cause them to will enter or will be introduced in the criminality. Our analysis count with the support of psychological and philosophical beginnings that orient a field of possible intervention.  In this journey investigative, from the stuff that itself raised in books, documentary, periodic, film and others itself focuses the speech of the diverse social actors (kids, teenagers and youths of the poor classes) seeking reveal some roads that can drive those actors to their not adhesion to the world of the crime.

Keywords: kids and teenagers; Enclosure and Exclusion; Psychology.

 

INTRODUÇÃO

O presente estudo vem analisar e problematizar alguns trabalhos que foram feitos com moradores de Comunidades1 na cidade do Rio de Janeiro. Essas ações estão voltadas para um tema em evidência na atualidade e que tem relação com a exclusão ou inclusão de crianças e adolescentes no mundo do crime e com os aspectos subjetivos que levam esses jovens a ingressarem ou serem introduzidos na criminalidade.

O título dado a este trabalho: "Inclusão ou Exclusão de Crianças e Adolescentes no Mundo do Crime. Que Questão é Essa?" Por si só provoca uma análise reflexiva. Muitos podem pensar que quando se faz referência a inclusão, pretende-se relacioná-la a um sentido de positividade como inclusão em educação, por exemplo. Tem-se a intenção de evidenciar o que pode parecer paradoxal. Mas é paradoxal? O título ficaria melhor: "Exclusão Social de Crianças e Adolescentes e sua inclusão no Mundo do Crime. Que Questão é Essa?". Quando se faz referência a palavra inclusão, o que se deseja com o título é discutir sobre a introdução de crianças e adolescentes no mundo do crime. Este trabalho versa sobre o por que de crianças e adolescentes estarem introduzidas e implicadas no mundo do crime.

Falar sobre exclusão ou inclusão no mundo do crime tem múltiplos e variados sentidos. Este trabalho pretende abordar aspectos como o medo, a violência e a manipulação desses sentimentos, por espetáculos vendidos pela mídia, por discursos de políticos, narcotraficantes, policiais, jovens que vivem na marginalização. Mesmo que alguns desses discursos estejam voltados para liberdade, segurança pública, solução imediata para fome, pobreza, educação e muitos outros fatores.

A motivação principal para o presente estudo funda-se nos impactos provocados por documentários como: "Falcão - Meninos do Tráfico", "Ônibus 174", "Notícias de Uma Guerra Particular" e noticiários de jornais como: "O Dia", "O Globo" e, "O Extra" entre outros. Eles apresentam situações reais do dia a dia de vários grupos de jovens moradores de Comunidades do Brasil e principalmente do Rio de Janeiro, onde pretendo focar o meu trabalho. Eles mostram a existência de um grande número de crianças e adolescentes que vivem do crime, principalmente do tráfico de drogas.

Nesses documentários, citados acima, pode-se ver que os assassinatos atingem principalmente adolescentes e adultos jovens do sexo masculino, de cor negra, com baixa escolaridade e pouca ou nenhuma qualificação profissional, moradores da periferia das metrópoles das regiões mais ricas do país, retratando toda a corrupção e narcotráfico vivido em pleno Estado do Rio de Janeiro, a cultura sendo desqualificada e, o momento das crianças e adolescentes irem à escola, brincar com os colegas, ler um livro, é deixado para trás. Neste vazio é colocada em prática a venda de drogas. A criança e o adolescente expressam o prazer de ter uma arma em mãos e ostentar a bandeira de uma facção criminosa. Os relatos se passam nos cenários de Comunidades como: Rocinha, Vidigal, Maré, Alemão, Galo, entre outros bairros.

Esse trabalho não é sobre Direitos Humanos, nem sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e, como também não é um trabalho criminalístico. É sobre o modo de como um dia olhei o envolvimento de crianças e adolescentes com o mundo do crime. Os direitos humanos e o ECA foram tomados como referências que propiciam, problematizar e sinalizar, para que a práxis psicológica, esteja voltada para a condição de possibilidades da construção, em conjunto com outras ciências do conhecimento, de "alicerces firmes" que não se deixem abalar por diversas situações do cotidiano que envolvem crianças e adolescentes nas Comunidades do Rio de Janeiro. Momentos históricos que denotam de alguma forma, a emergência de algumas classes chamadas de ‘perigosas'. Trata-se de uma história de crianças e adolescentes pobres; da história de sujeitos pobres que, durante o movimento higienista, subiram os morros cariocas, produzindo-se o que hoje se denomina Comunidades; uma história vista e analisada pela ótica da Psicologia.

 

1 - MOVIMENTOS HISTÓRICOS SOBRE A EXCLUSÃO SOCIAL

1.1 – Como a sociedade reprime o crime

Sabe-se que pessoas acusadas de crimes já iam para a prisão em tempos antes de Cristo, mas naquela época ainda não existia um sistema penitenciário, nem um período para a pena de reclusão, como conhecemos hoje. Hamurabi, século XVIII a.C., na Mesopotâmia, criou um código penal, determinando regras de vida e de propriedade, e aplicando a lei a todos os súditos do império. Na Antiguidade, muitas vezes a punição seguia a Lei do Talião, do "Olho por olho, dente por dente", e "as penas chegaram a ser rigorosas". Quem matava alguém era morto, quem desmoralizasse outra pessoa era desmoralizado e assim por diante. Segundo Foucault (2000): "Minha hipótese é que a prisão esteve desde sua origem, ligada a um projeto de transformação dos indivíduos. Habitualmente se acredita que a prisão era uma espécie de depósito de criminosos" (p.131).

Em meados do século XIX na França, houve o desaparecimento dos suplícios, a punição física em praça pública desaparece, o castigo não mais inclui a dor. Entretanto desde esta época, o poder sobre o corpo, ainda não deixou de existir inteiramente. Em Foucault (1999):

"Sem dúvida, a pena não mais se centralizava no suplício como técnica de sofrimento; tomou como objeto a perda de um bem ou de um direito. Porém castigos como trabalhos forçados ou prisão – privação pura e simples da liberdade – nunca funcionaram sem certos complementos punitivos referentes ao corpo; redução alimentar, privação sexual, expiação física, masmorra. Conseqüências não tencionadas mas inevitáveis da própria prisão? Na realidade, a prisão nos seus dispositivos mais explícitos, sempre aplica certas medidas de sofrimento físico...A pena se dissocia totalmente de um complemento de dor física. Que seria então um castigo incorporal?" (p. 18.)

Na reportagem do programa Fantástico de 14 de maio de 2006, na rede Globo de televisão, podemos assistir a: rebeliões nos presídios; ataques de bandidos contra policiais; ônibus queimados, entre  outros, a população em pânico, medo, muito medo. Esta mesma reportagem mostra como a população carcerária cresceu e se organizou, se organizou tanto que inverteu a situação, os presos, determinam o que acontece nas ruas e os cidadãos livres são obrigados a ficarem presos em suas próprias casas. De acordo com Foucault (1999):

"Desde o começo a prisão devia ser um instrumento tão aperfeiçoado quanto a escola...e agir com precisão sobre os indivíduos. O fracasso foi imediato e registrado quase ao mesmo tempo que o próprio projeto. Desde 1820 se constata que a prisão, longe de transformar os criminosos em gente honesta, serve apenas para fabricar novos criminosos ou para afundá-los ainda mais na criminalidade" (p.131 – 132).

O sistema penitenciário cria um exército de inimigos dentro da sociedade. Excluir não elimina, ao contrário, a parte excluída tende a crescer, a se fortalecer cada vez mais. Foucault (1999) chama atenção para as várias formas de suplício e encarceramento, fala de um personagem chamado "Damiens", condenado pela justiça dois séculos antes de nossa época. Este personagem teve seu corpo puxado e desmembrado por quatro cavalos. O autor aponta para as formas de como os corpos dos condenados, ficavam em poder de uma justiça que fazia com eles o que bem se entendia.

Se pararmos para pensar nos noticiários que estão presentes no nosso cotidiano como a manchete do jornal: O Globo do dia 8 de fevereiro de 2007, que conta a morte de um menino chamado João Hélio no dia 7 do mesmo ano e mês, que teve seu corpo puxado e desmembrado não por quatro cavalos como Damiens o personagem do livro de Foucault (1999), mas por um carro nas ruas da cidade do Rio de Janeiro, iremos perceber que esse fato também foi um verdadeiro suplício onde os assassinos não deram ouvidos aos pedidos de socorro da vítima.

São manchetes como essas que nos levam a refletir sobre como pessoas inocentes ficam em poder de uma população de marginalizados, que lhes tiram o direito de defesa e ainda lhes privam do direito de viver. A situação já se inverteu totalmente? Será que as prisões não são bastante punitivas? É justo que o menino João Hélio seja condenado pelo tribunal do tráfico e sofra mais que os outros homens? Concorda-se com Foucault (1999) - o poder sobre o corpo, e o suplício ainda não deixaram de existir completamente.

Supõe-se que nos dois tipos de população, a marginalizada e a não marginalizada, existe uma forma de ver, uma forma de pensar que sempre elimina, de sempre excluir o que lhes incomoda. Na sociedade de classe média e alta, como na prisão se produzem modos de subjetivação e um dos seus efeitos é o da exclusão. Todos não são capazes de abrigar o que lhes incomoda, ou o que não querem ver; é como mesmo sem perceber estão sempre excluindo alguém; é como sentir medo de ter algo diferente e tão próximo. Quem de nós nunca sentiu pelo menos uma vez na vida o desejo de punir alguém que cometeu um crime bárbaro, com os mesmos métodos ou piores que foram usados pelo criminoso? Ao pensar que dessa maneira achamos que estamos fazemos alguma espécie de justiça, quando na verdade estamos caindo numa armadilha de responder a violência com a violência e assim produzindo delinqüência. Foucault (2000) diz: "A prisão fabrica delinqüentes, mas os delinqüentes são úteis tanto no domínio econômico como no político. Os delinqüentes servem para alguma coisa" (p.132).

Uma pesquisa sobre a origem do desenho das identidades dos sujeitos no cotidiano do drama urbano, realizada por Mello (2006), se refere às camadas subalternas:

"...como conciliar a democracia com todas as violências e violações de direitos mais elementares que parecem constituir o quotidiano de alguns segmentos da população? Como constituir e manter representações positivas de si mesmo, quando elas são sistematicamente depreciadas pela sociedade como um todo?" (p.129).

Para a autora, os elementos geradores de exclusão e da indiferença pelas atitudes violentas, é o próprio cotidiano nas grandes cidades, pois elas acobertam uma impunidade de crimes que são cometidos contra crianças e adolescentes, onde as populações dos mais pobres são estigmatizadas e sofrem preconceitos, em que a mídia está envolvida na manutenção e geração dos estereótipos. 

Sawaia (2004), diz que a violência social tem muitas formas de se expressar. Explica sobre o medo da violência e a manobra político-ideológica deste sentimento, acoplado ao discurso da segurança pública:

"O medo da violência opera no sentido de incentivar a aceitação e a submissão ao cerceamento da liberdade, haja vista o clamor por mais vigilância, encarceramento, policiamento e a desvalorização da civilidade e da cortesia, que acompanha os momentos de trauma social, como o que ocorre, atualmente com os americanos que por medo do terror, entregam-se, voluntariamente, ao patriótico trabalho de espiar....com muitos de nós que apoiamos a pena de morte e a redução da idade penal" ( p. 21).

Ainda a autora afirma que nosso cotidiano é marcado por injustiças e crueldade, crime organizado, crime hediondo, banditismo político, violência moral (trabalho infantil, a exploração, a escravidão e a fome). A ideia do autor é que não estamos livres de sermos vítimas ou de nos revoltarmos contra essa violência que está sempre em evidência na mídia que nos vende como um espetáculo, como diz a autora:

"Quem nunca foi cometido por cólera, raiva ou pelo desejo de agredir o autor de crime hediondo contra inocentes ou não se enfureceu alguma vez com a ‘benevolência' da justiça para com eles ou, não foi tomado por uma espécie de cegueira moral, uma incapacidade de avaliar e superar as evidências comparativas entre pecadores e vítimas dos pecados, para usar uma linguagem moralista da moda? Do ponto de vista da vítima, não há bom bandido ou motivo justo de violência, há simplesmente sofrimento e desespero, paixões, ressalte-se, plenamente condizentes com o vivenciado" (SAWAIA, 2004, p. 22 – 23).

Para Foucault (1999),permaneceu na sociedade mecanismos modernos da justiça criminal:

"O afrouxamento da severidade penal dos últimos séculos é um fenômeno bem conhecido dos historiadores do direito. Entretanto, foi visto, durante muito tempo, de forma geral, como se fosse fenômeno quantitativo: menos sofrimento, mais suavidade, mais respeito e "humanidade". Na verdade, tais modificações se fazem concomitantes ao deslocamento do objeto da ação punitiva...Se não é mais ao corpo que se dirige a punição, em suas formas mais duras, sobre o que, então se exerce?...Pois não é o corpo, é a alma. À expiação que tripudia sobre o corpo deve suceder um castigo que atenue, profundamente, sobre o coração, o intelecto, a vontade, as disposições...Mably formulou o princípio decisivo: 'Que o castigo, se assim posso exprimir, fira mais a alma do que o corpo'" ( p. 18).

Foi com o aparecimento do capitalismo, que surgiu a necessidade de se proteger a riqueza, de acordo com Foucault, (2000): "Já que a sociedade industrial exige que a riqueza esteja nas mãos não daqueles que as possuem mas daqueles que permitem a extração do lucro fazendo-a trabalhar, como proteger essa riqueza?" (p.132 – 133). Surgia a necessidade de uma produção de subjetividade no povo que o constituísse, Foucault (2000): "como um sujeito moral, portanto separando-o da delinqüência" (p.133). Mostra-se, logo, para os pobres e não somente para os ricos, que esses delinqüentes eram extremamente perigosos, responsabilizados por todos os tipos de vícios.

