Mesa 6: Conversando para além do um a um (grupo, workshop, instituição)
Palestrantes: Laura Cristina
de Toledo Quadros, Marcelo Pinheiro, Teresa Amorim.
Moderadora: Gladys D’Acri.
Resumo:
Nossa proposta nesta mesa-redonda é promover uma reflexão sobre
a visão de grupos e workshops em Gestalt-terapia. Através do olhar
de alguns autores que tem tratado sobre os temas específicos do homem
em relação, pretendemos discutir como a Gestalt-terapia se coloca
frente a estes fenômenos grupais.
6.1 A dimensão social da prática clínica na perspectiva da abordagem gestáltica: do espaço íntimo às transformações coletivas.
Laura Cristina de Toledo Quadros
Resumo
O objetivo deste trabalho é discutir aspectos epistemológicos
subjacente s à abordagem gestáltica que possam sustentar uma prática
clínica no contexto contemporâneo considerando não só
o espaço íntimo mas também suas afetações
no coletivo. Par a construirmos tal pr ática, faz-se necessário
esclarecermos a dimensão social da prática clínica situando
nossas responsabilidades nesse processo.
Proposta
Historicamente, o trabalho social em diversas áreas de atuação
tem sido identificado com o assistencialismo gerando distorções
e, principalmente limitando possibilidades na medida em que se repetia um modelo
que se aproximava mais do colonialismo do que do desenvolvimento.
Em relação à atuação da Psicologia, o crescimento da ação comunitária vem acompanhando esta mobilização embora possamos observar que no próprio contexto da Graduação de Psicologia o enfoque da formação e o interesse dos alunos ainda concentrem-se na atuação clínica tradicional, o modelo de consultório.
Assim, a internalização desse modelo de atuação “clínica-individual-em-consultório-particular” é bastante intensa no imaginário dos estudantes e acreditamos ser reforçado pela formação acadêmica. Na verdade, apenas recentemente os cursos e os profissionais de Psicologia tem se voltado para as práticas sociais comunitárias possibilitando uma ampliação de possibilidades de alcance da pratica de psicologia. As iniciativas isoladas estão se juntando e constituindo-se numa preocupação da categoria.
Se considerarmos a idéia do Ser Humano como um processo
de transformações e imprevisibilidades, a Psicoterapia é
uma prática fundamental para que o sujeito amplie a consciência
de si mesmo e possa reconhecer potencialidades através da fluência
do sentir a partir do Vivido. Assim, poder criar um espaço nas comunidades
onde ela possa ser uma opção de tratamento é, ao nosso
ver, uma postura renovadora.
No entanto, é extremamente importante não realizarmos uma simples
transposição de modelo de um espaço para outro. Precisamos
repensar a forma sem perder a seriedade e os fundamentos que a suportam. Estamos
diante da complexidade não alcançável pela via da causalidade
o que representa, de fato, um desafio para as Ciências Humanas neste momento
de transição onde o caos e a desordem se interpõem às
certezas e às estruturas constituídas até então.
Mas, como nos diz Morin (2002)
“Como a complexidade comporta necessariamente antagonismos e incerteza, a sua fragilidade não nos permite fixar uma excelência durável. A excelência complexa só pode ser incerta, mutante, modificável, sem otimização definitivamente determinável.” (p. 199)
A Gestalt-terapia é uma abordagem que trabalha com uma visão de homem contextualizada numa integração corpo, mente e ambiente. É uma abordagem de vanguarda que inclui os aspectos sociais sem uma perspectiva determinista.
Segundo Perls:
“O homem que pode viver um contato intimo com sua sociedade, sem ser tragado
por ela nem dela completamente afastado, é um homem bem integrado (...).
