CF 07: O CUIDADO NA CLÍNICA CONTEMPORÂNEA: A HOSPITALIDADE COM O QUE É HUMANO E O TERAPEUTA COMO O OUTRO-RAIZ
Resumo
CF 07: O CUIDADO NA CLÍNICA CONTEMPORÂNEA: A HOSPITALIDADE COM O QUE É HUMANO E O TERAPEUTA COMO O OUTRO-RAIZ Beatriz Cardella A partir de minha experiência como psicoterapeuta ao longo de 25 anos, e do tema do presente congresso: Ser Humano, o objetivo deste trabalho é realizar uma reflexão sobre a tarefa ética do Cuidado na clínica contemporânea. Essa reflexão surge também no diálogo com diversos autores que tratam do sofrimento humano na atualidade e apresentam importantes contribuições para a compreensão da condição humana e para o reconhecimento das novas modalidades de sofrimento e adoecimento na contemporaneidade. Abordo o cuidado em sua dimensão de Hospitalidade com o humano, como a disposição do mundo humano em receber os seus membros para que possam existir ENTRE outros, estabelecendo as condições necessárias para o acontecer humano. O contrário da hospitalidade é o exílio, o desterro e o desenraizamento, fraturas éticas e problemáticas comuns que se apresentam no cotidiano da clínica, e que convocam o psicoterapeuta a responder através do reconhecimento das necessidades fundamentais da pessoa. Hoje, é freqüente no relato de meus pacientes inúmeras situações nas quais o fenômeno humano é colocado em risco: humilhações, perda da dignidade, coisificação, solidão profunda, ausência de pertencimento, dificuldade para estabelecer e encontrar relações significativas, impossibilidade de repousar e encontrar silêncio, etc.Há, cada vez mais, o aparecimento de pessoas que não se sentem gente, revelando um tipo de sofrimento diferente de outros momentos da história. Observamos em meio aos inúmeros benefícios da tecnologia, o nascimento do homem digital, que perde as raízes na condição humana, pessoas que começam a responder como robôs, autômatos, “zumbis” e espectros, revelando profundas rupturas no ethos humano. Tratar da hospitalidade na clínica é assinalar a compreensão ontológica no trabalho terapêutico, e assentar-se na mensagem buberiana que evoca no pensamento contemporâneo a nostalgia do humano, como enfatiza Von Zuben na introdução do Eu e Tu (Buber, 1974): “Sua voz (de Buber) ecoa exatamente numa época que paulatina e inexoravelmente se deixa tomar por um esquecimento sistemático daquilo que é mais característico no homem: sua humanidade.”(1974, p.VII) Nessa perspectiva, o terapeuta é anfitrião, o outro-raiz, capaz de acolher a pessoa na comunidade humana, através de uma compreensão não apenas ôntica, mas ontológica. Nessa perspectiva também, a relação terapêutica se configura como Morada, restabelece o ethos. A partir dos fundamentos da Gestalt-terapia e da Abordagem Dialógica discuto sobre elementos fundamentais da sessão terapêutica no restabelecimento do ethos: a temporalidade em suas diferentes dimensões, o lugar (físico e simbólico) onde é possível enraizar-se, a relação como hospitalidade e construção conjunta, transformação mútua e oferta compartilhada (dimensão comunitária onde é possível singularizar-se), e o acolhimento do Mistério, revelado na surpresa, na singularidade, no tempo, no espaço, na origem, no fim, no encontro com o outro em si e fora de si, e nas experiências do Sagrado. Comento também sobre as atitudes terapêuticas e a formação humana do profissional para realizar a tarefa do cuidado no contexto atual, e as necessidades e responsabilidades do homem contemporâneo na co-criação de um mundo humano.Publicado
2014-09-19
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Seção
Conferências