Michel Foucault (2003) nos remete ao início do século XIX, para mostrar o que ele denominou de ‘sociedade disciplinar' a sociedade contemporânea, em diferentes países do mundo e da Europa. O autor nos mostrou como e quais são as formas de práticas penais que caracterizavam essa sociedade e, segundo Foucault (2003): "...quais as formas de poder subjacentes a essas práticas penais; quais as formas de saber; os tipos de conhecimento; os tipos de sujeito do conhecimento que emergem, que aparecem a partir e no espaço desta sociedade disciplinar que é a sociedade contemporânea" (p. 79).

Segundo o autor, na França ocorreram muitas e intensas modificações penais, sem que o conteúdo da lei penal tenha-se modificado e cita que uma reelaboração da lei penal pode ser encontrada em teóricos como: Beccaria, Bentham, Brissor e em legisladores que são autores do 1º e 2º Código Penal francês da época revolucionária.

Para Foucault esses autores definiram como princípio fundamental do sistema teórico penal que o crime não devia ter mais nenhuma relação com uma falta moral ou religiosa. O crime ou infração penal seria uma ruptura com a lei civil, que era estabelecida no cerne de uma sociedade pelo legislativo do poder político. Como diz o autor:

"Para que haja infração é preciso que haver um poder político, uma lei e que essa lei tenha sido efetivamente formulada. Antes da lei existir, não pode haver infração. Segundo esses teóricos, só podem sofrer penalidades as condutas efetivamente definidas como repreensíveis pela lei" (FOUCAULT, 2003, p. 80).

Havia ainda um segundo e um terceiro princípio, o segundo princípio é onde essas leis positivas estabelecidas pelo poder político no cerne da sociedade, somente seriam leis apropriadas, se elas representassem o que era útil e definia como digno de repreensão, o que era considerado maléfico. O terceiro princípio se concluía dos dois primeiros, Foucault (2003): "uma definição clara e simples do crime" (p. 80). O crime era algo que prejudicava a sociedade, seria um estrago social e não algo parecido com o pecado ou falta.

Conforme Foucault (2003):

"Há por conseguinte, também, uma nova definição do criminoso. O criminoso é aquele que danifica, perturba a sociedade. O criminoso é o inimigo social... Há uma identidade entre o crime e a ruptura do pacto social. O criminoso é um inimigo interno. Esta idéia do criminoso como inimigo interno...no interior da sociedade...é uma definição nova e capital na história da teoria do crime e da penalidade" (p. 81).

As classes pobres, segundoFoucault (2000): "quanto mais eram vítimas da delinquência, mais dela tinham medo" (p.133). O criminoso era considerado inimigo da sociedade e seu crime era determinado como um prejuízo social. A lei penal devia somente admitir a retaliação do prejuízo causado à sociedade, seguindo com Foucault (2003):

"A lei penal deve apenas permitir a reparação da perturbação causada à sociedade. A lei penal deve ser feita de tal maneira que o dano causado pelo indivíduo à sociedade seja apagado; e isso não for possível, é preciso que o dano não possa ser recomeçado pelo indivíduo em questão ou por outro. A lei penal deve reparar o mal ou impedir que males semelhantes possam ser cometidos contra o corpo social... Daí decorrem para esses teóricos, quatro tipos possíveis de punição..." (p.81- 82).

Jeremy Bentham deu uma importante ‘contribuição' para o desenvolvimento do sistema penal, no século XVIII, ao criar um modelo arquitetônico, chamado de Panóptico, um aparato onde um vigia é colocado em um lugar central para controlar todas as celas. Foucault (1999) fez uso deste modelo para falar do poder disciplinar, assegurando que este procedimento do Panóptico é um modo de subjetivação de controle constante bastante econômico, pois se efetiva através de uma cadeia de olhares vigilantes que acaba sendo interiorizada pelos indivíduos, onde todos vigiam e todos são vigiados. Vigia-se até a si próprio.

Foucault (1999) segue com a ideia de que a prisão não é somente um lugar para a pena ser executada, é também um local onde se observa os indivíduos que ali se encontram. Sendo assim, o objetivo do Panóptico, não é apenas vigiar, mas conhecer o comportamento, suas disposições profundas, sua progressiva ‘melhora' é, sobretudo um lugar de produção de subjetividades. Portanto, supõe-se que a prisão se tornou local de formação de um saber clínico sobre o sujeito, no qual a figura de um especialista da prática ‘psi' seria indispensável.

Em Foucault (2000), o policial ou o alcagüete, se tornou uma profissão necessária nesse sistema, onde "a partir do momento que alguém entrava na prisão se acionava um mecanismo que o tornava infame, e quando saía, não podia fazer mais nada senão voltar a ser delinqüente". Op. cit. (p.133). A delinqüência era e ainda hoje é associada a classes mais pobres. Assim as prisões além de necessitarem da atuação de um profissional, o policial, servia para a separação, para a reclusão ou detenção dos delinqüentes, dos ‘perigosos', que deveriam ser excluídos da sociedade industrial, e o que se vê hoje em dia é que nada disso mudou, segundo Foucault (2000):

"A delinqüência era por demais útil para que se pudesse sonhar algo tão tolo e perigoso como uma sociedade sem delinqüência. Sem delinqüência não há polícia. O que torna a presença policial, o controle policial tolerável pela população se não o medo do delinqüente? Você fala de um ganho prodigioso. Esta instituição tão recente e tão pesada que é a polícia não se justifica senão por isto. Aceitamos entre nós essa gente de uniforme, armada enquanto nós não temos o direito de o estar, que nos pede documentos, que vem rondar nossas portas. Como isso seria aceitável se não houvesse os delinqüentes? Ou se não houvesse, todos os dias nos jornais, artigos onde se conta os quão numerosos e perigosos são os delinquentes?" (p. 137, 138).

Faz-se necessário associar o que temos falado até o presente momento, com o surgimento da figura do pobre como ‘perigoso', pois, desde a sociedade da revolução industrial, até a sociedade que habita os bairros de classe média e alta em algumas cidades do Rio de Janeiro, estamos falando de uma sociedade excludente, uma exclusão se dá nos níveis: econômico, social e através do sistema judiciário criminal e de segurança privada.

 

1.2 A criança, o adolescente e o Poder Público

Comandadas por médicos e juristas, as políticas públicas voltadas para a infância no Brasil, ganharam corpo nas primeiras décadas do século XX. Foi sancionado o primeiro Código de Menores em 1927, esse código é que levou a criação de Juizados de Menores em quatro cidades do Brasil: Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre e Recife. Fato esse considerado como um marco na história da infância e da juventude no Brasil. O Estado assumiria a função de cuidar da criança, se por acaso esta não tivesse ninguém que a cuidasse.

O órgão responsável, no Estado do Rio de Janeiro, pela execução das medidas socioeducativas aplicadas pelo poder judiciário aos adolescentes que praticam ato infracional é o Departamento Geral de Ações Socioeducativas (DEGASE). Ele foi criado em 1993, com o intuito de atender as exigências do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e, assim, facilitar as políticas de atendimento ao adolescente em conflito com a lei, dando prioridade à educação, à integração e à inclusão. A instituição recebe, atende e acompanha os adolescentes (entre 12 e 18 anos incompletos) apreendidos por prática de ato infracional. Para tal conta com: Centro de Triagem e Recepção (CTR); plantão interinstitucional; polos de Liberdade Assistida; Projetos para Tratamento de Usuários de Drogas; Centro Profissionalizante; e Centro de Recursos Integrados de Ação ao Menor (CRIAMs).

Com o ofício do Poder Judiciário o adolescente é encaminhado ao CTR, após a determinação da medida do Juiz responsável pelo local onde se cumprirá a Medida Social Educacional (MSE). Em janeiro de 2001 foi inaugurado, pela Superintendência de Saúde da Secretaria de Estado de Justiça, o Núcleo de Avaliação Biopsicossocial Anita Heloisa Mantuano. Esse núcleo tem como objetivo, traçar um perfil do adolescente em conflito com a lei e assim subsidiar programas de educação e saúde individualizados. Os adolescentes de um modo geral, quando encaminhados ao CTR teriam por obrigação passar pelo Núcleo para Avaliação Biopsicossocial do adolescente, que deveria entrevistar todos os adolescentes apreendidos, mas, aqueles que eram apreendidos num final de semana e não recebiam MSE de internação, eram liberados e não faziam Avaliação Biopsicossocial (ABPS).

A ABPS do adolescente é um exame realizado por uma equipe multidisciplinar, no qual se busca estabelecer um perfil do adolescente, as suas aptidões e interesses educacionais. Uma equipe multidisciplinar baseada nessa avaliação propõe encaminhamentos, como por exemplo: escolarização, assistência médica, psicológica, odontológica, qualificação para o trabalho entre outras ações. Tendo em vista um adequado cumprimento da medida socioeducativa e a futura volta ao convívio familiar. Este exame serve também como um registro daqueles adolescentes que não recebiam uma medida de internação naquela apreensão, mas que posteriormente reingressam no CTR, através de nova apreensão.

No documentário: "Ônibus 174", sabe-se que a maior parte de crianças e adolescentes apreendidas pela Polícia no Rio de Janeiro, era é procedente da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) e o motivo mais frequente da apreensão é o tráfico de drogas seguido de outros atos como: furto e roubo. Mostrando assim, que é muito difícil solucionar o problema das crianças e dos adolescentes inseridas no mundo do tráfico de drogas na cidade do Rio de Janeiro. Neste documentário, observa-se que as crianças e os adolescentes apreendidos nas unidades socioeducativas apresentavam baixa escolarização, evasão escolar e repetência, fatos que não mudaram até os dias de hoje, basta assistir a outros documentários que já citei neste trabalho.

Se houver uma redução de maioridade penal, o menor de 18 anos de idade responderá pelos crimes ou contravenções penais que pratica da mesma forma que um maior de 18 anos de idade, sendo, inclusive, processado, condenado e, se o caso, cumprir pena em presídios. Precisa-se refletir que é necessário levar em consideração que  um adolescente com 12 anos de idade é ainda considerado  como pessoa em condição peculiar de desenvolvimento, necessitando,  consequentemente  de proteção diferenciada, especializada e integral, dessa forma  a redução de maioridade penal pode não ser relevante , visto que há discrepância entre as faixas de desenvolvimento.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 104), a Constituição Federal (art. 228) e as leis infraconstitucionais, como por exemplo, o Código Penal (art. 27), dizem que a maioridade penal começa aos 18 anos, mas, na prática é tudo diferente, porque as medidas socioeducativas aplicadas aos menores (adolescentes de 12 a 18 anos de idade) são como se fossem penas, ou seja, penas iguais as que são aplicadas aos adultos, logo é forçoso concluir que a maioridade penal, no Brasil, começa aos 12 anos de idade.

Faz-se necessário dizer, que a internação em estabelecimento educacional, a inserção em regime de semiliberdade, a liberdade assistida e a prestação de serviços à comunidade, algumas das medidas previstas no Estatuto da Criança e do adolescente (art. 112), são iguais ou muito semelhantes àquelas previstas no Código Penal para os adultos que são: prisão, igual à internação do menor; regime semi-aberto, semelhante à inserção do menor em regime de semiliberdade; prisão albergue ou domiciliar, semelhante a liberdade assistida aplicada ao menor; prestação de serviços à comunidade, exatamente igual para menores e adultos.

O legislador ao criar as medidas socioeducativas, tentou tratar os menores de uma maneira diferenciada, reconhecendo que eles são pessoas em desenvolvimento. Sendo assim, essas medidas, eram para serem aplicadas no sentido de recuperar e reintegrar o jovem à comunidade, mas na realidade isso não ocorre, pois quando são executadas se transformam em verdadeiras penas, completamente ineficientes, e assim gerando muita impunidade. As medidas socioeducativas, no processo de sua execução, se transformam em castigos, revoltando menores e maiores de idade, e como ocorre no sistema penitenciário adotado para os adultos, não recuperam ninguém.

O Juizado de Menores e o DEGASE foram criados, e permaneceram sendo entendidos, como os órgãos mais indicados para solucionarem os problemas de uma infância desassistida, o "problema do menor", porém, seus modos de funcionamento nunca conseguiram dar conta do intento inicial. Suas práticas se mostraram repletas de ações de extrema dureza repressiva, elegendo a internação como prática predominante, tanto nos casos das chamadas ‘crianças perigosas', quanto para as denominadas ‘em perigo'. A institucionalização de menores, através da sentença de abandono e internação foi construindo uma noção específica acerca do ‘menor' que divergia da idealização social da "criança".

Nas filmagens do documentário "Notícias de Uma Guerra Particular", os tiroteios; internações; prisões; remoções de corpos; confissões de traficantes; e detalhes da estrutura do tráfico e do comércio de drogas nas Comunidades do Rio de janeiro, confirmam a prática de internação que começou nos leprosários, permaneceu nos manicômios e presídios até os dias de hoje. Os manicômios e principalmente os presídios se tornaram em instituições fechadas, longe dos olhos da sociedade. A exclusão passou a ser a forma mais imediata de punir, de corrigir, de curar. Guattari (1999) diz: "A produção maquínica de subjetividades pode trabalhar tanto para melhor como para pior" (p.05). Um dos grandes problemas destas instituições é que o isolamento cria uma população cada vez maior de marginalizados. Além disso, a exclusão facilita o surgimento de comunidades de delinqüentes cada vez mais independentes e organizadas.

Será que de alguma forma todos nós, nos sentimos excluídos? Quais os sentidos da palavra exclusão? É preciso refletir mais sobre a palavra exclusão e respeitar a pluralidade de seus sentidos históricos, sociais e psicológicos. Será que é correto falar da exclusão como se ela fosse uma coisa, um objeto, um fenômeno fácil de entender? Será que a representação fiel desta palavra contém significados tão diferentes, que sempre quando a pronunciamos, estamos falando sobre a mesma coisa? Sabemos que a palavra trata de: algo negativo; algo que não desejamos; que recusamos, rejeitamos e expulsamos. A palavra nos remete a alguma forma de não relação.

