POSSIBILIDADES DE ATUAÇÃO DO GESTALT-TERAPEUTA EM SITUAÇÕES DE CRISE E EMERGÊNCIAS: RELATO DE EXPERIÊNCIA
Palavras-chave:
CRISE E EMERGÊNCIASResumo
A demanda pelos saberes e fazeres dos psicólogos para além do consultório tem crescido vertiginosamente, à medida que a vida em sociedade se complexifica. Somos convocados a atuar em espaços institucionais diversos, como escolas, empresas, instâncias jurídicas e, até mesmo, em situações cujos limites e possibilidades de intervenção estão pouco delineados, como as de crises, desastres e emergências. Tais situações, por natureza, impõe-se aos sujeitos, os quais, a despeito das representações sociais com que tenham se identificado até então, passam a ser reconhecidos como “vítimas”; além de experimentarem uma forma peculiar de sofrimento (MÜLLER-GRANZOTTO, 2009; 2012a; 2012b). De acordo com a perspe ctiva destes autores, os ajustamentos criativos que predominam nestas situações são os ajustamentos de inclusão: apelos por inclusão ética, gratuita e solidária, os quais se baseiam no reconhecimento do outro como alguém capaz de ajudar, de oferecer suporte para que se possa voltar a criar (MÜLLER-GRANZOTTO, 2012b). Ressalta-se que o sofrimento em questão pode atingir tanto sobreviventes e pessoas afetivamente ligadas àqueles que faleceram, quanto os membros da equipe de resgate e outros serviços de apoio (FRANCO, 2005). Sendo assim, o gestaltterapeuta, reconhecendo-se como esse outro-capaz-de-ajudar tecnicamente, deve estar preparado para intervenções distintas daquelas utilizadas diante de ajustamentos neuróticos ou psicóticos (MÜLLER-GRANZOTTO, 2012a; 2012b). O objetivo deste artigo é apresentar e discutir, à luz da Gestalt-terapia, o trabalho de suporte psicológico que vem sendo desenvolvido em situações de pós-acidente aeronáutico envolvendo aer onaves militares. Os psicólogos foram convocados a atuar poucos dias após à ocorrência dos eventos, sob a seguinte demanda explícita: facilitar o restabelecimento da capacidade operacional dos integrantes da organização-vítima do acidente; e oferecer atendimento técnico aos familiares dos profissionais que faleceram em decorrência do evento. Para atender ao aspecto organizacional da demanda, cujo foco era o restabelecimento do desempenho e a saúde ocupacional, o trabalho consistiu em mapear os focos de tensão – ou “pedidos de socorro” – da organização e disponibilizar a escuta psicológica ao sofrimento anunciado pelos seus integrantes, de forma coletiva. A ideia era poder acompanhar, em cada micro-campo mobilizado da organização, o processo de resignificação das representações sociais acerca de si mesmo e da atividade laboral, e a reconstrução da autonomia e da operacionalidade dos coletivos de trabalho, sem prejuízos ao funcionamento saudáv el dos mesmos. O atendimento aos familiares, por sua vez, traduziu-se na criação de um espaço e na disponibilidade para acolher a expressão verbal e/ou comportamental e/ou emocional do luto, tal como fosse possível aos sujeitos naquele momento: choro, grito, revolta, lamentação, pedido de informações, dentre outros. Cabe salientar, que os efeitos desta forma de atuação do psicólogo não são passíveis de mensuração objetiva. No entanto, pudemos perceber, a partir do relato dos próprios participantes, e considerando a cultura organizacional rígida a que eram submetidos, que a presença e a ação do psicólogo permitiram que o sofrimento peculiar daquelas pessoas fosse priorizado, acolhido, expresso e elaborado. E, acima de tudo, constatamos que apropriar-se do luto foi “o primeiro passo para a construção de uma nova identidade antropológica” (MÜLLER-GRANZOTTO, 2012b) e, no caso de alguns, contribuiu, ainda, para a reconstrução da identidade laboral . Tal discussão torna-se relevante por ser este um campo de atuação do psicólogo em construção, com práticas e diretrizes ainda pouco estruturadas. Cabe-nos, nestas situações, enquanto gestalt-terapeutas, sempre resgatar como base de nossas intervenções a visão de homem e de mundo peculiar da abordagem, que reconhece no outro-emsofrimento a potencialidade para crescer e seguir criando mesmo diante do imprevisto e indesejável. Também nos é fundamental, consistindo num diferencial de nossa prática, o estabelecimento de uma relação dialógica - ainda que o vínculo com os que demandam nossa intervenção seja de curta duração -, a qual permite que todo diálogo aconteça tendo como fundamento o pertencimento a uma relação. E, nesse contexto, o objetivo jamais será tutelar as vítimas, mas sim oferecer-lhes suporte para que possam recobrar ou “relembrar” a habilidade de reconhecer necessidades, experenciar emoções significativas e agir no mundo, ass imilando o novo que as surpreendeu tão drasticamente. Palavra 1: Intervenção Psicológica Palavra 2: Situação de Crise Palavra 3: Gestalt-terapia Modalidade de apresentação: Comunicação/ tema livre Área de concentração: Contribuições teóricasPublicado
2015-12-01
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Seção
Temas-Livres