O objetivo da psicoterapia é justamente criar tal
homem.” (1981, p. 40)
Vale ressaltar que esta idéia não está vinculada ao conceito de adaptação que é mais reativo, porém guarda íntima relação com a idéia de Afirmação em Nietzsche que representa o ativo, o criativo. Dessa forma, ter a Gestalt-terapia como referência no trabalho social é uma conseqüência natural de uma abordagem que permite e facilita tal ação. Quando ressaltamos este aspecto estamos nos referindo às bases conceituais e filosóficas da Gestalt-terapia e não as suas técnicas. A partir desses fundamentos buscamos construir um conjunto de referências do que chamaremos aqui de “atuação possível” na clínica através da experiência que vem sendo vivenciada numa ONG que atua na comunidade da Cidade de Deus, Rio de Janeiro. (QUADROS, 2002)
A Gestalt Terapia desenvolveu-se no rastro das novas descobertas e é, portanto, uma abordagem que se afasta do determinismo e da causalidade, enfatizando a dinâmica relacional. A teoria da relatividade, a física quântica, a termodinâmica irreversível e a concepção sistêmica demonstraram, que na natureza havia também o caos não apreensível porém compreensível, se admitirmos uma nova concepção de mundo. Caracteriza-se, portanto, um momento de transição de paradigmas levando-nos ao desafio de enfrentarmos os fenômenos sociais dentro de uma ótica multi-dimensional.
Ao discorrermos sobre este
tema, a primeira coisa que não pretendemos é criar um modelo de
atuação de clínica social em Gestalt-terapia. Ao contrário,
nossa finalidade é discutir tal conceito visando uma praxis
que possa validar as especificidades de cada contexto, transitando pelas novas
possibilidades epistemológicas, visto que a idéia de um modelo
é incompatível com os rumos atuais. Porém, observando o
crescimento destas chamadas “práticas sociais”, torna-se
imprescindível não só uma revisão acadêmica,
bem como uma discussão que possa abranger e fundamentar uma prática
consistente.
A Clínica na transição
de paradigmas
Somos seres sociais e quando nos unimos em uma rede de interações,
constituímos um movimento constante de conservação desta
ordem singular.
Assim, penetrar numa nova comunidade implica numa reorganização
do sistema que estaremos ali representando e na conseqüente mobilização
do sistema que nos recebe. Portanto, não basta elaborar um trabalho para
a comunidade. É necessário recriá-lo dinamicamente no processo
de interação.
A tradição da ciência clássica reforçou em
todas as áreas a fragmentação dos saberes a partir da dicotomia
sujeito/objeto intensificando os especialismos e o reducionismo dos fenômenos
e, consequentemente, impedindo a integração entre as diversas
perspectivas do conhecimento.As Ciências Humanas neste trajeto histórico
foram perdendo a dimensão integrada de indivíduo/espécie/cultura/sociedade,
comprometendo a compreensão dos fenômenos humanos em todos os sentidos.
A idéia da integração que consideramos aqui nada tem a ver com uma simples unificação, mas sim com uma articulação processual onde as peculiaridades de cada cultura e as particularidades de cada indivíduo possam ser preservadas dentro de uma perspectiva relativizada permitindo-nos uma visão mais ampla e representativa do social. Para nós isso implica em ver o Homem em sua condição humana, ou seja, ativo, vivo, emergente ao invés de entendê-lo como um objeto de estudo.
Em relação à Psicologia Clínica, consideramos que o enfoque fenomenológico propicia uma visão mais atualizada. A partir dele podemos afirmar que estamos diante de um Homem imprevisível, singular, indeterminado e subjetivo que não pode ser cindido de sua relação com o mundo, assim como não pode ser descontextualizado de seu tempo e de sua cultura. Ao abordarmos o Homem em Psicoterapia temos que considerar a relação que está sendo estabelecida no setting terapêutico e o trabalho clínico que sai do consultório tradicional e busca atingir outras fronteiras; necessita ser revisto e afirmado na busca da confirmação e validação do Humano.
