Cirurgia bariátrica e resiliência: o sujeito em busca da melhor forma

Autores

  • Fernanda Galhardo de Castro

Palavras-chave:

Cirurgia bariátrica e resiliência

Resumo

Este trabalho é elaborado a partir dos efeitos gerados pelo processo de cirurgia bariátrica tanto no aspecto físico como psíquico do indivíduo, relacionando-os com o conceito de resiliência e o papel do psicólogo neste contexto. Observase que a ocorrência de casos clínicos em que a cirurgia bariátrica é utilizada como recurso para proporcionar melhor qualidade de vida é crescente. Segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM), o Brasil lidera as pesquisas na área, podendo este recurso também ser conhecido como cirurgia da obesidade, ou ainda, redução de estômago, reunindo técnicas com respaldo científico destinadas ao tratamento da obesidade e das doenças associadas ao excesso de gordura corporal ou agravadas po r ele. Neste caso, é considerado o adoecimento em seu aspecto psicológico. Segundo Silva e Kawahara (2005), “a obesidade é uma doença crônica, complexa, multifatorial e de muito difícil tratamento”, isto é, implica em alterações a nível psicológico que, associadas ao avanço nos estudos sobre o assunto, apontam para a necessidade de haver maior atuação do profissional de psicologia, compreendendo a forma como o indivíduo faz contato com o seu corpo e com o campo no qual está inserido. “Não existe eu e meu corpo. Só sei que existimos. É a necessidade de meu ser que faz tudo acontecer. Meu corpo não pode ser pensado isoladamente” (RIBEIRO, 2006, P. 97). Se pensarmos numa sociedade que se modifica a todo tempo, numa velocidade extraordinária, temos que considerar que o indivíduo inserido nela tem necessidade de ajustar-se internamente de forma que acompanhe tais mudanças externas. Segundo a revista viver, novembro, 2000 “o resultado são indivíduos com o mundo interno cheio de flutuações, com dificuldades em relação à auto-imagem e, portanto, à auto-estima, tentando lidar com ansiedade, procurando encontros e achando na maior parte das vezes desencontros.” É possível, então, indicar dois pilares que sustentam a cirurgia bariátrica como recurso utilizado com frequência crescente: Os efeitos de emagrecimento acelerado, estando de acordo com a velocidade com que informações são obtidas e fatos gerados atualmente; e a busca pelos padrões do corpo socialmente e culturalmente estabelecidos. Tendo em vista a busca pela melhor forma do indivíduo no que se refere à relação consigo, seu corpo e com o contexto no qual está inserido, destacamos o conceito de resiliência como referência para o processo de aproximação deste aos ajustamentos necessários. Segundo a Revista de Psicologia do Instituto Gestalt de São Paulo, N 3, 2006, “Em Gestalt terapia, entendemos resiliência como a capacidade do indivíduo realizar ajustamentos criativos que sejam funcionais quando diante de situações adversas”. Dessa forma, é importante destacarmos que, ao contrário das comorbidades clínicas, os distúrbios psíquicos nem sempre são satisfatoriamente revertidos após o emagrecimento. Isto se dá uma vez que as mudanças físicas ocorrem de forma muito acelerada, dificultando a percepção do indivíduo sobre sua atual identidade e, consequentemente, sobre a relação dele com o campo no qual está inserido de forma saudável. A partir disto fica evidente a necessida de da ação de um agente facilitador nesta dinâmica, já que os ajustamentos criativos psíquicos necessários não acompanham a velocidade da mudança corporal. Segundo Robine (2006, p.53) “o ajustamento garante a dimensão do real e da adaptação, a criação abre para a dimensão da fantasia e para a ampliação de possibilidades”. É importante ressaltar o fato de que a cirurgia é apenas um instrumento que irá gerar resultados positivos, desde que a haja a devida reconfiguração na organização da vida do sujeito. Pensando a resiliência como algo que se constrói numa relação do individuo com o meio, esta pode ser