 

2- A HISTÓRIA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE EM NOSSA SOCIEDADE.

Para se entender a realidade da exclusão de crianças e adolescentes na nossa cultura, é necessária uma análise de como evoluiu a história social da criança e do adolescente e a história da nossa cultura com relação à criminalidade, ao tráfico e ao uso de drogas.

Para Áries (1981), no século XII a duração da infância era reduzida. Ao apresentar alguma independência física, a criança era inserida no mundo dos adultos, sendo consideradas capazes de dispensar a ajuda das mães ou das amas. Elas eram transformadas em adultos jovens, sem vivenciar uma "infância". A socialização da criança não era controlada pela família. A educação era garantida pela aprendizagem, uma vez que este processo se desenvolvia através de realização de tarefas junto com adultos. A presença da criança na família era insignificante.

Áries (1981) destaca que a partir do final do século XVII, ocorreram mudanças no contexto familiar e, por conseguinte, em relação à criança. A escola passa a substituir a aprendizagem como meio de educação. A escolarização torna-se, nos séculos XVIII e XIX, uma modalidade de enclausuramento. Ainda segundo Áries, juventude significava a força da idade, pois até o século XVII, não era feita qualquer distinção entre infância e adolescência; não havia limitação da infância pela puberdade; só se saía da infância ao sair da dependência.

A família cumpria uma função, assegurava a transmissão da vida, dos bens e dos nomes, mas não penetrava na questão da sensibilidade, e a aprendizagem afastava os laços afetivos entre pais e filhos. Este afastamento dos laços afetivos não está tão distante assim da contemporaneidade, e é percebido com clareza por Giddens (1993), em sua análise das relações familiares. As mudanças dos papéis sociais e familiares tornam-se inevitáveis, frente à crescente interdependência causada pela globalização da economia. No caso específico do Brasil, os ajustes econômicos ocorridos nos últimos dez anos têm colocado a família brasileira em acelerado processo de empobrecimento, alterando profundamente sua estrutura, seu sistema de relações sociais, papéis, modelos e formas de reprodução social inevitável diante da crescente incorporação da mulher no mercado de trabalho e contracepção cada vez mais assegurada. Torna-se evidente uma questão estrutural na família brasileira moderna.

Autores como Áries (1981) e Giddens (1993) já sinalizavam que a exclusão se iniciaria dentro da própria família, instituição que tinha estruturas diferenciadas das que adotou na contemporaneidade, embora conservando similaridades quanto aos dias atuais, carregando em seu bojo traços de exclusão pela ausência de afetividade.

O contexto social em que a exclusão é um traço tão característico, e que ensejou este trabalho, tem acentuado as desigualdades sociais e os avanços das políticas sociais voltadas para a proteção integral à criança e adolescentes no Brasil. Partir do princípio de que todas as crianças e adolescentes têm direitos significa desafiar muitas das crenças arraigadas no mundo. Há apenas cem anos, as crianças ainda eram tratadas como propriedades, e colocadas para trabalhar assim que fossem fisicamente capazes não diferentemente daquilo que se vê hoje em dia, em que crianças e adolescentes são objetos de exploração. Segundo Mello (2006):

"Crianças e jovens, no Brasil, são objeto de exploração desde os tempos coloniais. Se durante a escravidão era legal o uso da criança para todo o tipo de trabalho, o trabalho semi-escravo de crianças, embora ilegal, ainda é prática comum no país...Só o desrespeito a direitos trabalhistas e a submissão a trabalho escravo afeta, no Brasil, 65000 jovens...Estas cifras são impressionantes para o final de um século que reconheceu e fez valer alguns direitos básicos dos cidadãos" (p.129 -130).

Assim, destaca-se que os enormes problemas de igualdade e de justiça no debate sobre políticas públicas ainda estão bem ausentes nos dias de hoje. Os cidadãos vivem sob um modo de governo em que existe um grande domínio dos discursos que exigem punições mais agressivas e violentas em detrimento da aplicação das leis.

Mello (2006) nos remete a ideia de que no campo o trabalho e pobreza infantil andam juntos, entretanto, nas grandes cidades por ter o maior número de pessoas concentradas em zonas urbanas, a exploração de crianças, além de não ser muito diferente fica mais evidente. Crianças e adolescentes mantém a sobrevivência de muitas famílias com seu trabalho que é geralmente informal, já que não são registrados e não tem seus direitos trabalhistas, ou seja, as autoridades fecham os olhos para o trabalho ilegal dessas crianças e adolescentes. Segundo o autor:

"Entre o trabalho e as escolas, que acabam por expulsá-las, após anos de repetidos fracassos, as crianças não contam com muitas alternativas para ter acesso aos rudimentos da educação formal e menos ainda a expressões culturais não banalizadas pela mídia. Ficam desse modo, excluídas desde cedo de um dos direitos de cidadania que é a educação" (p.131).

Nos documentários: "Falcão - Meninos do Tráfico" e "Ônibus 174", um aspecto observado são as relações familiares e as relações com a sociedade. Mesmo que a relação desses jovens com a mãe, seja de amor, ela se revela em uma relação de desamparo de mãe, de pai, de educação. Ficam expostos ao amparo dos traficantes, por exemplo. Os pais na maioria das vezes terão que deixar os filhos em casa para irem trabalhar. Muitos não têm pai, porque ele foi embora, ou porque morreu. Ficam assim largados pelas ruas, quando não são adotados por traficantes ou alugados a eles, o caminho mais rápido para ingressarem no "mundo do crime". No jornal Extra de sexta-feira, do dia 21 de março de 2008, podemos ler a seguinte notícia:

"Pai alugou filho para ‘mula'... Ele recebeu R$50 de traficante da Mangueira pelo menino de 4 anos para evitar ser parado pela polícia...Morador do Morro da Mangueira. Y., de 47 anos foi preso ontem por alugar o próprio filho..." (p. 9).

Os documentários, notícias de jornais e telejornais, nos levam a refletir sobre a questão do abandono familiar, quando constatam que as crianças e adolescentes que habitam as Comunidades do Rio de Janeiro encontram os cuidados e proteção no seu "fiel" (o traficante), sem sofrerem exclusão, se sentem incluídas naquela comunidade. Quem proporciona condições de possibilidades para essas crianças e adolescentes sentirem-se felizes e para elas se tornarem pessoas que agem em gratidão a esses traficantes por se sentirem assim, segundo as palavras expressas no documentário: "Falcão - Meninos do Tráfico", por esses meninos e adolescentes, é o "fiel". Assim eles dizem: "quando crescer quero ser bandido, quero ser como o meu ‘fiel'! O meu maior ídolo é o meu ‘fiel'". Eles fazem tudo o que o seu "fiel" lhes pede.

 

2.1 - A exclusão de crianças e adolescentes

A exclusão de crianças e adolescentes de exercerem sua cidadania é um acontecimento que marca a humanidade desde tempos bem remotos de sua história. No século V. a.C., em Atenas, segundo Chauí (2002):

"Em primeiro lugar, nem todos são cidadãos. Mulheres, crianças, estrangeiros e escravos estão excluídos da cidadania, que existem apenas para os homens livres e adultos naturais de Atenas...Dois princípios fundamentais definem a cidadania: a isonomia, isto é, a igualdade de todos os cidadãos perante a lei, e a isegoria, isto é, o direito de todo o cidadão de exprimir em público (na Boulé ou na Ekklesía), sua opinião, vê-la discutida e considerada no momento da decisão coletiva" (p.134).

Pode-se perceber que desde o século citado até os dias de hoje no Brasil pouca coisa mudou quando se trata da exclusão de crianças e adolescentes ao exercerem seus direitos de cidadão. Uma das marcas registradas da sociedade brasileira é a exclusão em vastas parcelas do seu contingente populacional. De acordo com Arroyo (1996):

"...a cultura escolar os estigmatiza e os rotula como diferentes, incapazes, inferiores, menos-dotados para o domínio das habilidades pretendidas e exigidas pelo processo de ensino-aprendizagem....a cultura do fracasso se alimenta da própria condição dos setores populares, ou dos preconceitos em relação ao papel social previsto para essa infância e adolescência: para ser pedreiro, faxineira...esses preconceitos e estigmas terminam sendo interiorizados pelos alunos e passam a ser componentes de sua auto-imagem...frente ao próprio rendimento...Escola - Instituição Excludente...As chamadas de atenção sobre a cultura do estigma e da exclusão das camadas populares e seus efeitos sobre o rendimento escolar não são novas. As pesquisas que poderiam trazer...a compreensão das formas sutis em que essa cultura do estigma se materializa na instituição escolar e impregna todas suas práticas. Por exemplo, as crianças das camadas populares são colocadas em condições de instrução menos exigentes, em classes especiais...como a cultura do fracasso e da exclusão está incrustada na organização seriada e disciplinar de nosso sistema escolar....exemplo, como a estrutura disciplinar - em que se recorta o direito de todo cidadão à educação e à cultura termina negando esse direito, excluindo desse direito a maioria de nossas crianças e adolescentes. .. Essa estrutura disciplinar é em si excludente" (p.12 -13).

Quando um sujeito é excluído do meio social, isto também pode ser compreendido como uma discriminação. Em vários dicionários, como por exemplo: Dicionário da Língua Portuguesa On-Line discriminação é: "Ato ou efeito de discriminar; separação; distinção; diferenciação; destrinça; discernimento; marginalização devido à diferença, de raça, por exemplo".

No início do século XXI, crianças e adolescentes ainda constituem a maioria das pessoas que vivem na pobreza em todo o mundo. Seus direitos foram estabelecidos, na Convenção Sobre os Direitos da Criança, em 20 de novembro de 1989. A humanidade, contudo, presenciou avanços espantosos e deram-se passos enormes a favor da criança e do adolescente, muitos ao longo da última década, muitos outros no espaço de uma geração. Seus direitos foram reconhecidos; para protegê-los, foram criadas leis e mecanismos para garantir seu cumprimento; Na Resolução n. L 44 (XLIV) da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989, e ratificada pelo Brasil em 24 de setembro de 1990 diz:

"Consagrando o princípio do reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos inalienáveis, de igualdade e liberdade, proclamados na Carta das Nações Unidas, de 1945, bem como, com o escopo de proteger a infância e promover a assistência especial à criança, nos termos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10 de dezembro de 1948, objetivando sua formação plena como cidadão conseqüente e responsável".

Apesar desses avanços, muitas metas permanecem fora de alcance para centenas e milhões de crianças e adolescentes em todo o mundo. Sua vida e seu futuro estão ameaçados em um mundo marcado por condições de pobreza mais difíceis de dominar, segundo UNICEF (2008): "mais de metade da infância mundial na pobreza ... Mais de metade das crianças no mundo – uns mil milhões – vive em condições de pobreza e carece dos bens e serviços básicos para sobreviver, crescer e desenvolver‑se....".

Introduziu-se no direito brasileiro um conteúdo e um enfoque próprios da doutrina da proteção integral da Organização das Nações Unidas, trazendo para nossa sociedade os avanços obtidos na ordem internacional em favor da infância e da juventude. Segundo o artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil 1988:

"É, dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade o direito á vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e ao convívio familiar e comunitário, além de colocá-los a salvo de formas de negligência, discriminação, exploração, crueldade e de opressão".

O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.059/90) reforça estas garantias em seu Art. 1º, ao afirmar: "Esta lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente". Sendo assim, o sentido das duas leis destaca a importância da inclusão e não-exclusão. Porém, se fomos relembrar o que já foi dito neste trabalho, iremos perceber que ainda existe muita coisa a ser pensada sobre o que se pode entender quando se quer falar de inclusão ou exclusão no mundo do crime. Questão que deu o título a este trabalho.

Apesar das iniciativas empreendidas com relação à prioridade dos direitos, há necessidade de maiores investimentos em políticas públicas econômicas e sociais, voltadas para nossas crianças e adolescentes, que são um dos vários contingentes de excluídos, num cenário no qual o Estado prega um discurso voltado para o bem-estar social, ou seja, um Estado democrático de direito.

 

3 - EXCLUSÃO SOCIAL, INCLUSÃO NO MUNDO DO CRIME: ANÁLISE DE DOCUMENTÁRIOS.

3.1 - A falta de Justiça Social

Foucault em seus livros: "Vigiar e Punir" (1999) e "História da Loucura Na Idade Clássica" (1972), remete-nos a questões como: Por que nossa cultura exclui as diferenças? O que isto tem a ver com as nossas vidas? Existe em nossa sociedade igualdade e justiça social? Em suas reflexões, nos remete a ideia de que todas as civilizações se constroem e se sustentam em leis. Sendo assim supõe-se que em todas as sociedades existem um grande número de coisas que não se pode fazer, que há coisas que não devem ser ditas, atitudes que não são permitidas. Todas as sociedades criam limites e proibições, elas escolhem algumas formas de viver e rejeitam outras. Mas, o que Foucault também nos apresenta, para além disso, é um poder que faz falar, saber e viver, sendo assim, é um poder produtor de realidade, ele faz uma positividade do poder no sentido de concretizar as coisas. O autor Roberto Machado na introdução de "Microfísica do Poder" (2000) deixa isto muito claro, quando ele nos fala que Foucault em seus estudos nos leva a pensar no micro e macro poderes, explicitando as relações de poder, essas relações que na:

"...Idéia básica de Foucault...as relações de poder não se passam fundamentalmente ao nível do direito, nem da violência...nem unicamente repressivas...ele está querendo demonstrar que é falso definir o poder como algo que quer dizer não, que impõe limites que castiga. A uma concepção negativa, que identifica o poder com o Estado e o considera essencialmente como aparelho repressivo, no sentido em que seu modo básico de intervenção sobre os cidadãos se daria em forma de violência...ele opõe, ou acrescenta, uma concepção positiva que pretende dissociar os termos dominação e repressão...a dominação capitalista não conseguiria se manter se fosse exclusivamente baseada na repressão...Mas o que a consideração dos micropoderes mostra...é que o aspecto negativo do poder – sua força destrutiva – não é tudo...é preciso refletir sobre o seu lado positivo, isto é, produtivo... O que lhe interessa...gerir a vida dos homens, controlá-los nas suas ações...aproveitando suas potencialidades...isto é, tornar os homens dóceis politicamente..." (p. XV – XVI).