Portanto, o que chamamos de clínica social ou clínica Social Comunitária não deve ser reduzido a uma ação de atender aos mais carentes. É fundamental estabelecermos outro olhar sobre esta questão e certamente há um desafio na defesa de um processo psicoterápico que valorize a singularidade e não esvazie a subjetividade para que o sujeito em seu contexto ou sistema social não seja invalidado ou até mesmo subjugado pela destruição dos elementos inerentes à sua cultura ou à sua comunidade só porque não o reconhecemos no nosso próprio código conceitual. Para Castoriadis “A questão do sujeito não é a questão de uma ‘substância’, mas de um projeto. A questão do sujeito é, em primeiro lugar, a questão do ser humano, a questão da psique, para começar, mas é também a questão do sentido e, também, a questão da própria questão. O sujeito é essencialmente aquele que faz perguntas e que se questiona, seja no plano teórico ou no que chamamos prático. Chamarei subjetividade a capacidade de receber o sentido, de fazer algo com ele e de produzir sentido, dar sentido, fazer com que cada vez seja um sentido novo.” (1999, p. 35)
Assim, a Clínica
não pode ser entendida como uma ação sobre o indivíduo
desconectado de seu contexto. Porém, não podemos partir do pressuposto
de que quando nos referimos à Comunidade, estamos diante de um conceito
fechado, criado por nós a partir de um olhar de cima para baixo. São
questões distintas e paradoxalmente relacionadas.
O sujeito da contemporaneidade é também um sujeito da massificação
e as práticas sociais precisam estar atentas a esta condição
a fim de não reproduzir intervenções ou reforçar
a criação de demandas como produto de mercado.
O comunitário, a
comunidade, não representam o ser em si.
O momento contemporâneo é propício para reformularmos o
nosso olhar sobre o Humano através da percepção das relações
estabelecidas entre o indivíduo, a cultura e a sociedade. A partir desta
visão, torna-se pertinente uma reavaliação das práticas
o conceito de Comunidade, especialmente no cenário atual da realidade
brasileira.
Bibliografia
CASTORIADIS, C. Para si e subjetividade, In: Pena-Veja, A.; Nascimento, E.P. (org.) O pensar complexo: Edgar Morin e a Crise da modernidade, Rio de Janeiro: Garamond. 1999.
CHAUVENET, A.; DESPRET, V; LEMARIE, J-M; Clinique de la Reconstructi on, L ‘Harmattan, Paris: 1996.
LATOUR, B Reensamblar lo Social: Una introducción a la teoría del actor-red Buenos Aires: Manantial, 2008.
MAGALHÃES, M. et al., Eu quero ajudar as pessoas: a escolha vocacional da psicologia, em Psicologia, Ciência e Profissão – Revista do CFP, Brasília: Ano 21 – nº. 2, 2001.
MORIN, E. O método 5: a humanidade da humanidade, Porto Alegre: Ed. Sulina, 2002.
PERLS, F. A Abordagem Gestáltica e a Testemunha Ocular da Terapia, Rio de Janeiro: Zahar,1981.
QUADROS, L.C.T.; Ribeiro, C. O real e o possível no trabalho social: a experiência de uma OGN referenciada na Gestalt-terapia, em Presença, Revista do Centro Universitário Celso Lisboa, Rio de Janeiro: nº. 2, 2002.
6. 2 O trabalho com grupos em Gestalt-terapia. Para além
do um a um.
Marcelo Pinheiro da Silva
Resumo
Este trabalho trata das expressões do atendimento Gestáltico de
grupos, definindo seus principais tipos e estilos com suas virtudes fundamentais.
Ressalta a riqueza, a importância, a coerência histórica e as modificações de características sofridas pela Gestalt-terapia em sua aculturação a realidade sócio-histórica brasileira.
Proposta
Neste trabalho buscarei tratar de algumas das expressões do atendimento
em grupo dentro de um referencial gestáltico. Farei isto a partir de
reflexões desenvolvidas ao longo de mais de 20 anos de experiência
trabalhando intensamente com diversos tipos de grupos dentro desta abordagem,
em especial com grupos terapêuticos 1
, grupos íntimos 2 e grupos de
treinamento 3.
1- Grupo formado especificamente
com o objetivo de desenvolvimento pessoal.
2- Universo relacional que pré-existe a intervenção terapêutica
e que busca este tipo de trabalho em função de
alguma dificuldade relacionada à dinâmica destas relações.
3- Grupo formado com o objetivo de desenvolver habilidades clínicas de
psicólogos ou estudantes de psicologia.