desenvolvida estando o psicólogo enquanto elemento que facilite este processo. De acordo com Granzzoto (2007), o clínico perceberá o momento de pontuar, o momento de frustrar o ajustamento neurótico. Sendo assim, é necessário que o profissional de psicologia se faça presente no processo de cirurgia bariátrica de forma abrangente, desde o acompanhamento do sujeito no período pré-operatório, até os efeitos do pós-operatório, dando início à construção da awareness que, segundo Yontef (1998, p. 215), “é o processo de estar em contato vigilante com o evento mais importante do campo indivíduo/ambiente, com total apoio sensoriomotor, emocional, cognitivo e energético.” É iniciado um processo no qual o indivíduo entra em contato com suas atuais limitações, o sentido que estas possuem e a configuração de vida que as sustenta, bem como suas necessidade s. “Para trabalhar o organismo e sua necessidade de um eterno retorno a uma cíclica auto-regulação, terapeuta e cliente precisam mergulhar no mundo de sua subjetividade a fim de vivenciar o sentido das coisas, descobrindo na totalidade de cada um o que é figura e o que é fundo”. (RIBEIRO, 2006, p.125) Enfrentar as mudanças com resiliência demanda do psicólogo ajudar o cliente a dar-se conta de como ele está diante da situação, de que forma o meio pode o favorecer e quais recursos estão disponíveis. “É a partir desse contexto total da história do cliente que será possível compreender sua história presente e seu sofrimento que contém em si gestalten inacabadas, gestalten estas que uma vez fechadas, implicarão numa ressignificação do sujeito e de seu mundo”. (Frazão, 1991, p.45) A prática da cirurgia bariátrica, estando em expansão, proporciona uma demanda crescente para a atuação do psicólogo. Visto que o potencial de cura se dá na relação, princípio da Gestaltterapia, este trabalho aponta para a possibilidade identificar potencialidades e possibilidades de reconfiguração do campo, mesmo diante do adoecimento com base no conceito de resiliência. A cirurgia bariátrica enquanto instrumento facilitador do emagrecimento, não implica apenas em modificações corporais. Considerando que o organismo busca regular-se, após certo período, este inicia um processo de retomada de estabilidade de funcionamento, desacelerando o ritmo de forma gradativa e, consequentemente, reduzindo os efeitos relativos ao emagrecimento. Isto indica a necessidade de manter as modificações sofridas até então através de novos hábitos alimentares e comportamentais. Ou seja, esta discussão vai muito além do ponto de vista físico. A cirurgia bariátrica impl ica, então, na necessidade do indivíduo passar por significativas alterações à nível comportamental, colocando-o diante de um processo de identificação de uma condição inicial, desconstrução desta e construção de uma nova condição a partir da identificação de novas necessidades, possibilidades e limites em diversos aspectos. O setting terapêutico assume a função de espaço no qual o indivíduo pode visualizar estas questões e experimentar alternativas que favoreçam o alcance da melhor forma consigo e com meio no qual está inserido. Segundo Robine (2006, p.25) “Para que haja um funcionamento, é necessário que haja um vazio. Para que um indivíduo evolua, é necessário que haja espaço para mudanças, que haja interstícios nos quais se possam apoiar as alavancas, espaços que acolham a novidade, as brechas e as falhas que permitam o movimento” Bibliografia CAMPOS, R.TROMBETTA, I. C. O estímulo da beleza. Viver Psicologia, São Paulo, V.8, N 94, p. 36-37, Nov., 2000. FRAZÃO, L.M. Pensamento diagnóstico em Gestalt-terapia. São Paulo: Revista de Gestalt do SedesSapientiae, 1991. LIMA, A.P; Resiliência: um enfoque da Gestalt-terapia. Sampa GT. São Paulo, V.3, N 3, p. 49-57, 2006. MÜLLER-GRANZZOTO, M.J. & MÜLLER-GRANZZOTO, R.L. Fenomenologia e gestalt-terapia. São Paulo: Summus, 2007. RIBEIRO, J.P. 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Publicado

2015-12-01