Neste trabalho questiona-se o modo como os narcotraficantes que vivem na marginalidade querem a inclusão de crianças e adolescentes no mundo do crime. Questiona-se como muitos traficantes se tornam ídolos e símbolos para essas crianças e adolescentes que vivem uma enorme falta de justiça social na cidade do Rio de Janeiro. Para os traficantes de drogas, inclusão no mundo do crime é sinônimo de introdução num trabalho com ótimos rendimentos, trabalho esse que de acordo com os relatos no documentário: "Notícias de Uma Guerra Particular", nunca conseguiriam trabalhando por meios legais. Na época do documentário o chefe de polícia civil Hélio Luz diz:

"A população vibra, não é verdade? Lógico, é alguém deles que deu certo...Enfim alguém nosso pode ser gente...alguém nosso pode comprar um carrão...pode ter cinco mulheres...Um dos nossos conseguiu chegar e se dar bem na vida...Qual a opção que se tem? Se conseguir um emprego vou ter que trabalhar 12h por dia para ganhar R$ 112,00 de repente se me encaixo no tráfico ganho R$ 300,00 por semana...é negócio...ganha-se bem mais que o pai ...Só não é negócio para quem nunca passou fome...o pessoal vai fazer fila para querer trabalhar...não é um emprego? É um emprego..."

A inclusão de crianças e adolescentes no mundo do crime é sinônimo de introdução em um trabalho que oferece ótimos rendimentos, para os que querem trabalhar e não encontram emprego e nem oportunidades. A economia que passa de governo para governo no nosso país, que traz: crescimento do desemprego; emprego temporário ou informal; descompromisso do Estado com as ações de apoio social. Tem como consequência, o aumento da zona de pobreza e, assim, aumenta extremamente a população dos que não tem poder algum, os excluídos. Neste processo, as crianças e os adolescentes são os mais enfraquecidos, pois as alternativas entre o desemprego e um emprego no narcotráfico não lhes dão opções para que definam uma trajetória profissional estável.

Constata-se que esses jovens não têm o preparo necessário para conseguir um bom emprego, mas têm desejos, eles querem status, uma boa profissão e como consequência disso um bom salário para ter o que a maioria dos jovens de classe média e alta de nossa época atual possuem, tais como: um tênis de marca e uma namorada bonita. Eles desejam ser poderosos, terem um carro bonito e saírem para se divertir, neles haverá sempre um desejo, então eles são capturados pelo sistema capitalista, pelo consumo exacerbado. Percebe-se aí que os territórios dos padrões da legalidade são trocados pelos territórios fora dos padrões destas. Novas cartografias começam a ser produzidas. De acordo com as palavras do delegado Hélio Luz, no documentário: "Notícias de Uma Guerra Particular", o tráfico de drogas é uma empresa ilegal, que tem o seu espaço aberto pelo Estado.

Em suas escolhas nessas crianças e nesses adolescentes, existe o desejo e a produção na sua rede social, há uma potência nos seus encontros, um desejo e uma produção no conjunto de suas relações. Deleuze e Guattari (1995)"A questão é produzir inconsciente e, com ele, novos enunciados, outros desejos..." (p.17). Eles estão sempre em movimento, para Deleuze e Guattari (1995) são: "agenciamentos maquínicos produtores de enunciados. Dizemos que o agenciamento é fundamentalmente libidinal e inconsciente. É ele, o inconsciente em pessoa." (p. 41). Então sempre existirá um movimento que nunca para, um ir e vir que nunca chega ao final, por esse motivo há uma incompletude por excesso. Deleuze e Guattari (1995):

"Ao mesmo tempo trata-se de algo completamente diferente...aumento de valência, verdadeiro devir...cada um destes devires assegurando a desterritorialização de um dos termos e a reterritorialização do outro...devires se encadeando e se revezando segundo uma circulação de intensidades que empurra a desterritorialização cada vez mais longe. Não há imitação nem semelhança, mas explosão..." (p.18).

Existirão aí também, contradições, impasses, porque as crianças e os adolescentes estão em processo de produção. Há uma engrenagem própria da vida. Essas crianças e esses adolescentes se movimentam com toda coragem no seu desejo de viver intensamente, um desejo e uma produção que está em constante movimento na sua rede social, na luta de enfrentamento de seus problemas. Observa-se aí um paradoxo, para além da doxa do senso comum, pois elas vivem um impasse ao assumirem certas opções para resolverem os seus problemas, porque produzem inconscientemente o seu desejo por viver que pode os levar à morte. Sabe-se que eles desejam viver cada vez mais e, por esse motivo correm o risco de morrer no enfretamento com a polícia, na busca pela vida.

Nessa busca pela vida onde muitos do grupo podem morrer, o desejo pode cair, mas essas crianças e esses adolescentes ao se conectarem em cadeias como formigas, onde a maior parte poder ser destruída, os que sobrarem poderão se reconstruírem, e nesse momento qualquer elemento pode afetar ou incidir em qualquer outro. Segundo Deleuze e Guattari (1995): "É impossível exterminar as formigas, porque elas formam um rizoma animal do qual a maior parte pode ser destruída sem que ele deixe de se reconstruir" (p. 12). Então eles podem ramificar-se em qualquer ponto e transformar-se, Deleuze e Guattari (1997): "Por isso, as linhas de rizoma oscilam entre as linhas de árvores, que as segmentarizam e até as estratificam, e as linhas de fuga ou de ruptura que as arrastam" (p.221). As linhas de fuga e o rizoma buscam a vida, num rizoma não existe hierarquia. Mas será que eles seguem o rizoma ou buscam a hierarquia? Sabe-se que eles formam organizações de poder que produzem forças que operam sobre o desejo. Deleuze e Guattari (1995):

"As pulsões e objetos parciais não são nem estágios sobre o eixo genético, nem posições numa estrutura profunda, são opções políticas para problemas, entradas e saídas, impasses que a criança vive politicamente, quer dizer, com toda força de seu desejo...Toda vez que o desejo segue uma árvore acontecem as quedas internas que o fazem declinar e o conduzem à morte; mas o rizoma opera sobre o desejo por impulsões exteriores e produtivas" (p. 21- 22).

Neles há um desejo eterno, há um eterno querer. RODRIGUES (2000): "É certo que sempre...insistiu...a esquizoanálise na imanência entre desejo e produção" (p1998)).Um querer que quer sempre ultrapassar o que a vida lhes oferece, ou seja, ao desejo não lhe falta nada, porque o desejo quer sempre exceder a vida. O desejo é pura aplicação, é um desejo maquínico. "G. Deleuze e F. Guattari propõe uma esquizoanálise cuja fundamentação está no reconhecimento do desejo máquina que é da ordem da produção e não da representação" (Barbier, 1985, p. 58, apud Rodrigues, 2000, p.197).

Mas há um desejo que sempre quer algo, um abraçar algo maior do que ele, porque ele quer abraçar a vida, o mundo e o infinito. Mas a vida é muito superior as formas que o sujeito dá para elas e ela sempre exige que o sujeito se transforme para que ele possa entender o que está por vir novamente e entender o que a vida traz de diferente. Existe nesse momento um abraço que nunca se completa, o que dá para essas crianças e adolescentes é a sensação de incompletude,  por excesso, no qual  se ama tão demasiadamente o desejo, que ao se conseguir o objeto que se deseja, logo a seguir esse objeto perde o valor para quem o possuiu e se começa a desejar um novo objeto. É um desejo imanente que está sempre a procura de um eterno devir.

Muitos jovens quando conseguem realizar alguns de seus desejos, como os chefes do tráfico, por exemplo, não abandonam a vida do crime. Segundo Nietzsche (2001): "Acabamos por amar nosso próprio desejo, em lugar do objeto desejado" (p.115).

Em "Falcão os Meninos do Tráfico", percebe-se que muitos desses jovens moradores da Comunidade por não ter um bom nível de escolaridade, além de não conseguirem o que desejam do mercado de trabalho e também da sociedade são discriminados e rejeitados. A sociedade fecha os olhos para eles, muitas pessoas não querem percebê-los, passam por eles como se não existissem e isso faz com que estes sintam um terrível mal estar na sociedade, pois o que mais desejam é que as pessoas os percebam. Querem que as pessoas saibam da sua existência, anseiam que a sociedade lhes trate com mais respeito e com mais amor.

Mv Bill mostra em seu documentário: "Falcão os Meninos do Tráfico", os problemas dos meninos e adolescentes moradores de Comunidades no Brasil, com relação ao uso e venda de drogas, as suas péssimas e árduas condições de vida, cheias de decepções e tarefas impossíveis.

A experiência de um emprego no narcotráfico é entendida por essas crianças e adolescentes, como um novo modo de existência, com igualdade e justiça social para todos eles, uma nova forma de existência que é estruturada por uma relação contínua com um trabalho e pela inscrição nas novas formas estáveis de sociabilidade. Os "novos traficantes de drogas" podem ser classificados em vários grupos, e eles são dinamicamente cambiáveis, como podemos ver nos documentários citados. Esses grupos vão desde os fogueteiros, passando por embaladores de drogas, vendedores, gerentes e que sabe um dia chefões. O que esses grupos têm em comum é um trabalho e uma inserção social, onde se incluem moradores da Comunidade, população de rua, toxicômanos e outros.

Sawaia (2004), remete a ideia de que uma grande parte das análises de desigualdade social que dão destaque a um estudo a respeito de exclusão dão mais ênfase ao seu uso como expressão de uma ideia ou de fatos, fazendo assim de seu emprego, um uso simbólico em detrimento do uso dos seus demais empregos, como, por exemplo, as análises localizadas somente na economia, que aproximam a exclusão da pobreza ou as que destacam somente o social, que elevam sua opinião como símbolo de discriminação, sendo assim, o intuito principal da análise, que é o da falta de justiça social,  estaria sendo atenuado.

Existe o preconceito social por parte de muitos habitantes de bairros de classe média e alta para com essas crianças e adolescentes moradores das Comunidades no Rio de Janeiro. As cenas do documentário: "Ônibus 174", mostra que pessoas ao parar seus carros nos semáforos da cidade do Rio de Janeiro, fingem que não veem crianças e adolescentes fazendo malabarismos com limões em frente aos seus carros. Será que essas crianças e adolescentes querem somente dinheiro, será que elas também não desejam ser percebidas como um ser humano que está fazendo algo diferente? Um adolescente relata em: "Falcão – Meninos do Tráfico", que o maior desejo de sua vida é sair da vida do tráfico de drogas e poder trabalhar como malabarista num circo.

Supõe-se que uma das coisas que as pessoas mais desejam é que outras pessoas não passem por elas como se elas fossem invisíveis; o que lhes causa um mal estar terrível.Elas ficam angustiadas e arrumam um jeito de chamar a atenção para que de alguma maneira a sociedade perceba que existam.Deleuze (1963): "A faculdade de desejar pressupõe uma representação que determina a vontade" (p.13). Eles sentem vontade de soltar um grito, como se fosse um grito de alerta dizendo: "olha para mim, veja como sou, veja o que posso fazer, eu existo". Meninos de Comunidade começam a soltar tiros com sua arma para o alto, como forma de soltar este grito, como podemos ver nesses documentários.

Mello (2006), nos remete a ideia de que a vida para as crianças nas grandes cidades se torna mais complicada que nas áreas rurais. As fatias sociais ricas e pobres convivendo num mesmo ambiente físico e simbólico fazem com que, se provoquem percepções distorcidas na imagem que os sujeitos constroem uns dos outros. No tecido urbano das grandes cidades emergem os contrastes explícitos. Além de haver o crescimento e dispersão nas periferias das grandes cidades de bairros populares, há também espaços no centro dessas cidades que se transformam em guetos urbanos, porque ali passam a viver os mais pobres. Segundo o autor:

"Nas metrópoles, como São Paulo, tudo parece escapar do controle, assim como ela escapa dos limites espaciais. Perde-se a visibilidade do todo, perde-se a inteligibilidade do conjunto. Na verdade, a metrópole não é apenas um enorme e disforme aglomerado físico, mas é imensa também na quantidade e variedade de sua experiência simbólica. Os habitantes da cidade não conseguem vê-la, ela não se deixa ler. Para conhecê-la precisamos ampliar nossos sentidos e nosso conhecimento. Temos necessidade de mediadores, instrumentos que tornem nossa visão e nossa compreensão mais abrangentes. Não são microscópios e não são telescópios. São a televisão, o rádio e o jornal" (p.131).

O documentário: "Ônibus 174", mostra  como na cidade do Rio de Janeiro, os espaços no centro das cidades, onde passaram viver os mais pobres, se transformarem em guetos urbanos, como por exemplo, as calçadas próximas a Igreja da Candelária, em que houve uma terrível chacina. Nesse mesmo documentário, ficamos sabendo de Sandro, um personagem que deu origem a esse documentário, somente porque ele apareceu nos meios de comunicação, instrumentos que tornaram nossa visão e nossa compreensão mais abrangentes a tal ponto que Sandro e outras crianças e adolescentes moradoras de rua e das Comunidades da cidade do Rio de Janeiro não passarem pelo fenômeno da invisibilidade. Segundo Mello (2006):

"Esses veículos denominam-se órgãos de comunicação de massa, porque a escolha e o modo de apresentar a informação que passam ao público devem nortear-se pelo fato primário de estarem se dirigindo a um espectador, um ouvinte ou um leitor ordinário, comum. Seu receptor não é alguém, é ninguém. É o homem da massa, incógnito, sem face. Esse é o aspecto que mais interessa à Psicologia Social, pois coloca o problema da qualidade do discurso: como dirigir-se a alguém que não possui perfil psicossocial definido?" (p.132).