Tenho como objetivo definir os principais estilos de trabalho com grupos, tratando
de suas virtudes fundamentais e de sua coerência histórica. Ressalto
as modificações de estilo sofridas pela Gestalt-terapia em seu
aculturamento em nosso país. Busco demarcar a riqueza, a importância
e a pertinência do trabalho com grupos dentro da realidade brasileira
de nosso tempo.
Pensar na prática
da psicologia de nosso tempo é fundamental para que não nos alienemos
de nosso contexto sócio-histórico e também para que não
percamos a consistência epistemológica de nosso trabalho.
Para cumprir os objetivos citados em primeiro lugar busco de forma breve tratar
da compreensão do que é Gestalt-terapia, demarcando suas características
e sua contextualização histórica. Problematizo o trabalho
com grupos dentro desta tradição. Demonstro a importância
deste tipo de trabalho dentro de nosso contexto sócio-histórico.
Introdução
Neste trabalho busco tratar de algumas das expressões do atendimento
em grupo dentro de um referencial gestáltico. Faço isto a partir
de reflexões desenvolvidas ao longo de mais de 20 anos de experiência
trabalhando intesamente com diversos tipos de grupos dentro desta abordagem,
em especial com grupos terapêuticos, grupos íntimos e grupos de
treinamento.
Tenho como objetivo definir os principais estilos de trabalho com grupos, tratando de suas virtudes fundamentais e de sua coerência histórica. Ressalto as modificações de estilo sofridas pela Gestalt-terapia em seu aculturamento em nosso país. Busco demarcar a riqueza, a importância e a pertinência do trabalho com grupos dentro da realidade brasileira de nosso tempo.
Pensar na prática
da psicologia de nosso tempo é fundamental para que não nos alienemos
de nosso contexto sócio-histórico e também para que não
percamos a consistência epistemológica de nosso trabalho.
Para cumprir os objetivos citados em primeiro lugar procuro de forma breve tratar
da compreensão do que é Gestalt-terapia, demarcando suas características
e sua contextualização histórica. Problematizo o trabalho
com grupos dentro desta tradição. Demonstro a importância
deste tipo de trabalho dentro de nosso contexto sócio-histórico.
O que é Gestalt-terapia?
Para falar sobre a intervenção de grupo em Gestalt-terapia em
primeiro lugar se faz necessário definir o que é Gestalt-terapia
e contextualizá-la historicamente.
Não existe consenso na definição do que seja Gestalt-terapia. Autores consagrados divergem em suas definições.
Claudio Naranjo traz como uma de suas definições que Gestalt-terapia é o que Fritz fazia. Uma das definições mais aceitas é a de que Gestalt-terapia é uma abordagem existencial humanista fenomenológica. Alguns autores vão além colocando que Gestalt-terapia é existencial humanista fenomenológica com perspectiva de campo. Outros se incomodam com o termo humanista e afirmam que Gestalt-terapia é uma abordagem fenomenológico-existencial.
Eu particularmente neste
momento gosto de pensar a Gestalt-terapia como uma das abordagens que surgem
da busca de superação do dualismo próprio a uma perspectiva
metafísica extremamente presente no pensamento ocidental de nossa Era.
A Gestalt-terapia entende o homem e qualquer ser vivo como inseparável
de seu meio. Não existindo a priore e sim se construindo em sua interação
com seu ambiente performaticamente.
O ser humano não é coisa, não é algo acabado. Não
pode ser esgotado por uma construção teórica, por um sistema
estático. Ser humano é processo. Minhas teorias, por melhor que
sejam, não dão conta do ser humano que está a minha frente.
A partir daí o que buscamos em nossa prática é o estabelecimento
de uma relação terapêutica. Um espaço de troca com
ingredientes nutritivos. Um espaço aonde este ser possa florescer dentro
de sua coerência. O respeito a singularidade é um valor fundamental
nesta abordagem.
As principais características que tornam uma relação terapêutica produtiva, isto é, com ingredientes que facilitam o desenvolvimento humano são: honestidade, transparência, presença, respeito, interesse, compreensão, entre outros.
