Frederick Perls, inquietações e travessias.
Palavras-chave:
INQUIETAÇÃO E TRAVESSIASResumo
Em busca de sentido: a trajetória teórica de Frederick Perls Nesse minicurso vamos examinar alguns aspectos da produção teórica publicada em livros de uma figura instigante e polêmica na Gestalt Terapia, Frederick Perls. Mas porque investigar Perls? Ainda haveria necessidade de se empreender uma tarefa desta natureza? Será que esse estudo ainda encontra ressonância nas necessidades teóricas e clínicas da Gestalt Terapia? A necessidade de atualizar um discurso teórico que faça jus à atualidade da prática clínica nos permite responder afirmativamente à necessidade de estudos de natureza histórica e epistemológica. Uma abordagem se mantém viva porque aberta às revisões e atualizações, desde que feitas de forma coerentes e consistentes com o sistema a qual pertencem. E é nesse compasso que a Gestalt Terapia tem marcado seu lugar, se mantendo aberta e buscando a produção de conhecimentos naquilo em que se reconhece incompleta, e dessa forma abrindo novos horizontes. No campo da psicologia clínica o conhecimento advém principalmente do setting clínico, exigindo por isso uma adequação da compreensão das teorias que a sustentam, assim como uma atualização dos seus pressupostos. Criador da Gestalt Terapia e seu principal divulgador, inegavelmente Perls é considerado uma pessoa inteligente, intuitiva e criadora. Porém, em relação ao seu legado teórico, importantes estudiosos da Gestalt Terapia avaliam que ele deixou uma produção fragmentária e inacabada, e por isso, geradora de muitos mal-entendidos, apesar de sua inegável originalidade e força. Sem dúvida, a polêmica figura de Frederick Perls provocou a concentração de muitas críticas, especialmente após a sua morte e a partir de meados dos anos 70 e a década de 80. A principal delas diz respeito ao modelo de Gestalt Terapia transmitido por Perls, tendo como consequência a divulgação da prática da Gestalt Terapia centrada na prática e na personalidade de Perls, causando um empobrecimento da produção teórica e uma sobrevalorização da prática. Entretanto, nesse movimento crítico muito se perdeu daquilo que Perls produziu com muita intuição e criatividade, porém descontextualizado de sua trajetória como um todo e com muito pouca sistematização, acarretando uma descontinuidade teórico-conceitual. Na crítica a Perls com o seu “fazer” em uma prática desvinculada da teoria, no natural movimento pendular, a Gestalt Terapia caminhou em direção contrária. Alerta nesse sentido foi dado por Walter Ribeiro em sua palestra de encerramento do II Encontro Candango de Gestalt Terapia (2006), numa alusão à comparação de Miller e From (1994) a respeito da divisão entre dois estilos literários opostos representantes da divisão na cultura norte-americana: o estilo carapálida da costa leste e o pele-vermelha da costa oeste, numa dicotomia entre experiência e consciência, entre energia e sensibilidade, entre a conduta e as teorias da conduta. W. Ribeiro avaliou que a Gestalt Terapia havia se tornado muito ‘cara pálida’, e que era preciso recuperar a intenção e originalidade do pensamento de Perls, que haviam se perdido nas críticas contundentes e adequadas ao movimento ‘pele vermelhismo’ que prevaleceu na publicação do Gestalt Terapia e no ensino de Frederick Perls. Acreditamos que a comunidade gestáltica, já de posse do resgate de suas origens filosóficas e científicas, poderia reintroduzir de forma criteriosa o que fora preciso excluir nas décadas anteriores por falta de fundamentação. Dessa forma, nesse minicurso, procuraremos resgatar o fio condutor da produção teórica de Frederick Perls através do exame das suas obras publicadas em livro, a partir de Ego, Fome e Agressão, publicada em 1942, até ao conjunto de suas obras publicadas em 1969. Examinaremos essa trajetória buscando recuperar o espírito de sua busca e produção, com as perguntas: qual a transição e as rupturas que cada uma delas propõe? Qual a relação teórica entre uma determinada obra de Perls e a sua trajetória como um todo, isto é, o que a obra traz de sua história e para onde ela aponta? O que a obra procurou estabelecer como proposta clínica? Há um fio condutor que se manteve? Se há, qual é esse fio que permeia sua trajetória? Em uma análise panorâmica priorizada por nós, levaremos em conta o fator temporal, cultural e teórico de forma a destacar a pertinência de cada obra, seu tema, e objeto de estudo. A trajetória da produção teórica de Perls publicada em livros é vinculada ao período cultural em que cada uma delas surge, e marca o pensamento de Perls em cada uma das etapas onde o autor se coloca diferentemente à obra ou ao período anterior. Assim temos: anos 40, na África do Sul, vivendo o distanciamento da Europa e do movimento psicanalítico; anos 50, nos EUA, na agitação cultural e cosmopolita de Nova York, com o início da revolução cultural que o país viveu nas duas décadas seguintes; e finalmente, a década de 60, com Perls vivendo o auge do movimento da contracultura. Essa década culmina em 1969, ano marcado pela mudança de Perls para Cowichan, no Canadá, em busca de novos sonhos, representando o fim de uma era com a desilusão com os movimentos libertários dos anos sessenta e o desapontamento com as instituições. Podemos também pensar a trajetória teórica de Perls segundo sua pertinência aos dois grandes sistemas aos quais foi vinculado, a psicanálise e a gestalt terapia. Mas, para o propósito deste minicurso, de forma a priorizar uma distinção conceitual, iremos considerar a diferente posição teórica de Perls em três etapas: Perls da Psicanálise, Perls da criação da Gestalt Terapia; Perls de 1969. E a partir daí, na perspectiva desses três posicionamentos teóricos identificados em sua trajetória, examinaremos alguns aspectos da sua obra referente àquele período. Recorremos a essa perspectiva histórico conceitual contextualizada, pois o nosso objetivo é manter o espírito da abordagem e realizar uma análise coerente com sua matriz. Esperamos renovar o entendimento dos conceitos filosóficos e científicos propostos por Perls em suas obras, sem perder de vista a linha mestra da Gestalt Terapia. Desse modo, buscaremos que as discussões nesse minicurso se insiram no movimento de busca da atualização dos parâmetros do entendimento da Gestalt Terapia, de forma a ampliar seus horizontes teóricos, e dessa forma, contribuir para que a abordagem possa alcançar uma amplitude maior na sua prática. Fádua Heloufaduahelou@gmail.com Público-alvo: Interessados em história e epistemologia da Gestalt Terapia.Publicado
2015-12-01
Edição
Seção
Mini-cursos