A invisibilidade pode provocar um mal estar no sujeito, porque o sujeito só sabe quem é porque o outro vai dar a ele um significado. Vivemos em função de nós mesmos e em função de que os outros falam de nós e, se eles não nos reparam, nos percebem e nem nos observam, logo, a nossa existência se torna muito difícil.

Assistindo a eventos como esses, sabemos que muitos deles se afastam do contato com pessoas que não pertencem ao seu contexto social, ou seja, muitos não querem sair da Comunidade onde moram para evitar o desprazer de encontrar com pessoas que transitam pela cidade e essas pessoas virarem os rostos para elas, como se elas não existissem.

Documentários como "Ônibus 174", fazem perceber que a exclusão social nos bairros de classe média e alta na cidade do Rio de Janeiro penaliza e restringe muitas vezes dramaticamente o acesso de muitas pessoas às condições mínimas de dignidade e cidadania. Os temas dos documentários revestem-se de maior importância, considerando os índices da pobreza e desigualdade social na cidade do Rio de Janeiro. A situação é ainda mais agravada, pela naturalidade com que o sujeito que vive nos bairros de classe média da cidade encara esse fenômeno: finge que não enxerga o fenômeno em si, e o que é pior, nem pensa em conhecer o em si do fenômeno.

Tudo se passa como se esse quadro social fosse inevitável, e produto da cultura, que naturaliza a exclusão social nos bairros de classe média e alta da cidade e o não reconhecimento da cidadania para todos. Quanto aos direitos de cidadania que o morador de classe média tem e que os trabalhadores que moram na Comunidade não têm, destaca-se na matéria do jornal "O Dia" de 24 de outubro de 2007, onde o Secretário de Segurança José Mariano Beltrame afirma que: "Um tiro em Copacabana é uma coisa. Um tiro na Comunidade da Coréia é outra" (p.9).

Na mesma matéria deste jornal citado acima, pode-se ler que a afirmação de Beltrame, na Fundação Getúlio Vargas, causou uma reação imediata. Para a presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Margarida Pressburger, que diz: "Beltrame assumiu publicamente que, para o governador, o morador de classe média da Zona Sul tem direitos de cidadania que o trabalhador da Comunidade não tem"(p. 9).

No documentário: "Notícias de Uma Guerra particular", pode-se observar que nem todas as pessoas que trabalham com o tráfico de drogas, moram em Comunidades do Rio de Janeiro, mas, no entanto, a repressão se concentrava exclusivamente nas Comunidades desta cidade. Neste documentário um capitão do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE), diz que já participou de centenas lutas armadas nas Comunidades da cidade e, que talvez se estivesse a serviço das Forças Armadas do país, não tivesse essa oportunidade. Ele diz que está participando de uma guerra, mas, com uma única diferença: ele volta para casa todos os dias.

Como conter a violência é uma questão muito complexa e nesse ponto concordo com a ideia de Sawaia (2004), de que tudo o que foi dito até agora prejudica a compreensão do vínculo, como diz o autor: "a retórica violência e programas políticos claros de práticas de exclusão, de profilaxia social e de purificação racial, legitimadas pelo medo" (p. 24).

De acordo com o autor, subjacente a essa citação, pode-se observar que há um desconhecimento e uma falta de controle naquilo que constitui as suas origens (que é a de terem nascidos livres) e, que por influências de qualidade que se requeria da sociedade da época em que seus ancestrais foram escravos, refletem nelas atualmente e por várias gerações, fazendo que elas fiquem alerta, porque pensam que estarão sempre dependentes de serem governadas e submissas a uma chefia, Sawaia (2004) diz:

"Do ponto de vista da ética, quer se conceba a subjetividade como produto do meio, quer da raça, ela se torna um estigma, uma marca daquela pessoa, alimentando o sentimento de que o sujeito nada pode fazer, individual e coletivamente, e que não lhe cabe a ação, só a reação ou o depósito da esperança em forças transcendentais ou sociais que fogem de sua competência. Em suma, se o homem ou a sociedade são, ontologicamente violentos, suas leis, em decorrência, também o são, resta as pessoas submeterem-se à brutalidade e tolerar formas de violência como parte do ônus de viver em sociedade e do caráter primitivo e animal de nossa filogênese" (p.25).

 

3.2 – As Comunidades como um lugar de população pobre e marginalizada

Pode-se retornar a ideia lançada no item: 1.1 - Como a sociedade reprime o crime, que mostra o aparecimento do pobre como ‘perigoso'. A pobreza passou e até os dias de hoje passa a ser vista como causa da criminalidade. Para Foucault (2000), as razões são várias: políticas, econômicas e sanitárias. Na revolução Francesa, por exemplo, essa parcela da população mostra a sua força através das revoltas, o que na época tornou-se um problema político e também econômico. Com a propagação da cólera, no final do século XIX, o pobre foi considerado um perigo sanitário e político para a cidade, sobretudo para os ricos, ocorre então a criação de um ‘cordão sanitário', ou seja, a divisão do espaço geográfico da cidade ao criarem-se bairros diferentes para pobres e ricos. 

O final do século XIX e no início do século XX, período de transição do regime monárquico para o republicano, um período histórico mais emblemático desse processo, ele mostra o aparecimento do lugar da população pobre e marginalizada na cidade e ilustra o início de um tratamento dado pelos governantes a essa questão.

 O prefeito Pereira Passos deu novos rumos à cidade, promovendo, um verdadeiro "bota-abaixo", tirando do caminho tudo aquilo que impedia a concretização de seus projetos inovadores. O maior desafio desse prefeito nessa época era organizar a urbanização, sanear e civilizar a cidade do Rio de Janeiro, a capital dessa nova República do Brasil. Ela havia se inspirado na Belle Époque, em quatro anos de trabalho transformou o Rio numa cidade cosmopolitana, derrubando os cortiços que deram lugar a um centro urbano moderno, com cara de capital.

Uma das principais características da administração desta prefeitura, entre 1902 e 1906 era a polêmica. Um dos episódios que mais marcaram, a empreitada desse prefeito, foi a "Revolta da Vacina", em 1904. Nessa época, as pessoas temiam serem vacinadas e era preciso que os agentes de saúde fossem até a casa de todos acompanhados da polícia, o que gerou um grande descontentamento. A polícia removeu a população dos cortiços, que já eram habitações precárias, e eles então começavam a subir os morros para não se afastar tanto do centro. Por causa dessa ocupação desordenada, se deu início a favelização, que se tornou um problema insolúvel para os governantes posteriores, devido ao grande crescimento populacional.

De acordo com as ideias de Bicalho (2005), o legado de atitudes hostis entre a polícia e os setores da sociedade considerado inferiores, colaborou para o surgimento das Comunidades, pois foi durante o movimento higienista, que os tidos como ‘classes perigosas' subiram os morros da cidade do Rio de Janeiro.

O tratamento dado pelos governantes a essa questão não mudou muito desde  o Brasil colônia até os dias de hoje e que as Comunidades têm se apresentado como um fenômeno cada vez mais comum na cidade do Rio de Janeiro,  seu desenvolvimento data desde o fim do século XIX, passando pelo século XX e início do século XXI. Desde então, as Comunidades têm sofrido cíclicas formas de intervenções, desde as políticas de demolições, passando pelo período das remoções até a atual forma de "inclusão", através de projetos de urbanização.

Muitos moradores das Comunidades na Cidade do Rio de Janeiro que aparecem no documentário: "Notícias de Uma Guerra Particular", mostram em seu discurso que as coisas no dia a dia das Comunidades no Rio de Janeiro, são bem diferentes do proposto nesses programas de urbanização. Dizem que se precisam de: remédios, gás, comida, dinheiro para enterrar algum ente querido, é o "movimento" (nome dado ao tráfico de drogas) que lhes oferece.

Levanta-se a hipótese de que, crianças e adolescentes moradores de Comunidades, a polícia e os políticos na cidade do Rio de Janeiro, sofrem de um mal estar na nossa civilização atual e todos passam por um processo de desumanização. Exemplo disso são declarações como do secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, na manchete do jornal: O DIA de 09 de julho de 2008, onde afirma que policiais que participaram no crime do menino João Roberto, estavam estressados. Vale a pena dizer que no título da manchete desse jornal estava escrito com letras em caixa alta e negrito: Batalhão de PMs da Tragédia Extinguiu o Apoio dos Psicólogos.

Crianças e adolescentes moradores de Comunidades do Rio de Janeiro culpam e acusam a sociedade de classe média e alta moradora em bairros mais abastados e a polícia de discriminação, preconceito , exclusão social e corrupção. E que não lhes oferecem oportunidades para que possam ter melhores condições de vida, por isso se envolvem com o crime.

De acordo com as ideias de Mello (2006), hoje em dia o modo de vida nas grandes cidades é centralizado nas riquezas, no dinheiro, mas, nestas cidades se reúnem renda e trabalho, riqueza e miséria. São muito visíveis condições de extrema riqueza e extrema pobreza, convivendo lado a lado nessas cidades, ou seja, por mais que queiram elas não podem se ignorar uma a outra. Se por um lado  a riqueza deseja ostentar-se mostrando seu luxo, a pobreza não consegue esconder-se e transcende dos bairros carentes para acomodar-se nas ruas, por baixo de viadutos, de pontes, nas marquises, etc. Qualquer terreno vago, hoje em dia é escolhido para moradia e assim vão se tornando enormes Comunidades ao lado dos prédios ricos da cidade e tão ou mais visíveis quanto esses.

 

3.3 – As armas e as drogas

Carneiro (2005), nos remete a época das grandes navegações nos séculos XVI e XVII, onde as principais riquezas buscadas no Oriente e na América eram o que os homens denominavam de drogas. O pau-brasil, o açúcar e o tabaco, levados do Brasil, assim como as especiarias levadas das Índias eram chamadas de drogas.

Foi do termo holandês "droog", que derivou a palavra ‘droga', que nos séculos XVI e XVII, significava produtos secos e designava as substâncias naturais que eram utilizadas naquela época na alimentação e na medicina. Entretanto, ele diz que também o termo "droog", foi usado para designar uma substância que poderia ser consumida por prazer. O autor nos leva a ideia de que as sociedades na época das colônias, não distinguiam com exatidão o que eram as drogas, ou seja, não discriminavam claramente a distinção entre o que era droga, remédio ou alimento.

Atualmente há muitas opções disponíveis para o consumo de drogas no mercado e essas opções crescem constantemente, porque os químicos que trabalham na clandestinidade, estão cada vez mais empenhados em fabricar o instigante primoroso, ou seja, a droga que leva a uma excitação sem defeitos.

Campbell e Graham (1998), diz que desde os meados do século XX, os usuários da maconha pertencem em geral à classe média e a menor parte da população. Entretanto, foi na agitação dos anos 60, que se considerava comum fumar maconha entre a rebelde juventude que englobava todas as classes sociais daquela época, de acordo com os autores: "...Muitos acreditavam e ainda acreditam que a maconha é um excitante natural, uma substância pura e inofensiva do jardim da Mãe natureza" (p.56).

No documentário: "Notícias de Uma Guerra Particular", na década de 70, o consumo da maconha era muito frequente, antes disso, a maconha era usada por malandros das grandes cidades e em regiões do nordeste. Na década de 60 o consumo da maconha cresceu nos centros urbanos principalmente entre os jovens de classe média e alta. O crescimento do uso da maconha e em menor proporção da cocaína (muito cara nessa época) e do ácido lisérgico – na década de 70 difundiu-se das grandes cidades brasileiras para as demais. Mais tarde, com a cocaína mais barata, seu consumo estendeu-se em maior proporção nos anos seguintes das classes sociais mais elevadas para as mais pobres.

Nesta época, nas Comunidades do Rio de Janeiro, os indivíduos que viviam na contravenção (principalmente como "empregados" do jogo do bicho) ou de pequenos delitos (como roubos e furtos) eram pessoas adultas e passaram a lucrar com a venda da maconha. Foi então que proliferaram os postos de venda, até hoje chamados de bocas de fumo, mesmo que, atualmente, seu produto principal seja a cocaína. Com relação aos usuários de drogas segundo Tiba (2007): "a droga assume papel importante em sua vida. O jovem passa a comprá-la, troca atividades costumeiras para poder usá-la e, quando está longe dela, já bate a saudade" (p. 27).

No que se refere ao uso de armas, segundo o documentário: "Notícias de Uma Guerra Particular", a expansão do tráfico de drogas a partir da metade da década de 80, é diretamente responsável por um crescimento vertiginoso do número de homicídios. Morria uma pessoa a cada meia hora no Rio de Janeiro e 90% delas eram atingidas por balas de grosso calibre, suponho que atualmente esses números sejam maiores. A Polícia federal estima que o comércio de drogas empregava cem mil pessoas no Rio de Janeiro, ou seja, o mesmo número de funcionários da prefeitura da cidade nesta época (década de 80).