A ênfase no caráter relacional da Gestalt-terapia marca o estilo brasileiro desta abordagem. Muito da abrasividade característica pessoal de Perls foi dissipada no processo de aculturação desta perspectiva em nosso país.
O brasileiro é marcado por uma grande capacidade de tolerar diferenças e de se conformar com “erros” alheios. Característica que certamente pode ser vista como qualidade e também como defeito, mais esta discussão não cabe neste trabalho. O que nos interessa é a definição de nosso estilo. E a avaliação de como este estilo se expressa nos atendimentos de grupos.
Outro aspecto que não pode ser esquecido na busca de definir Gestalt-terapia é sua perspectiva holística. O gestalt-terapeuta em seu trabalho tem como objetivo facilitar que seu cliente aprenda sobre si mesmo, porém este aprendizado não é um aprendizado teórico, é um aprendizado organísmico. A melhor forma de explicar isto é pensar no aprender a andar de bicicleta. O tipo de conhecimento que buscamos facilitar vai nesta direção. Dizemos que alguém aprendeu a andar de bicicleta no momemento em que esta pessoa consegue lidar com a bicicleta sem ter que pensar no que está fazendo. Este é um aprendizado organísmico. E é este tipo de aprendizado que interessa dentro desta abordagem.
Neste ponto já estamos prontos para pensar nas características de um atendimento de grupo dentro de uma perspectiva gestáltica à moda brasileira.
Pensando grupo a partir
destes princípios: O que é trabalho com grupos?
É um trabalho realizado com mais de uma pessoa. É como diz o tema
desta mesa: para além do um a um.
Quais são os principais tipos de trabalhos desenvolvidos em grupo por
Gestalt-terapeutas?
Tipos de grupo 4:
• Grupos terapêuticos. São grupos formados especificamente com o objetivo de desenvolvimento pessoal.
• Grupos Íntimos. São universos relacionais que pré-existem a intervenção terapêutica e que buscam este tipo de trabalho em função de alguma dificuldade ligada à dinâmica destas relações.
• Grupos de treinamento. São grupos formados com o objetivo de desenvolver habilidades clínicas de psicólogos ou estudantes de psicologia.
4- Vale ressaltar que os workshops também são trabalhos com grupos e ora tem caráter terapêutico e ora tem finalidade didática.
Estilos de coordenação:
Vou ressaltar dois grandes estilos que possuem variações.
O primeiro estilo que vou destacar é aquele que marca de forma pungente
a história da Gestalt-terapia, aquele que caracterizou os primeiros Workshops
de divulgação da prática de Perls e que teve papel fundamental
no crescimento inicial desta abordagem.
Este estilo tem como característica a realização de um trabalho individual em grupo. Enquanto o terapeuta atua com uma pessoa o restante do grupo funciona como uma espécie de caixa de ressonância que dá mais peso a este trabalho. O terapeuta centraliza a interlocução, funcionando como personagem principal no processo terapêutico. Esta forma de trabalhar ainda vem sendo utilizada por muitos gestalt-terapeutas até a atualidade.
Nesta forma de atuação
os membros do grupo que não são diretamente
trabalhados têm ganhos indiretos eles crescem por identificação.
A intervenção pontual muitas vezes utilizada em workshops de demonstração
convida a um trabalho mais aprofundado, de maior exposição e infelizmente
são muitos os relatos de pessoas que terminam ficando extremamente insatisfeitas
com este tipo de prática principalmente por se sentirem demasiadamente
expostas e com isso
percebo que a Gestalt-terapia termina pagando um preço muito alto, angariando
a antipatia de muitas pessoas. Vale ressaltar o que nos dizem os profissionais
de comunicação: no que se refere a imagem pública, uma
pessoa insatisfeita traz consequências negativas muito maiores do que
as consequências positivas trazidas por uma pessoa satisfeita. A propagação
de informações ligadas à insatisfação é
muito mais dinâmica do que a propagação de informações
ligadas à satisfação.
