A UTILIZAÇÃO DE CONTOS DE FADAS E OUTRAS ESTÓRIAS NO EXERCÍCIO CLÍNICO

Autores

  • Dafne Andrea Vazquez

Palavras-chave:

contos de fadas na psicologia

Resumo

O costume de contar estórias é tão remoto quanto a existência do ser humano, assim como o encantamento das crianças e adultos ao ouvi-las; muito bem retratado no conto “As Mil e uma Noites”, no qual Sherazade livra-se da morte contando estórias e prendendo a atenção do seu algoz. Diversos autores têm se dedicado ao estudo dos mitos, lendas e fábulas (Bonaventure, 1992; Campbell, 1997; Del Picchia, 2010; Von Franz, 1993) com o intuito de compreender o fascínio que estes exercem sobre as pessoas de um modo geral. Campbell (1997) observou a estrutura comum que essas produções possuem, nas mais diversas culturas. A figura do herói foi identificada em todas elas e, além disso, o fato desse herói receber um “convite” para sair de sua acomodação e lançar-se à aventura. Ao aceitar o convite, ele inicia uma trajetória na qual se deparará com forças que facilitam e dificultam os seus passos e, ao retornar para a sua origem, o fará contemplando em si uma série de aprendizagens e de mudanças: ele volta reconfigurado. Nessa nova configuração deixou a posição de vítima passiva das circunstâncias para tornar-se agente de mudanças. É possível tecer uma clara relação entre as descobertas de Campbell (1997) e a proposta de Murray (1995) que, ao criar o tão divulgado e pertinente TAT (Teste de Apercepção Temático), buscou abordar o processo projetivo mediante a criação de estórias. O autor propôs que, trabalhando com o material produzido, houvesse a identificação da figura do herói e de suas necessidades, assim como as facilidades e dificuldades que ele encontra para concretizá-las. Sabe-se que o TAT deu origem a uma série de outros testes temáticos, que também tomam como base o mesmo tipo de estrutura para a sua análise. Tanto no trabalho de Campbell (1997), como no trabalho de Murray (1995), é possível identificar o modelo teórico do ciclo de contato (Ginger & Ginger, 1995), um dos pilares da Gestalt-terapia, assim como os conceitos de ajustamento criativo e de polaridades, apesar de nenhum dos dois autores serem Gestalt-terapeutas. Uma pessoa inicia cada ciclo de contato por meio de sensações e da identificação de necessidades; ou seja, uma figura se encontra aberta e busca por um fechamento. Nessa primeira fase do ciclo, denominada pré-contato, o self funciona como “id”. Num segundo momento, ocorre o contato, no qual há um enfrentamento do meio: são feitas escolhas que visam à satisfação das necessidades que foram identificadas; o self funciona no modo “eu” e adota-se uma postura mais ativa. Na terceira fase do ciclo de contato, o contato pleno, o self também funciona no modo “eu” e ocorre uma abolição momentânea das fronteiras de contato; uma confluência considerada saudável. Por último, passa-se à última fase do ciclo, o póscontato: as experiências nas quais ocorreu o contato são assimiladas e aquilo que é necessário para o desenvolvimento da pessoa será parte da nova configuração que ela apresenta. O self funciona no modo “personalidade” e a figura inicia l se fecha, um ciclo se conclui. Pois bem, é possível relacionar a fase do pré-contato ao momento em que o herói recebe o chamado para a ação e sai do seu comodismo, tão bem descrito por Campbell (1997). Na linguagem gestáltica, algo anseia por mudanças, a figura está aberta. Em seguida, o modelo de Campbell (1997) descreve uma série de fases em que o herói fará o enfrentamento e concretizará, por fim, o seu objetivo; essas fases podem ser relacionadas ao contato e ao contato final, no ciclo de contato gestáltico. Por último, o herói deverá retornar de sua trajetória transformado e isto corresponde, no ciclo de contato, à assimilação daquilo que vivenciou, ao pós-contato. Para que todo o processo de contato ocorra sem interrupções e que haja um adequado desenvolvimento, a pessoa deverá distinguir suas necessidades, diferenciar entre o que é figura e o que é fundo em cada momento, assim como deverá saber escolher as formas de enfrentamento que utilizará, ajustando-se criativamente no seu caminhar. O que será assimilado ao longo desse percurso são polaridades com as quais é necessário dialogar para poder integrá-las, tornando-as parte da nova configuração que surge dessa jornada. Um novo ser humano surge a cada ciclo de contato que se completa; flagra-se, assim, a impermanência e a transcendência do existir. No exercício clínico a utilização das narrativas mostra-se bastante útil. É possível trabalhar de diversas maneiras que serão abordadas neste minicurso. Desde a utilização de estórias já conhecidas, que podem ser dramatizadas pelo cliente, dando voz e buscando integrar cada polaridade que estas apresentam, até a criação de estórias a partir de qualquer material produzido por ele (colagem, sonho, cenário no jogo de areia gestáltico, pintura, etc.). Como estratégias didáticas serão utilizadas a exposição teórica e breves exercícios e relatos de caso. REFERÊNCIAS Bonaventure, J. (1992). O que conta o conto? São Paulo: Paulus, 1992. Campbell, J. (1997). O Herói de Mil Faces. São Paulo: Cultrix, Pensamento. Del Picchia, B. & Balieiro, C. (2010). O Feminino e o Sagrado: Mulheres na Jornada do Herói. São Paulo: Ágora. Ginger, S. & Ginger, A. (1995). Gestalt: uma terapia do contato. São Paulo: Summus, 1995. Murray, H.A. (1995). T.A.T. Teste de Apercepção Temática. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1995. Von Franz, M.L. (1993). Érase una vez...: una interpretación psicológica. Barcelona: Luciérnaga, 1993 Modalidade de apresentação: Comunicação/Tema livre Público-alvo: Estudantes e profissionais com interesse no assunto.

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Publicado

2015-12-01