Magalhães (1999), fala sobre como funciona o narcotráfico. De acordo com o autor, não é Fernandinho Beira-Mar o grande traficante do Brasil. Magalhães diz que os grandes chefes das facções são somente varejistas e quer mostrar o que está por trás de todo o mundo do tráfico ,explica Magalhães, que no morro da Mangueira, no Rio, o comércio de maconha e cocaína funciona a menos de um quilômetro do palco onde presidente dos Estados Unidos discursa, segundo o autor:

"Na manhã do dia 15 de outubro de 1997, o presidente da maior potência econômica e militar do mundo, Bill Clinton, participou de uma cerimônia na Vila Olímpica da Mangueira...Ali, no sopé do morro pregou: 'Queremos manter nossas crianças longe das drogas'...A menos de um quilômetro, no Buraco Quente, maior boca de fumo da Comunidade, o comércio de cocaína e maconha mandava brasa...Na véspera, a comunidade de 40 mil pessoas que fundou a mais popular escola de samba carioca assistiu a ocupação do morro pela Polícia Militar. Três dias antes da visita do presidente dos Estados Unidos...o traficante Magno da Mangueira, ‘dono do movimento', celebrava sua despedida temporária com tiros de fuzis, metralhadoras e pistolas" (MAGALHÃES, 1999, p.70).

 

3.3.1 - Como crianças e adolescente começaram a traficar drogas.

Qual o motivo dessas crianças e adolescentes usarem drogas? Qual o motivo dessas crianças e adolescentes venderem drogas? Será que é por causa da necessidade de sua inclusão no grupo? Como tudo começou? O que houve no Brasil para que crianças e adolescentes se envolvessem com uso e o tráfico de drogas e, ficassem tão ligados ao crime? Que história é essa? Pode-se pensar que a resposta para isso está em alguns fatos que já ocorreram e ocorrem no Brasil, este estudo pretende pelo menos poder entender um possível início de tudo.

 Pereira (2008), ao escrever a matéria do jornal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro de julho de 2008, disse que o movimento hippie teve o seu embrião nos Estados Unidos e chegou ao Brasil nos anos 60. Segundo narra autora, esse movimento trazia com ele uma ideologia, que introduzia nos jovens ideias como: um espírito de liberdade, esperança e um mundo melhor, de paz,  felicidade, transformação da consciência, dos valores e do comportamento, buscando novos espaços para os sujeitos se expressarem, mas também foi caracterizado pelo que a autora diz: "sexo, drogas e rock'n roll" (p. 26). Foi um tempo de uso de drogas, palavras de paz e amor e um novo estilo de música. Como consequência disso, os hippies foram muito discriminados por pessoas conservadoras, devido ao excessivo uso de drogas e  pela oposição ao capitalismo. Segundo Pereira (2008):

"A contracultura foi um movimento dos anos 1960 no qual teve lugar um estilo de mobilização e contestação social....jovens inovaram estilos, voltando-se mais para o anti-social aos olhos de famílias tidas como conservadoras...Seu embrião vem dos Estados Unidos, onde jovens lutavam contra a guerra do Vietnã e contestavam o valor mais sagrado da sociedade americana: o dinheiro. Eram os hippies usando flores, fumaça e o lema ‘Paz e Amor' que seguiam à frente do movimento" (p. 26).

Entende-se ao ler a matéria de Pereira (2008), que no Brasil, o movimento hippie deixou consequências em nossa cultura jovem, que podem ser observadas até a atualidade, por exemplo, na maneira como alguns jovens falam, usam drogas excessivamente, fazem sexo sem precaução, alegando ser tudo pela liberdade, pela paz e  amor. Percebe-se aí, que houve uma ingenuidade, uma falta de esclarecimento para que a juventude dessa época pudesse perceber o paradoxo que havia num movimento que pregava a liberdade e era contra a sociedade de consumo, era o que mais comprava drogas.

Os movimentos desta época tinham tudo para dar certo, pois seus ideais transformavam a nossa sociedade em uma sociedade mais livre, mais humana, que era contra a repressão de qualquer tipo. Uma sociedade que, mesmo na época em que vivemos, poder-se-ia chamar de ideal. Sabe-se que o movimento hippie e o movimento de maio de 68 marcaram uma época. Segundo Rodrigues (2000):

"O maio: algo muito além da França, caro a todos os mundos, sob uma infinidade de causas e bandeiras...Maios: ‘americano' (recusa da Guerra do Vietnã, desobediência civil, hippies, flower power, black power); ‘alemão' (renovação cultural....); ‘polonês' (socialismo e liberdade...); 'tcheco'...; 'japonês'...; 'espanhol'...; ‘italiano'...; brasileiro' (contra o golpe militar de 64, os acordos MEC-USAID e todos os imperialismos)..." (p.235).

O mundo hoje em dia é globalizado, a globalização se espalhou pelo mundo inteiro. Passos e Barros (2008): "na Paris de 68, ao final do movimento se aceitava que cabia buscar explicação sobre o fracasso da revolução nas produções inconscientes da subjetividade".. Mas, será que maio de 68 ‘fracassou'? Diz Rodrigues (2000):

Sim, porque para quase todo mundo, maio de 68 ‘fracassou'. Renunciamos a opor um pretenso ‘sucesso' a tal alegação: não o podendo defender sem cair nas armadilhas políticas montadas pelos adversários, preferimos abordar alguns elementos da construção do alegado ‘fracasso' (p.244).

De acordo com Rodrigues (2000), ‘A Grande Recusa' (um esplêndido nome pela qual se designou os acontecimentos de maio de 68), diz a autora:

"… constitui acontecimento efêmero: não mais alguns meses entre um fim de março e um fim de julho de 1968 em que uma ‘revolta' fragmentária e expansiva conecta territórios vários sem se totalizar em uma revolução que ‘dividiria' a História em uma antes e um depois" (p.200).

Santos (2000), no seu livro: "Por uma outra globalização - do pensamento único à consciência universal", nos remete a ideia de que a globalização já está aí e não tem jeito, segundo o autor: "O que é transmitido à maioria da humanidade é, de fato, uma informação manipulada que, em lugar de esclarecer, confunde" (p.79). Sabe-se que muitos traficantes manipularam e manipulam até os dias de hoje o que queriam nos transmitir esses movimentos libertários, eles usaram e usam até hoje do modismo transmitido e manipulado pela mídia e o manipulam mais ainda para venderem suas drogas a uma juventude que desejava e até os dias de hoje deseja a liberdade, principalmente a "liberdade para dentro da cabeça" (Nome da música cuja autoria da letra é de Charles Brown Jr).

Santos (2000) sugere uma outra globalização, um processo que seja mais humana. Ele mostra que a atual forma de globalização não é irreversível e a utopia é pertinente, e diz: "É somente a partir dessa constatação, fundada na história real do nosso tempo, que se torna possível retomar, de maneira concreta, a idéia de utopia e de projeto" (p.160). Nesta compreensão, podemos perceber que não é esta a globalização desejada, e sim uma outra, a de todos.

Os dois movimentos, infelizmente foram capturados pela globalização. Venceu o capitalismo , a mídia , o imperialismo Norte Americano,  o tráfico de drogas e o poder militar , o que segundo Foucault (1999) nos afirma: "o poder disciplinar" é adestramento, pois, "a disciplina ‘fabrica' indivíduos; ela é a técnica específica de um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos de seu exercício" (p.35).Mas, a luta pela liberdade continua até os dias de hoje, e ela é atual em qualquer momento histórico.

Tendo como base o documentário: "Notícias de Uma Guerra Particular", pode-se dizer que a repressão militar influenciou o contexto histórico e social do Brasil e consequentemente o contexto histórico e social a Cidade do Rio de Janeiro, onde na Ilha Grande, teve origem o Comando Vermelho. Atualmente quem comanda o mundo do crime é o tráfico de drogas. A reunião de presos políticos com presos comuns; influenciaram muito para o surgimento das facções que comandam o tráfico atualmente no Rio de Janeiro.

Mas, supõe-se que é uma atribuição que se faz de acordo com a história do sujeito, onde cada sujeito constrói a sua singularidade, e ela faz parte de uma continuidade histórico-social, afetado pela sua integração num contexto global. Neste sentido, pode-se também supor que a nossa produção como sujeitos demanda um estar com o outro e um interagir com o outro.

O documentário: "Notícias de Uma Guerra Particular", mostra que a maioria das pessoas envolvidas com o tráfico de drogas hoje em dia são as crianças e os adolescentes. No documentário, F. de 16 anos de idade, diz: "...Quando a gente mata o inimigo, a gente solta fogos, a gente comemora e dá até churrasco, tudo é festa...É uma vitória, ué, não é para comemorar? ...matar o inimigo para mim é uma vitória, o Terceiro Comando, por exemplo..."

No jornal O DIA  de 02 de maio de 2008, a manchete mostra claramente como moradores de um bairro de classe média e alta da Cidade do Rio de Janeiro, sentem medo de morarem perto de uma Comunidade, isso é uma prova de que moradores que vivem na mesma cidade querem se afastar uns dos outros.  Parece não haver solução para a exclusão social dos moradores daquela Comunidade, pois moradores do bairro de classe média e alta próxima a ela, criam até táticas para viverem no meio dessa guerra. A violência que há nessa guerra entre facções como a do Comando Vermelho e a do Terceiro Comando Puro são pela disputa do poder de quem vai comandar o tráfico de drogas naquela região, segundo a matéria do jornal: O DIA, de 02 de maio de 2008:

"Moradores do Leme enfrentam o pânico e buscam proteção...Janelas blindadas e colchões no chão fazem parte da rotina... ‘Não dá para morar de frente o perigo né?'...Como noticiou O DIA em cadernos especial publicado no dia 25, a proximidade com Comunidades do bairro já afeta mercado imobiliário. O preço dos imóveis caiu 70% no Leme...Disputa instala clima de terror........A violência denunciada por O DIA explodiu no dia 21. Liderados pelo traficante José Ricardo Ribeiro Rosa, o Cagado que teria se aliado a facção Terceiro Comando Puro – bandidos invadiram o morro da Babilônia pela mata e entraram em confronto com rivais do Comando Vermelho..." (p. 12).

No dia 03 de maio de 2008, p. 10, mais notícias sobre essa guerra. Segundo o jornal "O DIA", Exército está de prontidão para essa guerra. De plantão nas matas do Leme para impedir ataques ao Forte Duque de Caxias, os Militares fazem um alerta à polícia para não serem confundidos com traficantes dos morros do Leme. Segundo a matéria desse mesmo jornal:

"Rio - Para evitar que traficantes refugiados na mata dos morros Chapéu Mangueira e da Babilônia, no Leme, se aproximem do Forte Duque de Caxias, sentinelas do Exército estão em posições estratégicas desde o início da semana. Policiais do 19º BPM (Copacabana) e do Grupamento de Policiamento em Áreas Especiais (Gpae) chegaram a ser alertados, por telefone, para ter cuidado nas operações e não "confundir" os militares do Corpo de Guarda com bandidos que têm feito da mata campo de batalha... Jornal" (p.10).

Em "Falcão - Meninos do Tráfico" um jovem traficante de drogas, relata que faz uso de cocaína, porque essa substância química o mantém acordado para que possa enfrentar a polícia, segundo Nietzsche (2001, p. 109): "Quem deve enfrentar monstros deve permanecer atento para não se tornar também um monstro...Se olhares demasiado tempo dentro do abismo, o abismo acabará por olhar dentro de ti".

Tiba (2007), relata que substâncias tóxicas como a cocaína, o êxtase produzem ao usuário mudança de humor para um estado eufórico, sentimentos de conforto, empatia e desejo de se comunicar com as pessoas, abertura emocional, aumento da energia corporal, estimulação da libido, redução da crítica, diminuição da inibição, sensação de felicidade, autoconfiança e maior afetividade para com seu parceiro.

Acrescenta-se aqui a informação de que as substâncias liberadas no cérebro por essas drogas (serotonina) demoram semanas para serem fabricadas. Depois que o usuário utiliza seu estoque não terá as sensações esperadas mesmo que a consuma mais. Além disso, elas causam danos às células do cérebro. Cientificamente, o sistema serotoninérgico – responsável pelo controle do humor e dos impulsos – é o mais atingido e lesionado pelo consumo da substância. Tudo isso leva a supor que drogas como essas que provocam satisfação e prazer se transformam em uma questão muito difícil de se solucionar.

Uma característica que leva a crianças e adolescentes a buscar drogas, nos tempos atuais, refere-se a mudança na disponibilidade da experiência da transcendência pelo uso da droga. Como descreve Bauman (1997), esta era anteriormente privilégio de poucos selecionados, fossem eles sacerdotes ou os fiéis merecedores de recompensa por seus sacrifícios. Na cultura pós-moderna, o êxtase, colocado ao alcance de todos os sujeitos, deixa de ser função de determinados critérios religiosos passando a significar o ápice do consumismo, que como diz Bauman (1997): "...para aqueles que conseguiram transformar a vida numa obra de arte da acumulação e insatisfação de sensações..." (p.224). No entanto, a frustrante busca pelo consumo ilimitado prometido pelos mercados legais ou ilegais, produz insatisfação e a sensação de ser falho ou incapaz. Para os consumidores falhos, a sensação de constante incompletude realimenta a busca de satisfação no consumo extasiado seja de bens de consumo, seja de drogas. Um desejo imanente realimentado por uma incompletude por excesso, onde se apaixona mais pelo consumo do que pelo objeto consumido.

A ausência de certezas também tem um lado atrativo para essas crianças e adolescentes, pois produz a sensação de liberdade e de satisfação com as suas novas experiências. Em suas relações interpessoais, como nas do trabalho com as drogas, mantém-se as opções abertas. Essa mudança de disposição é favorecida, segundo Bauman (1997): "um mercado inteiramente organizado em torno da procura do consumidor e vigorosamente interessado em manter essa procura permanentemente insatisfeita" (p.22-23). Como o desejo é imanente, o estranho seria aquele que não é seduzido pela mudança constante promovida pelo mercado consumidor.

Continuando com Bauman (1997), mudanças profundas nas relações sociais dos sujeitos quem faltam recursos para consumir, podem ocorrer de modo a provocar desestabilização das relações desses sujeitos com o grupo social e até desses sujeitos com suas próprias escolhas.