Esta forma de trabalho também tende a fazer muito bem para o ego do terapeuta que muitas vezes ocupa uma posição quase de guru em seus grupos de trabalho.
Acredito que este tipo de
prática fez todo o sentido em Esalen na década de sessenta, mas
questiono sua validade no Brasil dos dias de hoje especialmente em workshops
de demonstração. Não tenho restrições a ocorrência
esporádica deste tipo de trabalho em grupos terapêuticos de longa
duração, pois dentro deste contexto os riscos são muito
menores.
O segundo estilo de trabalho que vou ressaltar aposta na riqueza interacional
do próprio grupo. Nele o terapeuta trabalha o grupo buscando exercer
uma função de guardião da relação. Atua no
sentido de facilitar as trocas propiciando a construção de um
clima de segurança e respeito. Busca criar condições para
que os canais de comunicação possam gradualmente se abrir e que
a riqueza das relações possa se dar. Eu particularmente me identifico
muito mais com este posicionamento.
O grupo é muito rico neste sentido. Como um espaço de troca. Um mini mundo onde as pessoas são e, sendo, mostram a expressão de seu ser. No trabalho com grupos, como no individual, temos duas dimensões: o que acontece aqui e o que o cliente conta sobre o que acontece lá fora. Estas duas dimensões são muito importantes em um processo terapêutico. Os motivos que dão sentido a um processo terapêutico estão ligados ao que acontece lá fora. Em contrapartida no aqui e agora as relações são vivas, as mesmas características que geram as dificuldades lá de fora tendem a aparecer no agora de forma bem mais palpável.
Quando observamos o trabalho com grupos a dimensão do aqui é especialmente rica, tanto em função da variedade relacional inerente a esta situação, como também pela riqueza das leituras acerca das situações experienciadas a partir dos vários pontos de vista dos membros do grupo.
Pontos de vista de pessoas que participam de um mesmo contexto relacional mais amplo. No grupo os consulentes experimentam a intimidade do contato com várias pessoas. Colegas com os quais vão se identificar muito e com outro em relação aos quais vão ter a experiência oposta. Podem participar da vida de pessoas de seu próprio sexo como também da vida de pessoas do sexo oposto. Em suma, o grupo traz em potencial um universo relacional extraordinário. Na medida em que acreditamos que o ser humano cresce na relação com o outro, isto significa um enorme potencial terapêutico. No que se refere ao atendimento de grupo, um dos momentos mais gratificantes é quando percebo um retorno interessante e rico, de um participante para outro, retorno este que eu jamais poderia dar. Simplesmente por este integrante estar vendo de outro ponto de vista, diferente do meu.
Por último gostaria de falar da importância da divulgação destas práticas em um país no qual a imensa maioria das pessoas não tem dinheiro para fazer uma terapia individual. O atendimento individual é extremamente caro e não podemos esquecer que vivemos em um país no qual a renda percapta é muito baixa.
Se pesquisarmos, veremos que de forma geral a imagem que as pessoas têm do que é uma psicoterapia é a de um atendimento individual. Um tipo de atendimento que o brasileiro médio não tem dinheiro para custear. Isto é um atestado de incompetência de nossa categoria. Nós permitimos que a população tenha como imagem do serviço que prestamos algo que fica fora de suas condições de consumo.
Com isso conseguimos formar uma situação na qual um universo enorme de pessoas necessita de terapia, mas não pode procurar em função da questão financeira e de outro lado temos uma quantidade grande de terapeutas com tempo ocioso em seus consultórios.
Penso que a ampliação da divulgação da possibilidade de atendimento em grupo é um grande favor que precisamos prestar tanto à sociedade de forma geral quanto em especial à nossa própria classe.
Para fechar este trabalho realizarei uma pesquisa com gestalt-terapeutas de várias gerações buscando identificar o quanto estes profissionais têm utilizado as formas de intervenção grupais em seus trabalhos. Para tanto utilizarei o questionário que se encontra no apêndice 1.
Apêndice 1
Questionário:
Nome:
Há quantos anos você está formado como psicólogo?
Há quantos anos você está formado como Gestalt-terapeuta?
