PN 05: AUTORREGULAÇÃO ORGANÍSMICA ATRAVÉS DO DIÁLOGO: RELATO DE UMA SESSÃO TERAPÊUTICA

Autores

  • Claudia Venancio de Lima

Resumo

PN 05: AUTORREGULAÇÃO ORGANÍSMICA ATRAVÉS DO DIÁLOGO: RELATO DE UMA SESSÃO TERAPÊUTICA Cláudia Venancio de Lima RESUMO O presente trabalho procura estabelecer como se dá a relação entre a postura dialógica do Gestalt-terapeuta e a autorregulação organísmica no cliente. Foram analisadas a aceitação e a inclusão como formas de intervenção e como, a partir delas, o processo de autorregulação organísmica flui. Para tanto, foi considerado o relato de uma sessão terapêutica e como se deu o processo de autorregulação no corpo da cliente. A revisão da literatura abordou a visão de homem da Gestalt-terapia, a abordagem dialógica, a relação dialógica e o conceito de autorregulação organísmica. Após identificar e discutir a confirmação e a inclusão como prática da relação dialógica, este trabalho mostra como é possível haver autorregulação organísmica a partir do diálogo. Palavras Chave: Psicoterapia dialógica; Autorregulação organísmica; Diálogo. PROPOSTA “Para a Gestalt-terapia, o ser humano é relacional, pois a existência humana é definida segundo a relação campo-organismo-meio” (KIYAN, 2006, p. 145). O fenômeno para Gestalt-terapia é o aqui-agora, o que acontece no setting esta a disposição da nossa percepção. Para Ribeiro (2006), o terapeuta não conseguirá encontrar seu cliente se ficar somente com o olhar clínico. O fenômeno que se apresenta é relacional. Permite uma visão holística da pessoa. “A Gestalt-terapia afirma que a pessoa deve ser vista como um todo, ou seja, que seu comportamento só se torna compreensível a partir de sua visão dentro de um determinado campo com o qual ela se encontra em relação.” (Ribeiro, 1985 pág. 95) O cliente não é reduzido a um sintoma que precisa ser tratado. “A Gestalt-terapia fez uma longa e complexa caminhada conceitual, sendo uma abordagem psicoterapêutica que surge da influência de várias escolas filosóficas e teóricas, entre elas a abordagem dialógica.” (KIYAN, 2006 p. 145). A psicoterapia dialógica não é somente uma abordagem, mas uma atitude ou postura em relação ao homem e ao processo psicoterapêutico. Não é um processo fechado, mas esta em andamento. A cada fenômeno é necessário uma resposta única. (HYCNER, 1997). “O dialógico acontece no reino do “entre”. Abrange duas posturas polares: o Eu-Tu e o Eu-Isso. [...]. A primeira é uma atitude de “conexão” natural e a segunda de “separação” natural” (HYCNER, 1997, p. 32). O que Hycner chama de conexão natural é a capacidade de o terapeuta tentar experenciar aquilo que o cliente está experenciando. A inclusão é um movimento de ir e vir do terapeuta e ainda assim manter seu próprio centro. A confirmação faz parte deste processo. Para Buber (1965, citado por Hycner, 1997) “[...] o homem espera, secreta e timidamente, um sim, que só pode vir de uma pessoa para outra. É de um homem para o outro que o pão celestial de ser o próprio ser é passado”. É na confirmação, que o cliente é capacitado para ser ele mesmo e ficar no centro de sua existência. Este trabalho propõe: ampliar e discutir como a confirmação e a inclusão do diálogo podem possibilitar a autorregulação organísmica? Para responder a esta pergunta, será discutida a autorregulação organísmica através do diálogo, seguida de uma conclusão. “Ana” é uma cliente em psicoterapia há 12 meses. Ela traz em seu relato um fato que estava mobilizando toda sua vida. Logo após a separação, o ex-marido de “Ana” foi morar com outra mulher, com a qual mantinha um relacionamento mesmo enquanto casado. Pouco tempo depois, essa mulher engravidou. Ana tem um filho de 7 anos com seu ex-marido. Na sessão, Ana chega muito abatida, todo seu corpo “falava” naquele momento: olhos abatidos, ombros caídos, passos lentos, olhar perdido, um sorriso que não conseguia se firmar no seu rosto. Ela comenta sobre o final de semana e fala da festa de aniversário de seu filho. Como, coincidentemente, o bebê irmão dele nascera no mesmo dia, seu ex-marido não pôde permanecer o tempo todo na festa de aniversário. Ana olhou para mim, me lembro que estava perto dela e inclinei meu corpo um pouco mais, encostei minha mão em sua perna, olhei para ela e perguntei como se sentia naquele momento. Ela começou a chorar muito e a dizer que aquilo tudo era muito triste, que seu filho teria que dividir esta data para vida toda. Continuei com a mão encostada em sua perna e disse a ela que realmente era muito difícil, continuamos a nos olhar e eu fui confirmando os sentimentos de Ana, sem tentar em nenhum momento retirá-la daquele lugar. Nossos olhares permaneceram juntos. Perguntei como “Ana” como se sentia quando eu dizia para ela que realmente era muito difícil e sofrida a sua situação. Ela começou a me relatar um bem estar físico e pude perceber como sua respiração e todo seu corpo foram se acalmando, e ela pode ficar presente em si mesma. Para Goldstein, estudioso da neurologia, o homem possui um impulso atuante de autorregulação; ele é sempre estimulado por este impulso. (RIBEIRO, 1985). Segundo Perls (2002), o organismo não tem capacidade de autorregular-se sozinho; ele precisa do outro, do mundo para atender suas necessidades. No caso descrito, “Ana” pode, a partir do diálogo, fazer contato com seus sentimentos e dar preferência às necessidades do seu organismo. A partir da inclusão e da confirmação - relação dialógica - ela pode respeitar a totalidade funcional do seu organismo, relatando um bem estar total. Segundo Hycner (1997), a confirmação está na essência de qualquer abordagem dialógica. Ele afirma que confirmar o outro é voltar-se para este outro e afirmar sua existência com ele e com os outros no mundo. É como se estivessem terapeuta e cliente numa interseção existencial o “entre”. É aceitar a pessoa, seu comportamento, quem ela é. Foi o que fiz por “Ana”: confirmá-la, aceitá-la e estar disponível para ir-e-vir, colocando-me na possibilidade de estar no outro lado. Neste trabalho, buscou-se defender que aceitação e inclusão, que fazem parte da relação dialógica, proporcionaram a autorregulação do organismica da cliente. Apresentou-se a experiência de uma sessão terapêutica, embasada pelos conceitos de autorregulação organísmica e relação dialógica. Ao longo do relato experencial da sessão descrita, ficou claro como foi possível para a cliente vivenciar um bem estar a partir da confirmação e da inclusão que o terapeuta pode proporcionar a ela. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA KIYAN, Ana Maria Mezzarana. E a Gestalt emerge: vida e obra de Frederick Perls. São Paulo: Altana, 2006. RIBEIRO, Jorge Ponciano. Vade-mécum de Gestalt-terapia: conceitos básicos. São Paulo: Summus, 2006. HYCNER, Richard; JACOB, L. Relação e cura em Gestalt-terapia. São Paulo: Summus,1997. PERLS, F.S. Ego fome e agressão: uma revisão da teoria e do método de Freud. São Paulo: Summus, 2002. RIBEIRO, Jorge Ponciano. Gestalt-terapia: refazendo um caminho. São Paulo: Summus, 1985.

Publicado

2014-09-19