O uso de drogas muitas vezes se faz de forma compulsiva e os usuários podem perder a capacidade de controlar seus gastos. Com isso, enquanto os usuários de classe média e alta encontram meios de financiar seu uso, os mais pobres contraem dívidas com os traficantes. Como se trata de um comércio ilegal, o modo de cobrança mais comum é a ameaça de morte, que para ser mais eficiente tem que se respaldar em exemplos concretizados. Atualmente, é comum lermos em jornais que circulam em nossa cidade os relatos, muitas vezes, desesperados de usuários ou de seus familiares sobre as ameaças de morte por dívidas não pagas. Como prova disso tenho a reportagem do Jornal: "O Globo" intitulada: "O tribunal do tráfico em ação" do dia 31 de março de 2008, que diz:

"O ministro da justiça, Tarso Genro, classificou...- Esses tribunais configuram uma situação de anomia: eles significam a ausência do Estado, o vazio de normas para regular a vida dos cidadãos. Constituem uma ‘justiça' paralela, e reproduzem o que há de pior no imaginário da população..." (p. 9).

Em outras reportagens da série "O tribunal do tráfico em ação" do Jornal: "O Globo", sabe-se que, muitos fogem se mudando para casa de parentes. Outros procuram a internação como um refúgio. Alguns iniciam atividades ilícitas como furtos e assaltos e outros prestam serviços ao tráfico como uma outra forma de pagamento e, assim, constituindo-se esta, numa das portas de entrada para uma "carreira" criminosa.

Nesses documentários, fica claro que para que crianças e adolescentes se aproximem do tráfico não basta que tenha necessidade de ajudar a família na complementação de renda ou falta de inserção no mercado de trabalho. Muitas dessas crianças e adolescentes optam pela carreira criminosa do narcotráfico, numa forma de abrir seu espaço para aspectos subjetivos nas escolhas relacionadas ao consumo e tráfico de drogas. Entre estes é destacada a valorização atual do consumismo, a procura pela sensação e pela fama que alcançam no seu meio ao entrarem para as quadrilhas. Além de um baixo capital financeiro e cultural, essas crianças e adolescentes herdam um capital simbólico negativo definido por sinais exteriores como sua cor de pele, maneira de vestir, linguagem corporal e verbal.

Talvez um projeto de inclusão social de meninos e adolescentes moradores da comunidade do Morro do Estado, na sociedade de classe média e alta do bairro de Icaraí, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro, seja utópico, quando se trata em lutar contra os enormes problemas que levam a exclusão social, como, por exemplo, o uso e a venda de drogas. Porém, os jornais que circulam  na cidade, fazem crer que ainda há condições de possibilidades de uma inclusão social desses jovens moradores de comunidade, em bairros de classe média e alta na nossa cidade, como aconteceu com os meninos da comunidade da Rocinha e com C., que já há algum tempo fazem parte de um projeto de uma escolinha de surfe  nesta mesma comunidade; C. foi protagonista de várias matérias de jornais com essa do jornal O DIA de 03 de Dezembro de 2006:

"o menino C. vivia solto pelas vielas da Rocinha...e brincava de ‘soldado do tráfico' durante as incursões policiais à Comunidade... Não sabia ler nem escrever o nome, mas atendia prontamente ao apelido de ‘Chefinho': nas brincadeiras com outros garotos da comunidade, era sempre seguido como um líder...C. foi fotografado por O DIA em cima de um veículo blindado da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) da Polícia Civil...Enquanto os policiais caçavam traficantes, o menino se divertia fingindo atirar nos agentes...Meses depois, Vânia Maria Tavares... Levou-o para casa e, com o consentimento da mãe verdadeira, que também mora na Rocinha, mas não tem condições de criá-lo, passou a educá-lo...Hoje, C. está finalmente matriculado na classe de alfabetização de uma escola próxima....quando sobe na prancha e encara o mar, recupera parte de sua infância...Sorri e volta a ser o que toda criança deve ser: apenas criança...Garotada da escolinha de surfe da Rocinha...pequenos surfistas da Comunidade e seu instrutor, Bocão, viraram tema de filme argentino rodado no Rio..." (p.13).

Existindo condições e possibilidades de que um projeto de não inclusão de meninos e adolescentes no mundo do crime seja extremamente viável e não se torne uma utopia se abrirão portas de esperança para a cidade e suas adjacências de se tornarem pelo menos um pouco mais humanas.

 

4 - RESPONSABILIDADE SOCIAL DO PSICÓLOGO – POSSIBILIDADES DE AÇÃO

O grande desafio não somente da Psicologia, como de outras disciplinas das ciências humanas, neste início de século seria escutar o outro, ter a percepção do sentimento de: "eu estou perdido" no rosto dos excluídos, mesmo que "de relance", como fez Lispector(1978): "Se sei quase tudo de Macabéa é que já peguei uma vez de relance o olhar de uma nordestina amarelada. Esse relance me deu ela de corpo inteiro" (p. 74). Enfim, escutar como nos diz Foucault (1999): "o rugido da batalha". Que segundo Azerêdo (2002): "É preciso querer saber das verdades do outro e não ficar preso à mesmice de nossas verdades, verdades essas, que construímos tantas vezes apoiadas em privilégios" (p.19).

Uma atribuição dada ao Psicólogo, desde 2003, está no art. 8º da Lei das Execuções Penais (LEP), é a elaboração dos exames criminológicos iniciais, que objetivam classificar o condenado.

No documentário: "Ônibus 174", temos o exemplo da elaboração de um exame criminológico, que dá um Parecer Psicológico e classifica o protagonista. O Parecer é de Sandro, que aos 16 anos foi detido e preso. A sentença que lhe foi aplicada foi a medida sócio educativa de interação (medidas já faladas anteriormente), como forma de oferecer ao adolescente maior proteção orientando-o para profissionalização, documentação e reinserção no ambiente familiar. Segundo o documento da Secretaria do Estado de Justiça Interior - Setor 5 – Social/Psicologia, Sandro, foi bastante resistente em prestar declaração sobre sua situação social, dizia não lembrar das coisas porque tinha problemas demais na cabeça. Mas não quis falar sobre esses problemas. Dependência química ignorada – diz que já usou cocaína duas vezes. Conclui o Parecer Psicológico – Sandro tem demonstrado bom comportamento, está cumprindo as regras e tendo atitudes cooperativas e solícitas, tanto para os profissionais desta quanto para com os demais adolescentes.

Segundo Gonçalves e Garcia (2007), o investimento em serviços sociais de qualidade é a melhor tática de prevenção. É de suma importância que esses serviços estejam direcionados para as questões que as crianças e os adolescentes lhes trazem. Porém, as autoras relatam que as táticas que são usadas nas campanhas preventivas apresentam um paradoxo, a diferença entre proteção e prevenção. As políticas preventivas de saúde são amiúde norteadas por campanhas sanitárias cujo objetivo muitas vezes não são reconhecidos pelas crianças ou adolescentes como algo que tem a ver com eles. Em sua maioria, eles se confundem com o problema que se deseja solucionar. Gonçalves e Garcia (2007):

"...por exemplo: drogas e gravidez precoce. Em vez de usuário do serviço, ele é apresentado como a origem do problema, por isso, tais mensagens devem evitar o uso de argumentos de autoridade de cunho científico ou moralista e serem veiculadas através de uma linguagem jovem, para que a identificação seja maior e, em conseqüência, a adesão. Mais um exemplo: em 2002, um veículo de comunicação, em escala nacional, elegeu o jovem negro como símbolo de uma estratégia de marketing social. O objetivo da campanha era divulgar o trabalho de prevenção realizado pela empresa, evitando que aquele jovem (supostamente mais vulnerável ao crime) fosse privado do acesso à educação. A princípio, a campanha pode ser interpretada como louvável, todavia, olhada de perto, a mensagem veiculada não foi a de proteção do jovem, mas da sociedade, contra os possíveis males decorrentes da ação daquele indivíduo" (p. 538-553).

A grande contribuição do Estatuto no âmbito da política de atendimento no que se refere às situações de risco é a criação dos Conselhos Tutelares. Onde o objetivo desses Conselhos é garantir que se aplique a Lei (art. 131) em todas as vezes que os direitos adotados na Lei forem infringidos ou ameaçados (art. 98), estabelecer as devidas medidas de proteção. Porém, o que se observa não é o que a Lei estabelece na sua prática, devidos aos escassos recursos humanos e econômicos de que se dispõem. Segundo Gonçalves e Garcia (2007):

...reduzem seu funcionamento às situações emergenciais, nem sempre evitando o estigma de "brigada policial" e nem sempre libertos do jugo do Poder Judiciário, numa cultura em que a menoridade tende ainda hoje a ser tratada como uma questão de polícia (p. 538-553).

As premissas que instituem Conselhos e norteiam as ações de proteção às crianças e adolescentes precisam ser reconstruídas. Os Conselhos Tutelares, assim como outro lugar de referência para crianças e jovens, têm direito de instalações e de acordo com Gonçalves e Garcia (2007): "suporte de modo a que os usuários desse serviço reconheçam ali um lugar de proteção e de busca de ações positivas ..."

As autoras também nos falam de outras ações que estão incluídas no mesmo Estatuto, que não são aceitáveis, são as chamadas "ações reparadoras", elas envolvem situações diversas que pedem novos laços sociais que foram desfeitos com a família, a comunidade ou com as referências significativas para a criança e o jovem. Nessas situações, encontram-se crianças ou adolescentes que tem problemas com a lei. Por razões culturais, por parte dessas crianças ou adolescentes, existe uma enorme dificuldade de que se cumpra a Lei. Como um transgressor, a criança ou adolescente, se defronta com muitos procedimentos de retratação que não atendem aos objetivos das chamadas medidas socioeducativas. Gonçalves e Garcia (2007) dizem que:

"O rótulo de ‘criminoso' não se extingue com as ações punitivas vividas nas instituições de acolhimento e internação, mas permanece aderido à imagem construída sobre o jovem, bem como à sua auto-imagem. Como mudar valores é um expediente que demanda tempo e capacidade de equacionar conflitos e interesses, nosso olhar se volta para medidas mais exeqüíveis nos ambientes institucionais" (p. 538-553).

De acordo com Fernandes (2006) et al: "Cidadania, trabalho e criação: exercitando um olhar sobre projetos sociais", uma possível proposta de ação junto à população em "situação de risco social", ou uma estratégia para "tirar crianças das ruas", "controlar a violência nos grandes centros urbanos" é o ensino da arte voltado para crianças, adolescentes e jovens de classes pobres. O lugar de práticas onde esse discurso procura realizar-se são os projetos sociais. Esses projetos são os principais responsáveis pelo desenvolvimento de atividades artísticas junto às classes mais pobres da sociedade, segundo Fernandes (2008) et al:

"No que diz respeito à concepção de arte, a busca central é do reconhecimento dos caminhos divergentes no conjunto de projetos sociais atravessados pela ideologia do terceiro setor. Seguindo perspectivas diferentes de alinhamento às exigências contidas nas propostas de financiamentos, surgem desde propostas que qualificam a arte como processo de criação, até aquelas que a utilizam como instrumento de adaptação da pobreza à lógica de funcionamento neoliberal da sociedade" (p.128-129).

Um mapeamento de onze projetos sociais que trabalham com arte na Grande João Pessoa e que integraram o campo de uma pesquisa realizada pelo Departamento de Psicologia da UFF, Fernandes (2008) et al nos mostra que:

"As atividades realizadas pelos onze projetos pesquisados são bastante diversificadas. Nesse conjunto foram encontradas as seguintes modalidades de trabalho com arte, desenvolvidas na sua grande maioria como oficinas: teatro, música, capoeira, moda, sensibilização, artes plásticas, confecção de adereços, percussão, confecção de brinquedos, empalhamento de cadeiras, reforço escolar, informática, educação física e esportes, crochê e pintura em tecido. Um desses projetos desenvolve seus trabalhos ligados à evangelização, enquanto que um outro parte de temas relativos à saúde" (p.131).

Educadores ou professores constituíram as equipes de profissionais. Profissionais de apoio como pedagogos, assistentes sociais e psicólogos tiveram participação em quase todas as equipes.

De todos os projetos que recebem financiamento direto de organizações nacionais ou estrangeiras além de parcerias estabelecidas com a administração pública ou diretamente com pessoas físicas, somente um não recebe apoio financeiro de nenhuma instituição.

O desenvolvimento da cidadania através da Arte (28%) e para a garantia do direito ao contato com a Arte (27%), mostraram para onde estavam voltados os projetos sociais que foram visitados. Fernandes (2008) et al dizem:

"No entanto, na discussão gerada na reunião de restituição, o grupo presente acatou a afirmação trazida por um dos projetos na modalidade de resposta aberta que indicava como fundamental no seu trabalho o desenvolvimento da consciência do ser associada a melhoria da qualidade de vida. Essa última colocação, que mobilizou os debates entre os coordenadores, focalizava o indivíduo e suas experiências subjetivas, enquanto os temas cidadania e direito, trazidos no momento de resposta ao questionário, demonstravam uma maior preocupação na relação deste sujeito com a sociedade" (p.132).

Atribuiu-se como importante relacionar as assertivas que mapeavam os objetivos dos projetos e a maneira como definiram o grupo social para o qual foi dirigido o trabalho, na discussão dos resultados. De acordo com Fernandes (2008) et al: "‘Prevenir a marginalidade social' e ‘tirar a criança e os jovens das ruas', não foram assertivas consideradas como relevantes do ponto de vista da fala dos coordenadores". Porém, utilizou-se de uma maneira extremamente expressiva, a formulação de risco social ao categorizar as crianças, adolescentes e jovens com os quais trabalharam. Todos os coordenadores dos projetos que estavam presentes na reunião de restituição, afirmaram de uma maneira em geral o termo risco social era utilizado por todos com a intenção de não se diferenciarem do discurso da mídia, deste modo procuraram um diálogo com os órgãos financiadores. Segundo Fernandes (2008) et al : "Alguns coordenadores, ainda, reafirmaram essa justificativa colocando que estavam referindo-se ao estado de vulnerabilidade do grupo social assistido, em função de suas precárias condições de vida".