Onde ou com quem você fez formação em Gestalt-terapia?
Levando em consideração
os vários tipos de grupo: terapêutico (só existe com fins
de tratamento), íntimo (famílias, instituições,
grupos que pré-existem a intervenção terapêutica
e que buscam atendimento de forma coletiva) e de treinamento (formado para o
ensino de práticas clínicas), hoje você está realizando
algum tipo de trabalho com grupo?
Que tipo?
Com quantos grupos?
Qual o número de integrantes destes grupos?
Em outras épocas você já trabalhou com grupos?
Quais tipos?
Qual era o número de integrantes destes grupos?
Você quer fazer alguma observação?
Referência Bibliográfica
GINGER, S.; GINGER, A. Gestalt:
Uma terapia do contato. São Paulo:
Summus, 1995.
HYCNER, R.; JACOB, L. Relação
e cura em Gestalt-terapia. São Paulo: Summus, 1997.
_____________________. De Pessoa a pessoa: psicoterapia dialógica. São
Paulo: Summus, 1995.
PERLS, F.S.; HEFFERLINE,
R.; GOODMAN, P. Gestalt-terapia.
São Paulo: Summus, 1997.
PERLS, F. S e outros. Isto
é gestalt. São Paulo: Summus, 1977.
PERLS, F. S. Gestalt-terapia explicada. São Paulo: Summus, 1977.
_________. A Abordagem Gestáltica e Testemunha Ocular da Terapia. Rio de janeiro: Zahar Editores, 1981.
PINHEIRO, M. A clínica
da síndrome do pânico. IGT na Rede
, Rio de Janeiro, RJ, 1.1, 05 08 2004. Disponível em: < http://www.igt.psc.br/ojs/viewarticle>.
Acesso em: 20 de julho de 2010.
POLSTER, M.; POLSTER, E. Gestalt-terapia integrada. Belo Horizonte: Interlivros, 1979.
RIBEIRO, J. P. Gestalt-terapia:
o processo grupal: uma abordagem
fenomenológica da teoria do campo e holística. São Paulo:
Summus, 1994.
RIBEIRO, W. F. R. Existência e Essência. São Paulo: Summus, 1998.
RODRIGUES, H. E. Introdução à Gestalt-terapia – Conversando sobre os fundamentos da abordagem Gestáltica. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
SILVA, M. A. D. Quem ama não adoece - O papel das emoções na prevenção e cura das doenças. p. 125-139. Editora Best Seller, 1994.
TELLEGEN, T. A. Gestalt e grupo: uma perspectiva sistêmica. São Paulo: Summus, 1984.
YONTEF, G. M. Processo,
Diálogo e Awareness: ensaios em Gestalt-
terapia. São Paulo: Summus, 1998.
ZINKER, J. C. A Busca da
elegância em psicoterapia: Uma abordagem
gestáltica com casais, famílias e sistemas íntimos. São
Paulo: Summus, 2001.
6.3 Conversando para além do um a um (grupo, workshop, instituição)
Teresa Amorim
O presente trabalho tem como objetivo promover uma reflexão sobre a teoria e prática de grupos e workshops em Gestalt-terapia, interrogando as questões existenciais e relacionais dessa modalidade de terapia.
“A Gestalt-terapia e sua abordagem do homem em seu ambiente nos oferecem de uma maneira mais ou menos explícita uma descrição das condições sociais propícias ao contato e ao desenvolvimento. [...] O grupo constitui, portanto, um excelente ‘laboratório de contato’ e amplia as possibilidades além das oferecidas unicamente pelo psicoterapeuta.” (ROBINE, 2006)
O grupo é um campo que potencializa a transformação, cuja essência reside no poder de escutar e sentir (RIBEIRO,1994). O autor ainda aponta para a experiência e a oportunidade rara de ver o mundo e a si mesmo com os olhos do outro, de se ouvir com os ouvidos do outro (RIBEIRO, 1994).
Podemos afirmar que o espaço grupal promove uma aprendizagem interpessoal possibilitando uma experiência emocional e relacional corretiva (YALON, 2006).