Afirmaram que os alunos são bastante criativos, embora para 55% fossem encontradas algumas limitações nas condições de aprendizagem, segundo Fernandes (2008) et al: "talvez por defasagens produzidas pela baixa qualidade do ensino público". Foi identificada como uma preocupação, a articulação com a escola, dificuldades em organizar atividades em parceria, foram apontadas pelo grupo no debate.

Ainda, Fernandes (2008) et al:

"O mais comum é a utilização do espaço físico da escola. Há uma expectativa de que o trabalho com arte repercuta no processo de escolarização melhorando as condições de aprendizagem, intervindo na formação da criança (respeito, cidadania, independência, aumento da auto-estima, conhecimento artístico, convivência em grupo, etc.), ou ainda, diminuindo a resistência em relação à escola" (p.133).

A evasão associada, especialmente a necessidade de o aluno ter de trabalhar para ajudar a família foi assumida pela maioria dos projetos. Podem estar relacionados à evasão, outros acontecimentos como: falhas do próprio projeto e alteração do lugar de habitação. Fernandes (2008) et al:

"As principais dificuldades encontradas, dizem respeito a limitações financeiras; a problemas no envolvimento das crianças, adolescentes e jovens (por não saber ler e escrever, por violência familiar ou por falta de estímulo) e às próprias características e organização do projeto, sendo apontados, a inadequação do espaço físico, o trabalho desenvolvido por voluntários e a precariedade na formação dos educadores" (p.133).

A partir da década de 90, no Brasil, os projetos sociais ficaram mais em evidência no cenário de práticas educativas. Organizações Não-Governamentais (ONGs), associações comunitárias, fundações ou entidades filantrópicas e outros, formaram um grupo heterogêneo, que dirigia suas ações a um objetivo em comum de promover o exercício da cidadania. Essas organizações são chamadas do terceiro setor e se definem com fins públicos, ou seja, sem fins lucrativos, suas ações estão voltadas especialmente a nível do poder local, no meio urbano e na gestão de cidades. As problemáticas sociais , tais como: violência contra a mulher e outras questões de gênero e raciais; controle da gravidez prematura e ações contra a transmissão da Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e defesa dos  direitos dos  soropositivos ; assistência a meninos e meninas residentes nas comunidades pobres ou que vivem e trabalham nas ruas. São de extremo interesse para essas organizações atualmente.

"Conforme aponta Gohn, a partir dessa década pode ser identificada a atuação organizada da sociedade civil em atendimento a essa demanda através de Organizações Não-Governamentais. Destaca-se, neste grupo aquelas organizações oriundas ou herdeiras da cultura participativa, identitária e autônoma dos anos 70/80 articuladas aos movimentos sociais reivindicatórios e de expressão cultural e as organizações mais propositivas que atuam segundo uma lógica mais integrada às políticas neoliberais...No processo de captação de recursos por essas organizações são desenvolvidos  alguns  programas  governamentais  em parceira com prefeituras e governo estadual e federal. As políticas públicas vão sendo dessa forma pulverizadas e a assistência à população passa do campo do direito para o da filantropia. Como conclui Gohn, "os novos cidadãos se transformaram em clientes de políticas públicas administradas pelas entidades do terceiro setor" (GOHN ,2008, apud FERNANDES et al, p. 127).

Os programas governamentais estão sendo problematizados. Esses programas são dirigidos às camadas populares, eles têm como intenção afetar as crianças e adolescentes em situação de risco social. Informamos, que essa intenção é produzida a partir da associação entre pobreza e marginalidade. A pobreza hoje em dia é vista como sinônimo de ociosidade, vadiagem, vícios e criminalidade, de uma forma natural, por uma sociedade capitalista. Desta maneira, como são vistos os adolescentes e as crianças pobres estariam, assim, pré-destinados a representar um "perigo social".  Segundo Fernandes (2008) et al:

"A população empobrecida é, também, marcada pela perversidade do trabalho infantil intimamente relacionado às deficiências do sistema educacional e à ausência de políticas públicas que respondam às suas necessidades de sobrevivência. O governo brasileiro pressionado, principalmente no cenário internacional, criou, na década de 90, segundo Alberto (2003), dois programas sociais: Programa Nacional de Geração de Emprego e Renda (PRONAGER) e Programa de Erradicação do Trabalho Infantil" (PETI) (p.128).

Implantado em 1996, o PETI teve como meta as seguintes ações: permanência das crianças e adolescentes (07 a 14 anos) nas escolas; o afastamento do trabalho infantil, através da implantação de um programa de distribuição de bolsas (R$ 40,00 para a zona urbana e R$ 25,00 a zona rural). Esse programa desenvolve uma jornada com atividades recreativas, esportivas, artísticas e culturais. Tudo isso complementando o horário da escola ou reforçando as frequências escolares das crianças e adolescentes. Nessas ações é também prevista a promoção social das famílias mediadas por ações socioeducativas de ampliação e geração de renda. Nessas localidades a jornada desenvolvida é organizada por meio de ONGs e outras entidades que compõem o Terceiro Setor através de parcerias, no qual a escola ou o próprio município não contam com uma estrutura satisfatória.

 

CONCLUSÃO

Os conflitos vividos pelos sujeitos ganharam mais sentido quando foram vistos pela ótica da Psicologia, a partir de uma análise na qual as práticas ‘psis' fazem parte. Não se pensou em nenhum momento em usar de ortodoxias e nem de especialismos ‘psis' para compor este trabalho. As ações do projeto de uma escolinha de surfe da Comunidade da Rocinha e todas as propostas das ONGS referidas neste trabalho podem dar certo e retirar crianças e adolescentes do mundo crime.

Essas ações nos servem como analisador para uma situação que é muito complexa. Neste trabalho, analisam-se também, os mecanismos que conduzem as diversas circunstâncias em que adolescentes e crianças vivem numa situação de exclusão como no seu direito ao trabalho, a educação, habitação, livre arbítrio e de ir e vir. Essas análises desconstroem o pensamento de que entre exclusão e desigualdade social existe uma simples relação que está vinculada a uma sociedade fragmentada, porque na verdade os valores que estão em jogo se vinculam a múltiplos processos sociais excludentes.

Quando se organizou a composição deste trabalho, houve uma preocupação de se contemplar com os diversos olhares que ampliaram a nossa visibilidade sobre as manobras históricas e as estratégias sócio-econômico-políticas, que vieram tecendo a inclusão de crianças e adolescentes no mundo do crime no seu cotidiano, nas suas relações sociais e nos modos de subjetivação. Para isso, apresentaram-se textos que levam a fazerem-se reflexões sobre o conceito de exclusão.

Constatamos que há diversos modos de subjetivação que levam sujeitos a refletirem sobre o que pode ser inclusão ou exclusão.  Um dos principais efeitos disso é a luta constante pela inclusão em uma sociedade e a exclusão do mundo do crime, paradoxo que gira em torno da palavra exclusão e que foi o tema deste trabalho.

Segundo Nietzsche (2001):

"Quando um pensador trata de descobrir de uma só vez em todo 'encadeamento causal' algo que se assemelhe a uma frustração, a uma necessidade, a uma concatenação obrigada, a uma pressão, a um servilismo, é quase sempre sintoma de que há algo que falha no ente em questão e ao sentir deste modo é inquestionável que a personalidade ali se desvele" (p.41- 42).

O lugar do psicólogo nesse contexto pressupõe parcerias. Será que uma Psicologia que não permite que outros saberes lhe atravessem e que está vinculada a conceitos preestabelecidos conseguirá existir ainda por muitos anos? De acordo com Nietzsche (2001):

"Toda a psicologia permaneceu vinculada, até o presente a preconceitos e apreensões de ordem moral...Concebê-la, como eu faço, sob...uma genética da vontade de potencia, é uma idéia que ninguém abordou nem mesmo superficialmente...A poderosa força dos preconceitos morais penetrou profundamente no círculo da espiritualidade pura, aparentemente a mais fria e desprovida de idéias preconcebidas, e, como é natural, influiu nela – de modo prejudicial – uma ação paralisadora, deslumbrante e deformante...Uma psicofisiologia autêntica se choca contra resistências inconscientes no coração do investigador...este homem sofrerá algo como um enjôo devido a orientação do seu próprio juízo" (p.43 - 44).

Para uma possível intervenção da Psicologia, ao longo deste trabalho problematizaram-se as dificuldades e possibilidades das crianças e adolescentes que vivem nas Comunidades da cidade do Rio de Janeiro. Com isso colocou-se a própria Psicologia em questão. As questões levantadas neste trabalho nos fazem pensar sobre o contato, ao que tudo indica, deveria ser realizado entre o Psicólogo e o ‘paciente'. Porém, se trata de um ‘paciente' bastante adjetivado: discriminado, privado da liberdade de ir e vir, "delinquente", "perigoso" e etc.

Pretende-se que este trabalho possa contribuir para um repensar em torno da Psicologia neste momento e sua articulação com os problemas que giram em torno dos moradores da cidade do Rio de Janeiro e adjacências. Que a Psicologia e as outras disciplinas das ciências humanas vençam esse grande desafio, que é escutar o outro (a sociedade da exclusão/inclusão). Segundo Guattari e Rolnik (2000):

"... devemos interpelar todos aqueles que ocupam uma posição de ensino nas ciências sociais e psicológicas, ou no campo do trabalho – todos aqueles, enfim, cuja posição consiste em se interessar pelo discurso do outro. Eles se encontram numa encruzilhada política e micropolítica fundamental. Ou vão fazer o jogo dessa reprodução de modelos que não nos permitem criar saídas para os processos de singularização, ou, ao contrário, vão estar trabalhando para o funcionamento desses processos na medida de suas possibilidades e dos agenciamentos que consigam pôr para funcionar" (p. 29.)

Não podemos ignorar que o Psicólogo é convocado a fazer parte da máquina das ciências sociais e psicológicas, a ser uma das suas engrenagens. Um psicólogo por mais desavisado que seja, não pode se deixar ser capturado, prisioneiro dos dispositivos de controle mortificantes, que giram em torno dessas crianças e adolescentes moradoras de Comunidades do Rio de Janeiro.

Entre os moradores dos bairros de classe média e alta e os moradores das Comunidades na cidade do Rio de Janeiro, existem fronteiras ,para muitos, elas são tênues, são imperceptíveis, mas para quem as vê com uma ótica como a que foi vista neste trabalho, percebe que os contrários como a pobreza e a riqueza convivem lado a lado, percebe também como a sociedade criou um sistema para poder mascarar suas contradições: concedendo poder aos técnicos, que terão como função ampliar as fronteiras da exclusão ao mistificar a violência através do tecnicismo. Segundo Basaglia (1985):

"O novo psiquiatra social, o psicoterapeuta, o assistente social, o Psicólogo de indústria, o sociólogo...são os administradores da violência no poder, na medida em que, atenuando os atritos, dobrando as resistências, resolvendo os conflitos provocados por suas instituições, limitam-se a consentir, com uma ação técnica aparentemente separadora e não-violenta, que se perpetue a violência global. Sua tarefa que é definida como terapêutica-orientadora, é adaptar os indivíduos à aceitação de sua condição de ‘objetos de violência', dando por acabado que a única realidade que lhes cabe é serem objeto de violência se rejeitarem todas as modalidades de adaptação que lhes são oferecidas" (p.101).

A história dessa cidade conta que ela se modernizou expulsando para os morros os cidadãos de baixa renda. Observa-se nesta história uma opção que foi sempre pela separação, uma opção que dividiu a cidade. Se quisermos juntar a cidade novamente. A Psicologia e as outras disciplinas das ciências humanas podem ser um canal de auxílio na reflexão contra essa política da exclusão.

Logo, ao se percorrer alguns momentos dessa história das Comunidades, foi possível analisar de que modo são construídas algumas das subjetividades que se encontram presentes em nossos discursos, que produzem verdades e instituem concepções.

Historicamente, todos aqueles que vem habitando os chamados territórios dos pobres da cidade do Rio de Janeiro vão sendo classificados como ‘diferentes', carentes e ‘perigosos'. ‘Perigosos', que representam ameaças para as classes média e alta dessa cidade e que desejam que a polícia tome medidas de controle ou eliminação do ‘perigo'. São essas políticas de exclusão que produzem subjetividades, que propõem intervenções radicais e operações policiais para a eliminação e remoção destes.

A proposta deste trabalho é que essa história vista pela ótica da Psicologia funcione como analisador das atuais práticas das políticas de exclusão. Sendo assim, essa história atua na forma de um impulso transformador, como uma potência capaz de desnaturalizar ideias já estabelecidas no pensamento das classes mais favorecidas, a fim de trazer um pensar diferente, apresentando  planejamento para uma possível política de inclusão de crianças e adolescentes pobres no mundo do trabalho, uma política do presente onde elas poderão sair das Comunidades de onde moram para irem trabalhar nos bairros das classes mais favorecidas sem carregarem consigo rótulos de ‘perigosos' ou ‘delinquentes'.

 

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NOTAS:

* Antônio Vieira Vitória – FAMATH - Faculdades Integradas Maria Thereza
1 Comunidades: termo utilizado nas décadas de 80/90 conhecido como Favelas, etiologia desconhecida.

 

Endereço para correspondência
Antônio Vieira Vitória
Endereço eletrônico:antoniopsique@bol.com.br

 

Recebido em: 05/02/2009
Aprovado em: 26/06/2020