A Gestalt-terapia é
uma abordagem que favorece as condições de contato e desenvolvimento,
um laboratório de contato (ROBINE, 2006), favorecendo a ampliação
dos ajustamentos criativos.
Para Zinker (2007): “o grupo é não só uma pequena
comunidade coesa, na qual as pessoas se sentem recebidas, aceitas ou desafiadas,
mas também um lugar e uma atmosfera em que elas podem se tornar criativas
juntas”.
A proposta desse trabalho parte de uma visão cada vez mais atual e dinâmica dentro das bases teóricas e filosóficas da Gestalt-terapia, de uma terapia voltada para a totalidade significativa do eu-self-mundo. A idéia é promover um espaço de compreensão da dinâmica relacional proposta pela Gestalt-terapia em grupos e workshops. Partindo das teorias básicas da Gestalt-terapia: a teoria holística, a teoria de campo e abordagem dialógica, o foco é abordar a condução de grupos e workshops terapêuticos e seu poder curativo.
O presente trabalho provém de inquietações e reflexões pessoais oriundas da atividade de psicoterapeuta individual e de grupos, workshops sobre a experiência relacional de diversos clientes de terapia ao longo últimos anos.
A idéia de uma sociedade líquida (BAUMAN, 2000) talvez possa nos colocar na presença de uma complexidade das interações humanas. É importante se refletir sobre as relações e interações que são estabelecidas dentro de um novo enfoque.
Com um olhar dialógico, a Gestalt-terapia é uma abordagem de psicoterapia que acredita no ser holístico, o ser integrado ao meio, no ser em relação. Partindo desse princípio, a abordagem gestáltica sustenta uma concepção do ser integrado ao meio num processo de ajustamento criativo e alinhado com os novos paradigmas de ciência, cultura e subjetividade.
Durante o desenvolvimento do trabalho, pode-se buscar entender através das teorias de base da Gestalt-terapia – Organísmica, Holística, de Campo – quais as verdades inerentes a essa nova realidade relacional do indivíduo. Uma vez que sua meta principal é a conscientização do indivíduo consigo mesmo, com o outro e com o mundo, gerando um ajustamento mais criativo para uma vida mais saudável.
A concepção de Fronteira de Contato, na estrutura de crescimento proposta pela Gestalt-terapia, estabelece a experiência de fronteira entre o organismo e o meio, dentro de uma visão biológica, psicológica e sociológica, definindo-se como um estudo dos ajustamentos criativos. Segundo seus autores, Perls, Hefferline e Goodman:
“O organismo/ambiente
humano naturalmente não é apenas físico, mas social. Desse
modo, em qualquer estudo de ciências do homem, tais como fisiologia humana,
psicologia ou psicoterapia, temos de falar de
um campo no qual interagem pelo menos fatores socioculturais, animais e físicos.”
(1997)
Nas afirmações desses autores, o homem precisa estar incluído na sociedade e, por conseguinte, considerar a importância da experiência de integração. O ser humano é relacional e, talvez seja possível refletir a importância do processo criativo de ajustamento criativo dentro nas situações de contato para o homem contemporâneo.
Referência bibliográfica
BAUMAN, Z. Modernidade Líquida. Rio de Janeio: Zahar, 2000.
CASTILHO, A. A Dinâmica do Trabalho de Grupo. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1994.
PERLS, F.; HEFFERLINE, R.; GOODMAN, P. Gestalt-terapia. São Paulo: Summus, 1997.
RIBEIRO, J. Gestalt-terapia– o processo grupal. São Paulo: Summus, 1994.
ROBINE, J. O self desdobrado. São Paulo: Summus, 2006.
STEVENS,J. (org.) Isto é Gestalt. São Paulo: Summus, 1997.
TELLEGEN, T. Gestalt e Grupos – Uma perspectiva sistêmica. São Paulo: Summus, 1984.
YALOM, I. Psicoterapia de Grupo – teoria e prática. Porto Alegre: Artmed, 2006.
ZINKER, J. Processo Criativo
em Gestalt-terapia. São Paulo: Summus, 2007.